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Os resultados obtidos neste trabalho são coerentes com as duas hipóteses atualizadas de mudanças na política (policy change), demonstrando a consistência da abordagem para as explicar, inclusive levando à reforma do marco regulatório do setor. A seguir, as hipóteses de mudança na política, na sua versão mais atualizada (Jenkins-Smith et al., 2014), serão discutidas em face do estudo de caso proposto.

Hipótese 1 – significantes perturbações externas ao subsistema, significantes perturbações internas ao subsistema, aprendizagem orientada pela política, acordos negociados, ou alguma combinação desses são condição necessária, mas não suficiente, como fontes de mudança nos atributos centrais na política de programas governamentais (Jenkins-Smith et al., 2014).

Percebe-se na conjuntura apresentada, que houve uma combinação dos fatores necessários para a mudança na política do subsistema. A perturbação externa se deu pelo diagnóstico da incapacidade institucional do governo induzir – de maneira adequada e suficiente – todos os investimentos necessários para que os portos brasileiros acompanhassem a evolução dos portos do resto do mundo. Também como evento externo, conta o apelo existente em função da opinião pública sobre a carência de infraestrutura no país.

A aprendizagem orientada pela política foi identificada nos discursos proferidos pela coalizão estatista durante as audiências públicas da MP nº 595/2013. As crenças expressadas não se opunham abertamente à promoção da competição, demonstrando um certo constrangimento em relação às crenças centrais de política defendidas em audiências anteriores realizadas previamente à edição da MP.

Também foi possível identificar existência de acordos negociados entre as coalizões para viabilizar a preservação da reforma. Foram relatados episódios de negociação com as entidades representativas dos trabalhadores, que possibilitaram a inserção de diversas cláusulas em favor da coalizão estatista, assim como a introdução de cláusulas de prorrogação antecipada dos terminais existentes9, permitiram obter a adesão de parte da coalizão liberal, obtendo os votos necessários para a aprovação do novo marco.

108 O fato de existirem essas condições, como coloca a hipótese, não torna automático o processo de mudança na política. A mudança somente pode ocorrer, pois essas condições foram canalizadas pelos policy brokers e entrepreneurs, em sinergia com os objetivos dos decisores governamentais.

Hipótese 2 – os atributos políticos centrais de um programa governamental, em uma jurisdição específica, não serão significantemente revisados enquanto a coalizão de governo que instaurou o programa se mantiver no poder na referida jurisdição – exceto quando a mudança é imposta por uma jurisdição hierarquicamente superior. (Jenkins- Smith et al., 2014).

Quanto à segunda hipótese, é possível testá-la a partir do entendimento das mudanças recentes na coalizão de governo, desde o impeachment da presidente Dilma Rousseff, ilustrados pelo fim do status de ministério da SEP e da discussão de alterações infralegais e legais ora em discussão pelo MTPA.

No próximo capítulo será apresentada linha do tempo do período analisado, destacando os grandes marcos das mudanças institucionais que ocorrem no setor portuário brasileiro. O objetivo é articular a aplicação do ACF presente neste capítulo com a evolução das políticas públicas do setor.

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6 AS MUDANÇAS NA POLÍTICA DO SUBSISTEMA BRASILEIRO DE INFRAESTRUTURA PORTUÁTRIA (2007 A 2016)

Este capítulo explora as mudanças na política do subsistema brasileiro de infraestrutura portuária no período alvo do estudo, de 2007 a 2016. Será traçada uma linha do tempo com os principais acontecimentos no período que foram fundamentais para a conformação do subsistema ao longo dos 10 anos em foco. Ao longo desse desenvolvimento são apresentados elementos trazidos tanto pela pesquisa bibliográfica e documental quanto pela análise documental das audiências públicas. A sua concepção é que funcione como capítulo de discussão final do trabalho, em que se aliam os conhecimentos gerados ao longo de toda a pesquisa ao objeto de estudo com a sua devida delimitação no tempo.

Uma rápida reconstituição histórica desde meados da década de 1990 é necessária antes de se ingressar no período alvo do estudo. Desde a extinção da Portobrás em 1990, o setor portuário carecia de diretrizes capazes de lhe conferir planejamento sólido. Mesmo a aprovação da Lei nº 8.630/93 tendo representado um grande avanço em termos de condições institucionais para a expansão das atividades do setor, a visão de médio e longo prazo mostrou-se secundária durante a década de 1990 e o início dos anos 2000. As linhas norteadoras da política portuária ficaram relegadas às decisões localizadas tomadas no âmbito do Conselho da Autoridade Portuária (CAP), que possuía o mandato de traçar os planos de cada um dos portos em caráter vinculante com base na lei de 1993.

Apesar da Lei de Modernização dos Portos permitir a concessão da administração dos portos organizados a particulares, esse expediente não foi utilizado10. Ainda assim, havia essa intenção, o que é demonstrado pela inclusão das Companhias Docas no PND em 1996, cujo processo de desestatização nunca foi levado a cabo, culminando com a retirada a sua retirada do Programa em 2008 (Guimarães, 2014).

De maneira geral, os anos 1990 foram marcados pelo movimento de descentralização dos portos organizados. Incialmente a transferência deu-se por meio do instrumento de concessão, como ocorrido com São Francisco do Sul (SC) e São Sebastião (SP). A base legal direcionada para tratar especificamente da questão veio com a aprovação da Lei 9.277/96, que autorizou a delegação da administração e delegação dos portos federais a estados e municípios, e regulamentada pelos Decretos nº 2.184 e nº 2.247, ambos de 1997 (CNI, 2007).

10 A única experiência de concessão de porto público a privados até hoje ocorreu previamente à Lei de 1993,

com a desestatização do Porto de Imbituba operacionalizada por meio do Decreto nº 7.842, de 13 de setembro de 1941, em favor da Companhia Docas de Imbituba, empresa privada originada como desdobramento da atividade de extração de carvão mineral na região. Em dezembro de 2012, com o vencimento da concessão, o controle do porto passou ao Estado de Santa Catarina (Porto de Imbituba, 2017).

110 As primeiras licitações de arrendamentos de terminais portuários públicos - sob o marco regulatório de 1993 - foram somente ocorrer a partir de 1995, a partir da concorrência pública do terminal de Libra em Santos (SP), tendo se intensificado nos anos seguintes. Até meados dos anos 2000, houve grande número de licitações, sobretudo de terminais de contêineres, incluindo terminais nos principais portos brasileiros como Rio Grande (RS), Vitória (ES), Paranaguá (PR), São Francisco do Sul (SC) e Itaguaí (RJ). A movimentação de cargas oriunda do comércio exterior acompanhou essa evolução, crescendo 6,6% ao ano em volume transportado e 12,6% no número de contêineres movimentados entre 1996 e 2007 (Goldberg, 2009).