• Nenhum resultado encontrado

3 DOAÇÃO DE ÓRGÃOS 3.1 BREVE HISTÓRICO

4. DOAÇÃO DE ÓRGÃOS POST MORTEM

4.6 PROPOSTA PARA SOLUÇÃO DO PROBLEMA

Apesar das duras críticas feitas neste trabalho à lista única de receptores e demonstração da falibilidade do sistema escolhido pelo legislador, cumpre salientar que tais críticas e observações que foram feitas destinam-se apenas à adoção do critério exclusivo de ordem cronológica.

Reconhece-se que o critério cronológico pode, de fato, estar pautado no princípio da justiça, contudo, para que se consiga de fato a justiça e a igualdade que se propõe, é necessário combiná-lo com outros critérios a exemplo da Espanha e dos EUA.

Assim, o que se pretende com o presente trabalho é compatibilizar o modelo de lista única de receptores trazidos pela legislação pátria, com a possibilidade de escolha pelo doador dos destinatários de seus órgãos.

Insta frisar que o objetivo que aqui se intenta não é o de exterminar a lista única, mas compatibilizar os dois modelos.

Diante do exposto, só nos resta propor uma solução para a questão que se impõe.

A proposta cabível é no sentido de que a lei excepcione o critério da lista, da mesma forma que fez em outras ocasiões, e permita que o doador possa escolher o destinatário de seus órgãos, quando da sua morte, através de testamento ou documento hábil, constando assinatura de duas testemunhas.

Assim, tendo o doador escolhido o receptor de seus órgãos, a ele devem ser doados. Caso não haja esta escolha, ou haja impossibilidade do donatário em recebê- los, os órgãos deverão ser encaminhados aos inscritos na lista única de receptores.

No entanto, não se pretende que a escolha seja livre, mas que, em analogia ao quanto disposto na doação intervivos, seja restrita à pessoa do cônjuge a parentes até o 4º grau.

De observar-se que, conforme mencionado em outro item, não seria a primeira vez que a legislação brasileira permitiria a escolha pelo doador de órgãos post mortem. Todavia, a escolha que se propõe é limitada e não livre como aconteceu nas legislações revogadas.

5 CONCLUSÃO

De tudo o quanto exposto nos capítulo acima, pode-se auferir as seguintes conclusões:

O direito ao próprio corpo, com enfoque no direito à doação de órgãos, é espécie do gênero direitos da personalidade.

E sendo espécie possui características inerentes ao gênero. Dentre estas características, levanta-se a característica da indisponibilidade.

A este respeito, diz-se que a indisponibilidade dos direitos da personalidade sofreu mitigação, temperamento e, hoje, já se admite a sua disponibilidade relativa.

Não se pode perder de vista que a autonomia do indivíduo exerceu o papel de instrumento mitigador da indisponibilidade dos direitos da personalidade.

Outra questão também debatida foi a respeito da autonomia como princípio bioético, ressaltando-se que nesse aspecto, reconhece-se o direito do indivíduo autodeterminar-se, autogovernar-se, bem como o direito do indivíduo de ser respeitado em sua autonomia.

Analisando alguns instrumentos legais de ofensa à autonomia do indivíduo, tem-se a doação presumida, que já foi exterminada do ordenamento pátrio, e a própria vedação de escolha pelo doador do destinatário de seus órgãos na doação post mortem.

Assim, tal intervenção é ilegítima, pois afronta o indivíduo em sua autonomia. Outrossim, através de um estudo da evolução legislativa nacional sobre o tema de transplantes de órgãos, nota-se que, caso houvesse mudança na lei no sentido de possibilitar que o doador escolhesse o destinatário de seus órgãos, esta não seria a primeira vez que um dispositivo traria esta possibilidade.

Da análise da legislação atual sobre transplantes, a lei 9.434/97 e o decreto 2.268/97, tem-se que o legislador diferenciou o tratamento entre a doação inter vivos e a doação post mortem, permitindo que, somente em vida, o doador possa escolher o destinatário dos seus órgãos.

Nota-se também que o legislador escolheu o modelo de lista única de receptores, adotando como critério único o cronológico.

Percebe-se que o critério cronológico é falho e, muitas vezes, burlado, seja através de práticas ilegais, como a venda de órgãos, por exemplo, sendo o seu expoente o tráfico de órgãos; seja através de intervenção judicial na tentativa de garantir a vida dos que se socorrem deste expediente.

Em relação ao modelo proposto, nota-se que, através de uma análise de legislações estrangeiras, o sistema legal dos EUA é o que mais se assemelha à proposta apresentada.

Por fim, conclui-se pela possibilidade de excepcionar o critério da lista única de receptores, permitindo que o doador possa escolher o destinatário de seus órgãos na doação post mortem, com fundamento na autonomia do doador, na isonomia de tratamento com relação à doação em vida; e na adoção de modelo semelhante, em outros países.

REFERÊNCIAS

ADORNO, Roberto. “Bioética y dignidad de la persona”. Madrid: Tecnos, 1998. (Versión española del propio autor).

AGUIAR, Mônica. “Direito à filiação e bioética”. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de; ZOBOLI, Elma Lourdes Campos Pavone. (Orgs.). “Bioética, vulnerabilidade e saúde”. São Paulo: Centro Universitário São Camilo, 2007.

BEUCHAMP, T.L.; CHILDRESS, J.F. Princípios de Ética Biomédica. 4 ed. São Paulo: Edições Loyola, 2002.

BERLINGUER, Giovanni. “Bioética cotidiana”. Trad. Lavínia Bozzo Aguilar Porciúncula. Rev. Técnica. Volnei Garrafa. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2004.

BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 1.ed. São Paulo; Rio de Janeiro: Forense, 1989.

BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Disponibilidade dos direitos da personalidade e autonomia privada. São Paulo: Saraiva, 2005. Coleção Prof. Agostinho Alvim. (Coord. Renan Lotufo).

BRUNO. Continuar Vivendo. In: Galvão, Antonio Mesquita. Diário Popular, [S.l], 3 maio 1998.

CARDOSO, Alaércio. Responsabilidade civil e penal dos médicos nos casos de transplantes. Belo Horizonte: Del Rey, 2002.

CASABONA, Carlos María Romeo; Sá, Maria de Fátima Freire de. (Org.) “Desafios jurídicos da biotecnologia”. Belo Horizonte: Mandamentos, 2007.

______. “El derecho y la bioética ante los límites de la vida humana”. Madrid: Editorial Centro de Estudos Ramón Areces, S.A., 1994.

CASADO, María.(Comp.) “Estudios de bioética y derecho”. Valencia: Tirant lo Blanch, 2000.

CASTRO, Mônica Neves Aguiar da Silva. Honra, imagem, vida privada e intimidade, em colisão com outros direitos. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

CHAVES, Antônio. Direito à vida e ao próprio corpo: intersexualidade, transexualidade, transplantes. 2.ed. rev. e amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.

DINIZ, Débora; GUILHEM, Dirce. O que é bioética. São Paulo: Brasiliense, 2007.

DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2.ed. aum. e atual. de acordo com o novo código civil (Lei n. 10.406 de 10-01-1002). São Paulo: Saraiva, 2002.

DURAND, Guy. “Introdução geral à bioética: história, conceitos e instrumentos”. Trad. Nicolás Nyimi Campanário. São Paulo: Editora Centro Universitário São Camilo; Edições Loyola, 2003.

ENGELHARD JR., H. Tristam. “Fundamentos da Bioética”. Trad. José A. Ceschin. São Paulo: Edições Loyola, 1998.

ESPANHA é recordista em transplante. Disponível em:

<http://fantastico.globo.com/Jornalismo>. Acesso em: 22 jun. 2009. Reportagem do programa Fantástico da Rede Globo, exibido no dia 03 de maio de 2009.

FERRAZ, Flávio Carvalho. A questão da autonomia e a bioética. In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE GENÉTICA E ÉTICA, 1., 1997, Rio de Janeiro. Anais eletrônicos... Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz, 1997. Disponível em:

<http://www.portalmedico.org.br/revista/bio9v1/simpo5.htm>. Acesso em: 06 jul. 2009.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini Aurélio: o dicionário da língua portuguesa: revisado conforme acordo ortográfico. 7. ed. Curitiba: Editora Positivo, 2009.

FERRER, Jorge José; ÁLVAREZ, Juan Carlos. “Para fundamentar a bioética: teorias e paradigmas teóricos na bioética contemporânea”. Trad. Orlando Soares Moreira. São Paulo: Edições Loyola, 2005.

FRANÇA, Rubens Limongi. Manual de direito civil. 3.ed. São Paulo: RT, 1975.

GARRAFA, Volnei. Qual o consentimento? Medicina. Conselho Federal, Brasília, n. 78, ano 10, fev. 1997.

GARRAFA, Volnei; PESSINI, Leo. (Orgs.) “Bioética: poder e injustiça”. Trad. Adail Sobral e Maria Stela Gonçalves. São Paulo: Centro Universitário São Camilo, Edições Loyola, Sociedade Brasileira de Bioética, 2003.

GARRAFA, Volnei; CÓRDON, Jorge (Org.). Pesquisas em bioética no Brasil de hoje. São Paulo: Gaia, 2006.

GHERSI, Carlos A. “Transplante de organos”. Buenos Aires: La Ley, 2003.

GOGLIANO, D. Pacientes terminais: morte encefálica. Disponível em:

<www.portalmedico.org.br/revista/bio2v1/pacienterm.html. Acesso em: 26 jun. 2009.

GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995.

JUNGES, José Roque. “Bioética: perspectivas e desafios”. São Leopoldo, RS: Unisinos, 1999.

KANT, Immanuel. Fundamentos da Metafísica dos Costumes. [S.l.]: Companhia Editora Nacional, 1785. Trad. Antônio Pinto de Carvalho. [S.l.]: Companhia Editora Nacional. Disponível em: <http://www.consciencia.org/kantfundamentacao.shtml>. Acesso em: 05 jul. 2009.

LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de Direito Civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Ed. Freitas Bastos, 2000. v. 1.

MORÁN, Luis González. “De la bioética al bioderecho: libertad, vida y muerte”. Madrid: Universidad Pontificia de Comillas, Editorial Dykinson : [S.l.], 2006.

NETO, Manoel Lemes da Silva Neto. Fatores de Risco para Infecções em Transplante Renal. Dissertação (Mestrado) - Universidade de Goiânia. Goiás, 2006. Disponível em: < http://tede.biblioteca.ucg.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=340>. Acesso em: 25 jun. 2009.

PERLINGIERI, Pietro. “Perfis do direito civil: introdução ao direito civil constitucional”. 2.ed. Trad. Maria Cristina De Cicco. Rio de Janeiro; São Paulo: Renovar, 2002.

PESSINI, Leocir; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problemas atuais de bioética. 7. ed., rev. e ampl. São Paulo: Centro Universitário São Camilo, 2005.

PESSINI, Leocir; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Problemas atuais de bioética. 6. ed., rev. e ampl. São Paulo: Centro Universitário São Camilo, Edições Loyola, 2002.

ROCHA, Eduardo. O “modelo espanhol” de transplantes uma idéia a ser copiada pelos brasileiros?. Revista Virtual de Medicina. v. 1, n. 2, ano 1 abr – jun, 1998. Disponível em: < http://www.medonline.com.br/med_ed/med2/espanha2.htm>. Acesso em: 22 jun. 2009.

ROXIN, Claus. A proteção da vida humana através do direito penal. In: CONGRESSO DE DIREITO PENAL EM HOMENAGEM A CLAUS ROXIN, 2002, Rio de Janeiro. Anais eletrônicos. Disponível em: <http://www.mundojuridico.adv.br>. Acesso em: 21 jun. 2009.

SÁ, Maria de Fátima Freire. “Biodireito e direito ao próprio corpo: doação de órgãos incluindo o estudo da Lei n. 9.434/97”. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.

SÁ, Maria de Fátima Freire; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira. (Coord.) “Bioética, biodireito e o novo código civil de 2002”. Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

SÁ, Maria de Fátima Freire. (Coord.). “Biodireito”. Belo Horizonte: Del Rey, 2002.

SANTOS, Rita Maria Paulina dos. Dos transplantes de órgãos à clonagem: nova forma de experimentação humana rumo à imortalidade. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

SANTOS, Maria Celeste Cordeiro. Transplante de órgãos e eutanásia: liberdade e responsabilidade. São Paulo: Saraiva, 1992.

_______. (org.). “ Biodireito: ciência da vida, os novos desafios”. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001.

_______. “O equilíbrio do pêndulo. A bioética e a lei: implicações médico legais”. São Paulo: Ícone Editora, 1998.

SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Instrumento n. 306.823-5/5- 8ª Câmara de Direito Público. São Paulo: TJSP;, 2003. Relator: Caetano Lagrasta em 28.05.03. SÃO PAULO. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação n. 70011591963 - 3ª Câmara Cível. Relator: Luiz Ari Azambuja Ramos em 07 jul. 05.

SARLET, Ingo Wolfgang. “Eficácia dos direitos fundamentais”. 8.ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

SEGRE, Marcos; COHEN, Claudio (org.). “Bioética”. 3.ed. rev. e amp. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002.

SEVEN Pounds. Direção: Gabriele Muccino. [S.l.] : Sony Pictures, 2008. 1 DVD.

SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética: fundamentos e ética biomédica. 2. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2002, p. 93.

SÉGUIN, Elida. “Biodireito”. 4.ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.

SEVERO, Julio. Eutanasia: matando os doentes, deficientes, e os idosos em nome da compaixão. Perspectiva do futuro próximo baseada em fatos passados e recentes. In: CONFERÊNCIA INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS HUMANOS E AS

QUESTÕES SOCIAIS, VIDA, ABORTO E EUTANÁSIA, Haia, Holanda, 19998. Anais eletrônicos. Disponível em: <

http://www.jesussite.com.br/download/EUTANASIA_Julio_Severo.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2009.

ROGAR, Silvia. Fraude: Um poder de vida ou morte. Veja, Salvador, Ed. 2072, 06 de ago. 2008.

SGRECCIA, Elio. “Manual de bioética”: fundamentos da ética biomédica. Trad. Orlando Soares Moreira. São Paulo: Edições Loyola, 1996. v. 1.

TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

VARGA, Andrew C. “Problemas de bioética”. Ed. Revisada.Trad. Pe. Guido Edgar Wenzel, S.J. São Leopoldo, RS: Unisinos, 1998.

VIERA, Tereza Rodrigues. “Bioética e direito”. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, 1999.

WALD, Arnoldo. Direito civil: introdução e parte geral. 9. ed. rev. ampl. e atual. de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2002.

ANEXOS

ANEXO A – LEGISLAÇÃO PERTINENTE

Senado Federal

Subsecretaria de Informações