O Sistema Nacional de Proteção da Propriedade Industrial: direitos, proteção de patentes e registo de design
III.6 O QUE PROTEGER?
Durante as últimas décadas as alterações nos domínios das tecnologias, das leis e das práticas comerciais conduziram-‐nos à atual controvérsia acerca da maneira como os regimes de proteção da propriedade industrial, dos diferentes países, afeta a difusão do conhecimento científico, o consequente processo de inovação, e respectivo desempenho económico, (Ciocoiu, 2011).
(Lessig, 2005) na sua obra Free Culture, debruça-‐se sobre a maneira como as diferentes formas de expressão e liberdade criativas se têm tornado dependentes das posições
extremistas de um regime de copyright que, legislado numa era cujas conquistas tecnológicas exigiam medidas de proteção completamente distintas do mundo contemporâneo, ficando desfasadas da era atual. A tecnologia de agora, possibilita que os cidadãos desejem participar e partilhar das vantagens em poder lhe aceder para contribuir na construção de uma sociedade radicalmente distinta da anterior. Este acesso à tecnologia e à informação favorece, simultaneamente, a possibilidade da cópia ser involuntária, uma vez que, devido à fluidez e quantidade de informação a circular aumentar as probabilidades de poder ser combinada e recombinada de maneira idêntica em pontos diferentes do globo, de forma descomprometida por indivíduos desconhecedores dos contratos sagrados abstratamente.
Coexistindo então, dois tipos de novidade, uma absoluta e outra pessoal. Pelo que, o ato de verificação que garanta que a novidade se verifica para todos tornar-‐se-‐á cada vez mais complexo. A teia interligada através da rede da Internet Web 2.0, possibilita que cada um de nós acumule o papel de editor com o de receptor, emitindo e absorvendo informação, que assim partilhada, está em permanente expansão não havendo a possibilidade de convergência territorial num único centro de controlo, (Lessig, 2008). É esta ambivalência a que (Lipovestsky, 2003) designa por híper-‐abundância, pelo excesso, pelo pletórico, que na atualidade promove a diversidade, logo uma complexidade de tensões e contradições.
Para (Nordstrom, 2009), trata-‐se de uma tendência da época atual, que designa por “Sociedade Hi-‐fe-‐ni-‐za-‐da”, que combina de uma forma nova, o que existe de formas interessantes, num incitamento à mistura das realidades passadas numa abordagem contemporânea.
Em acordo com (Hall, 1983), é tempo de dar um passo no sentido de tentar soltar-‐nos do domínio do passado para poder enfrentar o futuro com a ajuda dos novos meios facilitadores das relações humanas. É esta a realidade que desfavorece os anteriores modelos de negócio hegemónicos de conteúdos que são tomados no espaço cibernético como medidas repressivas. Os aspectos económicos pretendem-‐se impor a um ambiente que favorece as trocas culturais para a humanidade. O espaço virtual, a que (Alegre, 2011), se refere como um espaço utópico no qual os bens materiais, e os imateriais, são voluntariamente disponibilizados para a partilha gratuita, em que o total domínio da cópia e da replicação se tornam na matéria que impulsiona a arte e o design.
Razão pela qual, até agora, também por evocação das redes sociais, todos os esforços de controlo da designada “pirataria na rede”, ao serem tomados como ações de censura e perda da liberdade, não têm sido aprovados, assim como, devido à noção de pertença, que agora se apresenta do lado de quem deseja consumir algo, e não tanto, de quem o criou.
Os acrónimos SOPA e o PIPA representam respectivamente as propostas de projeto lei do senado nos Estados Unidos com a designação de “Stop Online Piracy Act73” e no
Reino Unido com, “Protect IP Act74”, sendo ambos esforços em legislar a proteção da
propriedade intelectual através da penalização daquilo a que as indústrias de entretenimento, sobretudo as grandes, designam por ação criminosa por pirataria, visando penalizar até cinco anos de prisão quem ultrapassar as exigências do detentor dos direitos de cópia sobre a escrita vulgarizados pela expressão, copyright.
Em Portugal temos uma proposta de Projeto lei 118/XII-‐1 que é sobre a cópia privada. Propõe uma taxação sobre os Direitos de Autor na aquisição de suportes de gravação digital, consoante a capacidade dos aparelhos. Esta taxa de 0,025€ por cada Gigabyte (GB) de armazenamento digital que no caso do telemóveis atinge os 0,50€ por GB aos quais ainda acresce o Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA). É uma proposta que é considerada tecnologicamente desatualizada porque, e também pela nossa experiência pessoal, o armazenamento de dados tender a estar desmaterializado na “nuvem digital” ou nos serviços de armazenamento online, em que a compra de conteúdos por streaming através das plataformas de venda digital, a aquisição de música, de literatura, de vídeo, de TV, de jogos e de software, já incluí o prévio pagamento dos direitos de autor.
No âmbito dos direitos autorais têm sido obtidos importantes avanços em relação ao estímulo à criação com base em obras originais, com os licenciamentos Creative Commons e o Copyleft.
73 SOPA – Parar a Pirataria em Linha. 74 PIPA -‐ Ato de Proteção do IP.
Figura 10 – Imagem gráfica do Creative Commons.
O licenciamento Creative Commons é um padrão de concessão mundial que se situando algures entre a dos direitos de autor, em que todos os direitos estão reservados, e a do domínio público, em que nenhum direito está reservado, garante que alguns direitos fiquem reservados. É uma forma proactiva dos autores poderem eleger a partir de um conjunto de opções que definem as condições e os diferentes níveis de proteção sob as quais as suas obras são partilhadas com terceiros, sendo que, todas as licenças requerem que os créditos sejam atribuídos ao autor da obra, da maneira por este especificada.
A licença copyleft é uma proteção jurídica praticada para exercer o direito de autor em controlar, quer a retribuição de sua criatividade e património intelectual, quer a cedência para distribuição gratuita de cópias e versões derivadas de uma determinada obra ou trabalho original, sob a exigência que os mesmos direitos sejam preservados nas versões obtidas por modificação do original. Ou seja, que se abdique das contrapartidas financeiras sobre as obras que se obtenham a partir do original dessa maneira partilhado. A eficácia desta prática depende das leis em vigor em cada país, e aplicou-‐se inicialmente ao software, mas atualmente estende-‐se à arte, à cultura e à ciência, ou a qualquer outro tipo de património criativo que se reja por direitos autorais. Por um lado, consiste num convite formal à participação intelectual dos indivíduos, tanto de pessoas singulares como de pessoas colectivas, quer de empresas privadas quer da administração pública, para que intervenham na cadeia de valor através de seu contributo intelectual de uma forma construtiva e partilhada. Por outro lado, ao não ser restritiva melhora o acesso e fruição à produção cultural e é uma maneira de obter um renumeração compensatória mais justa e razoável porque o dissemina.
Figura 11 – Imagem gráfica do copyleft.
A designação copyleft opõe-‐se e ironiza as restrições do copyright em termos quer conceptuais, quer por conotação política, tendo sido usada pela primeira vez na década de setenta para reivindicar a liberdade de divulgação e de escrita sobre determinado software anfitrião. Mais tarde transformou-‐se no conceito-‐chave do software livre, o Open Source75.
Posicionamentos e avanços face à fruição do património intangível que, quanto a nós, poderá influenciar positivamente uma revisão do sistema de propriedade industrial para que, o que é tomado até aqui como condicionante à inovação passe a atuar como fator impulsionador.
Estabelecemos um paralelismo com a necessidade de proteção da inovação quando (Hall, 1983), classifica a obra de arte no âmbito das mensagens lentas, enquanto a reprodução da mesma obra como uma mensagem rápida, ou seja, transporta um investimento de tempo na escala da velocidade de comunicação, de frequência diferente, logo, com importância relativas antagónicas devido a serem de consumo imediato, ou prolongado.
Estamos cientes que há que realizar um esforço para encontrar o justo equilíbrio entre a estruturação das atividades de inovação, de modo a fazer funcionar as sinergias envolvidas nas economias de escala e nas empresas, sem afetar ou comprometer a
75 Open Source é uma licença que permite que os utilizadores executem o software, que redistribuam cópias exatas desse software, que estudem e modifiquem o seu código-‐fonte e que distribuam as versões modificadas.
aposta no capital intelectual via conhecimento estratégico, para se tornarem mais competitivas. Para ajudar as empresas a recuperar seus investimentos em design e desenvolvimento, e para garantir no futuro uma vantagem de mercado de seus projetos, a robustez da proteção da propriedade intelectual na europa76, quer para a forma, quer para a função, é poderá vir a tornar-‐se mais, um ativo valioso e duradouro. No entanto, a fim de obter essa proteção, o processo de design deve ser conciliado com os princípios concorrentes de proteção à propriedade intelectual, (Cohen, 2004) e (Mendonça, 2011), para quem o assegurar da proteção de design de maneira abrangente, requer a coordenação de propriedade intelectual, design e estratégias de marketing, através de uma efetiva gestão de design, a fim de fortalecer a proteção do produto, e simultaneamente criar vantagens de mercado, tomando a liderança na coordenação dessas estratégias. Para este autor, embora existam disponíveis dispositivos legais para proteger quer a forma, quer a função, respectivamente através do registo de design e do modelo de utilidade, em certa medida, entre erguem uma barreira entre a forma e função. Enquanto a forma está enquadrada como característica não funcional que define a aparência de um produto como requisito ornamental, sob a denominação de propriedade intelectual. Analogamente aos modelos de utilidade, o registo de design também protegem a novidade das características ornamentais.