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O CASO DO BRUNO 1 – N OTA B IOGRÁFICA

2 – Q UADROS C LÍNICO T ERAPÊUTICO , F AMILIAR E E SCOLAR

O Bruno nasceu com tempo completo de gestação. O parto foi normal, muito demorado e difícil, com auxílio de “ventosa”. Os primeiros dez dias de vida foram passados numa incubadora2. Realizou vários electroencefalogramas que detectaram lesões cerebrais com etiologia provável na anoxia sofrida durante o nascimento. Essas lesões resultaram em sequelas graves a nível motor e da fala3.

Aos dois anos, começa a ser seguido por uma das equipas do CRAPPC, inicialmente, através de consultas externas e, depois, em regime de semi-internato. O apoio terapêutico incidiu sobretudo nas áreas da terapia ocupacional, terapia da fala e fisioterapia que “actuando de forma conjugada”4 entre si e com as educadoras, professoras e auxiliares a trabalhar na instituição “procuraram chegar a soluções funcionais que lhe permitissem executar/concretizar o que foi aprendendo ao longo das suas vivências motoras e sensoriais”5.

O comportamento motor do Bruno “caracteriza-se por movimentos involuntários em todos os segmentos do corpo. A falta de controlo voluntário do movimento e das reacções de equilíbrio não permitem sequer assumir a posição de sentado sem apoio. Não tem controlo efectivo da cabeça, não dissocia os movimentos da cabeça em

1 DOC – PEI, 2001/02

2 DOC – Ficha de anamnese 3 DOC – PEI, 1996/97

4 DOC – Relatório de avaliação da equipa do CRAPPC, 1997 5 Idem

relação à cintura escapular”1. Este quadro clínico torna o Bruno num jovem dependente, a nível da concretização, nas actividades de vida diária (locomoção, alimentação, higiene), na utilização da capa de comunicação e nas actividades escolares.

O Bruno deixou de ter consultas sistemáticas nas áreas da terapia ocupacional, terapia da fala, psicologia e fisioterapia do CRAPPC. Apenas vai, periodicamente, às consultas de nutricionismo e, quando solicitados, os técnicos da instituição dão apoio pontual à escola2.

Os pais do Bruno possuem o antigo Curso Complementar de Liceus. O pai é coordenador de vendas de uma multinacional e a mãe é contabilista. Ambos têm quarenta anos. O Bruno tem uma irmã com nove anos3.

Os tios e os primos participam de uma forma activa nos cuidados a prestar ao Bruno, sobretudo a irmã da mãe, solteira, que o vai buscar à escola, lhe dá de almoço e que com ele fica o fim-de-semana e as férias. O Bruno dorme em casa de segunda a sexta-feira, para os pais o ajudarem nos trabalhos da escola. No sábado, vão todos almoçar a casa de um primo do Bruno e aí combinam o que vão fazer todos juntos, nesse fim-de-semana (cinema, futebol, passeio)4.

A família vive em habitação própria, num apartamento T3, sem elevador. O acesso ao 2º andar faz-se por escadas. O Bruno possui quarto individual, onde trabalha no seu computador5.

A casa da tia, um apartamento, também não possui elevador e é esta que o transporta, ao colo, todos os dias à hora do almoço6.

O acompanhamento familiar é descrito como sendo “óptimo em todos os aspectos (afectivo, técnico, cognitivo, etc.). Os familiares estão sempre disponíveis e são os primeiros a sugerir alterações para maior eficácia no trabalho com o aluno” 7

Para além da tia, é a mãe que está mais disponível para o acompanhar a consultas ou atender a outras necessidades, cabendo ao pai um papel mais

1 DOC – PEI, 2001/02

2 NC – Conversa informal com o pai 3 DOC – PEI, 2001/02

4 NC – Conversa informal com a tia 5 NC – Conversa informal com o pai 6 NC – Conversa informal com a tia 7 DOC – PEI, 99/2000

interveniente na área das tecnologias utilizadas pelo Bruno tendo, inclusive, colaborado com os técnicos de terapia ocupacional do CRAPPC, na procura de soluções e aperfeiçoamento de programas específicos para o filho1.

O Bruno começou a frequentar o jardim-de-infância do CRAPPC aos três anos de idade. No ano que antecedeu a entrada para o 1º Ciclo, frequentou um jardim-de- infância a funcionar fora do CRAPPC, mas integrado num projecto experimental de integração de crianças com Paralisia Cerebral, no ensino regular2.

Entre 1994 e 1997, frequentou a escola do 1º Ciclo integrada no CRAPPC onde, para além dos técnicos do centro, que o acompanhavam de forma sistemática, teve o apoio de professoras de apoio educativo aí destacadas, professor de desporto (natação e boccia), auxiliares e psicóloga.

No ano lectivo de 1997/98, passou a frequentar uma escola fora do CRAPPC, inserido numa turma de vinte alunos do 3º ano. Foi um ano lectivo “muito complicado”3 para o Bruno, devido a vários factores: “professora sem experiência em casos com paralisia cerebral (…) não teve qualquer tipo de material (computador, Ke:nk, switch, mesa, talas e cadeira de rodas) e, além disso, não teve professor de ensino especial, nem tarefeira durante todo o ano” 4. No 1º período desse ano lectivo, ia três dias à escola, onde apenas assistia às aulas, e dois dias ao centro, “para treino e estudo da funcionalidade”5. A equipa do CRAPPC avaliou a situação no final do 1º período e concluiu que estava a provocar-se um retrocesso no comportamento e na realização académica e funcional do Bruno. Dado que as situações de falta de material e de apoio pedagógico se mantiveram, o Bruno acabou, nesse ano lectivo, por frequentar apenas um dia por semana a sua escola “para não perder o vínculo à turma e às professoras” 6.

No ano lectivo seguinte, obteve-se o equipamento tecnológico necessário, disponibilizou-se uma auxiliar a tempo inteiro e foi colocada uma professora de apoio

1 NC – Conversa informal com o pai

2 DOC – Relatório de avaliação da equipa do CRAPPC 3 DOC - Relatório de avaliação educacional, Junho 1998 4 Idem

5 DOC – PEI, 1998/99 6 DOC - Idem

educativo, na escola. No final do ano, transitou para o 5º ano, tendo atingido os objectivos estabelecidos no Programa Educativo1.

No 2º Ciclo, mantiveram a formação da turma do 1º Ciclo. As medidas do regime educativo especial, ao abrigo do Decreto-Lei 319/91, propostas para o Bruno, mantiveram-se também as mesmas: “ensino especial” (Currículo Escolar Próprio), “equipamentos especiais de compensação”, “adaptações de materiais”, “adequação na organização de turmas e condições especiais de avaliação”. Acrescentou-se a medida “apoio pedagógico acrescido”, dado pela directora de turma e pela professora de apoio educativo.

A escola disponibilizou uma auxiliar de acção educativa que passou a acompanhar o Bruno a tempo inteiro. As pessoas que mais de perto lidavam com o aluno, nomeadamente a directora de turma e a auxiliar, tiveram a orientação de uma professora de educação especial destacada no CRAPPC, quanto à forma como utilizar a capa auxiliar de comunicação e o extenso material tecnológico utilizado pelo Bruno.

A directora de turma frequentou um curso no CRAPPC sobre os sistemas de varrimento, o emulador Ke:nx e o programa Boardmaker. Segundo ela, esta formação foi essencial para melhorar significativamente o trabalho que realizava com o Bruno, sobretudo ao nível das adaptações curriculares e das actualizações dos quadros de varrimento2.

As avaliações durante o 5º e 6º anos referem que embora o Bruno continue a ter “graves dificuldades ao nível da concretização (…) e um tempo de trabalho restrito”3 por se cansar com facilidade, “os objectivos previamente formulados foram atingidos plenamente”4, necessitando apenas de uma redução da carga curricular nas áreas de Educação Visual e Tecnológica e Educação Musical5.

3-I

NTRODUÇÃO DE

T

ECNOLOGIAS DE

A

POIO

O Bruno usufrui de Tecnologias de Apoio desde que começou a ser apoiado pelo CRAPPC, aos dois anos de idade. Dado à severidade do seu quadro motor, foi

1 DOC – Relatório de avaliação educacional final, 1999 2 NC – Conversa informal com a directora de turma do 2º Ciclo 3 DOC – Relatório de avaliação educacional, Junho 2000 4 DOC – Relatório de avaliação educacional, Junho 2001 5 DOC – PEI,2000/01

necessário um “longo período onde se foram experimentando diferentes ajudas técnicas a nível do posicionamento, comunicação e funcionalidade”1.

Aos oito anos, utilizava uma “cadeira de rodas com acento moldável, talas e faixas nos membros superiores e inferiores para lhe permitir estabilidade para accionar o comutador que, colocado num braço articulado e preso a uma mesa regulável, lhe permite accionar o computador com o movimento da cabeça para o lado direito”2 .

De acordo com os registos das informações dos técnicos e dos professores, o pai mostrou-se sempre muito interessado e a par da investigação de soluções tecnológicas para portadores de Paralisia Cerebral. “Ao constatarem o interesse e disponibilidade do pai, os técnicos integraram-no numa acção de formação sobre o funcionamento do Discover Ke:nx, aumentando-lhe o conhecimento ao nível da informática”3 Como se deslocava frequentemente ao estrangeiro, devido à sua situação profissional, adquiriu o material mecânico e tecnológico utilizado pelo Bruno no centro, de modo a permitir continuidade do trabalho em casa4.

Em termos de eficácia, a apreciação global da equipa do CRAPPC, quando o Bruno tinha dez anos, foi a seguinte: “… embora apresente dificuldades a nível da concretização das aprendizagens realizadas nas áreas académicas, em termos de trabalho no computador é excelente, superando as nossas expectativas”. No ano lectivo seguinte, com o objectivo de facilitar o processo de escrita, onde manifestava maiores dificuldades, começou a utilizar o preditor de texto Co:writter, “o que fez com que obtivesse maior rapidez na resposta, embora o nível de desempenho na escrita continue a não corresponder às suas capacidades intelectuais e conhecimentos”5 .

Ao longo dos anos, fez a actualização de equipamento de “forma a permitir a portabilidade entre os espaços escolares a frequentar e a aumentar níveis de funcionalidade e de eficácia”6. O Bruno adquiriu as competências na utilização desses equipamentos na sala de Tecnologias de Apoio do CRAPPC, onde se introduziu, de forma continuada, os novos quadros de comunicação correspondentes ao aumento do seu vocabulário e necessidades escolares.

1 DOC – PEI, 1996/97

2 Idem

3 DOC - Relatório de avaliação da equipa do CRAPPC, 1997 4 NC – Conversa informal com o pai

5 DOC – Relatório de avaliação da equipa do CRAPPC, 1998 6 DOC – PEI, 1999/2000