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Quanto ao interesse objetivado

No documento Dano moral ambiental coletivo (páginas 69-73)

3.2 A RESPONSABILIDADE CIVIL NO DOMÍNIO DO DIREITO AMBIENTAL

3.2.2 Pressupostos da responsabilidade civil por dano ambiental

3.2.2.1 Dano ambiental

3.2.2.1.2 Quanto ao interesse objetivado

Pode-se também classificar o dano quanto ao interesse objetivado, cingindo-se em dano individual e dano coletivo. Como o próprio nome sugere, o primeiro corresponde ao dano sofrido apenas por um indivíduo e o segundo, por um grupo ou por uma coletividade.

Milaré (2011, p. 1.120) apresenta a seguinte distinção entre o dano ambiental coletivo e o dano ambiental individual: o primeiro, que o autor também denomina de dano ambiental propriamente dito, é “causado ao meio ambiente globalmente considerado, em sua concepção difusa, como patrimônio coletivo”; por sua vez, o segundo, considerado como dano ambiental reflexo, atinge pessoas certas, “através de sua integridade moral e/ou de seu patrimônio material particular” (p. 1.120).

Sobre a base da demanda no dano ambiental individual, Leite (2003, p. 141-142) ensina:

[...] a demanda tem como base um interesse próprio do indivíduo ao microbem ambiental e que, de forma incidental, repercute na proteção do macrobem ambiental pertencente à coletividade. Não há dúvida de que este dano individual pode ser elencado dentro do gênero dano ambiental, levando em consideração que a lesão patrimonial ou extrapatrimonial que sofre o proprietário, em seu bem, ou a doença que contrai uma pessoa, inclusive a morte, podem ser oriundas da lesão ambiental. Leite (2003, p. 138) salienta que a tutela jurisdicional reparatória individual possui duas formas:

1. levando em conta os bens e interesses individuais ou individuais homogêneos próprios e reflexos no meio ambiente (microbem); 2. tendo em vista os direitos subjetivos fundamentais, relativamente à proteção do direito fundamental ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado (macrobem).

Com referência ao dano ambiental, na concepção macrobem, assenta-se em dois pressupostos, subdividindo-se, de acordo com Canotilho (1993, p. 14-15 apud LEITE, 2003, p. 98), em: “1) O dano ecológico é, prima face, produzido ao bem público, ambiente de que é titular a coletividade; 2) O dano ecológico é, ainda, o dano sofrido pelo particular enquanto titular do direito fundamental ao meio ambiente e à qualidade de vida”.

Assim, a vítima do dano ambiental individual pode buscar a reparação do dano sofrido, por meio de uma ação indenizatória, de cunho individual, que, se julgada procedente, dará ensejo à indenização dirigida à recomposição do prejuízo individual sofrido (MILARÉ, 2011, p. 1120-1122).

O prejuízo causado à esfera privada das pessoas, não como membros da coletividade titular de um bem de uso comum, mas na qualidade de sujeito de direitos individuais, tem o meio ambiente como liame entre o fato e o dano causado; o prejuízo às pessoas e a seus bens tem algum dos componentes da natureza. Em virtude disso, o dano individual ambiental também é denominado pela doutrina como dano indireto, ricochete ou reflexo, vez que a lesão sofrida pela vítima surge como consequência de uma agressão, primeiro e imediata, à qualidade ambiental.

Indo mais adiante, Leite (2003, p. 138) acrescenta às afirmações de Milaré que os interessados podem utilizar como instrumentos processuais as regras do Direito Civil e processual civil, bem como as demais legislações pertinentes, a ação popular ambiental, a Ação Civil Pública, em se tratando, especificadamente, de interesses individuais homogêneos.

Ressalta-se que nesse caso incide também o regime da responsabilidade objetiva, a teor do artigo 14, § 1o, da Lei n. 6.938/1981 e do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil.

Corroborando, Freitas (2005, p. 591-601 apud MILARÉ, 2011, p. 1.122) menciona que “ao lado do direito coletivo à reparação e indenização pelo dano ambiental, remanesce o direito individual daquele que foi diretamente lesado, sendo a responsabilidade do infrator objetiva”.

Em suma, o dano ambiental individual consiste em uma lesão ao meio ambiente que repercute no interesse particular do indivíduo, podendo ser na esfera patrimonial como também na extrapatrimonial. Logo, o objetivo imediato não é a proteção do meio ambiental, que será tutelado de forma indireta, mas sim a lesão ao patrimônio e demais valores da pessoa.

Já com relação aos danos ambientais coletivos, a doutrina leciona que estes “dizem respeito aos sinistros causados ao meio ambiente lato sensu, repercutindo em interesses difusos, pois lesam diretamente uma coletividade indeterminada ou indeterminável de titulares”

(CARVALHO, 2001, p. 197 apud MILARÉ, 2011, p. 1121).

Assim, caracterizam-se “pela inexistência de uma relação jurídica base, no aspecto subjetivo, e pela indivisibilidade (ao contrário dos danos ambientais pessoais) do bem jurídico, diante do aspecto objetivo” (CARVALHO, 2001, p. 197 apud MILARÉ, 2011, p. 1.121).

Dito isso, denota-se que essa classificação do dano ambiental consiste na lesão aos direitos coletivos stricto sensu ou difusos que, como já visto, possuem em comum o caráter “transindividual” e a “indivisibilidade” do bem tutelado.

A tutela coletiva ambiental foi reconhecida pela Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 6.938/81), “pois anteriormente, predominava a concepção de cunho individualista do direito de propriedade imprópria a uma proteção coletiva do bem ambiental, [...]” (BENJAMIN, 1996 apud LEITE, 2003, p. 175).

Mas somente com o advento da Lei n. 7.347 de 1985, que estabeleceu a Ação Civil Pública no ordenamento jurídico brasileiro, é que surgiu um instrumento jurisdicional para responsabilização pelo dano ambiental coletivo.

Nessa esteira, Leite (2003, p. 175) aduz que anteriormente àquela legislação não existia “um diploma específico e global para atender a proteção do meio ambiente, posto que a tutela era feita por um aparato legislativo diluído, [...]”.

Na sequência, a Constituição Federal de 1988 destinou vários dispositivos à proteção ambiental, como, por exemplo, o artigo 5º, inciso LXXII, artigo 23, artigo 24, artigo 129, inciso III, artigo 200, artigo 216, § 4º e, em especial, o artigo 225 (BRASIL, 1988).

Ademais, a busca pela responsabilização do poluidor, no dano ambiental coletivo, ocorrerá através da Ação Civil Pública, objetivando-se a recuperação do meio ambiente degradado e a indenização decorrente do dano causado; essa indenização devida pelo dano causado é direcionada ao já mencionado fundo de reparação dos interesses difusos (Lei n. 7.437, de 24.7.1985, artigo 13, regulamentado pelo Decreto n. 1.306/94).

3.2.2.2 Nexo de causalidade

Prescinde-se para responsabilização pelos danos ambientais, também, o nexo causal, ou seja, “em cada caso concreto haverá de existir a prova de dois pressupostos indispensáveis: a existência do dano ambiental e seu nexo causal com ação ou omissão do pretenso responsável que seja a causa eficiente do evento capaz de gerar o prejuízo a ser indenizado” (LIMA, 1998, p. 320 apud MILARÉ, 2011, p. 1.255).

difíceis caracterizações, porque, por muitas vezes, lida-se com danos camuflados pelo anonimato ou de emissor indeterminado, como também pela multiplicidade de causas; e, às vezes, por sua tardia consumação, pelas dificuldades técnicas e financeiras para sua aferição, além de tantos outros fatores (MILARÉ, 2011, p. 1.255).

Para resolução desse impasse, Leite (2003, p. 179-188) apresenta algumas soluções como a criação de mecanismos coletivos de responsabilização dos custos da restauração e a criação de fundos, com vistas à indenização coletiva; e a admissão da teoria da causalidade alternativa do dano coletivo, que consagra a responsabilidade solidária dos intervenientes.

Além disso, para facilitar a demonstração do nexo de causalidade, Goldenberg (1984, p. 227 apud LEMOS, 2003, p. 92) ressalta ser suficiente que o risco da atividade tenha exercido influência causal decisiva para ocorrência do dano.

Ainda, muitas vezes, o caminho a prosseguir é o da aplicação do instituto da inversão do ônus da prova. Segundo Sampaio (1998, p. 232 apud LEITE, 2003, p. 188), “o princípio que norteia a inversão do ônus da prova no Código do Consumidor é, em tese, aplicável à responsabilidade por danos ambientais, pois as razões que justificam a inversão do ônus da prova são comuns em ambos os casos”.

Não obstante, acrescenta-se como argumento a demonstrar a hipossuficiência técnica a utilização do princípio da precaução. Por conseguinte, deve o empreendedor da atividade de risco provar a inexistência de dano ambiental.

A aplicação do princípio da precaução como instrumento hermenêutico foi introduzido na jurisprudência em um julgamento da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (BRASIL, 2010b). Em seu voto, a Ministra relatora Eliane Calmon deferiu o pedido por meio da equiparação da proteção do meio ambiente às relações de consumo, nas quais o instituto da inversão do ônus da prova aparece expressamente previsto no ordenamento jurídico (artigo 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor). Ela explicou:

No caso das ações civis ambientais, entendo que o caráter público e coletivo do bem jurídico tutelado nos leva à conclusão de que alguns dos direitos do consumidor também devem ser estendidos ao autor daquelas ações, afinal tais buscam resguardar ou reparar o patrimônio público de uso coletivo (BRASIL, 2010b).

Nesse sentido, diversas são as decisões do Superior Tribunal de Justiça: REsp 1237893/SP, julgado em 24/09/2013; AgRg no REsp 206748/SP, julgado em 21/02/2013; REsp 883656/RS; AgRg no REsp 1192569/RJ, julgado em 19/10/2010; REsp 1049822/RS, julgado em 23/04/2009 (BRASIL, 2015).

A propósito, o colendo Tribunal, ao lançar a “Jurisprudência em Teses no 30”,

reforçou: “O princípio da precaução pressupõe a inversão do ônus probatório, competindo a quem supostamente promoveu o dano ambiental comprovar que não o causou ou que a substância lançada ao meio ambiente não lhe é potencialmente lesiva” (BRASIL, 2015).

Percebe-se que o nexo de causalidade do dano ambiental busca um aperfeiçoamento, a fim de não deixar impunes os responsáveis pelo evento danoso.

3.2.3 Consequências da objetivação da responsabilidade civil fundada na teoria de risco

No documento Dano moral ambiental coletivo (páginas 69-73)