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DESENVOLVIMENTAIS NA COMPREENSÃO DA PSICOPATOLOGIA

B. RISCO E PROTECÇÃO NO DESENVOLVIMENTO

3. A RESILIÊNCIA E OS MECANISMOS DE PROTECÇÃO

3.1 O QUE É A RESILIÊNCIA?

O conceito de resiliência é oriundo das ciências físicas e traduz a capacidade dos materiais se moldarem e flexibilizarem de acordo com as circunstâncias ambientais.

Na área das ciências sociais e humanas, a resiliência diz respeito à capacidade para os indivíduos e sistemas lidarem com sucesso face ao risco ou adversidade. Encontramos as raízes do termo no latim, cujo significado traduz a acção de saltar os obstáculos. De uma maneira geral, ocupa-se das variações individuais em resposta aos

factores de risco, sendo geralmente descrita como a capacidade para manter um

funcionamento saudável em condições pouco saudáveis, ou a capacidade para manter a adaptação em condições de stress.

O termo resiliência é usado "... to describe the positive pole of ubiquitous phenomenon of individual difference in people's response to stress and adversity" (Rutter, 1990, p. 181). Estas diferenças individuais têm vindo a ganhar terreno e a serem contempladas na investigação sobre o risco, assim como na compreensão dos mecanismos que podem tornar inteligíveis os processos inerentes ao risco (ao mesmo tempo que trazem implicações em termos de prevenção e intervenção). A resiliência é um processo dinâmico e assenta numa interacção complexa entre as características do indivíduo e do ambiente.

A definição de resiliência engloba dois grandes paradoxos. O mesmo

comportamento (e.g. suporte parental) pode dar lugar a diferentes resultados (cg dependência vs. auto-confiança) e diferentes comportamentos (e.g. negligência vs. cuidados maternos adequados) podem dar origem aos mesmos resultados de

desenvolvimento. Por outro lado, as características individuais que estão associadas à resiliência (e.g. criatividade) podem confrontar-se com características familiares que também se associam à resiliência (e.g. coesão e cooperação) e estas podem opor-se a certos valores culturais em vigor na comunidade (e.g. consumismo, individualismo). Daí que a promoção da resiliência se torne um processo bastante complexo por todos estes paradoxos que lhe são inerentes.

A resiliência não é um atributo fixo de determinados indivíduos. Isto significa que num momento temporal x, o indivíduo pode ter um funcionamento adaptado face às cirscunstâncias adversas, sendo considerado resiliente, e no momento anterior ou

seguinte, sucumbir de forma dramática. A mudança circunstancial implica mudanças nas situações de risco, ou pelo menos na maneira como são percepcionadas, e

mudanças na própria competência dos sujeitos para lidar com elas. A resiliência é um conceito dinâmico e o coping bem sucedido fortalece a competência individual para lidar com a adversidade futura. A resiliência reflecte a "...capability of individuals to

cope successfully in the face of significant change, adversity, or risk. This capability changes over time and the environment" (Stewart, Reid & Mangham, 1997, p.22). O

stress grave intenso e a adversidade na segunda infância pode levar a situações de distúrbio psiquiátrico, mesmo que tudo tenha corrido bem na primeira infância.

A flexibilidade inerente à noção de resiliência, para além de variar com o momento temporal, varia com os contextos, podendo o indivíduo ter um

funcionamento adequado no contexto familiar, por exemplo, e um funcionamento disruptivo evidente no contexto escolar, ou vice-versa.

Não existem "super-crianças"; nenhuma criança é invulnerável e mesmo as crianças consideradas resilientes necessitam de apoio. A resiliência não é sinónimo de protecção absoluta contra os efeitos de privação, stress ou probreza. Apesar de lhe ser atribuído um estatuto especial ao qual só certas crianças e famílias têm acesso, uma perspectiva alternativa mostra a resiliência como uma parte integral do

desenvolvimento que qualquer criança deve apresentar. "The capacity of resilience

develops over time in the context of enviormentalsupport" (Egeland, Carlson &

Sroufe, 1993, p.517-518). A resiliência é um conceito que diz respeito à capacidade da própria criança para se envolver em desafios e usá-los para o crescimento psicológico. O termo invulnerabilidade, noção extrema já em desuso, implica uma resistência absoluta que de facto não existe. Podemos falar da susceptibilidade ao stress como um

fenómeno não absoluto. O termo invulnerabilidade sugere que esta característica se aplica a todas as circunstâncias de risco, o que também não parece corresponder à realidade. Desta forma, as características intrínsecas à resiliência variam de acordo com o mecanismo de risco, sublinhando a ideia de que a resiliência reside tanto nos

indivíduos como nos seus contextos. Por último, o termo invulnerabilidade parece referir-se a uma característica estática. Sabemos que as mudanças desenvolvimentais influenciam a resiliência tal como outros aspectos.

Por todos estes aspectos, avaliar a resiliência torna-se um processo falível com uma margem de erro significativa, mesmo com recurso a diferentes fontes de avaliação utilizadas ao longo do tempo, "...if we are to assess resilience by just one

measurement at one point in time, much of what seams to be resilience will be no more than meaningless error" (Rutter, 1993, p.626).

Qual é então a origem da resiliência? A origem da resiliência pode residir nas circuntâncias prévias ou futuras. "Many of the important turning point that bring with

them enhanced resilience occur in the adult life" (Rutter, 1993, p. 629). O sucesso

numa área promove uma auto-estima positiva e auto-eficácia, levando a uma maior confiança para lidar de forma activa com os desafios da vida em outros domínios. Experiências bem sucedidas numa determinada área incrementam os aspectos do auto- conceito que promovem a resiliência. As diferenças individuais na susceptibilidade ao stress e experiências adversas podem derivar de características individuais. Mais uma vez, somos obrigados a fazer referência às avaliações individuais das circunstâncias. Os factores cognitivos jogam um papel importante maneira como as pessoas lidam com os problemas sociais de vários tipos.

3.2 A POPULARIDADE DO CONSTRUCTO E AS LIMITAÇÕES