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3. SOBRE O FEMININO: GÊNERO, IDENTIDADE E REPRESENTAÇÃO

3.1 MOVIMENTO FEMINISTA: UMA TRAJETÓRIA DE (DES)ENCONTROS

3.2.2 A questão da identidade

Conforme anunciado anteriormente, nesta seção, trataremos da noção de identidade – um desses vetores\=´po aos quais nos referíamos centrais na discussão que empreendemos até aqui, pois a política de identidade – emergida nos movimentos sociais a partir das décadas de 1960 e 1970 – era/é a base sobre a qual se alicerçavam/alicerçam esses movimentos e dentre os quais se encontra o movimento feminista.

Hall (2011) descreve com bastante acuidade como é caracterizada a identidade pelo senso comum. Ele explica que nessa perspectiva ―a identificação é construída a partir do reconhecimento de alguma origem comum, ou de características que são partilhadas com outros grupos ou pessoas, ou ainda a partir de um mesmo ideal‖ (p. 106). É importante recuperar essa concepção, pois é apoiada nela que determinados grupos estabelecem relações de solidariedade, fidelidade e reivindicam políticas específicas.

Woodward (2011) explica que essa política da identidade foi, durante muito tempo, traduzida como a celebração da singularidade de um grupo – daí o seu caráter essencialista:

[...] A política de identidade era o que definia esses movimentos sociais, marcados por uma preocupação profunda pela identidade: o que ela significa, como ela é produzida e como é contestada. A política da identidade concentra-se em afirmar a identidade cultural das pessoas que pertencem a um determinado grupo oprimido ou marginalizado. Essa identidade torna-se, assim, um fator importante de mobilização política [...] (p. 34).

Contudo, essa perspectiva identitária vem sendo desconstruída em diversas disciplinas e no interior dos ―novos movimentos sociais‖. Ambos ―criticam a ideia de uma identidade integral, originária e unificada‖ (HALL, 2011, p. 103).

Moita Lopes (2002) atribui essa mudança de cenário a uma transformação frenética que as sociedades têm enfrentado no tocante à ―locomoção/migração de um continente a outro, em curto espaço de tempo, e à comunicação via meio eletrônicos, em tempo real‖ (p. 58). Para ele, isso explica, entre outras coisas, o agravamento dos confrontos identitários, tomando-se a instauração de uma nova ―percepção sociopolítica de um mundo plural em que modos de ver a experiência humana de forma homogênea dão lugar à heterogeneidade que nos constitui ou ao intricado mosaico de que somos feitos‖ (MOITA LOPES, 2002, p. 58). Em síntese, Moita

Lopes (2002) aponta, portanto, três características das identidades sociais: ―fragmentação, contradição e processo‖ (p. 62).

Nesse sentido, os movimentos sociais vêm se adequando a essa nova configuração das identidades sociais de modo que algumas ações consensuais podem ser destacadas: a adoção de uma postura não essencialista ao se enfatizar o caráter fluido, não homogêneo, fragmentário e contraditório da identidade; o questionamento da associação da identidade a aspectos biológicos e, por fim, a rejeição das oposições binárias.

Sobre esse último aspecto, uma parcela significativa da crítica feminista, por exemplo, tanto reconhece a tendência de se classificar o mundo a partir de estruturas dicotômicas – natureza/cultura; sexo/gênero; homem/mulher; alto/baixo; sagrado/profano; etc. – quanto denunciam que os pares dessas divisões recebem pesos desiguais e ―é por meio dessas dicotomias que o pensamento, especialmente no pensamento europeu, tem garantido a permanência das relações de poder existentes‖ (WOODWARD, 2011, p. 54).

Contrário a essa interpretação ―naturalista‖ bastante sedimentada do conceito de identificação, Hall (2011) reforça o caráter dinâmico desse processo que não é definitivo e, como tal, está sujeito a adesões, a abandonos e a um movimento contínuo de articulações, pois ―embora tenha suas condições determinadas de existência, o que inclui os recursos materiais e simbólicos exigidos para sustentá-la, a identificação é, ao fim e ao cabo, condicional; ela está, ao fim e ao cabo, alojada na contingência‖ (HALL, 2011, p. 106).

Nesse aspecto, mas sem diluir a heterogeneidade de perspectivas e abordagens, e ponderando que a aproximação Hall/Chartier não seja comum ou esperada, ainda assim, encontramos um ponto de interseção entre o pensamento de Stuart Hall e Roger Chartier dada a relevância da subjetivação nesses processos de manifestações sociais e culturais – a identificação para um, e a tríade representação/prática/apropriação para o outro. Porque, ainda que em suas formulações Chartier não priorize o processo de construção identitária pela força das representações, como feito por Hall, tanto um quanto outro entende que se trata de processos fluidos e cambiantes e, portanto, sujeitos a transformações e ressignificações.

A identidade é, pois, tratada como ―um produto de uma intersecção de diferentes componentes, de discursos políticos e culturais e de histórias particulares‖ (WOODWARD, 2011, p. 38), um produto de articulação desses discursos que não representam uma totalidade

e que escapa ao significado tradicional de ―uma identidade sem costuras, inteiriça, sem diferenciação interna‖ (HALL, 2011, p. 110).

Tomaz Tadeu da Silva também oferece uma importante contribuição para esse debate ao problematizar a produção da identidade e da diferença e enfatizar como se estabelece a relação estreita de dependência entre elas em seu ensaio ―A produção social da identidade e da diferença‖. Silva (2011) inicia seu texto questionando a posição socialmente difundida de respeito e tolerância para com a diversidade e a diferença sem que essa abordagem do ―respeito à diversidade‖ e as relações de poder que ela oculta sejam questionadas. Ele explica que identidade e diferença são indissociáveis e a maneira afirmativa como manifestamos a identidade tende a camuflar essa relação:

[...] Quando digo ―sou brasileiro‖ parece que estou fazendo referência a uma identidade que se esgota em si mesma. ―Sou brasileiro‖ – ponto. Entretanto, eu só preciso fazer essa afirmação porque existem outros seres humanos que não são brasileiros. Em um mundo imaginário totalmente homogêneo, no qual todas as pessoas partilhassem a mesma identidade, as afirmações de identidade não fariam sentido [...].

A afirmação ―sou brasileiro‖, na verdade, é parte de uma extensa cadeia de ―negações‖, de expressões negativas de identidade, de diferenças. Por trás da afirmação ―sou brasileiro‖ deve-se ler: ―não sou argentino‖, ―não sou chinês‖, ―não sou japonês‖ e assim por diante [...].

[...] As afirmações sobre diferença também dependem de uma cadeia, em geral oculta, de declarações negativas sobre (outras) identidades. Assim como a identidade depende da diferença, a diferença depende da identidade. Identidade e diferença são, pois, inseparáveis (SILVA, 2011, p. 75).

Além de defender que identidade e diferença são mutuamente determinadas, Silva (2011) destaca que ambas são ―atos de criação linguística‖, ou seja, são criadas por meio de atos da linguagem e, como tais, estão suscetíveis às leis que caracterizam a linguagem. Essa é uma característica fundamental para que se compreenda, definitivamente, que nem identidade, nem diferença são elementos da natureza. Elas são construções sociais e culturais e estão sujeitas a ―vetores de força, a relações de poder‖ (SILVA, 2011, p. 81). Isso significa, entre outras coisas, que elas estão sempre em disputa, que suas definições não estão dadas harmoniosamente, elas são impostas. São elementos privilegiados de poder, logo, implicam exercícios de incluir e de excluir, de demarcar fronteiras entre ―o que somos‖ e ―o que não somos‖, de estabelecer hierarquias, classificações e oposições binárias:

Não se trata, entretanto, apenas do fato de que a definição da identidade e da diferença seja objeto de disputa entre grupos sociais assimetricamente situados relativamente ao poder. Na disputa pela identidade está envolvida uma disputa mais ampla por outros recursos simbólicos e materiais da sociedade. A afirmação da identidade e a enunciação da diferença traduzem o desejo dos diferentes grupos sociais, assimetricamente situados, de garantir o acesso privilegiado aos bens sociais. A identidade e a diferença estão, pois, em estreita conexão com relações de poder. O poder de definir a identidade e de marcar a diferença não pode ser separado das relações mais amplas de poder. A identidade e a diferença não são, nunca, inocentes (SILVA, 2011, p. 81, grifo meu).

Uma ilusão de inocência construída, essencialmente, sob o esteio da normalização, ―um dos processos mais sutis pelos quais o poder se manifesta no campo da identidade e da diferença. Normalizar significa eleger – arbitrariamente – uma identidade específica como o parâmetro em relação ao qual as outras identidades são avaliadas e hierarquizadas‖ (SILVA, 2011, p. 83). Dessa forma, são atribuídas às identidades consideradas ―normais‖ todas as propriedades positivas possíveis diferentemente das demais identidades que, por oposição, são classificadas e, por consequência, hierarquizadas, de maneira negativa. Silva (2011) explica que:

A identidade normal é ―natural‖, desejável, única. A força da identidade normal é tal que ela nem sequer é vista como uma identidade, mas simplesmente como a identidade. Paradoxalmente, são as outras identidades que são marcadas como tais. Numa sociedade em que impera a supremacia branca, por exemplo, ―ser branco‖ não é considerado uma identidade étnica ou racial [...] (p. 83, grifo do autor).

E, embora concordemos que a potência da identidade considerada ―normal‖ está, principalmente, na sua capacidade de tornar-se invisível, ou seja, natural; ainda assim, há sempre a possibilidade de sinalizá-la para subvertê-la e desequilibrá-la. Até porque, enquanto operação de produção de diferença, aquilo que foge ao padrão é constitutivo da norma. Em outras palavras, a vulnerabilidade da identidade hegemônica reside, exatamente, na sua dependência às configurações consideradas ―anormais‖ e sem as quais, ela não faz sentido. Construção, processo, instabilidade, multiplicidade são palavras, pois, que, se não definem, sugerem a perspectiva teórica que coloca em xeque o discurso consensual, seguro e alicerçado na identidade enquanto política de normalização e afirmação de um ―eu‖ coerente.

Sobretudo, quando essa perspectiva é transposta para as discussões engendradas por teorias feministas que questionam as oposições binárias que delimitam e assentam as identidades de gênero e as identidades sexuais, pois essas fronteiras podem ser transpostas e, constantemente,

desestabilizadas. Silva (2011) evidencia essa instabilidade da identidade ao esclarecer que embora esse trânsito entre as fronteiras já esteja previsto no próprio processo de fixação das identidades, ―o ‗cruzamento de fronteiras‘ e o cultivo propositado de identidades ambíguas é, entretanto, ao mesmo tempo uma poderosa estratégia de questionamento das operações de fixação da identidade‖ (p. 89).

Isso nos possibilita pensar o papel das representações na medida em que elas, aliadas a outros sistemas de significação, concorrem na construção e fixação da identidade e da diferença. Para Silva (2011), a representação é medular na teorização contemporânea sobre identidade, pois ―é por meio da representação [...] que a identidade e a diferença adquirem sentido. É por meio da representação que, por assim dizer, a identidade e a diferença passam a existir‖ (p. 91). E amplia a questão ao afirmar que:

[...] Quem tem o poder de representar tem o poder de definir e determinar a identidade [...] Questionar a identidade e a diferença significa, nesse contexto, questionar os sistemas de representação que lhe dão suporte e sustentação. No centro da crítica da identidade e da diferença está uma crítica das suas formas de representação [...] (SILVA, 2011, p. 91).

O caráter aparentemente determinista da afirmação poderia denotar uma negligência às possibilidades de se subverter as identidades fixas impostas pelos sistemas de representação. Porém, o próprio autor recorre ao conceito de performatividade para esclarecer que a representação não cumpre um papel meramente descritivo ou prescritivo em relação a certas características identitárias e que a produção de identidade é, sobretudo, uma questão de performatividade à medida que os discursos, incessantemente repetidos, constituem ou reforçam identidades de gênero, por exemplo. Mas isso não implica supor que esses sistemas sejam infalíveis ou que não possam ser deslocados e desconstruídos.

Silva (2011) ilustra muito claramente como a performatividade, por meio de proposições e repetições de atos linguísticos, impacta diretamente na produção da identidade, tendo em vista que muitas sentenças revestidas de um caráter meramente descritivo, acabam, na verdade, produzindo um fato.

Em geral, ao dizer algo sobre certas características identitárias de algum grupo cultural, achamos que estamos simplesmente descrevendo uma situação existente, um "fato" do mundo social. O que esquecemos é que aquilo que dizemos faz parte de uma rede mais ampla de atos linguísticos que, em seu conjunto, contribui para definir ou reforçar a identidade que supostamente apenas estamos descrevendo. Assim, por exemplo, quando utilizamos uma palavra racista como "negrão" para nos referir a uma pessoa

negra do sexo masculino, não estamos simplesmente fazendo uma descrição sobre a cor de uma pessoa. Estamos, na verdade, inserindo-nos em um sistema linguístico mais amplo que contribui para reforçar a negatividade atribuída à identidade "negra".

Esse exemplo serve também para ressaltar outro elemento importante do aspecto performativo da produção da identidade. A eficácia produtiva dos enunciados performativos ligados à identidade depende de sua incessante repetição. Em termos da produção da identidade, a ocorrência de uma única sentença desse tipo não teria nenhum efeito importante. É de sua repetição e, sobretudo, da possibilidade de sua repetição, que vem a força que um ato linguístico desse tipo tem no processo de produção da identidade (SILVA, 2001, p. 93-94, grifo do autor).

Contudo, esse sistema não é infalível, pois a mesma repetição que assegura a eficiência e a força dos atos performativos também está sujeita a deslocamentos, dada a irrupção das múltiplas apropriações. Por isso, a necessidade de se considerar a atuação do sujeito diante de sistemas representacionais que são passíveis de serem contrariados, adaptados ou reinventados.

Silva (2011) salienta a possibilidade de se produzir identidades novas e renovadas, distintas das identidades hegemônicas, pela arbitrariedade das relações entre esses atos repetidos ou pela própria incapacidade de repeti-los infinitamente.

Desse modo,

[...] A repetição pode ser interrompida. A repetição pode ser questionada e contestada. É nessa interrupção que residem as possibilidades de instauração de identidades que não representem simplesmente a reprodução das relações de poder existentes. É essa possibilidade de interromper o processo de "recorte e colagem", de efetuar uma parada no processo de "citacionalidade" que caracteriza os atos performativos que reforçam as diferenças instauradas [...] (SILVA, 2011, p. 95).

Assim, se as identidades são performativas, fabricadas; se os sujeitos são constituídos pelo discurso, incluindo-se as múltiplas formas de representação; se o gênero verdadeiro é apenas uma ficção; não há, portanto, uma essência, uma unidade originária, uma identidade naturalizada. Não há identidade de gênero verdadeira nem falsa, real nem ilusória, original nem derivada.

No intuito de reiterar os aspectos da identidade abordados até aqui, consideramos pertinente apresentar os principais pontos do quadro teórico elaborado por Woodward (2011) no qual ela enumera, didaticamente, as traços basilares da identidade e da diferença: a identidade possui

diferentes dimensões (simbólica, social e psíquica); frequentemente, envolve reivindicações essencialistas, concedendo-lhe um caráter fixo e imutável, por vezes, baseado na natureza; a identidade é relacional e está vinculada a condições materiais e sociais, enquanto a diferença é estabelecida por uma marcação simbólica, muitas vezes, obscurecidas por outras diferenças; e, por fim, não se pode ignorar as contradições presentes no interior das identidades, pois elas não são unificadas e precisam ser constantemente negociadas (WOODWARD, 2011, p. 13- 15).

Nossa preocupação em deslindar, portanto, os diversos aspectos e particularidades do processo de construção identitária, deve-se, entre outras coisas, à conexão estreita entre identidade e representação. Desse debate, interessa-nos, principalmente, a possibilidade de pensar como as representações femininas/da mulher presentes no livro didático reforçam, ou não, conformações identitárias de gênero, pois, se concordamos que o livro didático é um importante – mas não o único – divulgador de representações sociais, para nós, é imperativo analisar em que medida ele perpetua ou legitima identidades hegemônicas por meio de suas representações, difundidas pelos textos literários.

Como vimos reiterando até aqui, não queremos com isso corroborar a ideia de representação enquanto potência ideológica e de controle social inexorável. Ao contrário, se as representações, notadamente aquelas presentes no contexto educacional, naturalizam ou essencializam aspectos identitários, mais especificamente sobre a identidade de gênero, não podemos ignorar as negociações suscitadas pelo próprio sistema representacional, ou seja, pela atuação dos sujeitos manifestada em suas práticas sociais e apropriações.

Os estudantes podem reconhecer nos livros didáticos outros valores que escapam aos instrumentos de coerção e aprisionamento específicos desse objeto cultural. Assim, as apropriações dele feitas podem ser ambivalentes, porque tanto permitem confirmar quanto escapar à imposição e ao controle estabelecido e desejado. Até porque, como já indicamos anteriormente, os alunos lidam com forças discursivas de diferentes naturezas e contextos. Na própria escola, eles são constantemente confrontados com discursos e representações distintos daqueles apregoados pelo livro didático e que também concorrem para a construção de suas identidades e para a maneira como eles atuam/atuaygcrão na sociedade.

Moita Lopes (2002) analisa, numa aula de leitura, a prática pedagógica do professor em relação às suas concepções discursivas e como elas influem na construção das identidades

sociais dos alunos, na medida em que os professores detêm o poder de chancelar uns tipos de identidades sociais e outros, não.

Mesmo assim, Moita Lopes (2002) ressalva que ainda que, nessa conjuntura, a natureza social dos processos de diferenciação seja ocultada, ou que o discurso em sala de aula não problematize ―a questão essencial de quem é beneficiado pelos significados que refletem o senso comum – a ordem social dominante – ou que preservam o mundo como está‖ (p. 53), é possível que os alunos contestem, mesmo em silêncio. Moita Lopes (2002, p. 54) escreve que ―identidades sociais na posição de resistência podem estar em progresso, mesmo que não sejam verbalizadas [...]. Ademais, os alunos estão também atuando em outras práticas discursivas fora da escola, o que pode influenciar a construção social de suas identidades‖. E insiste:

A percepção do discurso como construção social coloca as pessoas como participantes nos processos de construção do significado na sociedade e, portanto, inclui a possibilidade de permitir posições de resistência em relação a discursos hegemônicos, isto é, o poder não é tomado como monolítico e as identidades sociais não são fixas (MOITA LOPES, 2002, p. 55).

Ou, num outro enquadramento, é preciso considerar que os sujeitos não estão posicionados igualmente na cultura, nas instituições ou na história e, ―portanto, alguns podem mais provavelmente definir que construções interpretativas são mais adequadas para o objetivo que têm em mente‖ (MOITA LOPES, 2002, p. 97). E não estamos nos referindo apenas a um posicionamento verticalizado, pois as relações interacionais pressupõem interesses distintos em diferentes contextos que vão além do par oposicional dominante versus dominado.

Assim, quando afirmamos que as meninas precisam se ver representadas nos livros didáticos, não estamos impondo a esse objeto cultural a primazia de romper com certas identificações estereotipadas e hegemônicas. De outro modo e sem ignorar sua relevância para que possamos construir nossas identidades sociais sobre outras bases, entendemos que o livro didático, todavia, não controla ou define em última instância o grau em que certos modelos, mesmo aqueles por ele reproduzido, serão admitidos ou refutados pelas alunas e alunos que o utilizam. Pois, definitivamente, concordamos com Moita Lopes (2002, p. 127) ao afirmar que ―o mosaico do qual somos constituídos é muito mais intricado do que normalmente se pensa‖ ou que nos querem fazer pensar.