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2. REGULAÇÃO NO SETOR DE ENERGIA ELÉTRICA

2.5. Regulação do setor de energia elétrica

2.5.1. Razões para a regulação do setor

A fim de compreender a forma como o setor de energia elétrica é regulado, é necessário, antes, entender os motivos específicos pelos quais existe tal regulação, para além do valor estratégico desse setor para o desenvolvimento do país.

O setor elétrico brasileiro se divide, basicamente, em quatro mercados distintos, quais sejam a geração, a distribuição, a transmissão e a comercialização. Diante dessa configuração, as empresas que atuam no setor podem fazê-lo de forma verticalizada219 ou desverticalizada220, sendo que, a fim de potencializar a eficiência do setor como um todo, a desverticalização tem sido vista, há alguns anos, como muito positiva, na medida em que permite introduzir a competição nos mercados em que isso é possível221, gerando, em última instância, benefícios aos consumidores em razão dos incentivos para que os agentes sejam

217 BRASIL. Lei nº 13575, de 26 de dezembro de 2017. Artigo 2º, caput. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13575.htm>. Acesso em: 07.06.2018.

218 BRASIL. Lei nº 13575, de 26 de dezembro de 2017. Artigo 2º, incisos I e II. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13575.htm>. Acesso em: 07.06.2018.

219 Por meio da integração vertical, há a participação da empresa em vários mercados ao mesmo tempo,

desenvolvendo, no caso, atividades em etapas diversas desde a geração até a comercialização de energia elétrica.

220 Por meio da desverticalização, a empresa participa em apenas um dos mercados, contratando empresas

atuantes nos outros mercados para a prestação dos serviços necessários em outros pontos da cadeia de produção e fornecimento de energia.

221 PRADO, Mariana Mota. O setor de energia elétrica. In: SCHAPIRO, Mario Gomes (coord.). Direito

mais eficientes e diminuam os custos de produção, reduzindo, assim, o preço final da energia. Nesse sentido, observa-se que a competição no setor elétrico pode ser introduzida nos mercados de geração e comercialização de energia elétrica – tendo em vista a estrutura integrada das redes de transmissão, que torna possível que os consumidores acessem diferentes geradoras de energia, em diferentes localidades –, ao passo em que a transmissão e a distribuição continuam caracterizadas como monopólios naturais – pois, em razão dos altos investimentos e baixo retorno, não há incentivo para a entrada de competidores e para a multiplicação das redes físicas de distribuição e transmissão.222

Diante desse cenário, constata-se, por um lado, que a regulação do setor de energia elétrica é necessária em razão da existência de monopólios naturais223, e, por outro, pelo fato de que, na prática, apesar da concorrência, a lei de oferta e demanda não funciona perfeitamente nos mercados de geração e comercialização de energia, impossibilitando tanto que os preços sejam fixados de maneira efetiva em tempo real, quanto que os agentes de mercado tomem suas decisões baseados nessa oscilação de preços.224

Esclarecendo esse ponto, baseada em estudo realizado por Stoft225, Prado226 afirma que:

Na prática, existem dois obstáculos que impedem que o mercado de geração de energia elétrica seja competitivo. Primeiro, o modo em que se dá o consumo de energia elétrica torna quase impossível determinar padrões de consumo de acordo com variações de preço. Isso ocorre porque a energia elétrica é consumida continuamente, dentro de um décimo de segundo a partir do momento em que é produzida. E não há possibilidade de estocagem. Assim, no momento em que o consumidor consegue obter informação sobre o preço real da energia, aquela informação já não necessariamente reflete o custo da energia que ele está consumindo nesse momento. Portanto, o consumidor não consegue responder efetivamente às flutuações reais de preço e, por consequência, a lei da oferta e da procura não funciona como em um mercado perfeito.

O segundo obstáculo é a impossibilidade de desconectar consumidores que estejam descumprindo seus contratos, seguindo uma variação do preço de custo em tempo real. No mercado de energia elétrica, o consumidor pode usar energia da rede sem ter nenhum contrato: quando uma fonte consumidora de energia se conecta à rede, ela vai “puxar” a corrente elétrica daquela rede. Por causa disso, o sistema é constantemente monitorado para garantir que está sendo produzida a mesma quantidade de eletricidade que está sendo consumida a todo momento, sem nenhum desequilíbrio. Portanto, a empresa pode fisicamente desconectar o consumidor da rede, mas não pode recusar-se a lhe fornecer energia no exato momento em que o consumidor deixou de cumprir seu contrato. Em outras palavras, há

222 PRADO, Mariana Mota. Ob. cit. p. 12-13.

223 GUSMÃO, Rossana Malta de Souza. Setor elétrico: livre concorrência existe na geração e comercialização.

Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2010-dez-21/setor-eletrico-livre-concorrencia-existe-geracao- comercializacao>. Acesso em: 25.06.2018.

224 PRADO, Mariana Mota. Ob. cit. p. 13.

225 Para mais, ver: STOFT, Steven. Power system economics, designing markets for electricity. New York: IEEE

Press, 2002.

inimputabilidade no sistema, Isso impede que o preço dos contratos seja determinado pela lei da oferta e da procura.

Assim, apesar de existirem argumentos contrários à regulação – especialmente focados nas deficiências regulatórias, que, de acordo com seus defensores, gerariam custos maiores do que as falhas ou ineficiências unicamente de mercado –, nota-se que ela é necessária, criando mecanismos que incentivem que a atuação das empresas e os preços praticados sejam os mais próximos possíveis daqueles praticados em um ambiente verdadeiramente competitivo.227

Não obstante, é importante mencionar que, em que pese tenham ficados claros os motivos pelos quais o setor de energia elétrica é regulado, há divergências quanto à melhor forma de promover tal regulação.228 E é com essa questão em mente que se parte para o ponto seguinte do presente trabalho, a respeito das reformas e reestruturações do setor nas últimas décadas e que resultaram, em última análise, na formulação do modelo atual que será exposto adiante.