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3. REFLEXOS PREVIDENCIÁRIOS NO CONTRATO DE TRABALHO

3.1. Benefícios previdenciários – noções gerais

3.1.1. Aposentadorias

3.1.1.1. Aposentadoria por invalidez

3.1.1.1.3. Recolhimento de FGTS e plano de saúde

Dúvidas não há no sentido de que o empregador está obrigado depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada do empregado, a importância correspondente a 8% da remuneração paga ou devida, no mês anterior a título de Fundo de Garantia por Tempo de serviço (FGTS), nos termos do que dispõe o art. 15 da Lei 8.036/90.

A mesma lei impõe ao empregador a obrigação de continuar depositando o FGTS ao empregado, mesmo em se tratando de afastamento para cumprimento do serviço militar obrigatório, bem como em caso de licença por acidente de

trabalho (§ 5º do art. 15).

A questão que se pretende colocar em debate diz respeito ao alcance da expressão licença por acidente de trabalho, ou seja, qual interpretação que deve ser emprestada ao termo licença.

Certo é que referido dispositivo legal se aplica aos casos de afastamento do empregado por auxílio-doença (acidentário – B91). É dizer, sempre que o empregado ficar afastado por mais de 15 dias em caso de incapacidade laboral temporária, a Previdência deverá conceder o benefício de auxílio-doença, bem como o empregador deverá depositar o FGTS enquanto o obreiro permanecer afastado. Dito de outra maneira, o termo licença abrange o afastamento do empregado por auxílio-doença acidentário.

Por outro lado, já que estamos a tratar do benefício de aposentadoria por invalidez, pergunta-se: estaria o empregador obrigado a depositar o FGTS quando o empregado passar a receber esta aposentadoria em decorrência de

causa originada no trabalho? A expressão licença usada pela norma fundiária abrange a aposentadoria por invalidez?

O Tribunal Superior do Trabalha interpreta o texto legal no sentido de que o afastamento do empregado aposentado por invalidez não lhe confere direito aos depósitos fundiários durante este período, in verbis:

RECURSO DE REVISTA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. FGTS. DEPÓSITOS. A aposentadoria por invalidez não garante ao empregado o direito aos depósitos do FGTS, mesmo porque a legislação específica mantém a obrigação patronal apenas nas situações em que o empregado se afasta para prestar serviço militar obrigatório e em razão de licença concedida em face de acidente do trabalho (art. 15, § 5º, da Lei 8.036/90). Recurso de revista conhecido e desprovido. (RR - 419-51.2010.5.03.0037, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 23/02/2011, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 11/03/2011)

Dado o caráter social e humanitário das normas trabalhistas e previdenciárias, entendemos não ser adequada a interpretação restritiva feita pela Corte Trabalhista.

Primeiramente, não se pode olvidar que a aposentadoria por invalidez tem caráter temporário, conforme visto acima. Em segundo lugar, esta aposentadoria pode ser implementada desde logo, uma vez concluindo a perícia médica que se trata de situação de tamanha gravidade que resulta em incapacidade total e permanente para o trabalho.

Imaginemos o seguinte exemplo hipotético: empregado que sofre acidente de trabalho e passa a receber auxílio-doença por 3 anos. Certamente a empresa deverá depositar o FGTS enquanto permanecer em gozo deste benefício.

Utilizando o mesmo exemplo, imaginemos que o benefício não foi auxílio- doença, mas sim aposentadoria por invalidez, dada a gravidade da situação. Seria razoável conceber que na primeira hipótese (menos grave – auxílio-doença) o empregador estivesse obrigado a depositar o FGTS, ao passo que em situação ainda pior (aposentadoria por invalidez) estaria dispensado deste encargo?

Nesta quadra, convém lembrar que em 2012, por meio da Resolução nº 185 de 14/9/2012, o TST editou a Súmula nº 44091, a qual obriga o empregador a manter o plano de saúde ou assistência médica oferecido pela empresa em caso de afastamento por auxílio-doença acidentário e aposentadoria por invalidez, não obstante suspenso o contrato de trabalho. Referida súmula certamente tem por fundamento o caráter social das normas trabalhistas, em especial pelo fato de que é justamente nestas hipóteses que o trabalhador mais necessita do plano de saúde.

É curioso notar que para a manutenção do plano de saúde e assistência médica em caso de aposentadoria por invalidez, sequer é exigido que tal benefício decorra de acidente de trabalho, como é o caso do auxílio-doença, que deve necessariamente ser acidentário.

Se um dos argumentos contrários ao recolhimento do FGTS em caso de aposentadoria por invalidez é que o contrato de trabalho está suspenso, igualmente não teria razão de ser o empregador estar compelido a manter o plano de saúde durante este período, quando também estamos diante de suspensão contratual.

Menos ainda se sustenta que os depósitos fundiários devem ocorrer apenas em caso de auxílio-doença acidentário, por se tratar de licença com caráter temporário, pois, conforme analisado, a aposentadoria por invalidez igualmente é de natureza precária.

As normas jurídicas trabalhistas e previdenciárias representam a essência ordem social, a qual objetiva, dentre outras, melhores condições de vida, daí porque a Constituição Federal afirmar serem objetivos da ordem social o bem

estar e a justiça sociais (art. 193).

Nessa linha de raciocínio, há de observar que o contrato de trabalho também deve cumprir sua função social, com a observância de princípios constitucionais como a dignidade humana (art. 1º, III) e a solidariedade (art. 3, III),

91 SÚMULA 440 - AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. RECONHECIMENTO DO DIREITO À MANUTENÇÃO DE PLANO DE SAÚDE OU DE ASSISTÊNCIA MÉDICA - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 - Assegura-se o direito à manutenção de plano de saúde ou de assistência médica oferecido pela empresa ao empregado, não obstante suspenso o contrato de trabalho em virtude de auxílio-doença acidentário ou de aposentadoria por invalidez.

que figuram respectivamente como fundamentos e objetivos da República Federativa do Brasil.

A função social contrato (art. 421 e 187 do Código Civil), ao lado da boa- fé objetiva e do equilíbrio econômico dos contratantes, enquanto cláusulas gerais, representam a trilogia de princípios do novo direito contratual, os quais não eliminam, por certo, aqueles princípios clássicos92 de matriz individualista, apenas limitam seu conteúdo e alcance93.

Em interessante artigo abordando algumas Súmulas do TST, dentre as quais está a Súmula nº 440, Renato Rua de Almeida94 analisa a questão alusiva à função social do contrato enquanto princípio que norteia as relações contratuais, dando ênfase à força irradiante dos direitos fundamentais nas relações privadas.

Pelo que dissemos, acreditamos ser princípio de justiça o recolhimento dos depósitos fundiários mesmo quando se tratar de afastamento por aposentadoria por invalidez; seja esta concedida de imediato, seja a posteriori, por conversão do auxílio-doença acidentário, ocasião em que o empregador continuará a depositar o FGTS, mesmo com a cessação do auxílio-doença, na medida em que na sequência já será implementada a aposentadoria por invalidez. Há um outro aspecto de relevo nessa seara que deve ser mencionado e que reforça a ideia do diálogo entre as esferas trabalhista e previdenciária, a saber: o empregado tem direito a levantar os depósitos fundiários ao se aposentar por invalidez.

As hipóteses de movimentação da conta vinculado do FGTS estão elencadas no art. 20 da Lei 8.036/90, sendo certo que o inciso III do referido dispositivo assevera ser hipótese de saque, “aposentadoria concedida pela Previdência Social”. Ou seja, qualquer que seja a modalidade de aposentadoria, autorizada está a movimentação da conta.

92 Referimo-nos ao princípio da autonomia da vontade, pacta sunt servanda e eficácia relativa dos contratos que sempre permeou as relações contratuais, sofrendo, contudo, profunda limitação de seu conteúdo em face dos novos princípios contratuais.

93 A respeito do tema, conferir os Enunciados nº 21, 22 e 23 da 1ª Jornada de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários – CEJ do Conselho da Justiça Federal.

94 ALMEIDA, Renato Rua de. A função social do contrato e a nova redação do item III, da Súmula

n. 244, a inserção do item III, na Súmula n. 378, e a edição das Súmulas ns. 440 e 443, do TST.

Ainda, é necessário recordar que o empregador que dispensar sem justa causa o empregado, estará obrigado a pagar-lhe uma indenização equivalente a 40% do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros (art. 18, § 1º).

Na hipótese de restar configurada, judicialmente, despedida por culpa recíproca ou força maior, reconhecida pela Justiça do Trabalho, o percentual da indenização será reduzido pela metade, ou seja, 20%.

Questão que poderia suscitar dúvida diz respeito à hipótese de o empregado ter sacado os valores relativos ao FGTS por ocasião de sua aposentadoria por invalidez e, ao retornar à atividade, ser dispensado sem justa causa. A indenização de 40% deverá incidir sobre os valores fundiários já levantados pelo empregado?

A resposta certamente é positiva e, para tanto, basta que seja feita uma interpretação do § 1º do art. 18 acima referido, segundo o qual, a indenização de 40% irá incidir sobre todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a

vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos

respectivos juros.

A este respeito, o TST editou a Orientação Jurisprudencial nº 361, a qual determina expressamente que:

APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. UNICIDADE DO CON- TRATO DE TRABALHO. MULTA DE 40% DO FGTS SOBRE TODO O PERÍODO (DJ 20, 21 E 23.05.2008) A aposentadoria espontânea não é causa de extinção do contrato de trabalho se o empregado permanece prestando serviços ao empregador após a jubilação. Assim, por ocasião da sua dispensa imotivada, o empregado tem direito à multa de 40% do FGTS sobre a totalidade dos depósitos efetuados no curso do pacto laboral.

Concluindo o raciocínio acerca deste tema, cabe consignar que o empregador irá desembolsar, por ocasião da dispensa sem justa causa, o equivalente a 50%, sendo 40% destinados ao empregado e a diferença (10%) a título de contribuições sociais, na forma do § 3º do ar.2º do Decreto nº 3.914/2001 que regulamenta a Lei Complementar nº 110/2001, a qual instituiu a

obrigatoriedade desta parcela de 10%, sendo exigida para despedidas ocorridas a partir de 28 de setembro de 2001, inclusive.