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PARTE I. AS CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO DO DISCURSO PARA A

CAPÍTULO 3: AS CRISES POLÍTICO-ECONÔMICAS E A CONSOLIDAÇÃO DA

3.1. Redemocratização e o otimismo econômico

O governo militar teve algum apoio da população enquanto conseguiu mostrar bons resultados econômicos para a classe média. O período que vai de 1971 a 1974, conhecido como milagre econômico brasileiro, foi o de maior crescimento do PIB do país, apesar de beneficiar uma parcela muito pequena da população. Após essa fase de grande crescimento, a crise do petróleo fragiliza as contas nacionais, reduz os possíveis compradores externos e o Brasil se vê em forte recessão. Iniciada em 1975, tal crise terá repercussões até o fim dos anos 1970, e por toda a década de 1980. A população, ciente do que está acontecendo, começa a se reorganizar em sindicatos, pressionando o governo para uma reparação das perdas salariais e para lutar contra a sobrecarga da classe trabalhadora, que pagava pelos erros dos governantes e dos empresários. No fim dos anos 1970, o sindicalismo brasileiro já desafiava a repressão militar, colocando mais de 500 mil pessoas

na rua. O discurso do governo militar entra em crise e a população inicia campanha por eleições diretas. (SANGUINÉ, 1998, p. 27).

O ano de 1984 foi marcado por grandes protestos que exigiam eleições diretas. Diante do novo contexto, as empresas de mídia tentavam entender os limites do governo militar, posicionando-se para atrair a atenção de sua audiência e a confiança dos próximos governantes (SANGUINÉ, 1998, p. 28). Como não havia sustentação para o governo militar, os setores mais conservadores esperavam continuar conduzindo o país e, para tanto, concentraram seus esforços em não permitir a aprovação das eleições diretas. A contraofensiva da população, todavia, intensificou-se e os grandes jornais impressos, após pesquisas de mercado, passaram a noticiar as manifestações (SANGUINÉ, 1998, p. 28), com exceção da Rede Globo, que ignora e dissimula os acontecimentos, ainda na expectativa de conseguir conduzir sua audiência para aceitar os benefícios das eleições indiretas.

Na data marcada para a apreciação do Congresso da possibilidade de convocação de eleições diretas, os deputados votam contra tal proposta, sendo instituído um conselho que escolheria, entre duas opções, o novo governante do país. Dessa forma, Tancredo Neves e José Sarney vencem as eleições indiretas como presidente e vice-presidente, respectivamente. Por problemas de saúde, Tancredo vem a falecer antes de tomar posse e Sarney assume como presidente do país. Esse dia, 15 de janeiro de 1985, marca o fim do período de ditadura militar no Brasil, com a eleição indireta dos novos presidentes.

Diferentemente de outros países da América Latina, o fim da ditadura no Brasil se deu por um acordo, em que os militares devolviam o exercício do poder aos eleitos pelo povo e, em troca, os crimes da ditadura não seriam investigados e julgados. Aos combatentes do regime que, em muitos casos foram presos e torturados, foi instituído que receberiam indenizações pelo sofrimento infringido, mas sem direito a julgamento e punição dos culpados pelos crimes dos quais foram vítimas.

O acontecimento foi celebrado pela imprensa, discretamente, sem que houvesse menção ao período militar como o de maior censura e perseguição já vividos no país. Os noticiários impressos e televisivos exaltavam o novo recomeço e o Brasil do futuro, resquícios do ufanismo militar, na tentativa de apagar da memória das pessoas os anos turbulentos anteriores. A ditadura militar deixou como legado uma dívida externa

incalculável; uma elevada concentração de renda, que beneficiava alguns grupos empresariais; e o sacrifício dos trabalhadores, que não podiam exigir direitos ou reparações, devido à violenta repressão às manifestações populares.

Entre os diversos segmentos da população, principalmente a classe média, que saiu às ruas pelas eleições diretas, foi revigorado o otimismo e o sentimento de nova chance para o Brasil. Esse entusiasmo, que imprimia a ideia de um recomeço, teve repercussões na economia. O otimismo, propagado pelos meios de comunicação, reverberaram para o consumo e, por consequência, para o mercado fonográfico. Como é possível perceber nos números apresentados logo abaixo, o período entre 1985 e 1987 registrou um crescimento acentuado das vendas de discos e cassetes.

Gráfico 2: Total de cópias vendidas entre 1979 e 1987 (em milhões)

Elaboração própria. Fonte ABPD.

As consequências desse período de otimismo se mostraram largamente vantajosas para o mercado fonográfico. Se desde o fim dos anos 1970, havia decréscimo no volume total de cópias vendidas, em apenas um ano, as vendas praticamente duplicaram: em 1985, foram 42,3 milhões de cópias vendidas e, em 1986, esse número chega a extraordinários 72,9 milhões de cópias, o que equivale a um crescimento de 72,30%. No ano seguinte, o mercado não registra crescimento, mas o volume de vendas continua o maior da história de atuação da indústria fonográfica no país.

Ao serem somadas a esperança de melhorias na economia e a relativa vitória pela redemocratização, temos, como resultado, um período de crescimento econômico, cujo efeito imediato pode ser notado no volume de vendas do setor fonográfico. O Governo Sarney, diante desse quadro, passa a adotar medidas econômicas não usuais para combater a inflação, que se tornou o principal problema econômico do período.

Entre 1986 e o início de 1987, variadas estratégias econômicas tiveram repercussão positiva junto à população. Em março de 1986, o país mudou sua moeda e viu a inflação chegar a praticamente zero. A valorização dos salários, para repor as perdas inflacionárias, e o posterior congelamento de preços (pacote econômico denominado Plano Cruzado), estabelecido por meio de decreto, foram medidas que reforçaram o otimismo. E, mesmo tendo consequências posteriores, nos primeiros meses de sua aplicação, o país viveu forte crescimento em diversos setores, inclusive o fonográfico – como verificado no gráfico acima. Essa trajetória pode ser mais bem detalhada em ABREU, 1989; GIAMBIAGI et al, 2005; GREMAUD et al, 2002.

Na próxima seção, será apresentada a continuidade do governo Sarney e as diversas pressões que ele sofreu dos agentes econômicos, durante a manutenção das medidas adotadas. O primeiro governo democrático, depois da ditadura militar, passou pela mais grave crise monetária de nossa história, e todos os mercados registraram consequências negativas, apesar de novas estratégias terem surgido.

3.2. A hiperinflação, o “remédio” neoliberal e as consequências para o mercado