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3 A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: FUNDAMENTO TEÓRICO-

3.4 Relação entre representações sociais e práticas

Como bem sabemos as representações sociais estão presentes na vida, principalmente quando precisamos saber sobre o mundo e as pessoas que nos cercam é quando percebemos sua presença. Elas são utilizadas para nos ajustar a determinados contextos, conduzir nossas ações, localizarmos fisicamente e intelectualmente no mundo, identificar e resolver os problemas do dia a dia.

Portanto, através da TRS, podemos entender os sentidos e significados que as pessoas têm em relação ao mundo e consigo mesma, bem como os processos que estão neles imbricados. Esses “[...] conhecimentos organizam-se em conjuntos de ideias articuladas, fornecendo ‘modelos explicativos’ acerca de uma determinada realidade” (ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000, p. 258). Conforme estas autoras “a TRS tem fornecido subsídios para a compreensão de diferentes realidades sociais e trazido à tona aspectos até então desconhecidos dessas realidades” (ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000, p. 258).

Como já dissemos a representação determina os comportamentos e as práticas dos sujeitos. É “um guia para a ação, ela orienta as ações e as relações sociais. Ela é um sistema de pré-decodificação da realidade porque ela determina um conjunto de antecipações e expectativas” (ABRIC, 2000, p. 28).

Como Santos (2005) afirma, as teorias do senso comum “[...] são conjuntos de conceitos articulados que têm origem nas práticas sociais e diversidades grupais cujas funções é dar sentido à realidade social, produzir identidades, organizar as comunicações e orientar as condutas” (SANTOS, 2005, p. 22).

As representações sociais têm caráter funcional, ou seja, direcionam os comportamentos dos sujeitos. Elas guiam o modo de se nomear e definir de forma conjunta os aspectos da realidade, interpretando-os, tomando decisões ou se defendendo frente a eles.

Almeida, Santos e Trindade (2000) afirmam que as práticas não se referem a um fenômeno de interesse apenas da TRS, porém o estudo da relação de representações e práticas sociais é um ponto central da teoria. Na visão das autoras há consenso entre os pesquisadores que as representações e práticas se engendram mutuamente, sendo fundamental estar atento às possíveis articulações existentes entre as práticas e a construção da representação de um dado objeto (ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000).

É importante atentar para o uso indiscriminado e a indefinição do conceito de práticas sociais. A esse respeito Abric (2001, p. 195, tradução livre) diz que as práticas sociais “[...] são sistemas de ação socialmente estruturados e estabelecidos”. Trindade (1998, apud

ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000, p. 261) ao se referir as práticas sociais destaca que há pelos menos dois requisitos comuns para defini-las: “(1) as práticas sociais são conjuntos de ações; (2) ‘as ações se apresentam com organização encadeada e padronizada’”. Contudo, Almeida, Santos e Trindade (2000) advertem que [...] apesar dos requisitos comuns, os pesquisadores ora destacam aspectos mais subjetivos (por serem as práticas sociais atividades significativas dos sujeitos) ora destacam seu papel social (ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000).

As autoras querem dizer que se as práticas, por um lado, são objetos da experiência pessoal, são também marcadas pelo social, pois são regidas por discussões que perpassam na mídia e grupos sociais. Acrescentam ainda que as práticas podem ser de reprodução ou de contradição e ruptura.

[...] se por um lado a maior parte das práticas que estudamos são práticas de reprodução, o que cabe também para as teorias do senso comum, por outro, elas não implicam em homogeneidade. Na gênese de uma teoria do senso comum emerge também a gênese da contradição. Ao lado de práticas e representações dominantes e resilientes, estudos mostram a face da ruptura, do novo e do inesperado. (ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000, p. 260).

Abric (2001, p. 195), autor que mais se dedicou ao estudo da temática, afirma que a relação entre representações sociais e práticas assumem três distintas direções, a saber: (1) as práticas determinam exclusivamente as representações; (2) as representações determinam as práticas; e (3) representações e práticas sociais estão interrelacionadas.

No primeiro caso as práticas determinam exclusivamente as representações, essa posição tem inspiração na filosofia materialista e parte de uma perspectiva da sociologia marxista. Nesta perspectiva, as representações sociais são entendidas “[...] como um ‘processo de adaptação cognitiva dos agentes sociais às suas condições específicas de existência, e particularmente aos múltiplos ‘comportamentos forçados’ que as relações sociais instituídas exigem deles no curso de suas vidas diárias” (ABRIC, 2001, p. 197, tradução livre). Sendo assim, as ideologias e seus correspondentes são originados e determinados pelos modos de produção que regem uma determinada sociedade (ABRIC, 2001).

Tomar as práticas sociais como condicionantes das representações tem sido entendido, no âmbito da TRS, como uma concepção radical, oriunda das teses marxistas, que pressupõe que apenas as condições materiais e objetivas de existências podem determinar as ideologias ou as representações. (ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000, p. 261).

Comentando sobre este tipo de relação Abric (2001, p. 197, tradução livre) demonstra que nessa relação das práticas determinando as representações, os comportamentos dos sujeitos “[...] não resultam de suas crenças, representações ou sistema de valores, mas da estrutura institucional, do ambiente social e, mais precisamente, do contexto de poder que estão enfrentando e que impõe-lhes, extrai o seu comportamento”. Assim, admite que as práticas aceitas e realizadas pelos indivíduos no dia a dia “[...] modelam e determinam seu sistema de representação à sua ideologia. A representação é então gerada por um processo de racionalização, que não se refere a conhecimentos ou crenças, mas resulta “das condições objetivas” (ABRIC, 2001, p. 197, tradução livre).

Almeida, Santos e Trindade (2000), baseadas em Abric (2001), afirmam que os estudos sobre o tema devem considerar três fatores que determinam as representações ao mesmo tempo em que encerram toda atividade prática, quais sejam:

[...] (1) os fatores culturais que atuam como ‘matrizes culturais de interpretação’ das práticas; (2) os fatores ligados aos sistemas de normas e de valores, que intervêm como elementos de negociação entre as práticas e as representações e (3) os fatores ligados à atividade dos sujeitos, tais como as atividades de decodificação, os sistemas de expectativas, antecipações e categorização que estão associados às representações das práticas. (ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000, p. 261).

No que se refere as representações determinam as práticas podemos perceber que são consideradas guias para ação e, portanto, acredita-se que “[...] é a natureza das representações de si, do outro ou da tarefa que incidem diretamente sobre o comportamento dos sujeitos” (ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000, p. 261). Essa perspectiva põe em evidência que as representações dos grupos determinam as relações intergrupais. Esse panorama coloca as representações com uma força maior na vida dos indivíduos, pois elas regem as práticas cotidianas. Isso aponta para percebemos que as práticas serão uma concretização das representações sociais que o indivíduo ou grupo detêm sobre determinado objeto.

A última relação incide na interação entre as representações e as práticas sociais. Esta relação implica em compreender que as representações sociais “[...] regulam as práticas sociais dos sujeitos, porém, ao mesmo tempo, elas emergem das diferentes práticas sociais, da diversidade das práticas no cotidiano” (ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000, p. 262). A relação entre representações e práticas sociais merece um maior aprofundamento, principalmente “[...] nas contribuições que o desvendamento das práticas pode oferecer à

compreensão das representações e ambas, à construção da realidade social” (ALMEIDA; SANTOS; TRINDADE, 2000, p. 263).

As representações sociais orientam as práticas, ao mesmo tempo em que elas emergem das práticas e esta tem sido a posição predominante entre os pesquisadores. Adotando essa perspectiva inter-relacional, esta pesquisa procura identificar as representações sociais de educação infantil, construídas pelos ADIs e suas relações com as práticas desenvolvidas por esses profissionais em instituições públicas municipais do Recife.

Na próxima seção apresentamos o aporte metodológico adotado para o desenvolvimento da investigação.