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Relação Heterogeneidade e Diversidade no Contexto do Sénior

Parte I Enquadramento Teórico e Legislativo

3.5 Relação Heterogeneidade e Diversidade no Contexto do Sénior

CONTEXTO DO SÉNIOR

Impõe-se, portanto, um novo discurso que deixe de classificar as pessoas não apenas pelo número de anos que possuem, mas capaz de reconhecer a idade sénior como mais uma etapa do desenvolvimento, uma etapa útil, produtiva na vida das pessoas.

Envelhecer na aldeia é uma experiência marcadamente diferente de envelhecer numa cidade. Os meios rurais, apesar de sofrerem muitas influências dos meios urbanos e industriais, continuam a manter um carácter distinto em relação a estes.

No actual mundo rural as tarefas são partilhadas dentro da estrutura familiar e muitas vezes na própria comunidade. Não há limite etário para esta participação – o período de actividade produtiva coincide com a própria vida. O quotidiano é marcado pelo ritmo da natureza e envelhecer não significa, obrigatoriamente, passar uma etapa não produtiva. No mundo rural a imagem negativa do sénior depende e está associada a uma incapacidade efectiva para o trabalho e não a uma idade específica, como acontece nos meios urbanos em que o sénior surge como necessidade de uma decisão administrativa, a aposentação, nem sempre relacionada com a efectiva capacidade do sénior realizar trabalho produtivo.

No meio rural, a separação entre o tempo de trabalho e o tempo de lazer não é nítida; as festividades encontram-se relacionadas com o mundo do trabalho. O próprio trabalho torna-se festa: quando se participa numa vindima, numa desfolhada ou se partilha os serões com os vizinhos em volta dos arrumos dos produtos agrícolas ou

78 numa tarde a fazer filhoses e coscorões para vender na associação, as fronteiras entre trabalho, lazer e ócio esbatem-se.

Assim “valorizam-se as festividades e os ócios, imbricados na própria actividade do trabalho” (Canário, 2000, p. 131). Nesta linha de pensamento a idade não afecta directamente o tempo disponível para o trabalho e para o ócio.

No mundo rural, a idade sénior tem o seu lugar no ciclo de vida merecendo respeito pela sabedoria nascida da experiência. Aos séniores rurais cabe continuar a dar expressão às tradições que constituem o património colectivo da comunidade. As suas memórias são valorizadas e constituem um conjunto de normas que tendem a repetir no tempo valores e padrões de comportamento, apoiados em crenças culturais, reflectindo respeito pela experiência acumulada pelos séniores. O seu saber, associado à agricultura, à jardinagem, às receitas caseiras ou à cura e tratamento de corpo, com base no conhecimento das propriedades curativas de plantas ou no valor de rezas e orações, tem valor afectivo e pragmático para os outros elementos da comunidade.

O mundo rural tem vindo a sofrer a influência progressiva dos contextos urbanos e industriais. “As zonas rurais vivem uma situação pragmática que parece conduzi-las para o colapso social e económico e as que restam constituem-se como telhas sociais depositárias de um modo de vida” (Canário, 2000, pp. 126-127).

As alterações sociais e económicas que ocorrem na sociedade em geral reflectem-se nas zonas rurais afectando o modo como é encarada a idade sénior. A melhoria dos cuidados de saúde multiplicam o número de séniores, quer no mundo rural, quer nas cidades; atingir idades avançadas foi um facto que se vulgarizou.

As cidades atraíram os mais jovens pelo que, nas aldeias, a família alargada deu lugar a uma família reduzida, a maioria das vezes constituída apenas pelos idosos que ficaram após a partida das gerações jovens. O sénior deixou de ter em casa alguém sobre quem exercer o poder que a idade lhe conferia. Com o acesso generalizado à escolarização a supremacia do saber sénior desapareceu. A economia moderna criou novas formas de ocupação do solo, grandes áreas foram atribuídas à produção intensiva, em regime de monocultura, e nelas a relação das pessoas com a terra modificou-se. Já não se trata de uma relação de base familiar, instalou-se o modelo industrial. Estas são algumas das modificações que levaram a afirmar que “o mundo rural tradicional tende a ser pura e simplesmente eliminado” (Canário, 2000, p. 133).

79 Se na sociedade em geral não há experiência no modo como integrar tantos séniores, pois nunca antes eles foram em tão grande número, no mundo rural esta questão acentua-se. Passou-se de um momento histórico em que nas aldeias os séniores eram em número reduzido, face aos numerosos jovens, para outro momento em que ser sénior é o denominador comum numa população onde os jovens são muito poucos.

Na actualidade quem envelhece nas aldeias rurais do país enfrenta o desafio de viver essa fase da sua vida numa comunidade quase toda ela sénior e esse facto trará certamente ajustamentos na rede de relações sociais, redefinindo estratégias quotidianas e conduzindo a alterações no modo de viver essa etapa da vida. De qualquer modo, envelhecer no mundo rural continua a ser uma experiência diferente do que envelhecer numa cidade.

Dada a imensa heterogeneidade do ser sénior, as investigações e o processo de envelhecimento mais do que chegarem à definição de padrões abrangentes resultam de retratos datados de pessoas ou comunidades que num determinado tempo histórico e social, vivem a sua condição de séniores, com necessidades que se cruzam com os recursos externos e promovem a criação de outros. As realidades diversas que constatamos são o espelho de expectativas e papéis que reservamos aos séniores das políticas sociais e, sobretudo, da sociedade em que estão inseridas. Só esse conhecimento permitirá proteger objectivos de qualidade de vida e adequar políticas sociais e educativas de inovação.

As políticas de inovação para séniores devem ter em conta um conhecimento profundo das suas realidades sociais, económicas, culturais e educativas, nos seus contextos e subjectividades.

Por todas estas sistemáticas funcionalidades do sénior é difícil definir o que se entende por sénior.

Sénior é um conceito relativamente recente que se insere numa perspectiva de desenvolvimento vital do indivíduo. Etapa que corresponde ao fim da vida activa, passagem à reforma em que o cidadão ainda é auto-suficiente, independente e responsável pela sua vida. O termo sénior surge para expressar novos padrões de comportamento de uma geração que se aposenta e envelhece tendo uma vida activa, o que corresponde a uma nova etapa do ciclo de vida do homem, podendo constituir um

80 momento propício para o cidadão se dedicar a actividades que, por falta de tempo, não teve oportunidade de realizar anteriormente.

O conceito sénior surge na sequência da criação de Instituições especializadas que correspondem às necessidades de cada etapa da vida. Entre elas a idade ou as idades séniores. Desta forma, emergem as US e com elas o conceito de sénior passa a ter mais relevo, tornando-se mais apelativo para os próprios séniores.

A reforma actua como uma fronteira apelidando todos os que a alcançaram de improdutivos, aposentar-se é sinónimo de não ser produtivo, de falta de actividade. Deste modo os séniores são “empurrados” para à inactividade muito cedo, onde por vezes são considerados um problema social, vivenciando o sénior as contradições da sociedade actual e as tão profundas transformações que a caracterizam.

O INE (1999) divide o grupo etário dos 65 e mais anos, em idosos/séniores jovens (65/69 e 70/74 anos) e idosos/séniores mais velhos ou grandes idosos/séniores (75 e mais anos). Os primeiros ainda são autónomos e independentes, enquanto o segundo subgrupo por vezes são dependentes com incapacidades que exigem cuidados específicos, mas muitos deles ainda tem projectos de vida.

Também o Relatório do (EANSP,2008) ao referir-se aos séniores agrupa-os em quatro grupos etários de séniores: 55-64 anos- séniores/jovens; 65-74 anos; 75-84 anos; 85 ou mais anos- séniores/idosos.

“Qualquer limite cronológico para definir as pessoas Séniores é arbitrário e dificilmente traduz a dimensão biológica, física, psicológica da evolução do ser humano” (Monteiro & Neto, 2008, p. 16).

A autonomia e a saúde são factores a considerar, pois afectam de forma diferente os cidadãos com a mesma idade. Contudo, demarcar os limites de idade a partir dos quais uma pessoa é sénior é imprescindível para a descrição nacional e internacional de envelhecimento em estudos comparativos.

No nosso estudo teremos em conta a idade cronológica e a idade funcional, embora consideramos pessoas séniores os cidadãos com idade igual ou superior a 50 anos, idade que em Portugal está associada à dificuldade em voltar a arranjar emprego. Trata-se, no entanto, de uma idade da pré-reforma, porque a reforma é aos 65 anos. Não é consensual este limite, em Portugal nem a nível internacional, “não se trata de negar a realidade de um envelhecimento cognitivo, trata-se sim de encarar o funcionamento

81 cognitivo dos adultos e dos séniores na sua plasticidade com capacidades mais dependentes da experiência e compensar deficits de capacidades mais dependentes das mudanças do sistema nervoso central que acompanham o envelhecimento cronológico” (Marchand, 2001, p. 70).

O envelhecimento não se processa de igual forma, pois é um processo dinâmico e que supõe a aceitação do facto de que cada um é responsável pela sua própria vida e que esta é vivenciada diferentemente por cada cidadão.

A Comissão da Comunidade Europeia propõe que “a terceira idade corresponde apenas ao grupo dos 50 – 74 anos e uma nova designação de quarta idade para os 75 e mais anos” (D.E.C.P., 2002, p. 159).

Esta alteração de significado da 3ª idade – idade sénior vem dar visibilidade aos séniores visto que a maioria das pessoas incluídas no intervalo das idades indicadas conservam um elevado grau das suas capacidades, quer físicas, quer mentais, quer cognitivas, quer psíquicas. Na sociedade actual, o trabalhador é condenado à inactividade muito mais cedo que antigamente, vendo-se a sociedade coagida a responsabilizar-se pela velhice que passa a constituir um problema social experienciando o sénior as contradições da sociedade actual e as profundas transformações que as caracterizam, sendo socialmente objectivado como 3ª e 4ª idades como referem Santos & Encarnação (1998 p. 69). Também a nível do Parlamento Europeu a própria definição do conceito de terceira idade – idade sénior está sujeita a alterações; Actualmente, já se fala em 4 gerações: I- jovens, II- adultos, III- terceira idade, idosos activos (dos 60 – 65 aos 75 – 85 anos) e IV idade – séniores passivos (acima dos 80 anos). Desta forma, “temos de começar a estabelecer uma distinção entre os idosos ainda activos que participam no mundo do trabalho ou em actividades sociais de voluntariado, e os que são passivos ou por opção ou por motivos de doença” (Esteves, 1995, p. 152). Nos séniores passivos também poderá ter ocorrido a viuvez e outras perdas de familiares e amigos e o isolamento da comunidade. Estas perdas contribuem para um isolamento social relacional que é do conhecimento do cidadão, percepcionando este as suas relações interpessoais como insatisfatórias e, por vezes, aceitando esta insatisfação como natural no seu ciclo de vida, conformando com a sua inactividade e isolamento.

A formação recebida pelo sénior foi de nível inferior à actual, quer a nível de cidadania, quer a nível de participação cívica, quer a nível de exercer a sua autonomia e,

82 muitas vezes, os conceitos básicos apreendidos deixaram de ser adequados ao tempo presente. Deste modo, “uma pessoa sénior confronta-se com dificuldades consideráveis na utilização das novas tecnologias que invadiram a nossa vida. Desta forma, torna-se imprescindível promover a formação – aprendizagem ao longo da vida”. E o conceito de envelhecimento activo da OMS tem por base “o princípio de permitir aos idosos que permaneçam integrados e motivados na vida laboral e social, parece ser uma solução encontrada, tornando-se indispensável difundir e implementar medidas” (INE, 2002, p. 187).

Daí considerarmos que esta etapa do ciclo de vida não pode ser vista como um fim de vida, mas antes uma etapa com características, competências e valores próprios e uma nova forma de olhar a vida, pois a cidadania é construída por todos os cidadãos e só é possível quando todos tiverem deveres e direitos iguais em participar.

Numa sociedade em que se privilegia a juventude, é fácil difundirem-se estratégias negativas em relação aos séniores. Muitas vezes a eles está associado o preconceito de que ser sénior é ser inútil para a sociedade. Tendo em consideração este pressuposto, os preconceitos precisam de ser desmistificados e reavaliados para que o sénior os possa enfrentar, não se isolando ou deixando de conviver, participar, interagir com os outros, quer a nível afectivo, quer a nível social, cultural e educativo.

É urgente alterar a percepção negativa que existe dos séniores; para tal é importante fazer uma reflexão sobre este conceito fazendo referência a algumas definições.

Existe um conjunto de definições e de perspectivas que pressupõem uma reflexão e medidas a tomar em prol dos séniores. O estatuto sénior é uma das fases do desenvolvimento do cidadão no seu ciclo vital e tem consequências na qualidade de vida dos séniores.

Após o levantamento dos diferentes estilos de vida, os sinais característicos das mudanças nesta fase etária são nítidas: mudanças físicas, mudanças psicossociais, mudanças quanto à memória, mudanças funcionais, mudanças socioeconómicas.

Desta forma as mudanças que ocorrem durante o desenvolvimento do processo de envelhecimento são sentidas por cada um de uma forma diferente, o que pressupõe que para “manter uma longevidade saudável exige uma aprendizagem e atenção contínua” (Monteiro & Neto, 2008, p. 21).

83 Partindo deste pressuposto, pode equacionar-se que se se assegurar aos séniores condições para se manterem autónomos e activos, num período de vida o mais prolongada possível, dando-se mais relevo às estruturas socioeducativas como as US e outras Associações desta natureza, promove-se assim o bem-estar e um envelhecimento activo do sénior.

Entre as diversas denominações que podem caracterizar o séc. XXI, chamar-lhe o “Século dos Séniores” será uma das mais pertinentes, como o séc. XX foi o “século da criança,” embora no final do séc. XX já fosse mais o século dos séniores do que das crianças.

A União Europeia declarou o ano de 1993 “Ano Europeu das Pessoas de Idade avançada e de Solidariedade entre Gerações”, e o ano de 1996 “ Ano Europeu da Educação e da Formação Permanente”, abrangendo também a última etapa da vida, a dos séniores. Por sua vez, as Nações Unidas, depois de várias assembleias gerais, onde foi tratado o problema do envelhecimento da população, declaram o ano de 1999 ao findar o séc. XX, como ano dos séniores, sobre o lema “Construir uma sociedade para todas as idades”, com o objectivo de promover os princípios da ONU para as pessoas séniores: independência, participação, cuidados, auto-realização, dignidade.

Também o Papa João Paulo II dirigiu uma carta aos anciãos “guardiães de uma memória colectiva”, pedindo que se promova urgentemente uma “cultura da ancianidade”, que poderíamos também denominar por “cultura do envelhecimento”.

A era da longevidade instalou-se o que coloca graves problemas e desafios à sociedade e em particular à educação. Deste modo a União Europeia declarou 2012 “Ano Europeu do Envelhecimento Activo e da Solidariedade Intergeracional”.

As Instituições devem implementar, em função dos séniores, o princípio da dignidade, devendo estes gozar de todos os Direitos, o princípio da autonomia em todos os sentidos e circunstâncias, o princípio do desenvolvimento pessoal, concebendo condições para o seu pleno desenvolvimento, o princípio do acesso aos cuidados de saúde, o princípio da participação em todas as actividades. Entre os diversos direitos e deveres dos séniores para a promoção de todos os princípios destaca-se também a educação, devendo as Instituições proporcionar a todos os séniores uma educação ao longo de todo o ciclo de vida que abranja a idade sénior.

84 O rápido envelhecimento da população arrasta consigo consequências de toda a ordem. No domínio da psicogerontologia, nos últimos anos a literatura sobre o envelhecimento tem crescido, podendo considerar-se o início do séc. XXI como o desabrochar da investigação gerontológica. Desta forma, “o envelhecimento é uma das mais complexas séries de fenómenos, que a ciência tem de enfrentar” (Birren, 1999, p. 470). Além da sua decisiva importância para a qualidade de vida e organização da sociedade.

Entre todas estas preocupações da sociedade pelo sénior, a dimensão psicopedagógica não deve ser esquecida. Assim, a abordagem do processo de envelhecimento e do sénior tem merecido relevo, incluindo a aprendizagem ao longo da vida.

Queremos também dar o nosso contributo para que a problemática dos séniores seja mais conhecida e, assim, se implementem medidas em prol dos séniores para que “o sénior possa ser mais reconhecido, estimado e ter cada vez mais um papel determinante na sociedade actual que bem precisa da sua sabedoria de experiência feita” (Oliveira, 2008, p. 8).

Na educação ao longo da vida dos séniores fala-se de gerontologia educativa e/ou educação gerontológica. A primeira refere-se à aprendizagem dos séniores e a segunda ao esforço da sociedade para os educar.

Recentemente é com as US que os séniores passaram a ser considerados como educandos, uma vez que se foi estudando a evolução ao longo de todo o ciclo de vida, abrangendo a educação desde a infância à velhice. O sénior é um ser educando e também educador.

A gerontologia educativa entende-se como “o estudo e a prática do empenhamento educativo por e sobre as pessoas séniores” (Requeijo, 2005, p. 79).

A valorização da experiência do sénior e o desenvolvimento de competências, leva-os a adquirir mais poder ou capacidade para conduzir o seu futuro e o da comunidade. É neste contexto que se fala de “empowerment” que consiste, “em outorgar aos idosos um maior controlo sobre as suas próprias vidas, assim como um papel mais importante na tomada de decisões que têm lugar nas comunidades e organizações a que pertencem” (Cusack, 1998, p. 49).

85 A UNESCO, na sua 4ª Conferência Internacional sobre a educação dos adultos, considerou os séniores como um grupo com necessidades educativas particulares, uma vez que a gerontologia tem problemáticas próprias.

É necessário dar oportunidade para que os séniores possam exercer a sua aprendizagem, pelo que as US são um espaço para praticar essa aprendizagem com diferentes áreas possíveis para séniores; (…) “os domínios propostos são áreas de actividades formativo-culturais; área de dinâmica ocupacional; área de desenvolvimento físico-psíquico; área de actividades sociais e participação de cidadania; área de extensão cultural; área de estudo e investigação” (Requejo, 2005, pp. 326-327).

Numa educação interactiva ou participativa muito se pode esperar também da escola onde os séniores podiam ser mais chamados, numa colaboração intergeracional enriquecedora para ambas as partes, levando os séniores a aprender a envelhecer e os mais novos a aprender a conhecer e a apreciar os séniores; Este é um dos objectivos fundamentais da educação ao longo da vida, levando à solidariedade entre gerações e a um envelhecimento activo em prol de uma sociedade sustentável.