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Relação médico-paciente: perspectiva da integralidade centrada no sujeito-cidadão e na construção da doença/itinerário/cura.

5. A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE UMA BREVE INTRODUÇÃO AO OBJETO.

5.6 Relação médico-paciente: perspectiva da integralidade centrada no sujeito-cidadão e na construção da doença/itinerário/cura.

A visão de integralidade centrada na construção da doença aparece no cenário nacional como proposta de trabalhar com a noção de indivíduo/sujeito/cidadão, reconhecimento das nuances para a construção social do processo saúde-doença. Neste sentido, apresenta-se uma proposta não hegemônica do exercício da medicina centrada nos valores do outro em detrimento de uma medicina objetivista, hegemônica com marcado caráter individualista e prática segmentada do cuidado da saúde.

Para Ricardo Ayres (2001:63), a “concepção de sujeito predominante no pensamento sanitário não está em sintonia com os principais valores e pressupostos que o orientam hegemonicamente na atualidade”. De fato, o autor comenta que o sujeito aparece no discurso em duas vertentes; como sujeito demandante - objeto de nossa prática, possuidor de valores e necessidades próprias a serem atendidas e, como sujeito capaz de definir o seu próprio destino no cuidado de sua saúde, “responsável pelo seu próprio devir”. Esta vertente, à diferença da outra, que vê o sujeito como identidade, destinatários de nossas práticas, enfoca a ação transformadora do sujeito-agente.

Porém, para Ayres (2001), ambas as vertentes necessitam de um debate mais preciso, enquanto os seus significados:

Dois núcleos de significados implícitos nessa concepção de sujeito parecem-nos problemáticos, nesse sentido. O primeiro é a idéia de permanência, de mesmidade, que reside no âmago desse sujeito- identidade, esse que é igual a si mesmo através dos tempos, a que “faz a si mesmo a partir de uma natureza dada” moldada por um “devir voluntário”,

uma “conquista pessoal”. O segundo é a idéia de produção em que se apóia o sujeito-agente de sua história. O ser histórico é o ser produtor, aquele que introduz ou melhora coisas ou idéias para o progresso da vida humana (Ayres, 2001:65).

Afirma Ayres (2001) que mais importante que discutir o sujeito, seria analisar o seu papel e a intersubjetividade que dele se desprende. O sujeito, segundo o autor, se constrói no espaço da alteridade, da presença do outro. A identidade do Ser está no Outro, como nos ensina Heidegger. Nesse processo relacional, a construção de identidades se dá no reconhecimento de não estarmos sozinhos, a identidade não está no eu, porém na “identidade-si”.

Entretanto, a construção de identidade no discurso sanitário está centrada na individualidade dos sujeitos enquanto seres capazes de emitir identidade, construir coisas. Para Ayres (2001), tratamos o sujeito com mesmidade e, nesse sentido, o vemos como objeto de nossa prática. Devido a este equívoco, enfatiza o autor:

Com isso o transformamos em mais um objeto no mundo. Ao perder de vista, em nossos conceitos e práticas, a ipsieidade dos sujeitos, torna-nos menos capazes de chegar ao âmago dos processos mais vivos de sua constituição como tal. Assim, escapam-nos, paradoxalmente, as mais ricas possibilidades de participar da construção de identidades e de fortalecer o poder transformador de indivíduos de grupos no que se refere à saúde (Ayres, 2001:66).

Ayres (2001) ainda diz que é no reconhecimento do outro que se dá a intersubjetividade. O espaço relacional onde se colocam ambos, no mundo compartilhado e que abarca, além do plano técnico, as dimensões éticas e estéticas expressas nas emoções e na satisfação de necessidades no plano espiritual.

Radica exatamente nesse espaço relacional, a construção de um diálogo entre/em si e não para si. Ayres (2001) procura na construção do sujeito como diálogo, orientar-se pelos filósofos da linha hermenêutica. A nosso ver, antes da idéia da linguagem como morada do ser de Heidegger, parte-se de Schleiermacher

(apud Ruedell, 2000) quando diz que nada existe fora da linguagem. Nesse sentido, o diálogo está na relação e não para a relação.

Para o autor, estabelecer um diálogo com os indivíduos aos quais queremos alcançar com nossa prática gera a idéia de um diálogo instrumental e não constituinte (grifo meu). Dá a idéia de um vazio, segundo Ayres (2001), entre o profissional e o sujeito alvo.

Precisa-se repensar na relação sujeito-profissional, em nosso caso profissional- médico e sujeito-população, constituída/moldada no diálogo e, não usuária deste para alcançar o seu objetivo, pois desta forma estaria condenada ao fracasso.

É neste diálogo que se dão os encontros do saberes técnico – senso comum. O reconhecimento do outro, dá-se na aceitação dos valores/significados/práticas que os sujeitos-população têm sobre o adoecer e a cura. Radica nesse diálogo precisamente o reconhecimento da medicina enquanto ciência e arte, tema já discutido neste trabalho. O encontro do eixo técnico (objetivo possuidor de um discurso normativo sobre a doença – o como fazer) com o eixo das emoções (reconhecimento das subjetividades – o que fazer).

Neste sentido, precisa-se ver a relação médico-paciente como espaço contido no diálogo de sujeitos em sintonia com uma linguagem compreensiva que respeite os saberes que emergem, não somente da experiência técnica positivista, mas dos “múltiplos tipos de sabedoria na construção de verdades úteis para a construção da saúde” (Ayres, 2001:70).

Em resumo, aponta Ayres (2001), que não se trata de abolir a questão técnica, senão dar sentido à felicidade almejada na intervenção: “reconhecer os interesses de natureza estética, emocional, moral dentre outros” no cuidado da saúde.

O reconhecimento das redes de sentido relacionadas ao processo saúde-doença vem sendo tema de debate de antropólogos americanos, como Good e Kleinman da escola de Harvard. Para eles, a saúde e a doença são culturalmente elaboradas, interpretadas e vivenciadas, requerendo, assim, investigações antropológicas para compreender os seus significados e seu impacto no cuidado clínico. No cenário brasileiro, Czeresnia e Freitas (2003) apontam como a saúde e a doença correspondem a experiências singulares e subjetivas. O não reconhecimento a esta desigualdade de práticas e conhecimentos entre as pessoas torna a relação inter- pessoal monótona/mecanizada, perdendo a riqueza da sua singularidade e estabelecendo-se a margem do espaço social/significante onde se dão o vínculo e as práticas.

Ancorando-se em Boaventura Santos, há necessidade de uma sintonia que chame à reflexão para a interação dos saberes do senso comum com o científico, a fim de que se construam os caminhos para o enfrentamento e solução destas dificuldades (Santos, 1987, 1988, 1989). Como toda relação onde se debate o saber científico com o senso comum de forma recíproca, ou ao menos assim deveria ser, precisa-se de uma harmonia entre os partícipes com a finalidade de que haja um entendimento comum. Em uma analogia à construção do conhecimento científico, o autor afirma que esta só poderá acontecer se o pesquisador sai da linguagem do senso comum em busca de uma linguagem técnica, própria de um saber rigoroso para encontrar a verdade. Porém, o começo parte da tradução do discurso subjetivo pelos caminhos semiológicos da medicina. No entanto, seja esse momento de procura pela linguagem técnica imprescindível, como nos lembra o autor, não há espaço para o conhecimento técnico dentro do senso comum. Entretanto, em um segundo momento, fechar-se-á o círculo hermenêutico na construção e

desconstrução do conhecimento. Sendo assim, faz-se necessária uma ruptura na retomada do senso comum. Aqui é onde se estabelece uma ponte na procura de alcançar, através de uma linguagem clara, o sujeito e mostrar os resultados à comunidade (Santos, 1987, 1988, 1989).

Quiçá seja com o advento da Aids que um singular processo de construção de códigos e interpretações presente durante a epidemia, se dá a partir dessa nova realidade. Entretanto, o que não era esperado, era o paralelo entre esta construção simultânea do sentido do senso comum com a codificação médica da doença (Herzlich e Pierret, 1993).

A doença, o adoecer e o doente são partes de construções sociais carregadas de significados a partir das quais o doente é um personagem social e estão imersas na cultura local (Helman 1994; Good, 1994, Kleinman, 1988; Minayo, 2004). Cabe ao profissional dialogar/penetrar o tecido simbólico que o leva a entender a doença como metáfora - segundo o saber popular - no espaço da relação e, assim, compreender as nuances que a partir do imaginário social, perpetuam na coletividade a idéia da doença, sua cura e cuidado (Sontang, 1984).

Entretanto, ao mesmo tempo em que foi construída uma metáfora para o HIV/Aids emergiram arquétipos de indivíduos vivendo com HIV/Aids na sociedade. Para Lupton (2006), na população australiana nos anos 90, novas significações sobre a síndrome apareceram na imprensa a partir de uma representação sócio- cultural sobre a Síndrome. Neste sentido, criara-se uma leitura sobre quem seriam estes portadores e emergiram de forma geral uma categorização estruturada sobre estes indivíduos, onde o HIV/Aids representava uma forma de adjetivar-los: Homem- HIV, Mulher- Aids, HIV-vítima, HIV- sobrevivente, HIV- repassador. Assim, junto a estas características individuais se desenvolveram sentimentos de simpatia,

admiração, medo ou abandono. Em tempo, o trabalho de Lupton (2006) nos permite reflexionar sobre quais os arquétipos presentes em nossa sociedade e qual a categorização e sentimentos que os indivíduos e, principalmente os profissionais de saúde apresentam. Trabalhos similares sobre a construção social de pacientes como vitimas ou repassadores e papel da policia nos Estados Unidos foram referidos por Donavan (1993) em um estudo com a mídia americana no período de 1981 a 1990.

Para Schaurich, Coelho e Motta (2006), a infecção pelo HIV, mesmo em diferentes momentos históricos e em diferentes sociedades, apresentou caracterizações culturais semelhantes na coletividade como o preconceito, a discriminação e o estigma relacionados ao indivíduo acometido pela epidemia. O vírus projeta-se sobre o indivíduo e o despersonifica. O sujeito muda a sua condição de ser um portador de uma doença para ser a própria doença – o aidético. Neste sentido cabe-lhe além ser portador do vírus carregar todo o estigma que se crio na sociedade me torno a Síndrome.

Neste sentido, Pinheiro (2005) para a necessidade de um cuidado ético observado não somente a doença senão considerando também as questões particulares como o estigma que se crio em torno da Aids.

Contudo, aparece uma construção simbólica nesse espaço sobre a doença do outro e, quem é o outro: a Aids construída no discurso do paciente e a Aids representada no paciente que pode gerar um sentimento de admiração – aquele que sobrevive a doença, que “deu a volta por cima” ou de medo e isolamento para aqueles pacientes que referem que praticam relação sexual sem camisinha para contaminar outras pessoas. Concorda-se assim, com Oliveira (2002), quando afirma que se ignora que as peculiaridades desse encontro se dão, inclusive, além do

encontro físico entre o médico e o paciente no consultório. Nelas, estão contidas as experiências/concepções dos indivíduos sobre a doença e o estar doente. (Helman, 1994; Kleinman 1980).

Contudo, para Oliveira (2002), há um descompasso entre a expectativa de atendimento nos serviços de saúde e a realidade. Cada dia é mais freqüente que os jornais noticiem sobre erros médicos e insatisfação dos usuários tanto no atendimento na rede pública de saúde, como também na rede privado-conveniada, porém em menos escala. A situação parece paradoxal, apesar do desenvolvimento tecnológico da medicina ainda persistem as queixas por mau atendimento. Isto gera uma situação de mal-estar geral, inconformidade, uma espécie de caos, uma crise do setor que precisa, segundo Oliveira (2002), ser pensada de dentro.

A saída seria reconhecer que falhamos ao abordar o paciente. A medicina biomédica hegemônica o desconsidera enquanto sujeito pleno. No seu lugar, centra- se a doença e, ainda assim, esta visão do paciente como doença se dá a partir do olhar/interpretação reduzido do médico. O que reforça a assimetria/ hegemonia/polarização da relação.

A doença é uma experiência que não se limita à alteração biológica pura, mas esta lhe serve como substrato para uma construção cultural em um processo que lhe é concomitante. Não queremos dizer com isso, que exista uma seqüência de “primeiro biologia e depois cultura”, mas sim que existem percepções culturais acerca de um fenômeno que abarca o biológico, mas que também o supera (Oliveira, 2002:64).

Utilizando-se dos argumentos dos antropólogos da saúde, como lembra Minayo (1998); Peirano (1991); Alves & Minayo, (1994); Canesqui (1994, 2003), estes têm trazido importantes aportes a pluralidade e criatividade da antropologia brasileira,

Oliveira (2002) ratifica o conhecido bordão na área médica de que “não existem doenças senão doentes”. A sensação de estar doente faz com que a doença no corpo, tenha matizes diferentes. A questão estaria no lidar com essa experiência, como lembram Herzlich e Pierrret (2005), porém a ciência médica não fornece as bases para o entendimento dos significados/concepções/sofrimento da doença dos indivíduos. Estes construtos envolvem invariavelmente vários aspectos da vida pessoal dos indivíduos que os médicos muitas vezes ignoram (Duarte, 1986, Helman, 1994).

Para Oliveira (2002), a procura pela integralidade no cuidado está centrada no reconhecimento da illness (perturbação) no momento de diálogo. O médico deve estar aberto para entender como os indivíduos, enquanto membros de uma sociedade local percebem os sintomas, os categorizam e lhe conferem atributos, experienciando-os e articulando esse sentimento por meio de formas próprias de comportamento, levados assim a recorrer os caminhos/itinerários específicos em busca da atenção/assistência/cuidado para a cura.

Almeida filho (2001) introduz as concepções de disease-patologia, disorder- transtorno, illness-enfermidade, sickness-doença e malady-moléstia e considera que estes devem superar o modelo de Kleinmam (1978) e Good & Good (1982), a partir dos trabalhos de Young (1990).

Embora o autor concorde com os enunciados de Artur Kleinmam (1978) e Mary- Jo e Bayron Good (1982) sobre o ponto central na reformulação do conhecimento médico consiste na distinção entre disease e illness, porém estabelece sua crítica argumentando-se nos trabalhos de Allan Young (1990) para evidenciar que as dimensões disease e illness são insuficientes para entender estes modelos. Assim, concorda com Young em introduzir o significado de sickness, formando um modelo

em forma de três círculos que se complementam (Modelo DIS). A introdução da sickness se dá, segundo Almeida Filho (2001, apud Young 1980, 1982), como uma forma de socializar a doença. Essa construção social da doença acontece dentro e através de um sistema médico “linkado aos circuitos da fronteira ideológica da sociedade”. Para o autor, a dimensão ideológica trazida por Young vem ao encontro da hegemonia do discurso médico que procura a neutralização da illness. Como resultado dessa posição hegemônica sobre o sofrimento, ocorre um processo de medicalização da medicina que reduz o indivíduo a sua condição biológica e falha ao desconsiderar suas dimensões sociais, políticas e históricas.

Para Coelho e Almeida Filho (2002), a principal crítica aos modelos interpretativos da antropologia médica deve-se aos modelos somente considerarem uma prática curativa da saúde.

Concentrando-se na produção de modelos explicativos baseados na noção de doença, a antropologia médica interpretativa de fato permaneceu limitada às práticas curativas e à perspectiva da saúde como ausência de enfermidade. Kleinman considerou que a prevenção integra o sistema de cuidado à saúde, mas a ela pouco se refere. A noção de promoção da saúde sequer é por ele mencionada. Kleinman visualizou o retorno do enfermo ao seu funcionamento normal, a partir da negociação dos diferentes modelos explanatórios, sem explicar ou problematizar o que seria essa normalidade (Coelho e Almeida Filho, 2002: 322).

Neste sentido, Coelho e Almeida Filho (2002) propõem a superação dos modelos a partir dos trabalhos de Bibeau e Corin, antropólogos canadenses, que procuram através da Teoria dos Sistemas de Signos, Significados e Práticas introduzir uma semiologia popular da illness (enfermidade), considerando a experiência do adoecimento como uma construção simbólica, coletiva e compartilhada da subjetividade. Segundo o autor, um dos pontos de superação apresentados pelos autores Bibeau e Corin é que nestes modelos radica o entendimento da necessidade de considerar o contexto sócio-econômico, político e histórico dos processos de saúde e doença (Coelho e Almeida Filho, 2002).

Ainda Almeida Filho (2001) ao se referir aos trabalhos de Bibeau e Corin, identifica uma nova formatação do complexo DIS. A proposta, destes autores, embasa-se no entendimento de o ficar enfermo como “um processo baseado desde uma perspectiva global, advindo das trajetórias individuais, códigos culturais e o contexto macro-social e seus determinantes históricos” (Almeida Filho, 2001:761).

Assim, nesses momentos de diálogo é onde se estabelecem as duas vias/fluxos a partir do encontro de duas visões de mundo diferentes, agora, a partir dessa visão, sustentado por um contexto histórico determinado. É nesse espaço onde se dá o processo saúde - doença e onde se espera que o médico tenha a capacidade para traduzir esse discurso do paciente, decodificá-lo e recodificá-lo como em um ciclo dialético, até chegar ao diagnóstico da doença.

Porém, para Oliveira (2002), quando uma pessoa procura um determinado serviço de saúde, ela lança mão de uma série de mecanismos que orientam tal procura e que são acionados muito antes do encontro propriamente dito: quais os sintomas que a levam ao encontro, qual o momento adequado de fazê-lo, qual o profissional buscado, qual o linguajar a ser utilizado para descrever ao médico o que se sente, que roupa vestir na consulta, e assim por diante. Em última análise, como é que o indivíduo se prepara para esse momento, como se comporta nele e qual a “bagagem” que carrega consigo? Portanto, quando mencionamos “comunicação/discurso”, também queremos dizer que há produção de significados de ambos os lados e que a cultura de cada grupo social estará igualmente sempre presente (Oliveira, 2002:65).

É neste sentido que se apóia o conceito de integralidade no diálogo com o paciente e na interpretação do seu discurso, seja a representação de illness – sickness, seja na forma como se nos apresenta. Deve-se superar a dicotomia

doença-cultura, como também doença-illness e inserir nesses momentos de escuta, na visão de Caprara (2003); Caprara e Franco (1999), as dimensões sociais, culturais, ideológicas e históricas do processo saúde - doença, reconhecendo a experiência de vida desses pacientes e os sentidos do ficar enfermo. A respeito desses espaços/momentos de escuta, Caprara (2003) adverte:

O médico tem de entender o paciente de um ponto de vista científico, utilizando os instrumentos e os conhecimentos da literatura de maneira que ele possa tomar as melhores decisões no processo diagnóstico e terapêutico. Estas ações, tomadas valendo-se da medicina baseada nas evidências, são necessárias, mas não suficientes. O médico tem de adequar sua intervenção clínica considerando o paciente enquanto sujeito, tomando em conta a experiência da doença, as percepções do paciente, adquirindo uma sensibilidade e uma capacidade de escuta que vão além da dimensão biológica (Caprara, 2003:929).

Os profissionais médios devem ser treinados para estar atentos para estas sutilezas do discurso do paciente. A necessidade de inserção das disciplinas do campo sócio-antropológico na área da saúde vem sendo argumentada por autores como Feuerwerker (1998, 2002); Almeida e Feuerwerker (2000); Campos (1997) e Caprara (2003), Caprara e Rodrigues (2004), Mc Leod (1998), todos preocupados por uma aproximação dos futuros profissionais com a comunidade, problemas de saúde locais e construções simbólicas do doença. Os pacientes que nos chegam estão envolvidos por sua cultura como se esta fosse um manto e permanecem conectados a ela. Isso ocorre de modo semelhante à forma como estamos ligados ao conhecimento médico, pois no final das contas, nosso modelo biomédico também constitui um sistema cultural bem interessante de ser observado, mas que infelizmente é pouco questionado durante a formação dos nossos técnicos (Oliveira, 2002).

Como resposta a esta problemática os autores, acima citados, concordam com a necessidade de mudanças na formação universitária de médicos e outros profissionais de saúde. A incorporação de disciplinas das ciências sociais,

antropologia da saúde, psicologia e outras áreas das humanidades médicas na formação curricular procura um desenvolvimento de atividades comunicacionais por parte dos futuros profissionais.

Segundo Caprara e Rodrigues (2004), as disciplinas, por eles definidas de humanidades médicas constituem um espaço para repensar a prática de uma medicina humanizada, abordagem ética da medicina com temas como a informação ao paciente/familiares em caso de uma doença grave/terminal ou do fim da vida. Estas disciplinas têm muito a contribuir para o aperfeiçoamento da comunicação médico-paciente, a prática de uma assistência digna e plena das necessidades/demandas dos pacientes, o reconhecimento à alteridade e outras finalidades da medicina, que em definitiva procuram o acolhimento humanizado e elevar o grau de satisfação dos paciente/usuários na relação com os profissionais e serviços de saúde.

É necessário salientar que se deve reconhecer outras alternativas/ caminhos/itinerários para a procura da cura por parte dos paciente. Como lembra Oliveira (2002), não se trata de exercer um domínio hegemônico sobre a saúde e a doença a fim de desconsiderar outras formas de tratamento. Pelo contrário, trata-se

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