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RELAÇÕES ENTRE OS MOVIMENTOS COMUNITÁRIOS E A IGREJA CATÓLICA NOS ANOS DE

1 A REALIDADE HISTÓRICA DO BRASIL SOBRE A URBANIZAÇÃO, HABITAÇÃO E OS MOVIMENTOS SOCIAIS

1.2 RELAÇÕES ENTRE OS MOVIMENTOS COMUNITÁRIOS E A IGREJA CATÓLICA NOS ANOS DE

A Igreja Católica e sua aproximação com a realidade social na Idade Contemporânea, em termos históricos, está ligada de forma determinante no final de século XIX com o início da sua “Doutrina Social” em que questiona as duas principais ideologias dentro do processo

de construção do capitalismo industrial. Na Europa, com a consolidação das ideias liberais e o sistema capitalista, a hierarquia da Igreja Católica procura ser uma força intermediária entre o capitalismo liberal e o socialismo marxista na divisão social. A Igreja católica torna-se um elo para a sociedade entre o capital e o trabalho. A doutrina social procurou ser uma orientação para os católicos, dentro da ótica de sua hierarquia, embora a presença junto às elites no mundo e, de modo especial, no continente americano, fosse a de uma visão assistencialista, que identificava os pobres e necessitados como objeto de caridade, não como transformação social.

No século XX, com a chamada “Democracia Cristã”, como uma terceira via política entre o socialismo e o capitalismo, procurou avançar em termos de justiça social e humanizar o capitalismo. Na Europa, ocorre nos governos de De Gaspari, na Itália, e Adenauer, na Alemanha; na América Latina, no Chile, no Governo de Eduardo Frei. Essa terceira via, com características semelhantes, também ocorreu nos países nórdicos da Europa, com o avento da social-democracia, ou governo de bem-estar social, como na Suécia, governada por Olof Palme, entre 1969 a 1976 e 1982 a 1986.

Com o Concílio Vaticano II, abre-se uma possibilidade concreta da Igreja Católica de uma maior abertura em relação à realidade do mundo e, consequentemente, uma aproximação social com Concílio Ecumênico Vaticano II entre 1962 a 1965. Período no qual a Igreja Católica começa uma fase de abertura ao mundo. Com isso, procurava, através da sua Doutrina Social, contribuir e influenciar as diferentes transformações que a humanidade atravessava, lutando pela dignidade humana e por uma mudança em favor dos pobres.

A leitura do Concílio Vaticano II, em termos universais, é adaptado à realidade de injustiça social na América Latina, onde maioria dos pobres tem, no cristianismo católico, sua principal referência em termos religiosos. Nas Conferências de Medellin, na Colômbia, em 196, é cunhada dentro da igreja Católica a expressão que se tornou a marca da igreja latino-americana a chamada “opção preferência pelos pobres” e na Conferência de Puebla no México, em 1979, é reafirmada essa posição da Igreja Católica e, por influência da chamada “Teologia da Libertação”, são formadas as chamadas “Comunidades Eclesiais de Base” (CEBs), base formativa dos movimentos sociais a partir da década de 1970, especialmente no Brasil. Isso abriu espaço para a ação dos católicos progressistas como uma força junto às camadas populares na luta por direitos sociais e humanos. Apesar de ter uma dimensão política cristã, identificada com um projeto de esquerda na sociedade, rejeitou desde o início o caráter filosófico ateísta. Embora usasse o instrumental marxista, para entender a sociedade

capitalista, apontava que a maior contradição da sociedade não era entre crentes e não crentes, mas entre opressores e oprimidos.

Ao mesmo tempo, em que capital e trabalho, com seus antagonismos entre os meios de produção, nas mãos da burguesia, e a força de trabalho, nas mãos dos trabalhadores, estão colocados na sociedade, setores da Igreja Católica na América Latina se aproximam cada vez mais dos trabalhadores. No Brasil, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), entidade que congrega não só a presença dos bispos católicos e sua influência capilar dentro da Igreja Católica no Brasil, mas também sua participação mais constante junto aos menos favorecidos em suas lutas e necessidades, através de suas pastorais sociais, especialmente a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a Pastoral Operária (PO). Enquanto que a CPT faz um trabalho junto ao meio rural e nos demais junto ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a PO faz um inserção junto ao movimento operário, especialmente no chamado ABC paulista, região do chamado berço do sindicalismo combativo brasileiro. Vale lembrar que as pastorais sociais no Brasil têm, em parte, sua origem na chamada “Ação Católica”, que teve, entre seus segmentos jovens nos anos de 1960, uma atuação em várias lutas junto aos movimentos sociais, como a Juventude Estudantil Católica (JEC), no meio secundarista, e a Juventude Universitária Católica (JUC), no meio universitário; além da Juventude Operária Católica(JOC), junto aos operários urbanos. Seus membros tinham uma atuação destacada, especialmente na União Nacional dos Estudantes (UNE). Suas lideranças estavam engajadas nas lutas sociais, junto com as demais forças progressistas que lutavam pelas reformas de base, no governo de João Goulart, como a universitária, a urbana e a agrária, além de atuarem junto aos pobres, buscando suprir suas necessidades e reivindicações. Esta nova postura da Igreja, como experiência local de transformação social, econômica, política e cultural, em sintonia com as transformações estruturais da sociedade como um todo, procura construir uma alternativa concreta de mudanças.

Nos movimentos de bairros, nesse período histórico, no início da década de 1960, sob a força de uma política de cunho populista desenvolvida pelos governos federais, surgiram as Sociedades de Amigos de Bairros (SABs), que procuravam manter a tutela dos movimentos sociais, através de porta-vozes e lideranças da política oficial, conforme relata Maria da Glória Gohn:

O velho movimento de bairros está intimamente ligado às associações de moradores da fase populista. Eram organizações locais, as Sociedades de Amigos de Bairros – SABs – dirigidas por lideranças vinculadas a determinados políticos, que tinham um

papel importante nos pleitos, eleições, como intermediários, nas barganhas de votos versus melhorias (GOHN, 1991, p. 53).

Com a Teologia da libertação com aporte teórico e as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), sua força prática junto aos pobres em pequenos grupos reflexivos na cidade e no campo, uma força importante para a formação dos movimentos sociais como movimento comunitário nas periferias das grandes cidades. Nesse sentido, a construção do movimento comunitário do bairro Mathias Velho em Canoas está inserida nessa conjuntura efervescente dos anos de 1970 e 1980 no Brasil e, particularmente, no Rio Grande do Sul.

Para essa vertente progressista da Igreja Católica, os pobres não são mais objetos de caridade, e sim protagonistas de uma nova sociedade sem opressão, na qual a hierarquia da Igreja é uma aliada nas suas organizações sociais e religiosas, e, não a condutora do processo. Sublinha-se que a Teologia da Libertação se torna a base teórica; as CEBs, uma organização de base formativa da Igreja e os pobres, os protagonistas.

Essa nova postura da Igreja Católica traz consigo uma aproximação com os movimentos sociais por democracia e justiça social. A conjuntura política marcada por Ditaduras Civis-Militares, dentro do contexto da “Guerra Fria”, marca uma nova trajetória da Igreja, especialmente, o Brasil. Destaca-se que o elemento agregador da força popular por mudanças está na profunda fé religiosa do povo, que encontra em setores da Igreja uma aliada em suas demandas. Nessa medida, muitos teólogos procuram teorizar uma alternativa dentro dos parâmetros cristãos, na qual a Igreja se tornasse mais evangélica e profética e, ao mesmo tempo, inspirasse os cristãos a lutarem, nas diferentes organizações populares, por uma sociedade fraterna e solidária.

A riqueza econômica de poucos, a pobreza e a miséria da maioria da população seriam uma ofensa ao Deus da vida e, ao mesmo tempo, uma injustiça que atinge principalmente os trabalhadores. Nessa visão teológica, marcada pela análise material da vida, o capitalismo seria um sistema excludente, que mantém uma situação de desigualdade social. Os cristãos, então, teriam a responsabilidade de conhecer e denunciar suas contradições. Nesse sentido, o referencial marxista é fundamental, como análise sociológica, para entender cientificamente as contradições do capitalismo. Desse modo, a democracia seria construída de forma coletiva em todas as esferas da sociedade, para que o ser humano não se torne objeto do lucro e do consumismo, mas um ser valorizado e reconhecido sem preconceitos e opressões. Assim estaria de acordo com uma nova concepção de democracia, que leva em conta as questões sociais, segundo afirma René Rémond:

[...] As novas orientações históricas estavam em harmonia com o ambiente intelectual e político. O advento da democracia política e social, o impulso do movimento operário, a difusão do socialismo dirigiram o olhar para as massas. A compaixão pelos deserdados, a solidariedade com os pequenos, a simpatia pelos “esquecidos da história” inspiravam um vivo desejo de reparar a injustiça da história para com eles e restituir-lhes o lugar a que tinham direito (RÉMOND, 2003, p. 19).

A visão progressista de aproximação dos católicos com políticas de esquerda também é ressaltada, através da seguinte reflexão:

O fenômeno recente que data de meados dos anos 60 é o afastamento de uma parte dos católicos praticantes das organizações de direita. Um em cada quatro aproximadamente vota hoje nas formações de esquerda. O fenômeno é difícil de interpretar e está, sem dúvida, ligada à evolução da sociedade e da Igreja (COUTROT, p. 353 apud RÉMOND, 2003).

A ação transformadora da Igreja Católica junto aos pobres tem sido uma crítica direta ao capitalismo3, por ter nas suas raízes políticas a produção da desigualdade social. As CEBs, dentro da Igreja, como também a base das organizações sindicais, como a CUT (Central Única dos Trabalhadores), da organização política, como o Partido dos Trabalhadores (PT) e o movimento comunitário, ligados às associações de moradores do bairro são uma resposta concreta da ação dos trabalhadores em suas diferentes entidades de luta por uma nova sociedade mais humana, democrática e justa.

A relação econômica imperialista, cujo centro de poder estava localizado em países do primeiro mundo, dos quais dependem regiões capitalistas periféricas, como a América Latina, articulava-se de tal forma a manter um abismo entre ricos e pobres. Estas questões podem ser percebidas dentro dos princípios de comunhão e participação propostos por essa conferência da seguinte forma:

O homem latino-americano encontra uma sociedade cada vez mais desequilibrada na sua convivência. Há “mecanismos que, por serem impregnados, não dum autêntico humanismo, mas de materialismo, produzem, em níveis internacionais, ricos cada vez mais ricos, à custa de pobres cada vez mais pobres” (João Paulo II, Discurso Inaugural, III,4). Tais mecanismos se manifestam numa sociedade muitas vezes programada à luz do egoísmo, nas manifestações da opinião pública, em expropriações invisíveis e em novas formas de domínio supranacional, pois crescem as distanciais entre nações ricas e pobres. Acrescenta-se, além disso, que, em muitos

3 a) propriedade privada dos meios de produção, para cuja ativação é necessária a presença do trabalho assalariado fortemente livre; b) sistema de mercado, baseado na iniciativa e na empresa privada, não necessariamente pessoal; c) processos de racionalização dos meios e métodos diretos e indiretos para a valorização do capital e a exploração das oportunidades de mercado para efeito de lucro (BOBBIO, 1995, p. 141).

casos, o poderio de empresas multinacionais se sobrepõe ao exercício da cidadania das nações e ao pleno domínio de seus recursos naturais. Devido a isso, vemos o ideal da integração latino-americano ameaçado. [...] Finalmente, não se torna estranho neste complexo problema social o aumento dos gastos com armamentos, como tampouco a criação artificial de necessidades supérfluas, impostas de fora aos países pobres. [...] Por isso a Igreja, perita em humanidade, deve ser a voz (da pessoa, da comunidade perante a sociedade, das nações fracas perante as poderosas) cabendo-lhe uma ação de docência, denúncia e serviço em prol da comunhão e participação [...]. Em povos de arraigada fé cristã impuseram-se estruturas geradoras de injustiça. Estas, que estão em conexão com o processo de expansão do capitalismo liberal (CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL, CNBB, 1983, p. 298-9).

Apesar desse engajamento social da Igreja Católica, do ponto de vista social, a maioria dos cristãos no continente orienta-se para a conservação das estruturas sociais e econômicas. A democratização da educação e a construção da cidadania se tornam, a partir da perspectiva político-religiosa, indicada pela nova Igreja, uma tarefa necessária e urgente para libertar os latino-americanos da servidão econômica, política, social e cultural. As entidades consumistas, egoístas e excludentes, através dos grupos conservadores da sociedade e da própria Igreja, passaram a questionar os cristãos das CEBs, mas no início dos anos 1980, parecia possível a transformação social, política e religiosa pretendida pelas CEBs – como bem apontavam as lutas no bairro Mathias Velho, na região metropolitana de Porto Alegre.

As CEBs geraram inúmeros líderes e dirigentes de movimentos populares, sindicais e políticos, que tiveram nelas o início da sua atuação a serviço da conquista de uma nova sociedade brasileira, tanto na fase da ditadura civil-militar quanto no processo de redemocratização. Entre os objetivos da CEBs, está a luta dos cristãos para adquirir mais espaços na Igreja, em termos de participação e valorização, pois se propõem a construir uma igreja nas bases, a partir do povo. A formulação desse objetivo implica necessariamente a ampliação de participação, ampliando, assim, as bases desta mesma Igreja. Dessa forma, as Comunidades Eclesiais de Base externamente dão apoio para todos aqueles que lutam nos espaços sociais, sindicais e políticos de mudança na sociedade.

De forma sistematizada, as CEBs passam a usar como lema: “uma nova forma de ser Igreja”, a fim de indicar que o novo, trazido por elas, era oferecer, dentro da Igreja, um espaço para o próprio povo simples participar da sociedade, através da luta pela justiça. Nesse sentido, há a mediação entre igreja e sociedade, fé e política, celebração e ação, Bíblia e História.

As comunidades urbanas, principalmente na periferia dos grandes centros, ampliam- se, geralmente, com a ajuda do clero progressista e começam a assumir tarefas sociais: lutas por habitação, eletricidade e água, dentro das favelas, ou luta por terra, no campo. A irrigação

desses movimentos sociais traz consigo uma ação comunitária, na luta por uma vida digna junto aos trabalhadores. As CEBs se relacionam com a população, em um ambiente de construção de uma história, cultura e valores, com suas organizações locais, em um mundo que se torna cada vez mais abrangente com suas reivindicações sociais. Na categoria da práxis dos movimentos sociais é delineada por Maria da Glória Gohn:

Em relação aos movimentos sociais urbanos, a categoria da práxis adquire importância pelo caráter criador e potencialmente transformador. A busca de soluções e alternativas para as condições de vida cotidiana leva ao encontro de caminhos que apontam para superação destas condições. O pensar articula-se ao fazer e este processo não se realiza espontaneamente, mas é permeado por uma intencionalidade política, presente nos projetos que os movimentos delineiam na história. A forma de organização do movimento é a expressão visível de sua práxis. O importante não é o fato de uma organização ser formal ou informal, mas saber como ela se estabelece para o movimento (GOHN, 1991, pg. 40).

A participação popular, porém, era sempre a meta principal de um projeto de uma sociedade humanista. Essa referência torna-se possível com a participação das (CEBs), organizadas pelos próprios moradores e auxiliadas no aspecto formativo por lideranças religiosas, que se tornam aliadas nesta luta, como retaguarda deste processo histórico, sob a ótica da Teologia da Libertação e com o auxílio do instrumental marxista, para entender os mecanismos excludentes da sociedade capitalista.

Assim, a presente pesquisa procura identificar a relação entre a fé religiosa, dentro de uma perspectiva cultural, e a realidade sociopolítica de um determinado espaço comunitário, o bairro Mathias Velho, em Canoas, onde a Igreja Católica é também um espaço de reflexão e formação para as lutas econômicas, sociais e políticas, isto é, um entendimento de que a Igreja, constituída a partir de comunidades eclesiais – Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) pode se engajar nas lutas dos setores sociais que constituem “a base da sociedade”.

Essa ação concreta com o aporte teórico metodológico das CEBs, no Rio Grande do Sul, torna-se referencial para os movimentos sociais. Em relação a esta experiência organizada, de forma coletiva, fugindo do empirismo, ou de qualquer experiência puramente individual, enquadra-se em uma análise histórica importante. Deve-se considerar também que os diferentes sujeitos históricos, com suas visões diferenciadas, estão em disputa na organização do movimento comunitário no bairro. Nesse sentido, a análise da historiadora Emília Viotti da Costa torna-se relevante:

[...] um novo tipo de história que enfocasse os trabalhadores e estudasse “não apenas parâmetros estruturais e estatísticos, organizações nacionais e importantes

movimentos grevistas, mas também a experiência cotidiana concreta dos trabalhadores nas fábricas e na comunidade, seus padrões e estilos de vida, sua cultura e sua consciência, suas divisões internas e relações com outros grupos” (COSTA, 2001, p.19).

Em relação aos aspectos político-ideológicos, principalmente com referência à participação popular e para conceituar um movimento de esquerda, evidencia-se o que podemos chamar de movimento de libertação, isto é, uma forma política de uma transformação social em prol de uma nova sociedade, em que possa ser superada a ordem injusta, no combate a qualquer forma de governo despótico. Enquadra-se, neste aspecto, a Teologia da Libertação, que tem nas CEBs sua ação concreta. Dentro dessa visão, é importante destacar a análise de Norberto Bobbio:

[...] creio poder dizer que o que o faz de um movimento de libertação um movimento de esquerda é o fim ou resultado a que se propõe: a derrubada de um regime despótico fundado na desigualdade entre quem está em cima e quem estão embaixo na escala social, percebido como uma ordem injusta, e injustiça precisamente porque inigualitária, porque hierarquicamente constituída; é a luta contra uma sociedade na qual existem classes privilegiadas e, portanto, em defesa e pela instauração de uma sociedade de iguais juridicamente, politicamente, socialmente, contra as mais comuns formas de discriminação (BOBBIO, 1995, p.19- 20).

Sobre isso, Pierre Bourdieu (2011) faz uma análise entre a cultura e a religiosidade, na obra “A economia e as trocas simbólicas”, apresentando uma analogia como base teórica para investigar a prática de vida entre os moradores do bairro Mathias Velho, em Canoas, com seus elementos significativos na vida destes novos moradores. É importante destacar nesta obra questões relevantes, como a gênese e a estrutura do campo religioso e o mercado de bens simbólicos, em que o autor trata a religião como linguagem de um sistema simbólico de comunicação e de pensamento.

Pode-se identificar que táticas de hegemonia foram construídas e a estratégia de transformação social era o objetivo maior dos moradores migrantes, embora difusa em termos ideológicos. Maria da Glória Gohn ressalta o papel da Teologia da Libertação na história dos movimentos sociais e sua relação com a autonomia e o processo de desvinculação de uma prática de relação direta com o Estado autoritário, além do assistencialismo, corporativismo e clientelismo, até então muito presentes, nos movimentos sociais durante a ditadura civil- militar:

No final dos anos 70, no Brasil, quando se falava em novos movimentos sociais, em encontros, seminários e colóquios acadêmicos, tinha-se bem claro de que fenômeno

se estava tratando. Era sobre os movimentos sociais populares urbanos, particularmente aqueles que se vinculavam às práticas da Igreja Católica, na ala articulada à Teologia da Libertação. A denominação buscava contrapor novos movimentos sociais aos ditos já velhos, expressos no modelo clássico das sociedades amigos de bairros ou associações de moradores. O que estava no cerne da diferenciação eram práticas sociais e um estilo de organizar a comunidade local de maneira totalmente distinta [...] A categoria teórica enfatizada era a da autonomia. Na realidade, tratava-se mais de uma estratégia política embutida no