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CAPÍTULO 2 – REVISÃO DA LITERATURA

8. Assunto Não apresenta subtipo Sobre, em relação a

2.2.3 As Relações Intersemióticas

De uma maneira geral, as relações intersemióticas, relações entre modos semióticos, podem ser definidas como a(s) maneira(s) pela(s) qual(ais) as diferentes linguagens que compõem textos multimodais se relacionam a fim de construírem significados. Essa subseção apresenta propostas de análise de relações intersemióticas em gêneros multimodais a partir de diferentes autores (CHAN, 2008; 2011; DALY; UNSWORTH, 2011; MARTINEC; SALWAY, 2005; ROYCE, 1998; 2002; 2007; 2015; UNSWORTH; CLÉIRIGH, 2009).

A metodologia de análise de gêneros multimodais pode levar em consideração as linguagens verbal e visual em momentos diferentes, gerando uma descrição verbal e outra visual. O estudo de relações intersemióticas, entretanto, busca descrever como as diferentes linguagens que compõem um gênero multimodal estão associadas a fim de mostrar como o visual e o verbal constroem significados integrados em textos multimodais (UNSWORTH; CLÉIRIGH, 2009).

As relações intersemióticas entre modo semiótico verbal escrito e imagens estáticas discutidas por Martinec e Salway (2005) e denominadas por eles relações texto-imagem11fazem uso de categorias analíticas do complexo oracional da Gramática Sistêmico-Funcional (GSF) (HALLIDAY, 1994)12 para o estabelecimento de possibilidades de relações lógico-semânticas que podem ser observadas em textos multimodais. Além disso, as sugestões de relações intersemióticas apresentadas por esses dois autores levam em consideração o Sistema de Transitividade da (GSF) (HALLIDAY, 1994) bem como os elementos dos Significados

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Neste trabalho, o termo “relações texto-imagem” por Martinec e Salway, 2005 é referido como “relações intersemióticas”, pois entendemos texto como unidade semântica multimodal da qual a imagem faz parte.

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É de conhecimento do autor dessa dissertação que existem edições da Gramática Sistêmico-Funcional mais recentes que a de 1994, publicadas em 2004 e 2014. Entretanto, como a publicação de Martinec e Salway data de 2005, a edição da GSF que eles tomaram como base para sua teoria foi apenas a de 1994.

Representativos da Gramática do Design Visual (GVD) (KRESS & VAN LEEUWEN, 1996)13. Seguindo os conceitos sistêmico-funcionais, as relações lógico-semânticas podem ser de expansão ou projeção. A expansão pode ser dividida em elaboração, extensão e intensificação; a elaboração pode ainda ser dividida em exposição e exemplificação. Por sua vez, a projeção pode ser dividida em Locução e Ideia.

Para Martinec e Salway, a exposição se dá quando os modos verbal e visual possuem o mesmo nível de generalidade, enquanto para a exemplificação os níveis de “generalidade são diferentes” (MARTINEC; SALWAY, 2005, p. 352). A relação de extensão se dá no momento em que um modo semiótico (verbal ou visual) adiciona informação nova/relacionada ao outro em termos ideacionais (o que está sendo representado em termos de participantes, processos e circunstâncias) (MARTINEC; SALWAY, 2005, p. 352-353). A intensificação acontece quando um modo semiótico qualifica o outro circunstancialmente, porém a circunstância intensificadora deve estar relacionada ao conteúdo ideacional do modo semiótico intensificado (MARTINEC; SALWAY, 2005, p. 353).

A projeção aparece principalmente em dois contextos específicos: histórias em quadrinho e combinação de textos e diagramas (MARTINEC; SALWAY, 2005, p. 354). No caso de estórias em quadrinhos, o tipo de balão presente é o fator decisivo para conceituar se a projeção se trata de uma Locução ou de uma Ideia. O balão de fala representa um processo verbal, portanto sua presença indica um caso de Locução. Outrora, o balão de pensamento representa um processo mental, logo há um caso de Ideia (MARTINEC; SALWAY, 2005, p. 355). No caso de combinação de textos e diagramas, quando o conteúdo ideacional do modo visual é dado pelo modo verbal, teremos a chamada projeção de significado (MARTINEC; SALWAY, 2005, p. 356).

Os apontamentos acerca das relações intersemióticas desenvolvidos por Martinec e Salway (2005) são notáveis em virtude de trazerem uma visão subjacente à Linguística Sistêmico-Funcional (HALLIDAY, 1985; 1994), o que colabora para o estudo das relações intersemióticas dentro dessa teoria. Entretanto, esses autores deixam alguns conceitos para suas classificações de relações intersemióticas subjetivos, como o de “parte de texto” em oposição a

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É de conhecimento do autor dessa dissertação que existe uma edição da Gramática do Design Visual mais recente que a de 1996, publicada em 2006. Entretanto, como a publicação de Martinec e Salway data de 2005, a edição da GVD que eles tomaram como base para sua teoria foi a de 1996.

“texto inteiro”, por exemplo. Outros pontos discutíveis do texto de Martinec e Salway (2005) são a tomada da linguagem verbal como ponto de partida de análise e o estabelecimento de relações intersemióticas oriundas apenas dos/das significados/metafunção representacionais/ideacional das linguagens. Além disso, os autores propõem categorias a partir de diferentes gêneros, não fica claro em que medida são generalizáveis ou particulares de cada contexto de uso da linguagem.

Semelhantemente a Martinec e Salway (2005), Chan (2008) e Daly e Unsworth (2011) vêm trabalhando com os/a significados/metafunção representacionais/ideacional da interação entre linguagens verbal e visual. Seus trabalhos desenvolveram os conceitos de concorrência e complementaridade entre o verbal e o visual. A relação de concorrência é estabelecida a partir da elaboração de um modo semiótico para com o outro, nela pode haver uma especificação ou uma descrição; entretanto, não há introdução de novos elementos (representacionais/ideacionais) pelo verbal ou pelo visual (DALY; UNSWORTH, 2011). Por sua vez, a relação de complementaridade é estabelecida a partir da adição de novos elementos (representacionais/ideacionais) por um dos modos semióticos (DALY; UNSWORTH, 2011).

Diferentemente dos trabalhos supracitados, Royce (1998; 2002; 2007; 2015) tem também se concentrado nas naturezas interpessoal/interativa e textual/composicional da linguagem. Esse autor realizou análises intersemióticas em textos advindos principalmente de duas grandes esferas: educacional e midiática. Baseando-se em Halliday e Hasan (1989) e Martin (1992), Royce (1998; 2002; 2007) procura investigar os laços coesivos entre as linguagens verbal e visual a partir das relações de repetição (sentidos iguais entre os modos semióticos), sinonímia (sentidos próximos entre os modos semióticos), antonímia (sentidos opostos entre modos semióticos), hiperonímia (sentido mais genérico de um modo semiótico sobre o outro) e hiponímia (sentido mais específico de um modo semiótico sobre o outro). Tais estudos de Royce (1998; 2002; 2007; 2015) deixam claro que a maneira pela qual o verbal e o visual se relacionam está além da mera repetição de informação ou duplicação de sentido, embora seus estudos estejam limitados às relações lexicais.

Chan (2011) avança nos estudos intersemióticos afirmando que a as relações intersemióticas de concorrência acontecem por elaboração e se subdividem em categorias tais como homoespacialidade, equivalência, exposição e exemplificação. Por sua vez, as relações intersemióticas de complementaridade acontecem por extensão, subdividindo-se em

argumentação, distribuição e divergência, por intensificação, subdividindo-se em espacial, temporal e causal ou ainda por projeção, subdividindo-se em Locução e Ideia (CHAN, 2011).

Como já apontado por Unsworth e Cléirigh (2009), os estudos intersemióticos ainda se encontram em sua “infância”, o que demanda mais pesquisa a fim de que eles se tornem mais consistentes, em especial quando se trata das relações intersemióticas ligadas ao conceito de gênero. No âmbito de leitura acessado pelo autor desta dissertação (publicações em português e inglês), não foram encontrados estudos intersemióticos cuja análise levasse em conta gêneros com imagens dinâmicas, corroborando o pioneirismo do presente estudo nessa gama de publicações.