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7. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS

7.2. O PROCESSO DE AIO – ENTRELAÇAMENTO

7.2.2 Relacionamento entre os sócios

Nesta categoria, vários aspectos observados quanto ao que compunha o relacionamento entre os sócios da CB foram sendo incluídos. Entre eles, destacou-se a questão da cooperação entre as unidades, a interdependência e a proximidade social. A interdependência teve como foco a observação dos aspectos ligados ao compartilhamento de objetivos, recursos e complementaridade de tarefas. A proximidade social envolveu questões ligadas à identidade e laços sociais estabelecidos entre os parceiros.

7.2.2.1 Cooperação

Muitos são os autores que abordaram a questão da importância da cooperação nos processos de AIO. Conforme Larsson et al. (1998), esses dois processos são circulares: para que um processo de cooperação seja bem sucedido, é necessário ocorrer aprendizagem entre as partes, e em contrapartida, essa cooperação facilita o processo de aprendizagem reciproca.

Segundo Lubatkin, Florin e Lane (2001), por meio da ação colaborativa entre as organizações parceiras, a AIO fica facilitada e são ampliadas as bases de conhecimentos. Para Mozzato e Bitencourt (2013), a cooperação consiste em ações colaborativas, em que há compromissos recíprocos; comprometimento entre os envolvidos, adotando a ideia de ganhos mútuos, mesmo não negando a coexistência de atitudes competitivas. Como apontaram as autoras, a

cooperação está profundamente interligada à confiança e ambas compõem o ponto inicial e a base para a AIO, imbricados com outros elementos que a constituem.

Larsson et al. (1998) desenvolveram um quadro que permite uma análise de trocas entre a forma como a aprendizagem coletiva é desenvolvida em alianças e como a articulação dos resultados da aprendizagem é dividida entre os parceiros. Para tanto, criaram uma tipologia de cinco estratégias de aprendizagem diferentes, com base em quão receptivo e transparente uma organização é em relação a seus parceiros.

As estratégias são: colaboração (altamente receptivo e altamente transparente); competição (altamente receptivo e não transparente); compromisso (moderadamente receptivo e transparente); acomodação (não receptiva, altamente transparente) e evasivo (nem receptivo nem transparente) (1tradução da autora). Ao tomar como base esse quadro, a estratégia de

aprendizado mais frequentemente adotada pela CB é a da colaboração, sendo altamente receptivo e transparente nas suas trocas, como se evidencia na passagem adiante:

Tinha uma empresa lá de um rapaz que era amigo nosso, o ADN e um dia a gente propôs negócio: ADN vamos ficar sócio? Eu preciso investir e a tua loja precisa crescer. E a gente gosta de você, você faz um bom trabalho. Vamos, vamos fazer um negócio juntos? A gente avalia tua empresa, a gente entra num negócio, a gente põe alguém aqui, vamos trabalhar, nós temos muita coisa pra fazer.”(E1)

7.2.2.2 Interdependência

Segundo Mozzato e Bitencourt (2013), a interdependência diz respeito à vinculação entre os diferentes agentes, podendo ser tanto referente aos objetivos quanto aos recursos, ou complementaridade na realização das tarefas:

a) Objetivos compartilhados - dizem respeito aos objetivos comuns entre os diferentes agentes, evidenciando interesses convergentes;

b) Recursos comuns - relacionados à interdependência de recursos entre os agentes; referem-se à partilha ou utilização conjugada de recursos (matéria prima, equipamentos, tecnologias), havendo receptividade e trocas em razão das necessidades para a realização de dado negócio;

1 Five categories of interactive behaviour: collaborating, competing, compromising, acommodating and avoiding

c) Complementaridade de tarefas - consiste da interdependência entre os agentes, no que tange à realização de tarefas conjuntas (práticas de negócios, exportações), havendo receptividade e trocas no sentido de complementar as tarefas.

A ideia de compartilhar está presente de forma clara e literal nas falas de muitos sócios e parceiros da CB. A percepção de compartilhamento como condição para o crescimento organizacional que E1, MI, defende relaciona-se com a definição de cooperação, como a busca de resultados conjuntos e a ideia de ganhos mútuos.

Esse modo de pensar está presente em várias situações e é utilizado inclusive como estratégia competitiva, na medida em que vem propiciando o crescimento da empresa e das suas unidades e parceiros, compondo uma rede que se ajuda mutuamente, fortalecendo a busca pela longevidade da organização. A interdependência aparece nos dados pela percepção de vínculo entre os diferentes agentes, no caso, as empresas parceiras, como se vê a seguir:

[...] porque quem perde no começo uma parte do faturamento é Minas. Ela tem que compartilhar, né. Mas, como ela recebeu um dia, também ela tem que doar um dia. Esse conceito também tem que existir. Se você só recebe, por exemplo, triângulo mineiro era da CB SP, a gente teve que abrir mão dele um dia, e fez falta pra nós. Por exemplo, quando nós abrimos CBI, aqui em SP, o faturamento.. quando a gente vendia pra Minas, o faturamento saia daqui da CB. Quando nós trouxemos a Indústria pra cá, esse faturamento nós perdemos. A gente faturava x milhões e a gente abriu mão, pra favorecer a indústria. (E1)

[...] é, que o grupo cresça, que o grupo se fortaleça. Eu não acredito em... se você não doar trabalho, dedicação, mesmo coisas desse tipo, regiões, isso e aquilo, você não.. é muito difícil pra uma empresa como a nossa evoluir. Porque se você quer tudo pra você, o lado de lá vai querer também, ele sabe que você quer tudo pra você.. e você provavelmente não vai ter. Mas, se você compartilha, e ele sabe que você compartilha, ele pode ter uma atitude semelhante. Nem todos tem, mas a maioria tem. (E1)

Em especial, quanto à interdependência, principalmente em relação à utilização conjugada e ao compartilhamento de recursos, sejam eles financeiros ou tecnologias, segundo a necessidade em função de um determinado negócio, esse aspecto fica bastante evidente, principalmente na relação da Casa Bugre com as revendas. Os trechos adiante ilustram esses aspectos:

[...] quando nasceu a HS a preferência era vender produtos da CB...ai pegamos as outras coisas por necessidade lá, também por questão de/ de necessidades da região e também oportunidade, mas a maioria desse nascimento o maior cliente deles, o maior fornecedor é a própria CB então o que acontece...ah eu trabalho com uma empresa A B C e D e CB. Ah, deu furo de caixa aqui, quem eu vou deixar de pagar? CB...você entendeu? Então, hoje a CB ficou uma mãe, é uma mantenedora mesmo. (E2)

Uma vez que a entrada da CB como parceira significa o aporte de investimentos e, possivelmente, como em alguns casos, uma estrutura maior provendo maior segurança a loja, identifica-se uma dependência dessas revendas em relação à Casa Bugre. Esse é um aspecto que irá, inclusive, envolver outro ponto, o do controle e poder.

Essa dependência gera um maior controle sobre a revenda, e seu desequilíbrio gera eventuais resultados negativos, como um relacionamento excessivamente paternalista e protetor:

[...] então a revenda precisou de um negócio ele está lá a disposição, se entrega e trabalha vinte e quatro horas por dia, então a CB é muito forte oxe...eu acho assim se parar a CB, essas revendas fecha tudo, para tudo. (E2).

Essa relação, que pode envolver questões políticas e de poder, será discutida em uma categoria à parte, em função de sua relevância. Contudo, a interdependência na expansão da Casa Bugre está bastante associada a outro aspecto que a teoria aponta: a complementaridade de tarefas.

Praticamente, todas as alianças formadas buscam essa complementaridade, uma vez que visaram à obtenção de conhecimentos fundamentais de regiões que a CB não acessava. Assim, essa interdependência também compõe o aspecto da cooperação, na medida em que as unidades precisam interagir de modo colaborativo, revendas em relação à CB e vice versa, como também com seus fornecedores e o setor de produção, a CBI. Conforme trecho adiante: E aí a gente foi. Juntamos eu, o MO, o MR o LI, e aí eu trouxe um outro sócio, que não está mais com a gente hoje chamado LZ. Ele ficou comigo dois anos, ele conhecia bem o cinturão verde de SP, ele é de São José dos Campos, ele conhecia bem essa região. E eu trouxe ele pro negócio, pra sociedade e a gente ficou trabalhando. (E1)

7.2.2.3 Proximidade Social

Outro aspecto observado no relacionamento entre os sócios da Casa Bugre foi identificado e adotado como uma subcategoria denominada proximidade social (MOZZATO; BITENCOURT; 2013). Esse conceito diz respeito à maior identidade entre os diferentes agentes, facilitando o estabelecimento de laços sociais mais fortes, e dessa forma, conduzindo à maior proximidade social:

a) Identidade entre agentes - consiste na similaridade social, que compreende valores comuns, percepções compartilhadas e fatores contextuais similares. Pressupõe a compatibilidade cultural entre os agentes, reforçando a identificação e a conectividade; b) Laços sociais – dizem respeito às relações sociais estabelecidas entre os diferentes agentes, em razão de laços de amizade e parentesco. Também incide a identificação e o gosto pela tarefa e/ou setor de trabalho e tempo de atuação no mesmo, culminando em entendimento mútuo e compromisso recíproco.

Esse conceito de proximidade social, aqui, parte integrante do relacionamento entre sócios, fundamentalmente, refere-se à identidade entre os agentes, o que facilita o estabelecimento de laços mais fortes, que por sua vez, serão facilitadores do processo de aprendizagem interorganizacional. Identidade configura a similaridade social, que inclui questões como valores comuns, percepções compartilhadas, similaridades quanto ao contexto. Pressupõe compatibilidade cultural entre os agentes, o que reforça a conectividade (MOZZATO; BITENCOURT, 2013).

Esses aspectos são extremamente fortes na formação da Casa Bugre e de suas alianças. Se olharmos o processo de aprendizagem que se manifesta, principalmente nas cinco unidades que carregam o nome CB, veremos que alguns valores estão tão consolidados que são possíveis de serem observados. Durante a coleta de dados, no processo de entrevistas, foi possível observar semelhanças ligadas às próprias falas, como a utilização de termos e expressões idênticas, semelhanças no tom da comunicação, o que nos parece um indicativo muito forte de proximidade social.

Há que se ressaltar, ainda, que, neste ponto, apresenta-se claramente a dinâmica da AIO como um processo que permeia os diferentes níveis de análise, do indivíduo ao interorganizacional. Essas observações têm como ponto focal a fala dos responsáveis por cada uma das unidades. Esse aspecto é bastante visível, principalmente entre a GM e a CB. A proximidade entre MR e MI é muito grande em seus discursos, na forma de falar sobre a organização e em suas percepções sobre parceria, como se observa nos trechos adiante:

[...] eu acho que eu ganhei muito mais do que eu dei. é por causa disso que eu tento tem hora que o pessoal brinca comigo que eu levanto cedo, eu já durmo pouco, eu saio para trabalhar quatro hora da manhã, cinco horas da manhã, você está entendendo? mas eu faço assim, eu estou recebendo demais, então eu tenho que fazer, então assim, o que eu ganhei da CB não tem/ não é financeiro só, também financeiro, também ganhei bastante, falar para você não, mas hoje a CB tem um patrimônio até razoável, mas o meu maior patrimônio da CB que eu levo daqui foi o conhecimento que eu conheci, foi as portas que me abriram e as pessoas que eu

conheci que me cativaram e hoje eu posso falar, eu tenho os amigos verdadeiros aqui dentro e isso é fundamental. (E2)

Ah eu recebi muita coisa, eu aprendi muito com todo mundo, esse relacionamento om todos, às vezes eu fico estressado, às vezes assim, mas eu aprendi muito na verdade, isso é parte de um projeto, assim em algum momento, eu falei isso algumas vezes, até em casa eu falei isso, em algum momento eu recebi uma oportunidade de tocar um negócio, de crescer, de deixar a vida que a gente tinha antes...e um dia a gente ficou pensando: porque eu tive essa oportunidade? porque justamente eu entre tantas pessoas, porque eu vim parar aqui? [...] tal e assim, a conclusão que eu cheguei, para resumir um pouco, tudo bem eu recebi uma ajuda, um empurrão ,seja lá o que for, e não é para ser à toa; e eu tenho que passar isso para frente, eu tenho que ajudar outras pessoas a fazer o mesmo, eu tenho que contribuir com outro e esse com outro, e assim vai. (E1)

Cabe destacar outro aspecto importante: os fortes laços estabelecidos entre eles. Essa proximidade, entre alguns dos dirigentes de unidades pesquisadas, reforça essa identidade social, gerando laços muito fortes de amizade. O trecho a seguir descreve como algumas das parcerias se deram:

[...] ai nessas conversas de composição de sociedade ai eles fizeram um convite eu falei assim olha gente eu também não tenho como entrar ( ) vamos trabalhar ai o MIaia naquela...naquela generosidade dele que eu sempre falo, tem um coração enorme, ele chegou falou assim: você não tem um carro, alguma coisa? você está trabalhando; eu falei oh tenho, mas está financiado para mim trabalhar aqui. Ele falou: não, deixa o carro ai; não precisa assinar contrato nada; o que vale é a palavra. Ah, então vamos trabalhar e assim começou. (E4)

Outro ponto é a presença de laços de parentesco em algumas funções, principalmente quando ocorre a abertura de novas parcerias com a Casa Bugre, escolhas essas que têm como base a confiança. Segundo os trechos a seguir:

E o que a gente fez com a GRL? A gente pegou e transformou numa empresa de propaganda, que tá com o VT (filho de MI). A gente mudou a atividade social, mudou tudo e passamos pro VT. Que também a gente fez a mesma coisa, eu falei: VT quem nós vamos ter como sócio? quem pode dar serviço pra nó? CB, AGR, AGV, HT, todos eles tem uma beiradinha na empresa. Significa que tem compromisso com a empresa, né. Porque viabiliza o projeto. (E1)

A força desses laços está bastante presente, por exemplo, em momentos de conflito e de crise. Em um determinado momento, diante da possibilidade de um rompimento, surge uma grande preocupação com as pessoas, seja em não abandonar o parceiro, seja em não deixar ninguém sem trabalho.

Daí, surgem alguns sentimentos e algumas emoções, indicando a importância dada às relações pessoais, reforçando essa percepção de laços entre pessoas-chave das organizações bastante fortes. A palavra gratidão, no sentido de que existe algo a retribuir, é citada em mais de uma

entrevista, como algo que impulsiona à troca, ao compartilhamento, à entrega profissional. Conforme a fala adiante:

[...] então eu vou fechar, vai ter um monte de gente desempregada, ele falou assim. Porque a gente tem estrutura em Minas, a gente tem estrutura em um monte de lugar, a gente criou estrutura para gente poder vender esses produtos, mas eu vou fechar, se você está saindo, então eu vou fechar. Porque a gente começou junto e se você está saindo, eu não quero olhar para trás e ver que um sócio ficou para trás [...] acabei refletindo bastante, eu não estou conseguindo achar uma palavra...gratidão. sim, acho que isso ai.. não é coisa só minha. acho que a maioria dos orientais tem isso...que é uma coisa de gratidão. Então, quando eu tive toda essa briga, eu comecei a analisar assim os fatos, eu falei: poxa, lá atrás o MI em especial me ajudou muito, me apoiou muito, aprendi muito com ele, a questão de negociação, a questão de lidar com as coisas, a questão de valores, tal. E eu sabia que não era dele aquilo, as atitudes que estavam tomando, não era dele. Poxa, tem pessoas que por má influência está influenciando ele, má índole não é, poxa, não é uma atitude dele, então assim, vou relevar, sou muito grato, então tenho que mostrar essa gratidão, e não é dessa forma. (E4)

Somando-se ao aspecto da pouca institucionalização destas empresas, o fato de a formação das alianças ter se dado em organizações com atividades complementares talvez tenha ocasionado alguma dificuldade em transferir rotinas e regras entre elas. Assim, os dados parecem apontar para a busca de uma alternativa para a padronização e estabelecimento de normas. Esta pode ter levado a Casa Bugre a adotar um manual de conduta, buscando, assim uma linguagem única e uma padronização de comportamento.

Destarte, por meio de uma atuação bastante forte promovendo constantes reuniões, treinamentos e encontros, a Casa Bugre buscou transmitir seus valores aos funcionários, para que esses se transformassem em uma forma de agir e atuar institucionalizada. Segundo a fala adiante:

Na verdade a CB não ensina não, a CB passa os valores, se você aceita e acredita e quer fazer, está tudo bem, se você não quer, não aceita os valores, vai ter choque, vai ter problema. a gente não tem pretensão de ensinar. porque você quando fala em ensinar. não tem jeito de ensinar esses valores para um adulto já formado, olha você é ou não é assim...você tem ou você não tem esses valores. você pode ter parecidos ou muito diferentes, não importa, mas é assim que a gente quer ser. (E1)

[...] são decisões que ele tem que tomar e.. não tem jeito de eu tomar por ele, ele está lá, ele está vendo e ele tem que usar os valores que a gente tem, se ele não usar, nós vamos ter problema, nós certamente vamos ter problema. Teve sócios que entraram e a gente pediu para se retirar, porque uma coisa ele era enquanto funcionário, amigo, e outra coisa que ele era como sócio, dono, muito diferente e a gente teve que pedir para se afastar, para o bem do negócio. (E1)

[...] como a gente começou um trabalho do zero, eu consegui assim, passar a minha ideia de trabalho, chego, oh gente vamos solucionar o problema do produtor, nós não temos de chegar e enfiar produto goela abaixo, fazer resolver o problema, se o produtor.. com a visão que o produtor tem que ganhar. se o produtor ganha, toda cadeia ganha, ai essa abordagem com os clientes começou dar resultado...e para eles foi uma coisa assim, nossa a gente só pensado em vender, vender ai começou a criar

vínculos não é, por exemplo, tem produtor de vários.. não é produtor, cliente de loja, Santa Catarina, Rio Grande do Sul que eles pedem para eu adicionar no face, no whatsApp, eles mandam mensagem, eles brincam comigo[...] (E4)

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