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CAPÍTULO 2 REVISÃO DA LITERATURA

2.2. Resolução de problemas em matemática

2.2.3. Resolução de problemas diferentes perspectivas

A expressão resolução de problemas, pelo facto de gerar diferentes interpretações, transformou-se, segundo Stanic e Kilpatrick (1989), “num slogan englobando diferentes visões da educação, da escolaridade, da Matemática e das razões, porque devemos ensinar Matemática em geral e resolução de problemas em particular” (p. 1), contribuindo, deste modo, para que diferentes autores defendam perspectivas diversas, relativamente às orientações para o ensino e organização dos currículos.

Hatfield (1978), defendendo o ensino da resolução de problemas através de processos heurísticos, caracteriza o ensino da resolução de problemas, no currículo da Matemática, segundo três perspectivas: o ensino para a resolução de problemas; o ensino acerca da resolução de problemas e o ensino através da resolução de problemas.

No ensino para a resolução de problemas, atribui-se importância aos conceitos e procedimentos matemáticos que os alunos devem aprender para aplicar na resolução de

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problemas. De acordo com esta perspectiva, aprende-se Matemática para se ser capaz de utilizar o conhecimento adquirido para resolver problemas.

No ensino acerca da resolução de problemas, coloca-se a ênfase no modelo de resolução que o professor utiliza. Assim, os alunos aprendem um conjunto de heurísticas ou estratégias que podem escolher e usar na resolução de problemas, para que se tornem melhores resolvedores de problemas, sendo também incentivados a tomar consciência da sua própria evolução, quando eles os resolvem. Esta perspectiva dá primazia à forma como os problemas são resolvidos.

Por último, no ensino através da resolução de problemas, os problemas são utilizados não só como um objectivo para a aprendizagem da Matemática, mas também como um meio para o fazer. Desta forma, utilizam-se situações problemáticas para se ensinar um conteúdo matemático e desenvolver as técnicas necessárias para resolver problemas.

Stanic e Kilpatrick (1989) perspectivam a resolução de problemas, no currículo escolar da Matemática, segundo três temas: como contexto, como capacidade e como arte.

A resolução de problemas como contexto considera que os problemas são veículos ao serviço de outros objectivos curriculares. Segundo os autores, tem servido como justificação para aprender Matemática, convencendo professores e alunos da sua utilidade, introduzindo nos currículos de Matemática problemas relacionados com experiências reais. É entendida como motivação, quando a finalidade é captar o interesse dos alunos, utilizando os problemas para introduzir temas e conceitos matemáticos, motivando-os para a sua aprendizagem. Como divertimento, quando se pretende que os alunos aprendam Matemática e, simultaneamente, tenham a capacidade de perceber que esta pode ser divertida. É vista também como veículo quando é utilizada para a introdução de novos conceitos e estratégias. Por último, é entendida como uma prática se usada para praticar e reforçar capacidades e conceitos previamente ensinados e aprendidos.

A resolução de problemas como capacidade encara a resolução de problemas como uma das diversas capacidades a serem desenvolvidas pelos alunos. Entendida desta forma, os autores colocam a necessidade de se fazer a distinção entre a resolução de problemas não rotineiros e de rotina. A resolução dos problemas não rotineiros pode exigir uma capacidade mais elevada, a qual só acontece depois da aquisição da capacidade de resolução de problemas de rotina. Consequentemente, só os alunos, que dominam os pré-requisitos, têm a oportunidade de resolver esses problemas, o que faz com que muitos se dediquem somente à resolução de problemas mais simples.

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A resolução de problemas como arte apresenta uma visão “mais profunda e mais compreensiva da resolução de problemas nos currículos escolares de Matemática” (p. 15). Esta concepção subjaz ao trabalho de Polya, que era um grande defensor do ensino da resolução de problemas através de métodos heurísticos e do papel do professor, neste tipo de ensino. Este autor defendia a resolução de problemas como sendo uma arte e não um processo mecânico que reduz os métodos heurísticos a capacidades procedimentais ou a técnicas algorítmicas.

Segundo Vale (1997), a resolução de problemas “é mais do que um conteúdo matemático; é um contexto, uma filosofia, uma metodologia de ensino-aprendizagem da Matemática” (p. 3). Neste sentido, Vale e Pimentel (2004) entendem a resolução de problemas segundo três perspectivas: (i) como um processo, quando se pretende capacitar os indivíduos com estratégias de resolução de problemas para que se tornem cada vez mais capazes de os resolver; (ii) como uma finalidade, quando se pretende desenvolver e trabalhar certas acções matemáticas como o explorar, o questionar, o investigar, o descobrir e o utilizar raciocínios plausíveis e (iii) como um método de ensino, quando é utilizada para a introdução de conceitos através de actividades de exploração e de descoberta, tendo em consideração factos, conceitos, procedimentos matemáticos e as finalidades do ensino da Matemática.

As perspectivas sobre a resolução de problemas de Hatfield (1978), Stanic e Kilpatrick (1989) e Vale e Pimentel (2004) apresentam algumas características em comum, pelo que o seu paralelo pode ser salientado pelo Quadro 1.

Quadro 1 - Resolução de problemas - diferentes perspectivas

Hatfield (1978) Stanic e Kilpatrick (1989) Vale e Pimentel (2004)

Ensino para a resolução de

problemas. Como arte. Resolução de problemas como finalidade.

Ensino acerca da resolução

de problemas. Como capacidade. Resolução de problemas como processo.

Ensino através da resolução

de problemas. Como contexto. Resolução de problemas como método de ensino.

Para outrosautores como Lesh e Zawojewski (2007), English, Lesh e Fennewald (2008) e English e Sriraman (2010), as perspectivas existentes têm tratado a resolução de problemas como um assunto isolado do desenvolvimento das ideias fundamentais, das compreensões e dos processos matemáticos. Consideram que umas enfatizam o ensino de conceitos e procedimentos matemáticos, sendo a resolução de problemas usada para a prática dos mesmos, em actividades que não envolvem os alunos numa verdadeira resolução de problemas; outras focalizam-se no

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ensino de estratégias ou heurísticas de resolução de problemas, tais como fazer uma tabela ou desenhar um diagrama.

Lesh e Zawojewski (2007) apresentam uma alternativa na qual se entende a aprendizagem da Matemática e da resolução de problemas como algo integrado e como uma construção que se encontra em desenvolvimento continuo. A perspectiva sobre a resolução de problemas destes autores está subjacente à ideia de que a resolução de problemas deve envolver situações que vão para além da Matemática escolar, principalmente aquelas onde a tecnologia desempenha um papel relevante, de forma a integrar a Matemática com outras disciplinas e com o mundo real.

Justificam que a complexidade da sociedade contemporânea e dos sistemas complexos que a constituem alterou, não só os tipos de situações de resolução de problemas, como as capacidades de resolução de problemas necessárias ao sucesso para além da escola. Consequentemente, estas novas situações requerem novas formas de pensamento matemático, tais como: interpretar, descrever, construir, explicar e manipular sistemas complexos (Lesh & Harel, 2003; Lesh & Zawojewski, 2007; English, Lesh & Fennewald 2008).

Desta forma, estes autores defendem que é fundamental que ocorram mudanças na natureza dos problemas propostos aos alunos nas aulas de Matemática. É necessário que as situações de resolução de problemas proporcionem simulações de experiências da vida real, onde o pensamento matemático seja útil. Em tais situações, a essência da resolução de problemas será encontrar formas de interpretar as mesmas matematicamente através de uma série de ciclos interpretativos e iterativos para produzir modos de pensamento matemático apropriado sob a informação dada (enunciados, objectivos). Para Lesh e Harel (2003), Lesh e Zawojewski (2007), bem como English, Lesh e Fennewald (2008), estas situações de resolução de problemas envolvem uma série de ciclos de modelação, onde as formas de pensamento do resolvedor de problemas sobre os enunciados, os objectivos e as etapas de resolução, requerem que sejam testados, aperfeiçoados e revistos repetidamente. Sublinham que é necessário que os alunos, num ambiente de resolução de problemas e durante um período prolongado de tempo, sejam envolvidos na verdadeira resolução de problemas para que criem, eles próprios, importantes construções, bem como modelos susceptíveis de serem generalizados. Desta forma, os alunos conferem sentido aos vários sistemas complexos que governam o mundo de hoje.

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