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8 STATUS DA AUTORALIDADE NA E-SCIENCE

8.3 RESSIGNIFICANDO A AUTORIA CIENTÍFICA

A autoria científica é uma função já presente no ambiente acadêmico-científico. É evidenciada como uma função de destaque no âmbito da investigação científica. A especificidade da autoria científica não é assunto recente, mas tomou outros contornos a partir do que os autores chamam de “condição pós-moderna da autoria científica” do século XXI. Krokoscz (2015, p. 97) “chama de noção compartilhada [...] o surgimento de uma corrente de reflexão que vem ressignificando a concepção tida sobre o conhecimento e suas implicações”. Esta ressignificação está atingindo todos os campos dos saberes, primordialmente no ambiente científico quando se busca resultados válidos e aceitáveis para a ciência. A autoria científica é portanto, “uma modalidade autoral, típica dos processos de produção textual acadêmica, a qual pode ser exemplificada como editoriais, resumos, pôsteres, artigos, capítulos de livro e livros inteiros” (KROKOSCZ, 2015, p. 90). Assim, prevalece suas características de criação, colaboração, produção e invenção nos diferentes campos dos saberes e se propaga por meio do processo de comunicação científica vigente.

A autoria patrimonial é centrada no direito privado, propriedade individual e transferível, e por conseguinte, recebe a recompensa pecuniária. E a autoria científica está centrada em um direito público, recebe por recompensa autoral: merecimento, aceitação, reconhecimento dos pares e a atribuição. Geralmente, a autoria científica não possui natureza pecuniária e a propriedade é inalienável. A recompensa é pautada no reconhecimento científico sendo a atribuição e os créditos as formas usuais.

Ainda no limiar da autoria científica a propriedade está associada ao direito imaterial centrado na diferença que a propriedade moral entendida como propriety voltada para o reconhecimento autoral por meio de um sistema de créditos autorais e a inexistência econômica. Enquanto que a noção de property está direcionada a uma recompensa que se pauta nos sistemas de direitos de propriedade intelectual, com base em um direito privado e na remuneração econômica. Essa dualidade, muito embora não seja tão evidente na prática da comunicação científica, reflete de forma latente duas compreensões: o conhecimento científico mediado sempre por uma dicotomia entre o público e o privado; e, a expropriação econômica dos feitos científicos como forma de recompensa autoral, por meio da remuneração.

Baracat e Rigolin (2012, p. 350) afirmam que “as contradições de âmbito social, econômico e cultural são pontos centrais nas discussões sobre propriedade intelectual, pois é a lei de proteção da propriedade intelectual que regula a produção, a circulação e o acesso ao conhecimento estão voltadas para uma vertente privada em um contexto contemporâneo de acesso aberto e público”. No entanto, o que se leva em consideração é o comportamento moral e ético do autor científico, devendo prevalecer sempre o bem comum e público para o progresso da ciência. O reconhecimento autoral é baseado na reputação, prestígio e promoção científica.

8.4 AUTORIA COLETIVA OU COLABORATIVA: ONDE RESIDE A

AUTORALIDADE NA E-SCIENCE?

Na ambiência contemporânea baseada na e-Science, o processo da comunicação científica é validado pelo modelo ciclo de vida dos dados, aplicado ao gerenciamento dos dados científicos compartilhados. Assim, no espaço científico além da autoria científica, outras duas condições autorais se destacam: autoria coletiva e autoria colaborativa. Os ambientes que perpassam as práticas da e-Science é realizado por diferentes pesquisadores, colaboradores e instituições.

Na doutrina, perdura ainda a diferença conceitual entre a autoria coletiva e colaborativa. A obra coletiva, “é criada por iniciativa, organização e responsabilidade de uma pessoa física ou jurídica, que a publica sob seu nome ou marca, e que é constituída pela participação de diferentes autores, cujas contribuições que se fundem numa criação autônoma” (PAESANI, 2012, p. 27). Assim, os direitos autorais também são coletivos, indivisíveis e destinam-se a múltiplos autores.

No sistema legal brasileiro, as obras colaborativas não estão previstas na LDA, uma vez que a previsão legal só prevê as obras em coautoria. A lei atual vigente consagrou o “princípio da coautoria, que englobaria, parcialmente, o de colaboração, definindo a obra em coautoria como aquela criada em comum por dois ou mais autores” (FRAGOSO, 2009, p. 162). A previsão legal reforça que o coautor tem a sua proteção autoral preservada. No que se refere a autoria, é o autor primário, o responsável pela pesquisa e gerador dos dados primários oriundos de um processo de investigação científica que goza do status de autoria originária.

Cada contribuição individual na criação colaborativa representa um “aporte intelectual de verdadeira criação, individualizada e identificada, resultando numa obra divisível, onde cada colaborador conserva o direito individual sobre seu trabalho [...], com interdependência

na sua obra, estamos a falar de uma obra colaborativa” (FRAGOSO, 2009, p. 162). É o caso dos editores, produtores, revisores e curadores que participam como auxiliares com contribuições secundárias ou acessórias, mas que seu papel complementa a obra intelectual em sua totalidade.

Porém, outra reflexão é imprescindível no atual contexto, considerando as novas vertentes de colaboração científica em uma ambiência compartilhada. Ressaltamos a figura do autor na contemporaneidade e que na obra de Barthes, ele aponta para ‘a morte do autor’, onde ocorre “o afastamento do Autor [...] (que seria a «mensagem» do Autor-Deus), para um espaço de dimensões múltiplas, onde se casam e se contestam escritas variadas, nenhuma das quais é original: o texto é um tecido de citações, saldas dos mil focos da cultura [...]” (BARTHES, 2004, p. 3). Esta reflexão é bastante atual no sentido de mostrar que a figura do autor deixa de ter uma função centrada na sua propriedade individualista para uma função colaborativa. A dimensão teológica que Barthes posiciona como Autor-Deus cede espaço para as posições e escritas múltiplas e compartilhadas, saídas de várias culturas e fundem-se em diálogos. O foco não está na obra e no autor, mas na multiplicidade e na coletividade de diferentes colaboradores.

Na contemporaneidade, a versão colaborativa é exemplificada pela Wikipédia. Krokoscz (2015, p. 79) afirma que “é a Wikipédia, uma enciclopédia eletrônica que vem sendo perenemente construída e permanentemente editada na internet desde 2001”. Essa obra colaborativa permite que qualquer pessoa possa publicar, criar, modificar e distribuir o conteúdo, seja para fins ou não comerciais, desde que obedeça aos parâmetros das licenças

Creative Commons Attribution-Share Alike e a condição da GNU Free Documentation License. Ambas são licenças para documentos e textos livres, apesar de “permitirem o uso

livre de conteúdos, exigem a condição de que os autores originais sejam creditados e o direito de uso livre por outras pessoas seja mantido” (KROKOSCZ, 2015, p. 80). As dimensões geográficas e linguísticas abrem espaço para os ambientes digitais colaborativos, conectados, interativos e sem fronteiras, proporcionados pelo uso intenso de tecnologias e através da

internet. Assim, é mister, também, entender as autorias já mencionadas e ter a compreensão

do processo autoral na seara compartilhada - strict sensu - da autoria colaborativa.