• Nenhum resultado encontrado

SCORER INVERSION IN SCHOOL PHYSICAL EDUCATION: A COOPERATIVE AND INCLUSIVE EXPERIENCE IN FUNDAMENTAL EDUCATION

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Trabalhando desportos como o futsal, o basquetebol e o handebol, no início do período letivo, o professor de Educação Física foi observando que determinados alunos detinham boas visões de jogo e se destacavam nas ações individuais e coletivas, apresentando motricidade e cognição bem desenvolvidas para esses desportos, fazendo cestas e gols com frequência.

Nesse início, as aulas eram todas voltadas para fazer um maior número de cestas e de gols, de modo que os alunos que participavam dessas modalidades já estavam acostumados com essa lógica e, por diversas vezes, perguntavam ao professor como estava o placar e o interpelavam quando o mesmo se distraía com outras atividades que estavam sendo desenvolvidas fora da quadra, no espaço ao lado dela, também utilizado para as aulas, porém com outras atividades.

Percebia-se que a grande maioria dos alunos ficava de fora dessas atividades desportivas e os que participavam já haviam naturalizado a lógica competitiva estabelecida naquele contexto. Não raramente, alguns alunos pertencentes ao time “campeão” bradavam, em voz alta, ao final da aula, “É campeão!” e seguiam cantando para dentro da escola, num ar de insulto aos que haviam perdido, ocasionando conflitos por três vezes, que precisaram ser mediados pelo professor e pela coordenadora. Os bullyings também eram corriqueiros. Falas do tipo: “Ah, professor, Alice no meu time, não!”, “Pô, cara, tu é burro

INVERSÃO DO GOLEADOR NA EDUCAÇÃO Fábio Narduchi FÍSICA ESCOLAR:... Alexandre de Jesus Pereira

Miriam Struchiner

Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.25 | n. 50 | p. 145-153 | mar./jun. 2020. 149

‘pacaralho’!”, “Cara, acorda!”, “Lento ‘pacaralho’!”, “Vai, baleia, anda!”, “Tira a Telma, professor, ela não corre...” eram comuns, algumas das quais fazendo alusão à deficiência de aspectos físicos, cognitivos e motores solicitados nas modalidades.

No entanto, certa vez uma fala chamou a atenção do professor: “Professor, tira o Michel; ele não passa a bola! Num vou jogar mais, não!”, vinda de uma aluna muito interessada, mas que não apresentava a mesma destreza de outros alunos em ações individuais e coletivas, corroborando a fala de Rodrigues (2003) de que a cultura desportiva e competitiva, de presença marcante nas propostas curriculares da área, torna-se um obstáculo adicional à inclusão de alunos que são, à partida, encarados como “menos capazes” para um “bom” desempenho, por diversas razões, numa competição.

Tal fala foi um dos motivos da mudança de estratégia por parte do professor em suas aulas. E dessa maneira, não satisfeito com essa lógica excludente e conflitante que acabara por excluir a aluna e alguns outros que não participavam, até então, e que houvera provocado conflitos, o docente começou a propor uma nova estratégia para essas modalidades desportivas trabalhadas, isto é, a “inversão do goleador”, proposta por Terry Orlick e que consiste no seguinte: “O jogador que marca o ponto passa para o outro time” (SOLER, 2003, p. 27), buscando romper então com essa perspectiva e estabelecer suas aulas com base numa ética cooperativa.

Considerada uma abordagem pedagógica da Educação Física, que tem como objetivo romper com o modelo mecanicista, esportivista e tradicional vigente na área, a abordagem Baseada nos Jogos Cooperativos (DARIDO; RANGEL, 2008) apresenta-se como alternativa metodológica a essa lógica esportiva, amplamente praticada nas aulas do componente curricular, com a vitória dos “mais habilidosos” sobre os “menos habilidosos”, acarretando assim sucessivas experiências de fracasso a grande parcela dos alunos (NARDUCHI; PEREIRA, 2018) e a exclusão de uma outra parcela, que, nem sequer, ousa participar.

Foi proposto então que aquele que fizesse cestas ou gols, em um determinado time, passaria para o outro time, a fim de ajudá-lo. Para a surpresa do professor, que demonstrou, inicialmente, receios quanto à adequação dos alunos, a proposta foi bem recebida pela grande maioria dos discentes e, conforme o ano letivo foi se desenvolvendo, os alunos foram naturalizando essa nova lógica, calcada numa ética cooperativa, que se baseia,

INVERSÃO DO GOLEADOR NA EDUCAÇÃO Fábio Narduchi FÍSICA ESCOLAR:... Alexandre de Jesus Pereira

Miriam Struchiner

Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.25 | n. 50 | p. 145-153 | mar./jun. 2020. 150

segundo Correia (2006), na cooperação, no envolvimento, na aceitação e na diversão. Isso deixou evidente também que propostas como a dos jogos cooperativos, quiçá outras, que rompem com uma lógica vigente, devem ser implementadas na base, ou seja, em turmas da 1ª etapa do Ensino Fundamental, onde os alunos são mais receptivos e menos resistentes, conforme demonstrado.

Notava-se que o aluno, quando fazia cestas (no basquetebol) ou gols (no futsal e no handebol), sentia-se motivado para passar para o outro lado, uma surpresa até mesmo para o professor, que relatou que nunca havia usado tal estratégia em suas aulas até então. Além do mais, este aluno ajudava o outro time, do qual agora fazia parte, auxiliando outros alunos com maior dificuldade, desta vez, pertencente ao seu time, a pontuarem também.

Foi acordado, entre discentes e docente, que o aluno, ao passar para o outro time quando fizesse ponto, não poderia mais fazer cestas ou gols, tendo somente que auxiliar os outros alunos desse seu novo time a pontuarem também. Assim, foi-se percebendo que uma maior quantidade de alunos acabou tendo experiências exitosas e quem fazia pontos e passava para o outro lado continuava motivado no jogo, mesmo não podendo mais pontuar e somente com a possibilidade de ajudar os outros a conseguirem. Os Parâmetros Curriculares Nacionais da Educação Física propõem inclusive o “avaliar se o aluno reconhece e respeita as diferenças individuais e se participa de atividades com seus colegas, auxiliando aqueles que têm mais dificuldade e aceitando ajuda dos que têm mais competência.” (BRASIL, 1997, p. 49).

As turmas foram aderindo, cada vez mais, à proposta, a ponto de o professor criar dinâmicas, dividindo os discentes em grupos de cinco alunos, em cada time, cinco de um lado e cinco do outro, e com tempo de quinze minutos para cada dez alunos jogarem. Tal dinâmica envolvia a sensibilidade do professor, que escolhia aqueles com mais habilidades para encabeçarem cada grupo. Ao término dos quinze minutos, os times estavam com outra configuração numérica que não a do início da partida (6 x 4, 7 x3 e 8 x 2).

Com isso, mais alunos foram pontuando e se sentindo importantes, fato este notado por seus semblantes, que demonstravam satisfação, prazer, durante e após a realização das aulas. E uma nova lógica, cooperativa e includente, percebida também por suas falas – “Vai, Lucas, para o outro lado!”; “Vai, Roberto, ajudar eles”; “A Laura não está conseguindo fazer o gol; ajuda ela, Ricardo!” –, ia sendo estabelecida, naturalizada (com

INVERSÃO DO GOLEADOR NA EDUCAÇÃO Fábio Narduchi FÍSICA ESCOLAR:... Alexandre de Jesus Pereira

Miriam Struchiner

Rev. Augustus | ISSN: 1981-1896 | Rio de Janeiro | v.25 | n. 50 | p. 145-153 | mar./jun. 2020. 151

quase dois meses utilizando a estratégia, já se organizavam autonomamente), de modo que foi sendo possível incluir alunos que, nem sequer, participavam outrora, gerando grande satisfação por parte do docente e dos discentes.

Sendo assim, foi possível ir da competição, com toda a sua lógica de exclusão, à cooperação, utilizando-se esse tipo de estratégia cooperativa, baseada no referencial dos jogos cooperativos (NARDUCHI; PEREIRA; TRIANI, 2017), e um clima saudável de otimismo, de participação e de ajuda mútua se estabeleceu, obtendo o reconhecimento inclusive de toda a equipe, que, muitas das vezes, ia assistir e prestigiar as aulas, motivo de grande alvoroço e de grande motivação entre os alunos. Além do mais, muitos dos alunos, ou melhor, a grande maioria, pôde se aprimorar, tecnicamente e taticamente, em ações individuais e coletivas, indo ao encontro do que postulam autores e documentos (BRASIL 1997, 1998; ASSIS, 2001; SOARES et al., 1992) de que tanto a técnica quanto a tática, enquanto saberes, devem ser ensinadas nessas aulas.