• Nenhum resultado encontrado

REVOLUÇÃO ISLAMICA DE 1979 E A CRISE DO PETRÓLEO

No documento Irã X Arábia Saudita (páginas 53-58)

3 HISTÓRICO DE CONFLITOS ENVOLVENDO IRÃ E ARÁBIA SAUDITA PÓS-

3.1 REVOLUÇÃO ISLAMICA DE 1979 E A CRISE DO PETRÓLEO

Segundo Silva (2015), até o ano de 1978, o Irã foi aliado dos Estados Unidos, detendo uma série de acordos militares com os norte-americanos e estando, ao final da mesma década, entre os dez maiores arsenais militares do mundo.

Entretanto, ainda de acordo com o autor, enquanto a política externa do país prosperava no que concerne relacionamento com grandes potências, internamente, a política de modernização, as custas do mercado interno e do povo, aplicada pelo Xá Reza Phalevi, governante e ditador do país, desencadeou, em meados de 1978 e início de 1979, uma rebelião popular liderada por dirigentes religiosos – particularmente o Aiatolá Ruhollah al-Khomeini, que vivia exilado em Paris – e por frentes políticas de esquerda. A saber, a Frente Nacional, pelo partido marxista Tudeh e pelas organizações político-militares dos Fedayins (nacionalistas) e dos Mujahedins (combatentes religiosos fundamentalistas). (PEREIRA, 2008) Especificamente, Hobsbawm (2006) explica:

A derrubada do Xá do Irã em 1979 foi a maior das revoluções da década de 1970. Reza Phalevi tentou implementar um programa relâmpago de modernização e industrialização do país, apoiado pelos Estados Unidos, em virtude da riqueza petrolífera do Irã. Porém, ‘o Xá dependia cada vez mais de uma industrialização financiada pelo petróleo, a qual, incapaz de competir no mundo, era promovida e protegida internamente’. A indústria que se formou era deficiente e eram necessárias importações maciças de gêneros alimentícios, têxteis e, inclusive, armamentos, o que elevou muito a inflação iraniana. (HOBSBAWM, 2006, p. 440 apud PEREIRA, 2008, p.60)

O sentimento de frustação e revolta direcionado ao ditador Phalevi e aos EUA apoiava-se primeiramente na Crise de 1953 quando o primeiro-ministro Moahamed Mosadegh, líder escolhido pelo povo em uma eleição democrática contra Reza Phalevi, foi deposto do poder através de golpe militar arquitetado pelos americanos e pelo serviço secreto inglês, insatisfeitos com a nacionalização das petrolíferas promovida pelo dirigente iraniano. Em seu lugar, foi alçado ao poder novamente, Reza Phalevi. (TRAUMANN, 2015)

Segundo Traumann (2015), em 1962 o xá passou a demonstrar apoio à Israel, sendo recompensado com pesados investimentos vindos do Ocidente, mas sem encontrar acolhimento pelas massas iranianas, favoráveis aos palestinos. Ademais, os lucros adquiridos pelo governo, em vez de serem reinvestidos em programas sociais, eram utilizados para desenvolvimento de tecnologia militar. As consequências foram: o Irã se tornar o maior comprador bélico dos EUA, o êxodo rural pela falta de suporte a população mais necessitada, aumento das favelas em torno dos grandes centros urbanos e, principalmente, crescimento do abismo entre a elite (ocidentalizada) e os pobres (tradicionalistas). “À título de exemplo, às vésperas da revolução de 1979, apenas 1% da população concentrava 80% da renda privada do país”. (JORNAL DO BRASIL, 1979 apud TRAUMANN, 2015, p. 5).

Assim, o regime do ditador sofreu forte oposição de intelectuais, marxistas e religiosos, tornando-se cada vez mais autoritário e opressor. Em 1975, a polícia invadiu uma escola religiosa durante um protesto dos estudantes, atirou um deles do telhado, matando-o, e fechou a instituição em clara demonstração de que contestações não seriam toleradas. (TRAUMANN, 2015)

Neste contexto, diversos iranianos se voltaram para os líderes religiosos em busca de auxílio, dando eco cada vez maior a voz do Aiatolá Ruhollah Khomeini que havia sido preso em 1963 por ideias contrárias ao regime e exilado no Iraque. Posteriormente, a pedido do próprio xá iraniano, Khomeini foi expulso do país vizinho e encontrou exilio em Paris. (TRAUMANN, 2015)

Com desgosto para com os EUA e, consequentemente, tudo relacionado ao ocidente, a ideia de um governo islâmico total promovida pelo líder xiita da oposição ganhou a simpatia do povo e principalmente dos jovens, que eram influenciados a participar de manifestações contra o governo através de fitas- cassetes gravadas e enviadas da França. (PEREIRA, 2008)

Mas a atmosfera tensa entre governo e população só atingiu níveis críticos no final de 1977 com a morte por envenenamento de Mustafá, filho de Khomeini, no Iraque, e com a proibição de manifestações de luto no Irã. A suspeita era de que a Savak (polícia secreta iraniana) estava por trás de sua morte. (TRAUMANN, 2015). O cenário estava armado e qualquer faísca poderia dar inicio ao fim do regime ditador.

Foi o que aconteceu no ano seguinte, quando, em um erro crasso de estratégia, Reza Pahlevi mandou distribuir panfletos que acusavam o Aiatolah Khomeini de trabalhar para o serviço secreto inglês, pondo em dúvida sua moralidade. Isto fez com que milhares de estudantes saíssem às ruas em busca de liberdade de expressão e pedindo, dentre outras coisas, o retorno de Khomeini ao Irã. Depois, a morte de 400 pessoas em um incêndio de um cinema (também atribuída a Savak) e ainda a morte de mais 900 em um massacre contra a população que protestava, tornaram a revolução irrefreável. (TRAUMANN, 2015)

Com isso, em janeiro de 1979, sem resistir à pressão popular e com o retorno de Khomeini depois de quatorze anos vivendo fora, o ditador Xá Reza Phalevi fugiu para o Egito abandonando o cargo político. Em 11 de fevereiro do mesmo ano, caiu o último representante da monarquia, com a deposição do primeiro ministro Shapour Bakhtiar e a tomada do Palácio Imperial pelos rebeldes. As forças armadas recuaram para evitar serem aniquiladas pela insurreição e aderiram ao novo regime, que eliminou a cúpula de mando anterior, mas conservou o essencial da sua estrutura. Teve início um período de disputas internas pelo poder que envolveram a própria sucessão de Khomeini como condutor espiritual do país, fator que paralisou o processo de mudanças iniciado com a derrubada do Xá. Enquanto isso, as relações com os Estados Unidos foram fortemente abaladas (estudantes iranianos tomaram funcionários da Embaixada norte americana como reféns em protesto ao acolhimento de Reza Pahlevi em território americano) e Estados Unidos e Irã romperam suas relações diplomáticas. (OLIC, 1991)

Schilling (2011) elucida quanto a situação:

O exército dissolveu-se, assim como a Savak, a polícia secreta, e a Majlis, a assembléia dos deputados que sustentavam o regime deposto. Todo o sistema politico-militar iraniano, apoiado pelo Ocidente desde 1953, ruíra como um castelo de cartas, assombrado pela fúria das multidões que saíram as ruas de Teerã pedindo a cabeça do Xá. Porém, a euforia durou pouco. A luta eclodiu entre as várias agrupações de esquerda e os líderes

religiosos. Não demorou para que a balança se inclinasse para os aiatolás, os guias espirituais do povo iraniano. Enquanto isso a sociedade era varrida de cima a baixo de todos os símbolos que podiam identificá-la com os valores ocidentais. (SCHILLING, 2011)

Então, em 1979 estabeleceu-se uma República Islâmica no lugar da antiga monarquia, com leis conservadoras inspiradas no Islamismo e com o controle político nas mãos do clero. Este regime tinha como Chefe Máximo do Irã o Aiatolá Ruhollah Khomeini. Os Governos iranianos pós-revolucionários, criticaram o Ocidente e os Estados Unidos da América, em particular, pelo apoio dado pelo antigo líder. Assim, acordando com Schilling (2011):

A Revolução Iraniana de 1979 é a matriz do renascimento do fundamentalismo islâmico, seja de inclinação xiita ou sunita, no Oriente Médio e na Ásia Central. Desde 1979, com a derrota das forças do Xá da Pérsia e a ascensão do aiatolá Khomeini, uma visão mais estreita, teocrática, xenófoba e anti-moderna passou a imperar na região inteira. A vitória das massas iranianas, desarmadas, sobre um exército poderoso, municiado e treinado pelos Estados Unidos, infundiu uma notável confiança nos setores mais atrasados das sociedades islâmicas. Se tal feito era impensável, a vitória do movimento liderado pelos fundamentalistas alterou radicalmente as perspectivas. De minoritários, eles passaram a ser predominantes, tendo como inimigos os governos islâmicos que se propõem a colaborar com o Ocidente ou com a Rússia, e no fronte externo contra Israel, os Estados Unidos, a Rússia e a Índia.(SCHILLING, 2011).

Posteriormente, houve tentativas de exportar a Revolução Islâmica e apoio a grupos militantes anti-Ocidente, como o Hezbollah, do Líbano, mas a Revolução Islâmica de 1979 não gerou o tão temido efeito dominó do levantamento das massas, porém uma desconfiança dos países fronteiriços, a exemplo do Iraque que tinha boa parte da população xiita, e próximos. Atualmente, o Irã está plenamente ciente do seu isolamento internacional, o que o faz perseguir uma política de aproximação com os demais países da região, não sendo conveniente a criação de inimizades com seus vizinhos (INTERNATIONAL CRISIS GROUP, 2011 apud FRANCO, 2012; OLIC, 1991):

Após a Revolução antimonárquica de 1979, o Irã passou a ser considerado o maior inimigo dos países do Golfo, pois muitos deles alegaram haver sofrido tentativas iranianas de exportar a sua revolução. O Bahrain teria sido, inclusive, uma dessas supostas vítimas. (FRANCO, 2012, p. 21)

De acordo com o Estado, a Revolução Iraniana foi uma revolução islâmica, e não uma revolução xiita como muitos países árabes alegam.

Porém, para Franco (2012, p.13) “o país prefere projetar-se como um defensor do pan-islamismo em geral, sem sectarismos, colocando-se como inimigo apenas do imperialismo, dos Estados Unidos e de Israel”.

Além do distanciamento entre o Irã e o mundo ocidental, a crise política iraniana desorganizou todo o setor produtivo do Estado e acabou interferindo na produção de petróleo do país, importante membro da OPEP e segundo maior exportador da organização atrás da Arábia Saudita. Tal fato, associado ao início da Guerra Irã-Iraque, foi responsável pela chamada 2ª Crise do Petróleo, que fez o preço do barril saltar de US$ 5 o preço oficial para US$13,33 e depois, em 1980, para US$ 30. (SOUZA, 2003; PEREIRA 2008)

Quanto ao cenário mundial, considerando o ponto de vista econômico, é possível dizer também que o consequente Choque do petróleo de 1979 teve um motivo muito mais especulativo internacionalmente do que de mercado, uma que vez que a confirmação da revolução islâmica no Irã e a suspensão do abastecimento devido a greves de operários contra o regime, causaram medo de que houvesse falta de abastecimento de petróleo no futuro e, assim, uma compra excessiva da

commodity por parte dos países consumidores e das grandes indústrias. Essa

aquisição além do consumo previsto, associada à especulação, levou a mais um exacerbado aumento de preços. (SOUZA, 2003) Aborda Souza (2003):

No começo de 1979 o petróleo iraniano começou a voltar ao mercado mundial, embora em níveis menores que antes. Nesse mesmo ano a produção da OPEP estava de volta aos 31 milhões de barris diários, o que mesmo computando a interrupção da produção iraniana, era de 3 milhões acima da média de 1978. (SOUZA, 2003, p. 42)

As alterações ocorridas no Irã não só foram determinantes para definir as diretrizes do país dali em diante, mas para consolidar o antigo rival, Arábia Saudita, como grande parceiro dos americanos no Oriente ao lado de Israel. (CAIRUS, 2015)

A partir de 1980, o Irã e o Iraque enfrentaram-se numa guerra destruidora que durou oito anos e pôs em risco tanto o abastecimento mundial de petróleo quando o equilíbrio político internacional.

No documento Irã X Arábia Saudita (páginas 53-58)

Documentos relacionados