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1 INTRODUÇÃO: SUSPENDE A BANDEIRA E VAMOS TRABALHAR

2 DOS CAMINHOS CRUZADOS, ENTRE SAGRADOS E PROFANOS: O NORTE (N)

2.4 RUMOS À GEOGRAFIA: O QUARTO GRÃO DE AREIA

Em 2011, ingressei na UFSM como professor substituto pela disciplina de Jogo Teatral I e II27 destinadas aos cursos de Pedagogia e Educação Especial.

Foram dois anos de experiência em docência universitária que possibilitaram uma segurança e um dinamismo maior de minhas práticas unindo as artes cênicas e a educação. Neste período, os desafios de estar frente aos alunos de um curso universitário eram superados ao propor encontros descontraídos e diversificados. O processo criativo em meio a alegria eram os principais fundamentos utilizados em aulas e isso facilitou a compreensão dos conteúdos discutidos.

27 Disciplinas ofertadas aos Cursos de Graduação, Pedagogia e Educação Especial, ambos pelo Centro de Educação, na Universidade Federal de Santa Maria/RS.

Percorridos os dois anos, em março de 2013, encerrava minha participação como docente na UFSM, mas carregava comigo e com todos aqueles alunos o carinho e a saudade das nossas aulas. Entre estes encontros me recordo dos seguintes momentos: das aulas realizadas nos gramados da universidade; das pesquisas de campo como exercício de aula realizado pelos alunos motivados a conhecerem e entrevistarem grupos de teatro da cidade de Santa Maria e do próprio curso de Artes Cênicas; das apresentações teatrais realizadas no final de cada semestre; dos exercícios de relaxamento corporal; das trilhas noturnas que fazíamos pelo campus entre outros momentos. Enfim, foi um período de criação, de trocas de conhecimentos, de aprofundamentos.

Os anos foram passando, as pesquisas e leituras continuavam e a vontade de fazer uma pós-graduação ainda se mantinha como meta. O interesse em investigar algo relacionado às minhas práticas de vida, assim como meus pensares, foram combustíveis para acreditar que era possível pesquisar um assunto relevante não apenas para si, mas para a sociedade. Nesse período, a religiosidade estava mexendo com meus sentidos, logo buscava na cultura umbandista uma identificação mais concreta sobre minhas ancestralidades africanas e sobre a presença de um corpo envolvido pela manifestação de espíritos e principalmente pelo entendimento da palavra fé.

O processo seletivo para concorrer ao mestrado foi lançado pelo programa de pós-graduação no curso de Geografia no segundo semestre de 2016. Logo, acreditava que naquele momento era o incentivo necessário de que eu precisava para dar continuidade aos estudos. Todavia, minhas reflexões eram encaminhadas para uma investigação que realmente me incentivasse a ler e a escrever e, além disso, de me colocar como sujeito investigador e fazer daquele estudo um veículo de informação e conhecimentos culturais.

O período de preparação para ingressar no mestrado foi marcado por muitas inseguranças e questionamentos, visto que não sou graduado na área, mas que por compatibilidade de projeto junto à pesquisa do provável orientador, tornaram-se fundamentais para esse sonho se efetivar. O desafio de compreender os conceitos de uma área em que se desconhece, talvez, seja o primeiro dos muitos obstáculos que estavam por vir. Em minhas memórias, quando chegava a palavra ‘geografia’, recordava-me exclusivamente de mapas e suas escalas, o clima, a vegetação, o relevo, a bacia hidrográfica, os estados, os países, as capitais e os números de

habitantes de determinados povos. Entretanto, a geografia cultural era muito distante de meus pensamentos, todavia, foi cerne principal para sustentar a proposta de pesquisa lançada ao programa de mestrado.

Retornar a frequentar aulas, pesquisar, ler, discutir em sala de aula e nos corredores eram necessidades que eu tinha depois do período como discente da graduação que, embora tenha participado de disciplinas como aluno especial em outros cursos de pós graduação, foi no mestrado que busquei a pluralidade de um olhar cuja interdisciplinaridade28 se fez presente em meio às leituras, escritas e

diálogos. A maturidade de enxergar o mundo com percepções diferenciadas foram possibilidades de adentrar nas ciências geográficas com uma bagagem de conhecimentos vindos das artes e da educação.

As disciplinas cursadas no mestrado trouxeram-me contribuições para meus saberes e foram fundamentais para as compreensões no tocante ao surgimento das ciências geográficas. Entretanto, para este estudo, os conteúdos estudados foram por mim canalizados especificamente à geografia cultural justificando o embasamento teórico dessa pesquisa. Nesse viés, busquei me aproximar do entendimento sobre o fenômeno urbano, bem como investigar as relações existentes entre sujeito, espaço e corpo.

Como falarmos sobre cultura na cidade, sobre identidades, representações se não tivermos uma forma prática de entendimento? Penso que as idas a campo e o exercício proporcionado, em algumas disciplinas do mestrado, romperam paradigmas que até então acreditava. Para cada campo visitado, uma paisagem era construída e as singularidades destas paisagens me reportaram para uma desconstrução de análise física e empírica do conceito de cidade29.

É o meu corpo que habita no espaço ou é o espaço que habita o meu corpo? A observação pelas formas transmutáveis de se viver em sociedade, em detrimento de um tempo em que o passado é a causa do presente, trouxeram entendimentos sobre a importância de se falar sobre um corpo que vive e é agente modificador da cultura citadina. O olhar do etnógrafo exercitado, em uma das disciplinas, possibilitou a aproximação desses meus desvelamentos do quão importantes é

28 Essa pesquisa, apesar de estar centrada nas Ciências Geográficas, ela tem caráter interdisciplinar pois abarca conhecimentos de outras áreas do conhecimento, como artes, história, filosofia, educação e antropologia.

29 Santos, 2008: Metamorfoses do espaço habitado: fundamentos teóricos e metodológicos da geografia.

refletir-pensar os sentidos e as percepções corporais a partir de uma determinada cultura.

A compreensão pelas categorias da Geografia foi fundamental para a compreensão do desenvolvimento científico e epistemológico dessa ciência. Eis o grande combustível do “ser” estudante: a descoberta pelo novo. A partir de agora não havia apenas a visão do comportamento humano pelo prisma artístico, mas, sim, a visão do ser-geógrafo. A partir desse momento, as leituras tomaram formas, focos, dimensões e interrogações. Um emaranhado de conceitos desalinhava-se com o tempo a partir da busca do foco de investigação. Os métodos e diretrizes pelo entendimento de uma geografia cultural iriam ao encontro de algo mais específico e ainda pouco discutido: a geografia da religião.