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Saindo do papel: aplicação do protocolo na Região Metropolitana de Campinas

testado em quatro municípios da RMC. Conforme mostra o Apêndice II o resultado geral para os quatro municípios é apresentado na Figura24. O objetivo não é comparar os quatro municípios por isto a análise será realizada para cada um em separado.

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Figura 24. Resultado da aplicação do protocolo de análise

O município de Santo Antônio de Posse no ano de 2013 não realizou compras de alimentos da AF, nem realizou nenhuma atividade de incentivo à participação dos agricultores (nem mesmo o lançamento de chamada pública). Por isto que Programa deste município em tese poderia contribuir muito pouco para o desenvolvimento local. Mesmo a participação do CAE só ocorre em poucas atividades durante o ano. O município consegue contribuir à SAN de forma modesta já que garantiu todos os recursos financeiros para a alimentação escolar nos 200 dias letivos e cumpriu o cardápio elaborado.

O município possui um responsável técnico, mas ainda há poucas atividades de educação alimentar, apesar de ter identificado o Pnae como uma atividade de grande importância para o desenvolvimento não só dos estudantes mas de toda a sociedade. O município precisa avançar muito em relação às compras e inclusão dos agricultores e da sociedade civil na execução do Programa. Portanto, tem Grau 2 de contribuição, já que possui um Programa de Alimentação Escolar, mas ainda não atende as normatizações do Programa e contribui pouco para o desenvolvimento local e para a SAN. Mas para o ano de 2015 está previsto o lançamento de uma chamada pública. Neste sentido é importante que os municípios trabalhem para a efetivação da compra de alimentos para a alimentação escolar de agricultores familiares como evidencia o discurso do extensionista:

Vinhedo

Santa Bárbara d’Oeste Campinas

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Primeiro, não precisa ser apenas produtores do município. Se não tem, que busque! Ele seguiu mesmo todos os passos? Fez uma chamada local? Depois na região. O produto que ela previu, tem na região? Ela articulou junto com alguém? Onde ela colocou está chamada? Ele procurou a Cati, o Itesp, as próprias cooperativas de produtores. Do jeito que eles lançam muitas chamadas não dá para acontecer. É uma chamada excludente (Extensionista1, 2014).

Campinas, recebeu Grau 3, já que o município possui um Programa de Alimentação Escolar que atende as normatizações do Programa e começa avançar em atividades que contribuem para o desenvolvimento local e à segurança alimentar. Campinas já compra dos agricultores familiares (38% dos recursos em 2013), mas em 2013 só comprou alguns produtos estocáveis da agricultora familiar, perdendo ponto na variável de diversidade de itens. Isto pode estimulara produção intensiva de alguns alimentos “restringe o leque de opções de oferta e, portanto, de consumo, podendo, assim, limitar a diversidade alimentar e a riqueza cultural ligada à alimentação” (ROCHA, 2013, p.91).

O estímulo à produção agrícola local ainda não é realizado (assistência técnica, capacitações etc). O apoio dado aos agricultores familiares ocorre de maneira muito tímida e eles não participam do processo de execução do Programa. O CAE em Campinas tem um papel tímido já que em 2013não realizou nenhuma visita às escolas. Por ser um município muito grande, as quantidades requeridas de alimentos são enormes junto com as entregas (pontoaponto) acabam inviabilizando a entrada de produtores familiares que não possuem todo o aparato logístico. A parceria entre a prefeitura e a Ceasa-Campinas (Centrais de Abastecimento de Campinas – SA) nas últimas décadas tem contribuído para o desenvolvimento do Programa no município podendo ser mais um elo entre os agricultores e gestores do Programa. O município precisa ir além das normatizações tentando incluir os agricultores na execução do Programa e trabalhando de forma integrada com outras secretarias e programas do município como evidencia a fala do extensionista:

A prefeitura tem que pensar em conjunto. Que o trabalho fosse minimizado para o produtor. Hoje o peso, como é colocado, está ficando tudo para o produtor. Ele tem ficado com o peso da logística, com o peso burocrático e às vezes por um valor não muito interessante (Extensionista1, 2014).

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O Programa de alimentação escolar de Santa Bárbara d’Oeste também recebeu Grau 3. No município os agricultores participam da execução do Programa de forma mais efetiva. O município só não avança para o Grau 4 pois ainda não há atividades de apoio aos agricultores em infraestrutura logística e produtiva, ou em capacitações e assistência técnica rural. No caso das compras, há diversidade de produtos comprados (tanto estocáveis como perecíveis). O CAE poderia atuar de forma mais efetiva e outras secretarias e órgãos do município poderiam participar da execução do Programa.

Nestes aspectos (inclusão produtiva) a política está caminhando muito bem, conseguindo chegar nestes objetos, voltar a ter uma produção local de alimentos e de desenvolver a própria organização dos agricultores. Nos projetos de Microbacia a cada 10 projetos, 9 falam de Pnae, PAA e Ppais (Extensionista 1, 2014).

O Programa de Vinhedo recebeu Grau 4, mas ainda não atingiu as notas máximas dos eixos. Apesar de avançar bastante na execução de seu programa e conseguir trabalhar de forma integrada, contribuindo bastante para os dois eixos, há alguns pontos que o município não conseguiu alcançar a pontuação máxima, como a compra de produtos orgânicos e ou agroecológicos. O que predomina atualmente no Brasil é um modelo produtivo que possui impacto nas condições de saúde e nutrição pelo uso indiscriminado de agrotóxicos. Acrescenta-se a isto a sustentabilidade ecológica e social do sistema agroalimentar (ROCHA, 2013).

A concepção de alimento adequado remete não apenas à perspectiva da saúde individual, mas também ao tema da saúde ambiental. O sistema de produção e consumo de alimentos tem um grande impacto ambiental à erosão do solo, a contaminação das águas, o desflorestamento e perda da biodiversidade são somente alguns desses impactos. Esse impacto na meio ambiente é tão significativo que já chega a ameaçar a capacidade de esse mesmo sistema continuar alimentando o mundo (ROCHA, 2013, p. 73).

No caso deste município, Vinhedo, a integração com outras secretarias e programas foi fundamental para a inclusão dos agricultores do próprio município na implementação e execução do Programa. Os gestores reconhecem a importância desta integração para a qualidade do Programa.

Os produtos deles (agricultores) são melhores. As merendeiras já falam: se for alface dos agricultores não precisa enviar a mesma quantidade de

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pés que do fornecedor. O alface deles é maior e não desperdiçamos quase nada (Gestor 7, 2014).

As atividades junto com a Secretaria de Saúde de Vinhedo já identificaram que atualmente um dos problemas de saúde dos estudantes é a obesidade. A importância desse fator na condição de SAN tem sido evidenciada por estudos que indicam que “pela primeira vez na história humana, o número de pessoas obesas compete com o número de pessoas desnutridas” (ROCHA, 2013, p.72 e 72).

Se eu for tirar tudo que eles não gostarem, não vai ter salada, não vai ter nada, só macarrão com salsicha (Gestor 7, 2014).

Nota-se nos diferentes municípios que o que falta é acesso a alimentos por uma parte da população (em quantidade e qualidade), já que esta se encontra em um País que produz e dispõe de alimentos em quantidade suficiente. O Pnae contribui para acesso a alimentos e os agricultores familiares podem contribuir com o quesito “qualidade” fornecendo alimentos frescos e isentos de agrotóxicos.

Uma parte dos entrevistados (agricultor e extensionista) evidenciou a extrema importância dos agricultores serem incluídos na execução do Pnae em todos os municípios brasileiros. Em sua fala, o extensionista acrescenta que os gestores municipais ainda não vêm o CAE como um parceiro na execução do Programa.

No início, faltava articulação. Era um processo novo. O Agricultor não sabia o que era a nutricionista e a nutricionista não sabia o que era o agricultor. Hoje, falta uma ação efetiva com quem não faz. Pois hoje em dia tem seminário, tem informação. Não tem uma ação efetiva, como por exemplo cortar, ou notificar, não tem uns trabalhos com os CAEs. Poucos CAEs são verdadeiramente atuantes. A maioria é chapa branca, está lá para assinar. Você não vê chamando a responsabilidade destes membros (Extensionista1, 2014).

O que determina a situação alimentar e nutricional de uma população são fatores complexos e multidimensionais. Assim, os conceitos de SAN devem ser implementados em uma ótica setorial o que implica em mudanças de lógica da atuação dos setores, no diálogo entre eles, na construção de uma concepção compartilhada de SAN na construção de programas e políticas. Assim, ações e projetos do Pnae devem ser planejados de forma

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integrada e intersetorial. Neste caso é importante que o governo em seus diferentes níveis sejam facilitadores “em vez de somente controladores e/ou provedores de recursos” (ROCHA, 2013, p. 80). Apenas a criação dos mercados institucionais pelo governo, como o caso da alimentação escolar, não é suficiente para garantir as vendas para os agricultores. Muitos não possuem meios para acessarem estes mercados já que não conseguem produzir ou quando produzem não possuem produtos dentro das especificações, não possuem o aparato logístico para entregar ou nem mesmo possuem os pré-requisitos para entrarem na disputa pelas vendas (DAP, nota fiscal etc).

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta dissertação teve como objetivo central propor uma análise, baseada em indicadores, que possibilitasse verificar em que grau o Pnae, através da aquisição de gêneros alimentícios produzidos pela agricultura familiar, está contribuindo para o desenvolvimento local e a para a segurança alimentar e nutricional de agricultores familiares e para os estudantes da rede pública de ensino.

Destaca-se, nessas considerações finais, os elementos centrais relacionados à segurança alimentar e nutricional e ao desenvolvimento local na execução do Pnae. Retomam-se, também, as questões consideradas centrais do protocolo de análise proposto para o Programa. Ao mesmo tempo, elaboram-se algumas sugestões para o seu aprimoramento que possam ser utilizadas pelos gestores do Programa.

O estudo indicou a importância do Pnae para a segurança alimentar das pessoas atendidas, seja pela garantia de acesso regular dos estudantes a alimentos, seja pela renda dos agricultores que não só podem ter a venda de seus produtos assegurada (garantia de renda) ou, até mesmo, podem investir em suas atividades produtivas.

O Pnae tem a possibilidade de repercutir nas condições de segurança alimentar e nutricional de diferentes formas, no acesso de alimentos, na garantia da diversidade e da qualidade destes alimentos. As principais repercussões do Pnae na alimentação dos estudantes referem-se ao acesso regular a alimentos, ao aumento da variedade de alimentos, bem como no consumo de alimentos que não são habituais aos estudantes.

Em algumas localidades o Pnae é a maior fonte de segurança de uma alimentação básica aos estudantes. Em outras, ele é uma possibilidade de aumento ou inclusão de alimentos como frutas, verduras, legumes e carnes considerados “supérfluos” ou economicamente inacessíveis pelas famílias.

De outro lado, há um desafio com o aumento da prevalência de excesso de peso e de obesidade dos alunos. Assim, o Pnae tem um papel essencial não apenas na promoção de alimentação saudável (acesso de refeições de qualidade que priorizem os alimentos in natura), mas na recomendação de ações educativas com o tema da segurança alimentar e nutricional.

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Sabe-se que os agricultores familiares são ao mesmo tempo produtores e consumidores de alimentos. O Pnae ao comprar desses agricultores, acaba não apenas apoiando sua produção, mas pode contribuir para a melhoria simultânea tanto no consumo alimentar da família quanto na oferta local de alimentos. Nesse sentido, recomenda-se, um maior apoio a estes agricultores e reforço nos programas de assistência técnica e extensão rural.

Nos municípios estudados verificou-se que poucos cumpriram o percentual mínimo de 30% para a compra de produtos da agricultura família. Também são necessárias intervenções que promovam a aproximação dos agricultores familiares e dos gestores locais do Pnae.

Outro aspecto mencionado é o fato de que na maioria dos municípios a entrega pelos agricultores familiares ainda é feita “ponto a ponto”, ou seja, em cada escola, inviabilizando a participação dos agricultores que não possuem condições logísticas para entregarem em diversos locais de um município. A criação e a forte ampliação dos centros de distribuições de alimentos para a alimentação escolar nos municípios é um passo fundamental para viabilizar a participação dos agricultores e de suas organizações.

Nos municípios estudados da RMC, a implementação do Pnae não ocasionou a inclusão de agricultores em situação mais frágil, em termos produtivos e financeiros, os que acabaram se beneficiando do Programa foram agricultores que já possuíam uma situação de destaque em relação a outros agricultores familiares. Dessa forma, constata-se a necessidade de estabelecer, não só na RMC pois este fato se perpetua por todo Brasil, mecanismos efetivos de implementação do Pnae, inclusive atividades de controle social. Não basta criar leis e resoluções e informar decisões aos atores, é necessário incluir a participação de todos (inclusive dos agricultores) em todas as etapas decisórias relativas à implementação, operacionalização e gestão do Programa em cada município.

Os resultados e contribuições do Pnae acontecem de forma difusa sendo complexo analisar seus resultados em apenas uma localidade. Os municípios acabam comprando de agricultores de outros municípios, regiões ou estados e assim parte das contribuições do Programa de um município pode estar acontecendo a centenas de quilômetros de distância.

O protocolo de análise proposto foi testado em 4 municípios e se mostrou satisfatório no cumprimento de seus objetivos. Todavia, para a efetiva avaliação do

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protocolo, outros testes devem ser realizados em outras realidades para verificar sua adaptação e consistência. Sua aplicação em outros municípios também é importante para sua validação estatística, já que no momento desta pesquisa não possuía a quantidade de amostra necessária para realizar uma análise multivariada do conjunto de indicadores e das variáveis que o compõe.

Na análise dos resultados da aplicação do protocolo na Região Metropolitana de Campinas, a constatação foi sobre a dificuldade de criar indicadores que se adequassem à diversidade de situações em que o Pnae está inserido. Os gestores do Programa já tinham apontado nas entrevistas que uma das recomendações a se fazer era estabelecer uma maior flexibilidade das regulamentações existentes para contemplar as especificidades encontradas em cada um dos municípios brasileiros.

A segunda constatação foi o baixo grau de engajamento dos gestores locais na execução de todas as atribuições do Programa. Não só é necessário maior força de vontade por parte dos gestores, mas também capacitação e provimento de melhores condições de infraestrutura para os gestores do Programa. Uma parte dos gestores fica muito atrelada apenas ao cumprimento das regulamentações existentes e não dão um passo além no sentido de realmente promover o desenvolvimento local e a segurança alimentar e nutricional através da compra de alimentos dos agricultores familiares.

A terceira constatação foi a grande dificuldade dos gestores locais em estabelecer práticas multi e intersetoriais na implementação e execução do Programa. Esta dificuldade deve acontecer em todos os níveis (federal, estaduais e municipais), todavia é no nível municipal que estas práticas precisam ser realizadas mais efetivamente pois é neste nível que ocorre a execução do Programa. Assim, propõe-se que já na composição do CAE e na gestão do Programa se tente criar e estimular a participação e articulação de membros de diversas áreas e funcionários das diferentes secretarias e órgãos do município que poderiam estar envolvidos com o Programa. A execução do Pnae exige ampla articulação, não podendo ficar restrita a uma única secretaria ou órgão do município.

Durante as entrevistas, gestores e agricultores demonstraram o desconhecimento de diversos aspectos do Programa. A contraposição entre os dados primários e secundários também demonstraram contradições entre as respostas dos gestores municipais e do CAE.

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Nesse sentido, recomenda-se a melhoria da comunicação e do envolvimento entre os diferentes públicos que precisam ser informados sobre a execução do Programa.

Pelo que foi apresentado neste estudo, conclui-se que o Pnae possui um papel importante na provisão de SAN, bem como de desenvolvimento local. No entanto, as maiores contribuições do Programa dependem fundamentalmente da integração de sua execução com outras atividades, programas e políticas e da participação efetiva e atuante da sociedade civil.

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