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Desenvolvimento local e segurança alimentar e nutricional no Programa Nacional de Alimentação Escolar : um método de análise

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE ENGENHARIA AGRÍCOLA

ERIKA DE SOUZA OLIVEIRA

DESENVOLVIMENTO LOCAL E SEGURANÇA ALIMENTAR E

NUTRICIONAL NO PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO

ESCOLAR: UM MÉTODO DE ANÁLISE

CAMPINAS

2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE ENGENHARIA AGRÍCOLA

ERIKA DE SOUZA OLIVEIRA

DESENVOLVIMENTO LOCAL E SEGURANÇA ALIMENTAR E

NUTRICIONAL NO PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO

ESCOLAR: UM MÉTODO DE ANÁLISE

ORIENTADORA: Profa. Dra. JULIETA TERESA AIER DE OLIVEIRA

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL

DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA ERIKA DE SOUZA OLIVEIRA, E ORIENTADA

PELA PROFA. DRA. JULIETA TERESA AIER DE OLIVEIRA

CAMPINAS

2015

Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Mestra em Engenharia Agrícola, na Área de Planejamento e Desenvolvimento Rural Sustentável.

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.

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca da Área de Engenharia e Arquitetura Elizangela Aparecida dos Santos Souza - CRB 8/8098

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Local development and food security in the National School Feeding Programme : a methods of analysis

Palavras-chave em inglês: Public policies

Family farming

Metropolitan Region Campinas

Área de concentração: Planejamento e Desenvolvimento Rural Sustentável Titulação: Mestra em Engenharia Agrícola

Banca examinadora:

Julieta Teresa Aier de Oliveira [Orientador] Walter Belik

Vanilde Ferreira de Souza Esquerdo Data de defesa: 25-02-2015

Programa de Pós-Graduação: Engenharia Agrícola Oliveira, Erika de Souza, 1986-

OL4d Oli Desenvolvimento local e segurança alimentar e nutricional no Programa

Nacional de Alimentação Escolar : um método de análise / Erika de Souza Oliveira. – Campinas, SP : [s.n.], 2015.

Oli

Orientador: Julieta Teresa Aier de Oliveira.

OliDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de

Engenharia Agrícola.

Ol

i1. Políticas públicas. 2. Agricultura familiar. 3. Região Metropolitana de Campinas. I. Oliveira, Julieta Teresa Aier de. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Engenharia Agrícola. III. Título.

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RESUMO

Este trabalho teve como objetivo propor uma análise que possibilitasse verificar como o Programa Nacional de Alimentação Escolar está contribuindo para o desenvolvimento local e a para segurança alimentar e nutricional de um município. A análise foi realizada a partir de indicadores, cuja construção baseou-se nos sistemas de prestação de contas e monitoramento já utilizados na gestão e avaliação do Programa. O protocolo de indicadores concebido foi testado em quatro municípios da Região Metropolitana de Campinas. Na concepção deste protocolo buscou-se contemplar as diretrizes do Programa, reunindo aspectos reconhecidos como essenciais que traduziam seus objetivos e princípios. Espera-se que com o resultado desta análise, gestores possam elaborar recomendações para a melhoria das ações do Programa principalmente no cumprimento das atividades relacionadas às compras da agricultura familiar. A expectativa é que a metodologia proposta possa ser testada em outras realidades e ajustada no futuro, de forma a viabilizar uma avaliação sistemática e abrangente e, portanto, o aperfeiçoamento contínuo do Pnae. Espera-se que esta pesquisa contribua fornecendo subsídios aos atores e gestores envolvidos no Pnae nos níveis de decisão, gestão e operacionalização.

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ABSTRACT

The present dissertation had the main purpose of analysing how the National School Feeding Programme contributes in the local development and in the food and nutritional security of a certain municipality. The analysis was based in indicators and built up making use of the accountability and monitoring systems already being used by the management of the Programme. The framework and indicators were tested in four municipalities in the Metropolitan Region of Campinas. In the conception of the indicators, the guidelines of the Programme were utilised ensuring that the essential aspects of the Programme were present. It is expected that, with the outcomes of this analysis, managers will be able to make recommendations aimed to improve the Programme, especially in regard to the activities of institutional procurement from family farmers. It is also expected that the proposed methodology can be tested in other realities and, adjusted into a possible systematic evaluation which could provide a continued improvement of the Programme that could make it possible a systematic avaliation. This research is hoped to contribute with subsidies to the main actors and management involved in all the decision making and implementation levels of the National School Feeding Programme.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 1

2 CAMINHOS TEORICOS ... 5

2.1 Da fome ao aprender a comer: O Programa Nacional de Alimentação Escolar... 5

2.2 O detalhe que faz a diferença: Segurança Alimentar e Nutricional na Alimentação Escolar ... 9

2.3 Agricultura Familiar: beneficentes ou beneficiários? ... 13

2.4 Desenvolvimento local: muito além de uma escala espacial... 16

2.5 O desenvolvimento local segundo Anthony Bebbington ... 20

2.6 Os Sistemas de avaliação do Pnae ... 24

3 CAMINHO METODOLÓGICO ... 31

3.1 Focalização da pesquisa: contribuições para quem e onde? ... 32

3.2 Desenvolvimento da Análise: Construção do Protocolo de indicadores ... 34

3.2.1 Fase exploratória da pesquisa: O que já se tinha à mesa!!! ... 34

3.2.2 Criação dos indicadores e das variáveis ... 35

3.2.3 Levantamento de Campo ... 38

3.2.3.1 O Formulário de Pesquisa ... 38

3.2.3.2 Outras entrevistas ... 38

3.2.3.3 Teste do Protocolo de Análise ... 40

4 RESULTADOS ... 43

4.1 Caracterização da RMC: Análise do repasse do FNDE e a agricultura na região ... 43

4.2 Um, dois, feijão com arroz, três, quatro verificar os resultados: o parecer dos Conselhos de Alimentação Escolar ... 52

4.3As compras na RMC: Cadê os agricultores que estavam aqui? O gato comeu! ... 56

4.4 Um protocolo de análise do Pnae baseado em indicadores ... 67

4.4.1.Construção dos Indicadores ... 70

4.5 Saindo do papel: aplicação do protocolo na Região Metropolitana de Campinas ... 89

5. REFERÊNCIAS ... 99

APÊNDICE I ... 107

APÊNDICE II ... 111

ANEXO I ... 123

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À Sirley, pelo privilégio e orgulho de tê-la como mãe.

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AGRADECIMENTOS

À minha outra metade, minha família. Aos meus pais pelo amor incondicional. Aos meus irmãos por serem meu espelho e meu avesso. Amo vocês!

Nunca saberei como agradecer à minha querida orientadora Julieta Teresa Aier de Oliveira. Com ela me senti como uma criança sendo lançada para alto. Pude sonhar e flutuar sabendo que não cairia, braços firmes e carinhosos estariam lá para me pegar. Ju, o caminho foi mais fácil e prazeroso com você ao meu lado. Este trabalho também é seu!

Muito obrigada a minha eterna professora, Sonia Bergamasco. Obrigada por repartir seus conhecimentos, vivências, experiências, e nos fazer acreditar que somos capazes de transformar sonhos em realidade.

Obrigada a Vanilde Ferreira de Souza Esquerdo e Anne Walleser Kepple pelo carinho e considerações durante minha banca de qualificação (e defesa). Obrigada ao professor Walter Belik pelas considerações e apontamentos durante a defesa.

Agradeço também todos os professores e pesquisados Profª Dra Maristela Simões do Carmo, Prof° Dr. Ricardo Serra Borsatto, Profª Dra Ana Paula Fraga Bolfe, Profª Dra Regina Aparecida Leite de Camargo e Dra Valeria Comitre.

À Marcinha, Kellen e Giovana pelo carinho, incentivo e pela contribuição ao meu enriquecimento pessoal e profissional.

Ao Centro de Excelência contra a Fome do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas, especialmente ao Daniel Balaban, Cinthya Jones e Christiane Buani. Obrigada não só por acreditarem no meu potencial, mas também por me proporcionarem uma das melhores aventuras da minha vida. Agradeço também a Nadia Goodman, Sharon Freitas, Vinicius Limongi e a Flavia Lorenzon pelo apoio.

À Ana Coimbra que me deu um lar (e um “cão”) em Conakry. Merci, a Catherine e Liliane por toda amizade e apoio em Niamey. Com vocês foi mais fácil subsistir ao Ramadã.

Ao Jérôme por todo o amor e companheirismo, por ver apenas o melhor em mim. Je t’aime! À Cinthia Maria pela amizade de quase 20 anos. À Eli pela amizade e por ter me dado à afilhada mais linda do mundo!

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Com muito carinho agradeço ao Lori, Lourival Fidelis. Que nossa amizade se perdure por muitos e muitos anos e que possamos contar um com o outro sempre.

Aos colegas de trabalho e luta, em especial, ao Wilon por todo apoio já no Vivência Agrária em 2007, à Taísa, Ana Luisa e Francine pela amizade. À Suzana por ter me dado a oportunidade de “relaxar” nas segundas! Ao Fer pelas palavras sempre sábias!

À Coordenação Geral do Programa Nacional de Alimentação Escolar, na figura de sua coordenadora Albaneide Peixinho, pela concessão dos dados. Agradeço a Julia Souza pelo apoio cuidadoso e paciente fornecido. Um Obrigada ao Cecane da Ufop.

À todos que cederam uma parte de seu tempo para construção deste trabalho. Agradeço aos funcionários da Feagri, principalmente a secretária de Pós-Gradução. À Unicamp, minha segunda casa, pelos 20 anos de convivência.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Situação de Segurança Alimentar da população residente de até 18 anos, em domicílios

particulares (milhões de pessoas). ... 12

Figura 2. Aporte analítico para o desenvolvimento local proposto por Bebbington. ... 23

Figura 3. Execução Financeira do Pnae ... 25

Figura 4.Passo a Passo da Prestação de Contas do Pnae ... 27

Figura 5. Representação do resultado final ... 36

Figura 6. Amostragem da pesquisa ... 41

Figura 7. Localização da Região Metropolitana de Campinas e de seus municípios no estado de São Paulo. ... 43

Figura 8. População e IDHM dos municípios da RMC. ... 46

Figura 9.Valores do repasse do FNDE ao Programa Nacional de Alimentação Escolar nos municípios da RMC. ... 48

Figura 10.Estratos de número de agricultores familiares por município da RMC. ... 49

Figura 11. Quantidade de DAPs Físicas e Jurídicas na RMC em março 2013. ... 50

Figura 12. Municípios cujo valor do repasse do FNDE é inferior (vermelho) ou superior (amarelo) a R$ 700.000,00. ... 51

Figura 13. Ações promovidas para Educação Alimentar e Nutricional na RMC, 2013. ... 53

Figura 14. Itens de infraestrutura que os municípios disponibilizaram ao CAE na RMC, 2013. ... 54

Figura 15. Periodicidade das visitas dos CAE às escolas na RMC, 2013. ... 55

Figura 16. Número de municípios da RMC por atividade que possuem programas que atuam de forma integrada com o Pnae, 2013. ... 55

Figura 17. Porcentagem dos recursos gastos do Pnae com aquisição de gêneros da agricultura familiar nos municípios da RMC, 2013. ... 57

Figura18. Diagrama dos agricultores e cooperativas que venderam para a Região Metropolitana de Campinas em 2013. ... 61

Figura 19. Percentagem na composição societária dos agricultores das cooperativas que participam do Pnae na Região Metropolitana de Campinas segundo Grupos de Beneficiários do Pronaf. ... 63

Figura 20. Analogia com a pirâmide alimentar: porcentagem de gastos com os grupos de alimentos. . 66

Figura 21. Principais formas de acesso à alimentação pelas famílias beneficiadas do Bolsa Família. .. 67

Figura 22. Esquema da análise das contribuições do Pnae ao desenvolvimento local e à segurança alimentar e nutricional. ... 69

Figura 23. Protocolo de análise – localização de cada grau. ... 81

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LISTA DE TABELAS

Tabela1.Relação dos atores-chave entrevistados, localização e caracterização dos entrevistados. ... 39

Tabela2. Produção vegetal da RMC por área e unidades de produção agropecuária3 ... 44

Tabela 3. Estrutura Fundiária da RMC. ... 45

Tabela 4. População total e valor de repasse do Pnae para cada municipalidade da RMC. ... 46

Tabela 5. Lista das cooperativas que venderam gêneros alimentícios ao Pnae no ano de 2013 na Região Metropolitana de Campinas. ... 59

Tabela 6. Lista de itens comprados da agricultura familiar. ... 64

Tabela 7. Bloco de Indicadores 1 -Informações gerais da execução do Pnae. ... 71

Tabela 8. Bloco de Indicadores 2 -Recursos financeiros aplicados. ... 72

Tabela 9. Bloco de Indicadores 3 - Monitoramento do CAE. ... 73

Tabela 10. Bloco de Indicadores 4–Oferta de alimentos e Cardápio. ... 74

Tabela 11. Bloco de Indicadores 5 -Compras da Agricultura Familiar. ... 76

Tabela 12. Bloco de Indicadores 6 - Apoio à agricultura familiar. ... 78

Tabela 13. Bloco de Indicadores 7 -Atividades de educação alimentar e nutricional. ... 79

Tabela 14. Bloco de Indicadores 8–Multisetorialidade do Pnae. ... 79

Tabela 15. Bloco de Indicadores 9 -Capacitações dos atores do Pnae. ... 80

Tabela 16. Propensão dos indicadores para contribuir para as dimensões de análise. ... 83

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AE – Alimentação escolar

AF – Agricultura familiar

ATER - Assistência Técnica e Extensão Rural CAE - Conselho de Alimentação Escolar CEASA - Centrais de Abastecimento CME - Campanha de Merenda Escolar

CNAE - Campanha Nacional de Alimentação Escolar CNME - Campanha Nacional de Merenda Escolar

Consea - Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional DAP - Declaração de Aptidão ao Pronaf

DHAA - Direito Humano à Alimentação Adequada DL – Desenvolvimento Local

DP - Dado primário DS - Dado secundário

EBIA - Escala Brasileira de Insegurança Alimentar EE – Entidade executora

FAO - Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura Fisi- Fundo Internacional de Socorro à Infância

FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

Fundeb - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação

Ibase - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDHM - Índice de Desenvolvimento Humano Municipal

Lupa - Levantamento de Unidades de Produção Agropecuária do Estado de São Paulo ONGs - Organizações Não Governamentais

ONU - Organização das Nações Unidas

Pnad - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Pnae - Programa Nacional de Alimentação Escolar

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Pronan - Programa Nacional de Alimentação e Nutrição RMC - Região Metropolitana de Campinas

SAN - Segurança Alimentar e Nutricional Sigecon - Sistema de Gestão de Conselhos

SiGPC Contas Online - Sistema de Gestão de Prestação de Contas Sinsan - Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional Unicef- Fundo das Nações Unidas para a Infância

UPA - Unidade de produção agropecuária

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1 INTRODUÇÃO

O Brasil tem chamado a atenção do mundo por possuir o segundo maior programa gratuito de alimentação escolar, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). Há interesse em replicar este programa em outras partes do mundo e o Brasil tem avançado aos poucos no seu monitoramento e avaliação.

No dia 16 de junho de 2009, o Brasil adota a Lei 11.947que dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e sobre o Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Esta lei entra no plano de luta contra a pobreza e exclusão social. Adotada pelo governo brasileiro nas últimas duas décadas contribui, no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), para segurança alimentar e nutricional, o desenvolvimento agrícola e desenvolvimento local com a instituição de que: do total dos recursos financeiros repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) no âmbito do Pnae, no mínimo 30% deverão ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações.

Portanto, este Programa acaba atendendo tanto as demandas de acesso à alimentação por parte dos estudantes, quanto às necessidades dos agricultores familiares de conseguir mercados para seus produtos. Contribui, assim, para a inserção da segurança alimentar e nutricional no desenvolvimento local. A Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) é a “realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis” (BRASIL, 2004, p.5).

Nas últimas décadas, o tema “desenvolvimento local” ocupa espaços cada vez maiores, tanto nas esferas governamentais como nas pesquisas acadêmicas, devido principalmente às ações de descentralização realizadas pelos governos federal e estadual. Constata-se, desde os anos de 1970, que as estratégias de desenvolvimento baseadas no crescimento econômico apresentavam enormes limitações e impactos, como por exemplo, o da Revolução Verde quando se trata da questão do rural e principalmente das questões

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ambientais. O debate é grande sobre estratégias para conciliar o crescimento econômico com as necessidades sociais, ambientais e culturais nos campos políticos e científicos.

Mas em que medida o Pnae e a Lei 11.947 contribuem para o desenvolvimento local e a segurança alimentar e nutricional? É possível mensurar essa contribuição?

Sujeito a muitas interpretações, a análise e avaliação de programas e políticas públicas é principalmente e,antes de tudo, uma ação de acompanhamento do processo de decisão política. De um lado, ela auxilia na boa utilização dos recursos públicos, por outro, contribui para a melhoria da administração e gestão da política. Baseada em métodos quantitativos e qualitativos, a avaliação pode mobilizar diferentes ferramentas para identificar, dentro de um contexto, os mecanismos pelos quais a política produz seus efeitos, esperados ou inesperados.

Esta pesquisa justifica-se em função da importância que o Pnae pode ter para os agricultores familiares de uma localidade e para o próprio desenvolvimento local, bem como pela carência de dados empíricos concretos para que os gestores e implementadores desse Programa realizem intervenções e ações sob a perspectiva da segurança alimentar e nutricional de estudantes atendidos pela alimentação escolar.

Este trabalho analisou a implementação e gestão do Pnae em alguns municípios da Região Metropolitana de Campinas. Esperou-se contemplar suas diretrizes, reunindo aspectos reconhecidos como essenciais que traduzam os objetivos e princípios do Programa e assim poder fornecer subsídios para o aprimoramento continuado de sua gestão aos atores e gestores nele envolvidos.

Assim, o objetivo geral desta pesquisa consistiu em propor um conjunto articulado de indicadores que possibilitasse avaliar como o Pnae, através da aquisição de gêneros alimentícios produzidos pela agricultura familiar, está contribuindo para o desenvolvimento local e a para a segurança alimentar e nutricional.

Os objetivos específicos foram:

 Analisar as compras, de gêneros alimentícios produzidos pela agricultura familiar, realizada para o Pnae nos municípios da Região Metropolitana de Campinas;

 Identificar os dados e informações já existentes de monitoramento e avaliação do Pnae;

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 Analisar a intersetorialidade do Programa e a multiplicidade de atores envolvidos na implementação do Programa no nível local.

A estrutura da dissertação além desta Introdução possui mais quatro capítulos. O capítulo 2 (Caminhos Teóricos) apresenta as bases teóricas que alicerçaram o desenvolvimento de todo o trabalho. O capítulo se inicia com um histórico dos principais avanços do Programa Nacional de Alimentação Escolar desde sua criação em 1955até a promulgação da Lei 11.947 em 2009. Em seguida, os conceitos de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), agricultura familiar e desenvolvimento local são trazidos à tona para que fosse possível estabelecer as relações destes conceitos com o Pnae, bem como da interrelação entre eles numa perspectiva mais abrangente de contribuição aos estudos sobre políticas públicas no Brasil. Ao final do capítulo, apresenta-se os sistemas, Sigecon e SiGPC Contas Online, e os meios de avaliação e monitoramento do Pnae já em uso pelo governo brasileiro. Ainda neste capítulo apresenta-se uma parte dos resultados da pesquisa que foram obtidos nas entrevistas sobre o resgate histórico do Pnae com o então diretor do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) em 2009, Daniel Balaban.

O capítulo 3 apresenta o caminho metodológico adotado para o desenvolvimento da pesquisa, sua delimitação, os dados utilizados, o trabalho de campo, a construção dos indicadores qualitativos para a análise proposta a partir dos dados primários levantados em campo e dos dados secundários disponibilizados pelo FNDE.

No quarto capítulo, os resultados do trabalho são apresentados. Uma análise estatística dos dados secundários é evidenciada inicialmente para em seguida ser proposto o modelo de análise e os resultados de sua aplicação em quatro municípios da Região Metropolitana de Campinas (RMC).

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2 CAMINHOS TEORICOS

2.1 Da fome ao aprender a comer: O Programa Nacional de Alimentação Escolar O Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) é o programa social mais antigo do Brasil na área de segurança alimentar e nutricional. Sua missão é “contribuir para a melhoria da educação por meio de ações educativas de alimentação e nutrição e da oferta de alimentação saudável” (BRASIL, [s.d]a).

O Pnae tem por objetivo,

Contribuir para o crescimento e o desenvolvimento biopsicossocial, a aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de práticas alimentares saudáveis dos alunos, por meio de ações de educação alimentar e nutricional e da oferta de refeições que cubram as suas necessidades nutricionais durante o período letivo. (BRASIL, [s.d.]a).

A alimentação escolar no Brasil teve início na década de 1950, com o Plano Nacional de Alimentação e Nutrição sob a responsabilidade do governo. Todavia, desse plano original, somente o Programa de Alimentação Escolar, que distribuía o excedente de leite em pó à campanha de nutrição materno-infantil, perdurou, tendo o financiamento do Fundo Internacional de Socorro à Infância (Fisi, hoje Unicef - Fundo das Nações Unidas para a Infância).Os 15 primeiros anos da alimentação escolar no Brasil foram marcados pelo predomínio da participação de organismos internacionais.

Em março de 1955 foi assinado o Decreto n° 37.106, que instituiu a Campanha de Merenda Escolar (CME), subordinada ao Ministério da Educação. Em 1956, com a edição do Decreto n° 39.007, a CME tornou-se a Campanha Nacional de Merenda Escolar (CNME), com o objetivo de promover o atendimento em âmbito nacional.

No ano de 1965, o nome da campanha foi novamente mudado para Campanha Nacional de Alimentação Escolar (CNAE) pelo Decreto n° 56.886/65. Nesse momento inúmeros programas de ajuda norte-americana surgiram no cenário. Como exemplo, o Alimentos para a Paz, financiado pela Usaid (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional); o Programa de Alimentos para o Desenvolvimento, direcionado às populações carentes e à alimentação de crianças em idade escolar; e o Programa Mundial de Alimentos, da FAO/ONU (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura). Ou seja, nesse primeiro momento o Programa se preocupava em “matar a fome” dos escolares de algumas localidades.

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No final dos anos 1970, mesmo financiado pelo Ministério da Educação e gerenciado pela CNAE, o programa integrava o II Programa Nacional de Alimentação e Nutrição (Pronan) e denominava-se Programa Nacional de Alimentação Escolar.

Somente em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, ficou garantido o direito à alimentação escolar a todos os alunos do ensino fundamental por meio do Programa Suplementar de Alimentação Escolar a ser oferecido pelos governos federal, estaduais e municipais.

Até o ano de 1993, a execução deste programa era realizada de forma centralizada, ou seja, o órgão gerenciador planejava os cardápios, adquiria os gêneros por processos licitatórios, contratava laboratórios especializados para efetuar o controle de qualidade e ainda se responsabilizava pela distribuição dos alimentos em todo o País.

Em 1994, a Lei n° 8.913 intitula a descentralização dos recursos para execução do Programa. Porém, apenas em 1994 é que ocorre a consolidação da descentralização, pois além do repasse direto a todos os municípios e secretarias de educação, a transferência passou a ser feita automaticamente, sem a necessidade de convênios ou quaisquer outros instrumentos legais. Atualmente, o Pnae é gerenciado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Este órgão transfere os recursos financeiros aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios destinados a suprir uma parte das necessidades nutricionais dos alunos. Grandes avanços começaram a surgir no Programa no final dos anos 1990.

Em 2000 instituiu-se que o Conselho de Alimentação Escolar (CAE), em cada município brasileiro, seria o órgão deliberativo, fiscalizador e de assessoramento para a execução do Programa com a reedição da medida provisória – a MP nº 1.784/98, em 2 de junho de 2000, sob o número 1979-19. No ano seguinte, a Medida Provisória n° 2.178, criou a obrigatoriedade de que 70% dos recursos transferidos pelo governo federal fossem aplicados exclusivamente em produtos básicos e houvesse respeito aos hábitos alimentares regionais e à vocação agrícola do município. Ainda que não fosse essa a intenção, pelo menos não era explicitada na MP, pode-se considerar esta a primeira medida dentro da história da política de alimentação escolar do País com potencial para fomentar o desenvolvimento local.

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O Programa vivia das medidas provisórias que só definiam as maneiras de repasse. O Pnae só repassava recurso... A resolução era muito tímida, não tinha nada de nutrição (...)Em 2004, começamos a discutir que estava na hora de ter uma legislação. Qualquer um podia chegar e acabar. Começamos a trabalhar na criação de uma lei (Daniel Balaban, 2014).

Assim, a criação da Lei nº 11.947, de 16de junho de 2009, foi uma conquista e fortalecimento para o Pnae. Segundo Peixinho, essa conquista foi “fruto de um processo intersetorial no Governo Federal e de ampla participação da sociedade civil por meio do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea)” (PEIXINHO, 2013, p.913).A Lei nº 11.947 trouxe a extensão do Pnae para toda a rede pública de educação básica de jovens e adultos.

Tinham alunos que na oitava série repetiam de propósito só para continuar comendo. Pois, a partir do primeiro ano do ensino médio não tinha merenda, não tinha livro, não tinha nada. Só professor e giz. O FNDE não tinha quase nada para o ensino médio (Daniel Balaban, 2014).

A Lei também garantiu e institucionalizou que 30% dos valores repassados pelo FNDE para a alimentação escolar fossem investidos na aquisição de produtos da agricultura familiar, a educação alimentar e nutricional passa a ser uma das diretrizes da alimentação escolar e fortalece o controle social do Programa através da participação da comunidade no Conselho de Alimentação Escolar.

A história de incluir a agricultura familiar vem por duas vertentes: primeiro a vertente da nutrição adequada... Todos sabemos que temos que comer alimentos que sejam mais frescos e que tenham, na dieta, frutas, verduras e legumes frescos. Então, muito dos produtos que eram ofertados nas escolas eram produtos industrializados... Então como era mais fácil, a merenda nas escolas era muito voltada para produtos industrializados, como em vários países do mundo (...) a merenda que se dá na realidade não é nutricionalmente adequada, é para matar a fome. Matar a fome não significa que se está nutrindo o ser humano. Então nós resolvemos optar pela nutrição, não para matar a fome, não por dar biscoito recheado e sim por dar produtos nutricionalmente adequados para as crianças. Então esta foi a primeira opção. Então tá, a segunda opção foi educar as crianças para que elas entendessem e não fossem futuros adultos com problemas de saúde, então a ideia é de educação. A ideia não foi de ajudar os pequenos produtores, a ideia foi de educação. Aí, logicamente uniu-se o útil ao agradável. Uniram-se as duas vertentes. De onde vêm os produtos frescos? Vêm do pequeno agricultor! e quem é o pequeno produtor? é o pai do aluno no campo. Então se acaba juntando duas coisas (Daniel Balaban, 2014).

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Também foram instituídas as novas diretrizes da alimentação escolar (Lei nº 11.947. Art. 2o):

I - o emprego da alimentação saudável e adequada, compreendendo o uso de alimentos variados, seguros, que respeitem a cultura, as tradições e os hábitos alimentares saudáveis, contribuindo para o crescimento e o desenvolvimento dos alunos e para a melhoria do rendimento escolar, em conformidade com a sua faixa etária e seu estado de saúde, inclusive dos que necessitam de atenção específica;

II - a inclusão da educação alimentar e nutricional no processo de ensino e aprendizagem, que perpassa pelo currículo escolar, abordando o tema alimentação e nutrição e o desenvolvimento de práticas saudáveis de vida, na perspectiva da segurança alimentar e nutricional;

III - a universalidade do atendimento aos alunos matriculados na rede pública de educação básica;

IV - a participação da comunidade no controle social, no acompanhamento das ações realizadas pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios para garantir a oferta da alimentação escolar saudável e adequada;

V - o apoio ao desenvolvimento sustentável, com incentivos para a aquisição de gêneros alimentícios diversificados, produzidos em âmbito local e preferencialmente pela agricultura familiar e pelos empreendedores familiares rurais, priorizando as comunidades tradicionais indígenas e de remanescentes de quilombos;

VI - o direito à alimentação escolar, visando a garantir segurança alimentar e nutricional dos alunos, com acesso de forma igualitária, respeitando as diferenças biológicas entre idades e condições de saúde dos alunos que necessitem de atenção específica e aqueles que se encontra em vulnerabilidade social.

Assim, novas possibilidades foram colocadas aos atores locais e criou-se a oportunidade para o surgimento de dinâmicas de desenvolvimento mais autônomas. Segundo Maluf,

A Lei nº 11.947/2009 pode se constituir num marco na história da alimentação escolar no Brasil, desde logo, por conferir densidade institucional a um programa que, embora antigo, carecia de definições em termos de diretrizes e obrigações dos gestores e entes federados envolvidos. O Pnae pode ser incluído entre os chamados “programas basilares” do futuro Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, previsto na Lei nº 11.346/2006. Este qualificativo se deve ao fato de ser este um programa em área-chave que, ademais, extrapola seus objetivos primeiros e estruturas específicas, sendo capaz de atuar como nucleador de ações integradas que expressam a desejada intersetorialidade da segurança alimentar e nutricional. (MALUF,[s.d]).

Belik (2004, p.01) aponta que “do ponto de vista do desenvolvimento local, a compra e a gestão descentralizada da alimentação escolar se constitui em um importante fator, na medida em que as aquisições feitas de produtores e empresários locais

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proporcionam a geração de trabalho e renda para as populações dos municípios envolvidos”. Outro fator é a ampliação da participação da comunidade no controle social, no acompanhamento das ações realizadas pelos estados e municípios para garantir a oferta da alimentação saudável e adequada nas escolas. A Rede Brasileira de Alimentação e Nutrição do Escolar é um instrumento que integra e dissemina as ações de segurança alimentar desenvolvidas nas escolas públicas brasileiras. Ela aponta que a inovação trazida pela Lei nº 11.947/2009, reflete a preocupação em se firmar uma política de participação social efetiva, para fins de controle e fiscalização das ações, mas também busca a conscientização da população quanto à sua responsabilidade social na efetivação dessas ações pelo Poder Público (REBRAE, 2009).

O orçamento previsto do Pnae para 2014 foi de R$ 3,5 bilhões e deve ter beneficiado 43 milhões de estudantes da educação básica e de jovens e adultos durante os 200 dias letivos de aulas. Uma referência importante na mensuração desses recursos são os valores per capita estabelecidos pelo FNDE para os diferentes tipos de alunos. Hoje, após anos sem aumento, o valor é de R$ 0,30 no caso dos alunos do ensino fundamental, médio e educação de jovens e adultos. Já alunos das creches e pré-escola recebem R$ 1,00 e R$ 0,50, respectivamente. Para alunos da educação básica das comunidades indígenas e quilombolas, o per capita está em R$ 0,60/aluno. Nas escolas que oferecem ensino integral com três refeições diárias e que integram o programa “Mais Educação”, ele se eleva a R$ 0,90/aluno e o Ensino integral R$ 1,00. (BRASIL, [s.d]a). Com a Lei nº 11.947, no mínimo R$ 1,05 bilhão poderia ter sido investido na compra direta de produtos da agricultura familiar em 2014; essa cifra só poderá ser apontada com exatidão em meados de 2015 quando são consolidados os relatórios de monitoramento do FNDE.

2.2 O detalhe que faz a diferença: Segurança Alimentar e Nutricional na Alimentação Escolar

“A Lei era muito mais importante para as crianças. A compra dos agricultores era um detalhe” (Daniel Balaban, 2014).

O Estado brasileiro reconhece o direito dos alunos da educação básica pública à alimentação escolar. Este direito visa garantir segurança alimentar e nutricional (SAN) dos alunos, principalmente aqueles em vulnerabilidade social. No Brasil, a noção de segurança alimentar e nutricional é definida como a “realização do direito de todos ao acesso regular

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e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis” (CONSEA, 2004, p.05). Esta definição é ampla e interdisciplinar, e traz aspectos em termos de qualidade e quantidade de alimentos para a população como um todo (KEPPLE e SEGALL-CORRÊA, 2001).

Acrescente-se, ainda, que à segurança alimentar e nutricional integram-se três referências indissociáveis de seu conceito: direito humano à alimentação adequada, soberania alimentar e relação com a promoção do desenvolvimento. O presente conceito traz em seu bojo a multidimensionalidade da segurança alimentar e nutricional, o que exige das políticas públicas que destinam a sua promoção uma abordagem muito mais complexa e de caráter multidisciplinar e interdisciplinar. (PINTO e QUIROGA, 2010, p.11).

A SAN pode ser avaliada através de diferentes métodos e medidas que indicam a quantidade de indivíduos em situação de carência alimentar ou fome. A FAO, por exemplo, utiliza um indicador de medida de disponibilidade calórica média diária per capita. No Brasil, a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) foi desenvolvida por um grupo de pesquisadores a partir de uma escala psicométrica americana. A EBIA permite identificar os graus de acesso aos alimentos, desde o completo atendimento das necessidades alimentares (Segurança Alimentar) até outros níveis gradativos de restrição alimentar (Insegurança Alimentar Leve, Moderada e Grave) (KEPPLE e SEGALL-CORRÊA, 2001). Já a análise de renda ou de consumo alimentar é utilizada por métodos mais tradicionais para avaliar o acesso aos alimentos pela população (KEPPLE e SEGALL-CORRÊA, 2001).

Tendo em vista a complexidade do tema SAN, em 2010, Kepple propôs uma abordagem dos determinantes da (in)segurança alimentar e nutricional. A autora utiliza quatro dimensões da SAN (disponibilidade, acesso, utilização e estabilidade) com três níveis sócio-organizacionais (macroeconômicos, regionais e locais e domiciliares) de fatores intervenientes e interdependentes (PINTO e QUIROGA, 2010 apud KEPPLE, 2010).A pesquisadora identificou em cada nível as diferentes variáveis que determinam a SAN:

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11

 Fatores domiciliares (Micro): a escolaridade, o perfil demográfico dos moradores, a raça/cor, a saúde dos moradores, o acesso a serviços e ações de educação alimentar e nutricional, renda disponível e a estabilidade financeira dos moradores, o tempo disponível da mãe nos domicílios com crianças, a participação em programas sociais e a rede social de apoio da família.

 Fatores regionais e locais (Meso): o preço dos alimentos praticado no mercado local, o custo de outras necessidades essenciais (saúde, educação, moradia etc.), a existência na região de programas que lidem com os riscos sociais a que a família esteja submetida, racismo e qualquer forma de discriminação negativa, programas de saúde e de educação, mercado de trabalho (emprego, salário e estabilidade), a cultura alimentar, presença de saneamento básico e vigilância sanitária.

 Fatores macroeconômicos (Macro): o sistema político-econômico mundial e nacional, as políticas econômica, social, agrícola e ambiental e o próprio reconhecimento do direito à segurança alimentar e nutricional (PINTO e QUIROGA, 2010 apud KEPPLE, 2010).

O Brasil possui uma Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional que visa garantir a realização progressiva do Direito Humano à Alimentação Adequada no País (DHAA).O Decreto 7.272 de 2010adotousete dimensões para monitorar esta política: 1) Produção de Alimentos; 2) Disponibilidade de Alimentos, 3) Renda e Despesas com Alimentação, 4) Acesso à Alimentação Adequada, 5) Saúde e Acesso aos Serviços de Saúde, 6) Educação; e 7) Políticas Públicas e Orçamentos relacionados à SAN. Estas dimensões foram determinadas e escolhidas a partir do estudo de modelos teóricos dos determinantes da Segurança Alimentar e Nutricional (BRASIL, 2010).

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2004 (Pnad), dos 52 milhões de domicílios brasileiros pesquisados cerca de 65% estavam em situação de Segurança Alimentar e os níveis de Insegurança Alimentar Moderada e Grave estavam presentes nos residentes de 12,3% e 6,5% dos domicílios respectivamente. Ainda que o meio rural possua algumas condições de garantir a SAN através do plantio de alimentos para o autoconsumo das famílias ou para a venda (garantia de renda), verifica-se que a maior prevalência de casos de Insegurança Alimentar Moderada ou Grave ocorre nesse meio. Na área urbana 11,4% e 6% dos domicílios apresentavam situação de Insegurança

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Alimentar Moderada e Grave, respectivamente, já no meio rural, estes números saltam para 17% e 9% (IBGE, 2006).

Assim, em um País tão diverso e desigual, Maluf [s.d] aponta a alimentação escolar como a principal, quando não a única refeição diária de um grande número de crianças. A Pnad de 2009 evidencia que aproximadamente das mais de 56 milhões de pessoas com menos de 18 anos, 22% não frequentavam a escola e destes um pouco mais de 2 milhões estavam em Insegurança Alimentar Moderada ou Grave. Outro dado é que 17% das que frequentavam a escola, mais de 7 milhões de pessoas estavam em Insegurança Alimentar Moderada ou Grave1. Um quarto destas pessoas se encontrava no meio rural (Figura 1). Assim, “a escola é um equipamento público de enorme capilaridade cujas possibilidades vão muito além de ministrar aulas, e que ela pode (deve) contribuir para promover o acesso a uma alimentação adequada e saudável” (MALUF, [s.d[).

Figura 1. Situação de Segurança Alimentar da população residente de até 18 anos, em domicílios particulares (milhões de pessoas).

Fonte: IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2009. Elaboração: a autora.

1

Ressalta-se que estes dados não são conclusivos já que são fruto de uma estrapolação de dados. As questões relativas a EBIA foram efetuadas em apenas um recorte da amostra total da Pnad.

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Assim, no caso do Pnae

(...) a necessidade primeira era atender os preceitos nutricionais das crianças. Comer produtos frescos, e menos produtos industrializados. Assim, as crianças consumindo estes produtos se tornariam adultos mais conscientes e com menos problemas de saúde no futuro (Daniel Balaban, 2014).

No mesmo sentido, a Lei 11.346, de 15 de setembro de 2006, cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sinsan) na tentativa de assegurar o direito humano à alimentação adequada. Em seu artigo 4°, menciona a abrangência da SAN na

ampliação das condições de acesso aos alimentos por meio da produção, em especial da agricultura tradicional e familiar, do processamento, da industrialização, da comercialização, incluindo-se os acordos internacionais, do abastecimento e da distribuição dos alimentos, incluindo-se a água, bem como da geração de emprego e da redistribuição da renda. (BRASIL, 2006).

2.3 Agricultura Familiar: beneficentes ou beneficiários?

O Pnae, através da quinta diretriz da Lei nº 11.947, pode contribuir para a segurança alimentar e nutricional no meio rural, já que prioriza a compra de alimentos produzidos localmente, preferencialmente pela agricultura familiar e dando prioridade às comunidades tradicionais indígenas e de remanescentes de quilombos.

A instituição da Lei 11.947/2009 abriu a oportunidade de um mercado institucional para apoiar e fortalecer a agricultura familiar local, contribuindo para diminuir insegurança do agricultor familiar quanto à comercialização da sua produção. Esse novo mercado pode melhorar a renda da família, bem como contribuir para a sua permanência no meio rural (SOUZA-ESQUERDO e BERGAMASCO, 2012, p.18).

A Lei 11.326 de 24, de julho de 2006, em seu 3° artigo estabelece como agricultor familiar aquele que:

I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento;

III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento;

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IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família.

Trata-se de uma definição “operacional”, que ajuda a identificar produtores que podem ter acesso ou não a diferentes políticas e programas do governo. Todavia, neste trabalho, gostaríamos de tratar estes agricultores familiares na perspectiva de seu “modo de vida”.

Durante anos, a agricultura familiar foi esquecida e deixada de fora dos investimentos públicos (acesso à água potável, habitação, saneamento, saúde, educação, comunicação, transportes, eletrificação e lazer). Ela volta a ser lembrada, somente em 1996, com a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). De lá para cá, várias políticas e programas voltados à agricultura familiar na tentativa de integrar esta parcela que já foi tão excluída das ações públicas.

Mesmo sendo uma categoria desprovida de grandes recursos produtivos, o último Censo Agropecuário (2006) acabou por confirmar a relevância da agricultura familiar principalmente na produção de alimentos. Um total de 4.367.902 estabelecimentos familiares foi identificado, correspondendo a 84,4% do total dos estabelecimentos rurais e ocupando apenas 24,3% da área total (IBGE, 2006). É a agricultura familiar no Brasil que produz 87% da produção de mandioca, 70% de feijão, 58% do leite, 59%dos suínos, 50% das aves, 46% de milho, 38% de café, 34% de arroz, 30% dos bovinos e21% do trigo (IBGE, 2006).

Apesar de achar que iriamos contribuir (os agricultores familiares), nosso objetivo era as crianças. Eles têm o que a gente quer e são uma grande força da nação. Vai ajudar e ao mesmo tempo vai ser benéfico para ambos. Tinha já lá a questão PAA, sido criado em 2003, então já tinha uma base... Então pensamos: vamos usar a mesma base, o pessoal que tem DAP2. É este pessoal que tem a DAP que pode vender para a alimentação escolar (Daniel Balaban, 2014).

Assim, o Pnae, através de suas atividades, pode assumir um papel importante no fomento à produção agropecuária local por envolver esses agricultores e incluí-los como

2 A Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) é o instrumento que identifica os agricultores familiares e/ou suas formas associativas organizadas em pessoas jurídicas, aptos a realizarem operações de crédito rural ao amparo do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, em atendimento ao estabelecido no Manual de Crédito Rural do Banco Central do Brasil (Fonte: BRASIL,[s.d.]b).

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um dos protagonistas do desenvolvimento de sua região. Já em 2010, no primeiro ano de obrigatoriedade de compra da agricultura familiar para o Pnae, pouco mais de R$ 150 milhões foram gastos com esta finalidade (SARAIVA et al, 2013). Saraiva mostrou que no ano de 2010, um pouco menos da metade dos municípios brasileiros (47,4%) adquiriram alimentos da agricultura familiar para a alimentação escolar, sendo que em média 22,7%, do repasse do FNDE foi utilizado para este fim. A maior justificativa para o não atendimento dos 30% foi a inviabilidade, segundo a percepção de administrações municipais, de fornecimento regular e constante por parte dos agricultores familiares (SARAIVA et al, 2013).

Eu dizia sempre sobre futuro desta Lei (11.947/2009); pois tem lei que pega e tem lei que não pega, A Lei só vai pegar se vocês estiverem prontos, se os agricultores estiverem prontos para dizer:

__ Não, eu tenho capacidade e condição de fornecer para a escola. Porque eles vão fazer de tudo para não comprarem. E realmente aconteceu. Foi um processo ao longo dos anos. No primeiro ano da Lei, em 2010, foi bem pouquinho. Este processo foi muito difícil (Daniel Balaban, 2014).

Villar et al. (2013) realizaram um estudo com relação à compra direta de produtos da agricultura familiar para o Pnae no Estado de São Paulo. Dos 613 municípios avaliados (95%municípios do Estado de São Paulo), 47% (288) realizaram a implementação das compras locais em todas as suas etapas (chamada pública, recebimento de produtos e pagamento dos agricultores) pelo menos uma vez desde 2009. Dos 325 municípios que não realizaram o processo em todas suas fases, 57% (185) não publicaram a chamada pública, 37% (120) publicaram, mas não assinaram o contrato de aquisição de produtos, 2% (7) publicaram, assinaram o contrato, mas ainda não haviam recebido os produtos e 4% (14) publicaram pelo menos uma chamada, receberam os produtos, mas ainda não haviam realizado o pagamento aos produtores (VILLAR et al,, 2013). Assim,

A inviabilidade de fornecimento regular e constante como justificativa para o não atendimento dos 30% exige articulação entre quem compra (demanda de alimentos para as escolas dos municípios) e quem vende (oferta de alimentos produzidos pelos agricultores familiares). Nesse sentido, do desenvolvimento local, é de fundamental importância o reconhecimento do papel interdependente das várias secretarias do poder executivo (tanto municipal quanto estadual)relacionadas ao tema, como

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agricultura, educação, fazenda ou administração, entre outras. (SARAIVA

et al, 2013).

Os agricultores familiares ao venderem seus produtos ao Pnae podem estar de um lado beneficiando os alunos com produtos frescos de melhor qualidade e variabilidade como atestou Triches e Schneider (2010) e de outro lado beneficiam a si próprios, com seus produtos e a garantia de renda.

2.4 Desenvolvimento local: muito além de uma escala espacial

Assim como outros temas, o desenvolvimento local também é caracterizado pela multiplicidade de discursos e práticas que lhes estão associados. Devemos reconhecer que é difícil dar uma única definição para o termo desenvolvimento local. Tanto é que nos perguntamos de que tipo de desenvolvimento estamos falando quando nos referimos ao desenvolvimento local. É um desenvolvimento econômico, cultural, territorial ou se trata de um conceito multidimensional que pode contemplar diferentes compreensões?

Quando falamos de desenvolvimento, logo nos vêm à mente algo com uma perspectiva de mudança, de progresso, de crescimento. Temos uma ideia que desenvolvimento gera mudança e melhoria para uma dada condição. E, o próprio conceito de desenvolvimento também vem passando por mudanças, por transformações ao longo dos séculos, inclusive já tendo sido visto como sinônimo de “Progresso” ou de crescimento econômico.

Para José Arocena (1986) não existe ainda uma teoria de desenvolvimento local, mas sim teorias de desenvolvimento que se diferem na maneira de olhar e considerar o local. Nestesentido, para o autor, o desenvolvimento localé um novorótuloou um novo qualificadorentre tantos outrosque juntamos ao termo “Desenvolvimento”. Por outro lado, autores como Bava (1996) acreditam que:

É importante assumir que o desenvolvimento local é endógeno, nasce das forças internas da sociedade; ele constitui um todo, com dimensões ecológicas, culturais, sociais, econômicas, institucionais e políticas, sendo que a ação a seu serviço deve integrar todas essas dimensões. (BAVA, 1996, p.58).

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Acredita-se que, mesmo sendo um conceito polissêmico, o desenvolvimento local é uma estratégia de intervenção pelo qual atores locais se tornam conscientes de que o destino de seu ambiente de vida está em suas mãos. Portanto,

(...) quando falamos em desenvolvimento local só podemos estar falando sobre isso – ainda que com diferente terminologia ou com outro aparato conceitual –, pois o desenvolvimento depende de decisões e de iniciativas locais, e da possibilidade de formulação e de implementação de um projeto, formal ou informal, pelos atores locais, que possa servir como uma espécie de catalisador das diferentes estratégias de reprodução social das unidades familiares que fazem parte das comunidades locais. (DELGADO, 2001, p.69).

Deser (1999) aponta na mesma direção, ao afirmar que o desenvolvimento local resulta das ações múltiplas e articuladas de diferentes agentes socias de um dado município ou local, com o objetivo de tecer uma estratégia a longo prazo. Portanto, “não se trata apenas de políticas públicas, mas de uma nova cultura e de ações voltadas para a construção de um objetivo comum” (DESER, 1999, p.33). Definitivamente verifica-se que o desenvolvimento local, longe de ser uma panaceia, é um conceito utilizado para compreender e explicar estratégias de desenvolvimento que contemplem as ansiedades de uma parte da população negligenciada pelas políticas capitalistas, mas também é uma teoria que analisa a réplica ao fenômeno da globalização e da exclusão socioeconômica em ascensão (DELGADO, 2001).

O surgimento do termo “desenvolvimento local” ocorre de maneira diferente em países subdesenvolvidos e desenvolvidos. Gostaríamos de descrevê-lo não para mostrar que as práticas de desenvolvimento local são diferentes em cada lugar, ao contrário, apesar das enormes diferenças culturais e socioeconômicas existentes, as “mensagens por trás” são as mesmas.

Várias evidências históricas demostram que é no Terceiro Mundo que o conceito de desenvolvimento local surge. Duas perspectivas muito semelhantes explicam a origem desta abordagem. A primeira perspectiva argumenta que o conceito de desenvolvimento local nasce como resultado do fracasso de inúmeros programas e projetos, em particular, o fracasso do que tem sido chamado das “Décadas de Desenvolvimento” iniciadas pela Organização das Nações Unidas (ONU) em favor dos países subdesenvolvidos (PARTANT, 1982; SCHUMACHER, 1982).

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Nestas décadas, os países em desenvolvimento do Terceiro Mundo foram, cada um em seu caso, recebendo ajuda de qualquer tipo: empréstimos financeiros, ajuda humanitária, alimentos, assistência militar, assistência técnica e envio de especialistas em desenvolvimento. Mas até que se prove o contrário, nenhum país saiu definitivamente do processo de desenvolvimento, ao contrário, muitos afundaram-se na miséria (PARTANT, 1982; SCHUMACHER, 1982).

Assim, nos anos 1980, especialistas da ONU começaram a rever os modos e escalas de intervenção. Desta vez, decidiram conceder ajuda no desenvolvimento de organizações não governamentais (ONGs) que trabalhavam em escalas mais restritas. É neste momento que nasce o termo "local". Assim, na lógica desta primeira perspectiva, o conceito de desenvolvimento local era sinônimo de uma restrição do território de intervenção para garantir que a dinâmica do lugar colocaria o ser humano no centro, como ator e beneficiário da assistência para o desenvolvimento e progresso (PARTANT, 1982; SCHUMACHER, 1982).

A segunda perspectiva é que, a história do desenvolvimento local como uma opção ou abordagem de desenvolvimento está intimamente relacionada a uma conjutura dos movimentos sociais. Ela nasce da ascensão da sociedade civil e das novas aspirações populares, impulsionada por associações comunitárias (nos anos 1980) através do qual o discernimento em torno da prática de desenvolvimento endógeno se emergiu. Nas áreas rurais, por exemplo, as pessoas perceberam que as ações para alavancar o desenvolvimento se concentravam nas áreas urbanas, e o Estado, que deveria intervir para garantir subsistência à população do campo, quase nada fazia (PARTANT, 1982; SCHUMACHER, 1982).

Já nos países desenvolvidos, a origem do conceito de desenvolvimento local acontece com o surgimento de um movimento simultâneo de dois lados: o lado do governo e o lado das populações das regiões periféricas. No que diz respeito ao governo, o desenvolvimento local estava intimamente ligado à necessidade de gerenciar de novas maneiras a situação marcada por crises econômicas, um crescimento mais lento e seu corolário, a limitação dos créditos públicos. E também o desejo de satisfazer as reivindicações de autonomia por parte da população. É a partir deste momento que as áreas rurais foram servidas como primeiros experimentos de campo (KAYSER, 1990).

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Em termos da população, especialmente aquela que vive em áreas rurais, é devido a uma combinação de mudanças econômicas e políticas que as pessoas gradualmente se voltaram para a evidência de que: a lógica intervencionista e a economia de mercado (fordismo e do Estado de bem-estar), que foram os fatores durante um certo tempo para o crescimento e progresso, estavamem crise. No plano econômico, as mudanças consistiam na desolocalizaçãoe fechamentos de fábricas e cortes nos serviços. Politicamente, as mutações em curso nos anos 1970, marcam o advento do Estado com o início de iniciativas locais em vez de um Estado-Providência. Para os agricultores e as suas associações, desde aquela época, a crise tornou-se tão grave que ameaçava a sua identidade como cidadãos e habitantes de um território que, além de tudo, contribuia para a prosperidade nacional. Como resultado, houve um despertar da consciência popular, consubstanciado no surgimento de associações civis que falavam de questões de identidade e no movimento desenvolvimento rural local (KAYSER, 1990). Assim, o desenvolvimento passa a ser orientado pelas necessidades e aspirações dos atores locais.

Tendo em vista este resgate histórico-conceitual, entendemos que o Pnae pode ser importante no fortalecimento e desenvolvimento de um dado local já que,

O que se destaca num projeto de desenvolvimento local é a possibilidade, por um lado, de articular, a partir de iniciativas dos governos locais, um conjunto heterogêneo de forças sociais locais em torno de um projeto comum e, por outro, de direcionar essa energia para o aproveitamento das oportunidades locais, viabilizando a produção de specialities, eliminando atravessadores, estimulando micro e pequenas empresas, formas cooperadas de produção e comercialização de produtos e serviços, enfim, articulando e estimulando uma série de iniciativas que abram novas oportunidades de trabalho, distribuição de renda, mercado. (BAVA, 1996, p.58).

Todavia, o Pnae só irá verdadeiramente contribuir para o desenvolvimento local na medida em que os gestores públicos consigam fazer do Programa uma ação transversal dentro de uma estratégia multi e interdisciplinar maior. Temas como a assistência técnica para agricultores, logística e armazenamento de produtos, planejamento e diagnóstico conjunto baseado na realidade agrícola local/regional, envolvimento dos agricultores, gestores e das escolas devem ser levados a sério (SARAIVA et al, 2013).

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2.5 O desenvolvimento local segundo Anthony Bebbington

Como pano de fundo deste trabalho buscou-se a abordagem teórica sobre o desenvolvimento de Amartya Sen (2000). O autor dissocia a visão clássica de desenvolvimento associada ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), aumento de renda, modernização ou industrialização. Na tese de Sen, o desenvolvimento é visto como algo mais amplo e abrangente, um processo imbricado aos conceitos de capacidades e liberdade. O desenvolvimento é visto como um processo de expansão da capacidade das pessoas de realizarem livremente suas próprias escolhas (SEN, 2000).

O enfoque nas capacidades de Sen oferece não só um quadro de avaliação do bem-estar individual, mas também da qualidade de vida dos indivíduos. Sen (2000) aponta algumas liberdades instrumentais que contribuem para a emancipação das pessoas (liberdades políticas, facilidades econômicas, oportunidades sociais, garantias de transparência e segurança protetora). Essas liberdades permitem de um lado que o indivíduo tenha capacidade para viver livremente e de outro reforça umas às outras. Todavia, sabe-se que nem sempre é possível garantir a liberdade de escolha aos indivíduos. Muitas vezes, o poder político impede que alguns grupos sociais tenham plena capacidade de liberdade e escolha.

Neste contexto de proposições de Amartya Sen pode-se incluir a obra de Anthony Bebbington, professor na área de Ambiente e Sociedade na Universidade de Clark em Massachusetts, que desenvolveu um aporte analítico que contempla sua preocupação com as ações vinculadas ao combate à pobreza e promoção do desenvolvimento. Segundo o autor, seu aporte pode ser também aplicado a outros projetos e pesquisas de desenvolvimento, sejam local, regional, endógeno, territorial etc.

Bebbington (1999) propõem uma abordagem através dos meios de vida, sendo o acesso a ativos e atores o centro da análise. O autor analisa diversas ações que podem “capacitar” os atores sociais no sentido de serem não apenas agentes de mudanças, mas também capazes de alterar “as regras do jogo do desenvolvimento”.

A abordagem dos meios de vida foi desenvolvida no início dos anos 1990 por Chambers e Conway (1992) com um foco na questão da “sustentabilidade social”. De lá para cá, diversos autores, organizações e institutos têm usado esta abordagem para estudos e projetos sobre o desenvolvimento.

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A abordagem de Bebbington se encaixa nessa pesquisa pois se espera analisar como o Pnae através da Lei 11.947/2009 está contribuindo para o desenvolvimento local e a segurança alimentar e nutricional de um município, já que retira o foco das estratégias de diversificação e o coloca em outro ponto limitante: a dificuldade que os agricultores possuem para acessarem, defenderem e manterem ativos de capital(NIEDERLE e GRISA, 2008). Nesta perspectiva, Delgado argumenta que:

O desenvolvimento local não é simplesmente uma questão de acesso a ou de disponibilidade de recursos econômicos e naturais. De um modo muito mais complexo, o desenvolvimento local deve ser encarado como um processo que requer a criação das condições para que as comunidades tenham acesso, isto sim, há pelo menos cinco tipos de ‘ativos de capital. (DELGADO, 2001, p.67).

Segundo Bebbington (1999), os meios de vida são dependentes de ativos de capital, que não apenas contribuem para que as famílias melhorem suas condições de vida, mas também dão significado ao mundo das pessoas e lhes dão “capacidades”. Bebbington classifica os ativos de capital em cinco tipos (NIEDERLE e GRISA, 2008):

 Capital natural (qualidade e quantidade de recursos naturais – terra, água, solo, etc.);

 Capital produzido (infraestrutura – estradas, energia, telefone, barragens, etc.; ativos financeiros – dinheiro, poupança, crédito; meios de produção – máquinas ,ferramentas, insumos);

 Capital humano (conhecimento, saúde, destrezas, habilidades);

 Capital social (redes de reciprocidade e confiança) e;

 Capital cultural (recursos, valores e símbolos apropriados em virtude da cultura dos grupos sociais dos quais se faz parte, e que sustentam formas de identidade, costumes, tradições e padrões de interação).

Portanto, somente a criação de um mercado institucional (a obrigatoriedade de uma parte do repasse do FNDE ser utilizado para a compra de produção da agricultura familiar, por exemplo) não faz com que o Pnae garanta o desenvolvimento de um dado local. A

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criação do mercado é apenas uma das vertentes. Por exemplo, Niederle e Grisa (2008) apontam que,

Os autores que discutem o acesso a ativos (Bebbington, 1999; De Haan, 2000) parecem caminhar para um entendimento no que concerne à centralidade do capital social enquanto um dos seus principais determinantes. Uma vez que o acesso a outros atores é considerado anterior ao acesso aos recursos (Bebbington, 1999), a discussão do capital social ajuda a entender como se formam redes sociais que favorecem o acesso, visto que este capital se torna um precursor fundamental para os demais. (NIEDERLEI e GRISA, 2008, p.55).

O acesso (essencial) a estes ativos depende do acesso (através do capital social) destas famílias aos atores do Estado, da sociedade civil e do mercado. Portanto, projetos, políticas ou programas de redução da pobreza ou promoção do desenvolvimento devem levar em conta estes vários elementos e dimensões para que seus resultados sejam atendidos.

Na análise da relação entre meios de vida e pobreza rural, Bebbington (1999) utiliza três pontos:

 os diversosativos (capital natural, capital produzido, capital social, capital humano e capital cultural)que a população rural depende para aconstrução dos meios de vida;

 as formas em queas pessoassão capazes deacessar, defender e sustentaresses ativos, e

 as capacidades das pessoaspara transformaresses ativosem renda,dignidade, poder e sustentabilidade.Em outraspalavras, para os transformarem em: níveis de consumoque reduzama pobreza; condições de vidaque implicamna melhoriada qualidade de vidade acordo comcritérios própriosde cada um; as capacidades humanase sociaispara usareme defenderemcada vez maisativos eficazmente e uma base de ativosque vai continuar apermitir queos mesmos tiposse transformam.

Portanto,

(...) é fundamental perceber o desenvolvimento como uma questão de capacidades e oportunidades de acesso e manutenção dos ativos de capitais. Trata-se de articular, por um lado, a ampliação das capacidades dos agricultores para controlarem de modo relativamente autônomo os capitais necessários à construção das trajetórias de vida que julgam adequados para si e para suas famílias (...) e, por outro, a criação de um ambiente social, político e econômico que favoreça o desenvolvimento

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destes meios de vida, garantindo oportunidades mais justas para as iniciativas que estão emergindo fazerem frente às pressões de instituições e atores sociais que reafirmam o padrão de desenvolvimento vigente. (NIEDERLE e GRISA, 2008, p.65).

Na Figura abaixo temos um resumo do framework apresentado por Bebbington (1999).

Figura 2. Aporte analítico para o desenvolvimento local proposto por Bebbington.

Fonte e elaboração: Bebbington, 1999, p. 22.

Unidade Familiar

Acesso Bem estar materialSignificadoCapacidade

CAPITAL NATURAL CAPITAL SOCIAL CAPITAL HUMANO CAPITAL PRODUZIDO CAPITAL CULTURAL Uso Transformação Reprodução

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