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168 BENJAMIN, Walter. O Narrador. In: Magia e técnica, arte e política:

ensaios sobre literatura e história da cultura. Obras Escolhidas, Volume 01. Tradução: Sérgio Paulo Rouanet. 3ª Edição. São Paulo: Editora Brasiliense, 1987. pp 201-205.

momento do contato com o interlocutor (pesquisador), quanto na composição da história.

Sustenta-se que a memória é elemento constituinte da rede de sentidos de uma sociedade. De um lado, atrela-se ao dizer, ao representar social, e, por outro interfere no fazer, atuar social. Os depoimentos dos Guarani refletem que a memória em sua seletividade é o esteio sobre o qual estes índios significam situações determinadas. Em outros termos, é o já-dito, o já-construído, ou seja, o legado dos ancestrais169.

Assim, a formação da rede de pessoas narradoras compõe com o pesquisador a tessitura da história, vinculada à constituição familiar existente dentro da comunidade da Aldeia de Linha Limeira. Constatou- se que algumas famílias se mantem unidas ocupando o mesmo lugar por pelo menos três gerações. Algumas, motivadas pelas diversas circunstâncias que envolvem o Guarani na busca de um bom lugar para se viver, o yvy marae’y, encontram-se hoje separadas e passaram a morar em outras comunidades no Estado de Santa Catarina e outros estados da Regiâo Sul e Sudeste do Brasil, porém se visitam constantemente e passam temporadas longas junto aos parentes distantes.

No intuito de constituir a rede de narradores, se partiu da constituição dos quatro grupos familiares principais que formam a comunidade da Aldeia de Linha Limeira, ou que em algum momento da história moraram na comunidade, desde o final da década de 1960. Os narradores são de três gerações destas quatro famílias e assim como tecem seus adjakás (cestos) contribuíram para tecer a história da comunidade e a compreensão dos objetivos propostos. A rede constituída resultou no gráfico abaixo, representado ao fundo pelo coqueiro, ou pindó, árvore e fruto importante na tradição alimentar do povo Guarani. A árvore também remete à genealogia familiar.

169 RIBEIRO, Sarah Iurkiv Gomes Tibes. A construção de um discurso

historiográfico relativo aos Guarani: Ensaio de Teoria e Metodologia. In:

FROTSCHER, Méri. (org.) Tempos Históricos. Vol. 05/06, 2003/2004 Cascavel: Edunioeste, 2004. p. 178.

Tabela 03 – Gráfico genealógico dos narradores e as famílias da Aldeia de Linha Limeira

Fonte: Quadro e desenho elaborado por Helena Alpini Rosa e Regina Alpini Rosa, em setembro de 2015.

Assim como em uma rede, há um entrecruzamento entre os narradores, quer pelo parentesco, quer pela convivência na própria comunidade formando um conjunto expresso na representação. No gráfico estão as famílias dos narradores e os nomes das pessoas estão realçados. Nas copas maiores aparece o bloco com o maior número de famílias e suas relações, que alcança praticamente toda a comunidade da Aldeia de Linha Limeira, tendo no tronco o nome que representa a família extensa. Também representado por um desenho de coqueiros, são pessoas moradoras da Aldeia de Linha Limeira, mas que necessariamente não possuem relações de parentesco. Nos losangos realçados são as pessoas que concederam suas narrativas, as demais pessoas das famílias estão representadas por pequenas bolas ou número, quando a bola aparece cortada representa a pessoa falecida.

No processo de constituição da rede, convém salientar que algumas pessoas foram cruciais e constituíram a formação do grupo. Essas pessoas foram indicando e conduzindo a partir de suas narrativas a outras pessoas, para que as informações se complementassem. Pode-se afirmar que se estabeleceu uma hierarquia, em uma dinâmica que perpassa praticamente toda a pesquisa: de três gerações de pessoas. Entre estas, destaca-se: o primeiro grupo formado com os mais velhos, chamados de Xeramoĩ e Xejariy representados por Júlio Benites, Antonia Martins, Eva Antunes, João Antunes. O segundo grupo formado pelos filhos: Augusto Martins, Nelson Benites, Deolinda Garcia, Marisete dos Santos, Lurdes Martins. Por fim, os netos: Florinda e Jurema Benite, Jurema Garcia, Eunice Antunes, Silvonês Martins. Estes três grupos formam o núcleo principal dos depoimentos e narrativas. Considera-se importante destacar a acolhida, colaboração, estadia na família de Eva Antunes, Marisete dos Santos, o cacique Belarmino da Silva e Silvonês Martins que apresentaram a comunidade, as pessoas e abriram suas casas para a permanência na comunidade durante a pesquisa de campo. As demais pessoas contribuíram com informações complementares e pertinentes aos temas abordados aqui.

1.3.2. O perfil dos narradores

A família Antunes é hoje formada por cinco irmãos, sendo que dois deles moram na Aldeia de Linha Limeira e os demais já moraram lá, mas estão em outras comunidades. Destes, destaca-se em negrito as pessoas que concederam suas narrativas. Eva tem cinco filhos, sendo que quatro deles moram na Aldeia de Linha Limeira: Ari Mariano casado com

Florinda Benite; Neuri casado com Juliana; Neli casada com Jonas (Kaingang); Neri Mariano casado com Eunice Martins moram na Aldeia Yynn Moroti Wherá de Biguaçu e Marisete dos Santos que vive com o Cacique Belarmino da Silva e tem dois filhos, sendo um deles o Prof. Silvonês Karaí Martins. São irmãos de Eva: João casado com Eva de Lima; Adão Karaí Tataendi Antunes (in memoriam) casado com Ivete Gonçalves que hoje vive no Massiambu, Palhoça, SC e seis filhos, entre eles Eunice Kerexu Yxapyry Antunes, da comunidade de Itaty, Morro dos Cavalos, Palhoça, SC. Os demais irmãos que compõem a família Antunes são Pedro Antunes que mora na cidade de Rio do Sul, porém seus filhos moram na Aldeia de Linha Limeira; Maria Erma Antunes (in memoriam) e por fim Antonio Carlos Antunes que vive no Morro dos Cavalos, Palhoça, SC.

A família Martins, de Julia Gonçalves, se compõe da seguinte maneira: ela é mãe de Leandra Martins e madrasta de Antonia Martins, também é avó de Lurdes Martins e bisavó de Jurema Martins e seus nove irmãos. Julia encontra-se em idade avançada e com dificuldade de visão e audição. A história de vida da família se confunde com a história da Aldeia de Linha Limeira. Chegaram no local na década de 1960 e se estabeleceram ali, onde a família foi crescendo e vivendo. O gráfico genealógico possibilita maior entendimento da dinâmica das famílias Guarani na Aldeia de Linha Limeira.

A família Benite, igualmente às demais, constitui uma família extensa, seu Júlio Benite casado com Luiza Coito (Kaingang) teve somente uma filha Deolinda que se casou com Nelson e juntos tiveram dez filhos, os quais nasceram e vivem até hoje na Aldeia de Linha Limeira, com exceção de dois deles, um que faleceu e outro que trabalha e mora em Porto Alegre. Esses filhos constituíram famílias, casaram-se e todos moram próximo à casa da mãe e da avó, que ajudou a criá-los, considerando-os inclusive como próprios filhos, prática muito comum entre os Guarani. Uma das filhas de Deolinda, Florinda casou-se com Ari, filho de Eva Antunes e um dos filhos casou-se com Jurema Martins, filha de dona Lourdes. Seu Feliciano Benite é tio de Júlio Benite e tio-avô de Deolinda.

Para além da comunidade, foram entrevistadas outras pessoas com o intuito de compreender alguns processos tradicionais do modo de vida Guarani, principalmente nos aspectos de formação da pessoa Guarani, na educação dos meninos e meninas, nos rituais de iniciação, nascimento e educação dos filhos e filhas.

Neste sentido que a família Moreira, do Karaí Alcindo Wherá Tupã e Rosa Poty Djá Gonçalves que vivem atualmente na comunidade Mymbá Roka, município de Biguaçu, SC. Tiveram seis filhos, entre eles Helena e Sônia – mãe de Marinês, que mora na comunidade de Laranjeiras, município de São Francisco do Sul, SC. Formam uma família extensa que agrega próximo deles filhos, netos, bisnetos, sobrinhos. Adriana Moreira, sobrinha de Alcindo e Rosa que vive na comunidade de Yynn Moroti Wherá com o marido e três filhos, também concedeu uma entrevista.

No mapa a seguir, se pode localizar onde moram as pessoas que foram entrevistadas e que formam a rede de narradores descrita anteriormente.

Figura 25 – Mapa de Santa Catarina com a localização das comunidades onde vivem os narradores

Fonte: Mapa escolar do Estado de Santa Catarina, IBGE. Disponível em www.infoescola,com/mapas/mapa-politico-de-santa-catarina, acessado em 27/09/2015. (Adaptação de Helena Alpini Rosa, 2015).

Na sequência se apresente uma breve biografia das pessoas que gentilmente cederam seus conhecimentos e “palavras”. Possibilitaram visibilizar aspectos, histórias e modo de ser desta comunidade com o

entendimento de que há uma espécie de cânone, uma identidade da cultura Guarani que cada um carrega consigo, onde quer que vá e onde quer que se estabeleça para viver o nhandereko.

Figura 26 – Feliciano Benites

Fonte: Acervo Helena Alpini Rosa, 04/06/2014.

O Sr. Feliciano Benites nasceu e viveu a maior parte de sua vida no noroeste do Rio Grande do Sul na TI Guarita, região de Miraguai e Tenente Portela. Não sabe precisar a data de seu nascimento, mas afirma ter 88 anos, o que significa que deve ter nascido no final da década de 1920. Atualmente, mora na Aldeia de Linha Limeira, em um dos lugares mais altos da mesma, próximo da mata preservada. A localização é isolada das demais casas da comunidade e para chegar até lá se passa por uma plantação de milho, mandioca e batata-doce.

Sua casa é feita de barro, taquara e coberta de capim, da forma tradicional de construção das casas Guarani, com aproximadamente oito metros quadrados, no interior da qual mantém sempre um fogo de chão aceso, especialmente no inverno, nos dias mais frios, o que significa dizer que não há assoalho, mas chão batido. A casa é cercada por uma pequena

plantação de bananeiras e de cana-de-açúcar, com pátio igualmente de chão batido que finaliza em um pequeno córrego que nasce na mata. Mora sozinho e ele mesmo prepara seus alimentos, quando não consome aqueles que são naturais, coletados para o consumo, como é o caso das frutas. Alegre, entusiasta e com espírito migrante, deseja muito morar junto aos parentes mais próximos que se localizam na aldeia Vy’a = Feliz, no município de Major Gercino.

Figura 27 – Eva Antunes

Fonte: Acervo Helena Alpini Rosa, 03/06/2014.

Eva Antunes nasceu no dia 1º de novembro de 1938, em Santa Catarina e não soube precisar o local de nascimento. Porém morava fora da aldeia. Quando mudou-se para a aldeia, casou-se com Mário Paulino Mariano na sede do Posto Indígena da T I Xapecó, na Aldeia Jacu, município de Ipuaçu/SC. É mãe de dez filhos, sendo que destes, três faleceram ainda crianças e duas filhas foram viver com o pai, de quem ela não tem notícias. Criou cinco filhos, sendo que quatro deles moram na aldeia e um mora no Rio Grande do Sul. Tem quatro irmãos, dois deles também moram na comunidade e um deles é seu Adão Karaí Tataendy Antunes (in memoriam), conhecido Xeramoĩ e professor que atuou muitos

anos nas escolas de Massiambu e Morro dos Cavalos, município de Palhoça/SC.

Conta dona Eva que passou por muitas dificuldades, especialmente relacionadas à alimentação, pois precisava trabalhar nas casas e nas lavouras dos colonos e estes usavam muito sal na comida e o Guarani quase não usa sal nos alimentos, pois os consomem de forma natural. Tem orgulho dos filhos, dos quais dois trabalham na escola da comunidade. Ari é professor e por ocasião da estada com ela, ele também era cacique da comunidade e Marisete, que trabalha na escola como servente.

Mora em uma casa de madeira, com duas netas que lhe fazem companhia, pois no momento está separada do marido. Pratica a religião evangélica em uma igreja instalada na comunidade bem próxima a sua casa.

Dona Eva é uma referência de conhecimento dos costumes Guarani e da história da comunidade. Foi uma das primeiras moradoras e acompanhou todo o processo de construção da Escola Indígena de Ensino Fundamental Mbya Limeira. Conhece todos os moradores da comunidade e os aspectos relacionados à cultura Guarani especialmente em questões relacionadas à alimentação e ao cuidado com as crianças e jovens.

Figura 28 – João Antunes e Eva de Lima Antunes

Fonte: Acervo Helena Alpini Rosa, junho de 2015.

João Antunes e Eva de Lima Antunes são casados há 35 anos e têm oito filhos. João nasceu no dia 22 de outubro de 1961 e vive na Aldeia de Linha Limeira desde 1969, com um período em que viveu na Aldeia de Itaty no Morro dos Cavalos, Palhoça, SC. Eva passou a morar na comunidade após o casamento. Seus filhos nasceram e cresceram na comunidade. Juntos cultivam a roça plantando milho, feijão, batata-doce, amendoim, mandioca. Criam porcos e galinhas. Praticam a troca de produtos cultivados na roça com os vizinhos, no sentido da reciprocidade, comum entre os Guarani.

A reciprocidade é um elemento forte da tradição Guarani. É um princípio da economia Guarani que trata de uma obrigação moral em ajudar sempre que o outro necessitar, de receber ajuda quando precisar e participar com alegria do trabalho do outro Guarani sempre que o outro necessite. Essa ajuda é conhecida como jopói, que pode ser traduzido por mão juntas, ou mãos mútuas, mãos abertas umas para as outras.170

João foi criado pelos pais e avós. É irmão de Eva Antunes e Adão Antunes (in memoriam). São tios de Eunice Antunes e de Marisete dos Santos. Foram criados na roça e assim criaram seus filhos com a roça e trabalhando nela. Eva é filha de Luiz de Lima e Eva Martins, ambos Guarani que prestavam serviços aos colonos no município de Quilombo, SC.

Figura 29 – Marisete dos Santos

Fonte: Acervo Helena Alpini Rosa, maio de 2015.

Marisete Kerexu dos Santos é uma das filhas de Eva Antunes, tem 49 anos e dois filhos, dos quais, um deles é Silvonês, acadêmico egresso da LII/UFSC e professor Guarani da EIEF Paiol de Barro. Marisete exerce atualmente a função de merendeira e servente da EIEF Mbya Limeira. Além disso, é articuladora dos trabalhos e atividades da ONG Outro Olhar dentro da comunidade e auxilia o cacique na tarefa de liderança, anteriormente com seu irmão Ari e atualmente com seu

companheiro Belarmino da Silva. Nasceu na comunidade e próximo aos dez anos de vida foi viver com a família em Biguaçu, retornando com vinte anos. Conhece muito da história da comunidade e da vida das pessoas que vivem nela. Relaciona-se bem com todos, o que faz se envolver em projetos de melhoria de vida e sustentabilidade, ervas medicinais, saúde e educação. Procura seguir a tradição e a cultura Guarani, especialmente no preparo de alimentos e no modo se ser, o nhandereko.

Figura 30 – Belarmino da Silva

Fonte: Acervo Helena Alpini Rosa. Janeiro de 2016.

Belarmino da Silva nasceu no dia 20 de dezembro de 1978, na antiga aldeia Guarani Barracão Mirim, na TI Nonoai, município de Planalto, Rio Grande do Sul. Hoje essa aldeia não existe mais, o pessoal guarani foi para uma nova aldeia, que fica localizado na beira da RS 324, também no município de Planalto. Vive na comunidade desde o início de 2014 e foi eleito cacique em 2015. Exercendo a função de liderança da

comunidade procura ajudar todos aqueles que precisam. Durante a caminhada de liderança percebe as necessidades da comunidade e procura manter a comunidade na paz, na tranquilidade, no sossego. Mantém ordem e disciplina na comunidade.

Belarmino também é acadêmico egresso do curso de LII/UFSC e professor da EIEF Mbya Limeira na própria comunidade. Adaptou-se muito bem à comunidade, sendo bem aceito. Mora com a companheira Marisete Kerexu dos Santos.

Figura 31 – Eunice Antunes

Fonte: Acervo Helena Alpini Rosa. Itaty, Palhoça, SC. 11.05.2015. Eunice Kerexu Yxapyry é filha de Adão KaraíTataendi Antunes (in memoriam) e de Ivete Gonçalves Antunes. Nasceu na Comunidade da Aldeia de Linha Limeira e lá viveu boa parte da infância até o momento em que a família se mudou para a comunidade de Massiambu, Morro dos

Cavalos, Palhoça, SC, no final da década de 1990. Na década de 1990 Eunice passou um tempo fora da aldeia, na cidade de Curitiba.

Hoje vive com os três filhos na comunidade de Itaty, Morro dos Cavalos, Palhoça, SC. Foi aluna do curso de Magistério Guarani Kuaa Mboé = Conhecer, Ensinar e acadêmica egressa do Curso de LII, UFSC. Exerce as funções de professora da EIEF Itaty na mesma aldeia em que mora. Enquanto foi cacique exerceu forte liderança para a regularização da Terra Indígena Morro dos Cavalos. Participa e atua em eventos que envolvem as questões relacionadas aos povos indígenas: educação, saúde, terra, direitos. Conhece bem a cultura e a tradição Guarani. Tem na família e na natureza sua força e energia para os enfrentamentos que a função de liderança exige no contexto atual.

Figura 32 – Júlio Benite

Fonte: Acervo Helena Alpini Rosa, Aldeia de Linha Limeira, TIX, SC. novembro de 2013.

Júlio Benite é uma das pessoas mais antigas de Aldeia de Linha Limeira. Chegou com a família no ano de 1959, quando tinha 25 anos de idade. Nasceu em Abelardo Luz e viveu dos oito aos vinte e cinco anos

no estado do Rio Grande do Sul, Votouro. Quando chegou havia somente mato e poucas famílias viviam no local, entre elas a família de João da Silva. Participou ativamente da comunidade atuando na casa de reza e como cacique. É rezador e faz os chás para a cura de doenças.

Conhece muito bem os “remédios do mato para as enfermidades que as pessoas apresentam. Não morou o tempo todo na Aldeia de Linha Limeira, passou uma temporada na Aldeia Bananal, em São Paulo, fato que lhe rendeu o apelido de “paulista”, que é como o conhecem na comunidade. No dia da entrevista ainda vivia com sua esposa Luiza Coito, Kaingang, com quem se casou e teve a filha Deolinda Garcia que mora na comunidade e criou todos os filhos ali, netos de seu Júlio. No ano seguinte separou-se e foi morar por um ano na comunidade de Biguaçu, SC.

Atualmente. Júlio retornou à comunidade e está empenhado em retomar os rituais na casa de reza, a Opy. Importante observar que embora a sua esposa fosse uma Kaingang, relata que ensinou a língua e os costumes dos Guarani, porque vivia na comunidade e ali todos tinham o mesmo costume. Isso também relata sua esposa Luiza, apresentada a seguir. Na sua casa se falava o Guarani, o Kaingang e eventualmente o português. Luiza Coito tem orgulho de falar e entender bem as três línguas.

As questões que envolvem a Língua na Aldeia de Linha Limeira serão especificadas no terceiro capítulo, através do qual se poderá compreender a dinâmica e os usos que a comunidade faz das línguas Guarani, Kaingang e Portuguesa.

Figura 33 – Luiza Coito

Fonte: Acervo Helena Alpini Rosa, Aldeia de Linha Limeira, TIX, SC. Junho de 2015.

Luiza Coito é Kaingang e casou-se com Júlio Benite, devido às relações muito próximas de famílias Guarani e Kaingang. Seus pais moravam na Terra Indígena Xapecó e teve somente uma filha, porém ajudou a criar os netos, filhos de Deolinda, os quais considera filhos. Passa seus dias com os afazeres domésticos e a roça, onde cultiva mandioca, milho, batata-doce, amendoim. Cria algumas galinhas e porcos “catetos”, para o consumo próprio e da família. Atualmente está com 77 anos e goza de boa saúde. Uma das netas mora com ela para não ficar sozinha. Relata que sempre acompanhou o marido em tudo, inclusive aprendeu a falar a Língua Guarani, criou sua filha e aprendeu muitos dos costumes dos Guarani, especialmente o modo de criar e educar a filha e os netos e a forma de cozinhar.

Nos casamentos interétnicos, a exemplo de Júlio e Luiza, ocorre o que se chama de guaranização. A pessoa que não é Guarani, a partir do casamento passa a viver com os Guarani e torna-se Guarani. Trata-se da

identidade do grupo. Importante salientar que esses casamentos inteétnicos são aceitos entre povos indígenas. Quando um Guarani se casa ou passa a viver com não-indígena, ele é orientado a sair da comunidade, salvo raras exceções.

Na Aldeia de Linha Limeira são comuns os casamentos e