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Para traçar conclusões mais aprofundadas sobre as danças africanas em Portugal, precisamos também observar as práticas artísticas. Nesse sentido, damos seguimento à análise com o material recolhido no norte do país no grupo Semente, no qual Eva atua como intérprete-criadora/coreógrafa.

Semente surgiu em 2005 na cidade do Porto, a partir de grupo de amigos que tinham interesses em comum: as danças e músicas do mundo, entre as quais, essencialmente, manifestações de África, Antilhas e Brasil. A tarefa de definir a linha de trabalho deste grupo encontra algumas dificuldades: em primeiro lugar, o grupo já passou por várias formações que foram alterando, aos poucos, a sua linha de trabalho; em segundo lugar, nos próprios discursos do grupo existe uma clara hesitação em se assumirem como um “grupo de música e dança africana”, apesar de esta ser uma vertente muito forte no projeto. Eva Azevedo, um das fundadoras, apresenta o grupo como uma “performance de fusões culturais” em que a vertente “africana” está mais em destaque. Porém ressalta que as “influências contemporâneas” também estão muito presentes, já que eles não tocam nem dançam o “tradicional”, mas sim criam as suas próprias composições a partir daí. Assim, hoje em dia, assumem o seu trabalho como um cruzamento de elementos tradicionais e étnicos com “referências contemporâneas”. Segundo Eva, o grupo tem demonstrado uma preocupação em enfatizar, através das suas músicas e danças, laços ancestrais que unem o ser humano à terra. Daí o nome “Semente”, que surgiu do sonho do casal Eva Azevedo e Paulo Rodrigues de criar um projeto que fundisse várias culturas e as transformasse numa só semente. O nome escolhido para o grupo pretende, então, transmitir uma “idéia de fusão, de mesclagem de todas essas culturas, da qual pode nascer algo novo” (AZEVEDO, 2010). Não se definem como uma banda de música nem como uma companhia de dança, mas consideram que criam performances. Atuaram já por

diversas localidades de Portugal e Espanha, em festivais, encontros, concertos em teatros, animações em festas regionais, casamentos, festas de empresas etc. Na época do nosso estudo, o grupo era constituído por 3 bailarinas e 4 músicos (entre os 29 e 40 anos).

Com cerca de uma hora de duração, o espetáculo assistido, “Capítulo II”, vem no seguimento do “Rizoma-Capítulo I”, espetáculo de 2007, que eles encararam como as “raízes”. Sobre este espetáculo o grupo conta: “pensamos que a seguir aos rizomas, às raízes, vem o tronco, que é aquilo que vai dar sustento à planta. Essas raízes transformaram-se num tronco e estão a ganhar forma, estão a crescer, e é isso que queremos transmitir” (AZEVEDO, 2010); “Ok, já temos as raízes, já sabemos quem somos, então por onde queremos ir? Qual é o caminho que nós gostaríamos de seguir?” (BORGES, 2010). Estas palavras traduzem um momento pessoal em que o grupo se sente mais maduro a nível da sua linguagem e procura caminhos para concretizá-la.

O espetáculo que apresentaram no Festival Etnias desenrolou-se ao longo de seis temas, dos quais faremos uma breve apresentação. O primeiro tema inicia apenas com o som do balafon (espécie de xilofone) e as três bailarinas24 entrando no palco com movimentos suaves. Estão vestidas com macacões, cada uma com a sua cor, e usam uns adereços, como cachecóis coloridos no pescoço e no cabelo. No segundo tema, as bailarinas entram já com outro figurino (o que de resto acontece sempre a cada novo tema): saias e camisetas de “farrapos” com padrões africanos. As três bailarinas entram correndo, brincando, interagindo e começam uma dança que sugere movimentos de trabalho, ligados à pesca e à relação com a água. Na terceira composição, a música de guitarra cria um ambiente denso que introduz a entrada de um “ser tricéfalo”. Nele, os três corpos estão ligados por um enovelado de cordas pretas, realçando-se as três cabeças através das máscaras africanas que cada uma usa. Esse ser se movimenta bem devagar, isto porque a passada de uma implica a passada de outra (estão ligadas por essa espécie de “rede” comum), fazendo que o foco seja simplesmente o fato de elas serem seres distintos, mas que estão ligadas umas às outras. No quarto tema, ao lado de uma música ritmada e “grave” (djembés e dununs, guitarra e baixo), temos três personagens que, através das vestimentas, representam a “portuguesa”, a “africana” e a “brasileira”. Elas estão sentadas em pequenos bancos e fazem gestos de afazeres diários, e brincam entreolhando-se, bebendo juntas, festejando e dançando. A certa altura, todos os músicos, menos o guitarrista, saem dos instrumentos, invadem o palco com vassouras e varrem as

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No âmbito deste trabalho, vamos usar como sinônimos o termo “bailarina” e “dançarina”, mesmo tendo consciência que no contexto estudado o conceito de “dançarina” tem habitualmente uma conotação pejorativa.

bailarinas para fora de cena; as luzes baixam e eles continuam varrendo, qual Stomp25, fazendo ritmos com as vassouras e os próprios pés.

O quinto tema, conhecido como “Afro-transe”, vai de encontro a novas tendências da música eletrônica, a trance music26 e breakbeat/drum’n’bass, mas é inteiramente tocada com instrumentos orgânicos (berimbau, surdos, bateria, dununs). A música cria um grande crescendo e, na hora do ápice, entra em palco uma lagarta gigante, formada pelos corpos das bailarinas cobertos por um tecido elástico amarelo fosforecente (as cores fosforecentes, marca do movimento trance). Essa lagarta, ao estilo de um dragão chinês, movimenta-se saltitando pelo palco, virando de patas para cima, engatinhando, dançando, explorando a comicidade deste personagem. Num momento de uníssono com a música, as bailarinas suspendem o tecido e criam uma tela bidimensional, em que, com a ajuda do contraluz, criam um momento de sombras. O último quadro é o tema com influências africanas mais vincadas, que começa também pela música. Em palco, os quatro músicos criam um ritmo potente e sincopado e, a dada altura, vemos três figuras entrando em palco: têm o corpo todo tapado de um tecido grosso tom de terra, inclusive a cabeça, parecendo bonecos de pano de vudu. Dançam movimentos frenéticos, com muitos saltos, movimentos vibratórios, combinações coreográficas complexas, com bastante mudanças de “passos”. O espetáculo acaba em círculo no centro do palco, fazendo um break, um uníssono, em que música e dança terminam juntos.

Um pouco por todo o espetáculo a relação música dança é sentida através de uníssonos da coreografia com a parte musical (acentuações dadas por instrumentos, crescendos, silêncios), e de uma igual importância cênica dada aos dois. Isso se evidencia através de longos momentos de cena que os músicos estão tocando sem dança; através dos músicos atuarem também, e não serem um mero “pano de fundo”. Nesse aspecto, Bilan (2010), músico cabo-verdiano, foi o único dos membros entrevistados que afirmou: “Semente é mais um grupo de dança do que de música, porque torna-se um espetáculo visual, o público foca mais na dança do que na música. É bom porque ao criar, a gente já cria tipo imagem, pensando em algo que seja visual.” O que parece estar contido na opinião de Bilan é o fato de este projeto ter um lado visual muito forte. Quando falamos “visual”, estamos falando em termos de quadros que são criados ao longo do espetáculo, o que se relaciona com a capacidade de contar histórias que Dora falava. Estes dois fatores parecem levar a que o próprio grupo

25 Stomp é uma companhia internacional espalhada pelos quatro cantos do mundo, conhecida pelas suas

performances rítmicas a partir dos mais diversos objetos.

26 O movimento trance é relativo ao universo da música trance, gênero de música eletrônica que foi desenvolvido

nos anos 90. O nome, a música, a moda e acessórios associados a este estilo de música relacionam-se com a procura de estados alterados de consciência como uma forma de entrar em transe.

defina o seu trabalho como uma performance. Quando falam em performance parecem estar se referindo a um conjunto de algumas caraterísticas reunidas num espetáculo, caraterísticas que, em nossa opinião, são caraterísticas intrínsecas ao próprio ato cênico, ou, então, caraterísticas de influências “africanas” ou modernas, e não a referências contemporâneas de artes “performáticas”, por exemplo.

Rótulos à parte, os elementos sugeridos têm em comum uma ênfase no aspecto visual e narrativo da obra e encontram-se expressos na relação música e dança, nos quadros que são criados ou na concepção dos figurinos. A maneira como é trabalhada a relação música-dança é apontada pelos membros do grupo, cria uma dimensão visual para o som e vice-versa: “para além de se tocar está-se a ter uma visão extremamente gráfica do que está a acontecer, porque estão pessoas a dançar exatamente aquilo que tu estás a tocar” (SILVA, 2010b). Em adição, os pequenos quadros criados ao longo do espetáculo funcionam devido a uma capacidade teatral das bailarinas e músicos, bem patente no quinto tema, em que não só as bailarinas desempenham personagens como os músicos também, varrendo e interagindo comicamente com elas. A par disso, nota-se a intenção de uma dramaturgia, de buscar significados e mensagens, o que parece estar sendo associado ao “contar histórias”. Essa, de resto, também é uma característica da tradição dos griots27 africanos, de contar histórias através da arte. Por último, o que o grupo relaciona à noção de performance é também uma importância dada a elementos visuais, como figurinos, luzes e adereços (por exemplo, a lagarta e outros adereços que as bailarinas usam), sendo referidos pelo Semente como uma maneira de cativar o público ao longo dos quadros criados.

27 Griots são contadores de histórias, equivalentes à figura do trovador. Em culturas orais como aquelas que

habitam a África ocidental, estes personagens adquiriram uma grande importância social na manutenção das tradições.

Figura 3. Espetáculo do grupo Semente. Foto de divulgação: Hugo Lima.

Outra característica forte que é salientada pelos membros do Semente é a união que existe no grupo, o que vem de encontro à filosofia do casal mentor do projeto: Eva Azevedo e Paulo das Cavernas. Apesar de ter sido concebido por eles, sempre houve a intenção de que o projeto fosse de todos os membros. É Eva quem diz:

Queríamos que esse projeto fosse criado como uma família, em que todos participam a nível de criação, todos tivessem os mesmos direitos e valores, e juntos criássemos um espetáculo de fusão de culturas. Já teve milhentas formações, e confesso que nós agora estamos numa crise pensando: “será que nós não deveríamos assumir mais o papel de patrões?”, mas isso vai contra o que nós acreditamos do projeto (AZEVEDO, 2010).

A noção de “família” sugere, à partida, união e colaboração com vista a objetivos em comum. Ao mesmo tempo, no seio de uma família, existe uma hierarquia, em que cada um tem que saber o seu papel e se envolver com o projeto: esses “acertos” e “desacertos” têm feito parte também do percurso deste grupo. Interessante é também e perceber que a mesma ideia de família está presente não só no projeto Semente, mas também na sua extensão pedagógica: a Escola Sementinha. Nas aulas que Eva e Paulo ministram no Porto (e nos workshops um pouco por todo o país), buscam criar um clima de igualdade, descontração, bem-estar, aparentemente, valores da família que o casal pretende criar. Deste modo, o que parece se tornar mais preponderante para os membros do grupo é a união, as relações que constroem entre si. Márcio Silva, o músico mais novo no grupo, opina sobre isso:

Quem viu o concerto como eu vi antes de entrar lá, tinha noção que era um grupo muito unido, e a postura de um é importante para o resto do grupo, e a importância de cada um ali dentro é notória. A união da música e a dança, e das ligações entre as

pessoas é o mais importante, e é a mensagem que eu consigo captar melhor, é a união (SILVA, 2010).

Logicamente, o processo criativo também é influenciado por este espírito. A opção de não haver um diretor artístico levou a que este grupo caminhasse no sentido de uma criação coletiva.

Há um método de criação muito harmonioso, as pessoas sabem se ouvir, toda a gente dá opiniões e ideias, eu senti-me muito feliz com o produto final. Aquilo que nós queríamos de criar um família eu senti isso, é uma família, mas não é perfeita há sempre discussões, mas senti que toda a gente participou no método de criação. E houve muito boa ligação entre os músicos e bailarinas, o que é a coisa mais difícil deste grupo [...] O trabalho veio de todos, todos (AZEVEDO, 2010).

Acho que os Semente funcionam como um conjunto, cada um chega com as suas ideias, e depois vamos criar ali uma ligação, fazer um elo das pequenas ideias que cada um tem e tentamos criar uma história sobre o conceito todo que o pessoal pensa. O grupo não tem um líder, há pessoas que sabem mais a nível de estrutura musical, de linguagem teórica, mas a nível do fluir, toda a gente tem as suas ideias e assim começamos a fazer coisas (BILAN, 2010).

Principalmente nos ensaios, pudemos também conferir que essa união decorre de amizades, algumas bem fortes, que estão implicadas na dinâmica deste grupo, situação que também tem o seu lado complicado. Dentre os três ensaios observados, nunca conseguimos reunir todo o grupo, e, pelos vistos, era frequente essa situação de faltas de alguns membros. No entanto percebemos a dificuldade em lidar com a situação de uma forma “profissional” e “objetiva”, uma vez que havia sentimentos de amizade à mistura. Esse pode ser também um elemento que compromete em muito a evolução de um projeto.

Algo que tem pautado o percurso deste grupo têm sido, sem dúvida, os contatos interculturais. A vontade dos fundadores em desenvolver um “projeto que fundisse as várias culturas” partiu inicialmente da cultura que este casal tinha mais próxima deles, a cultura africana. Paulo refere o mestre Gueladjo Sané, que lhe ensinou a arte de tocar djembé antes mesmo que pudesse viajar até ao continente africano, dando conta da referida proximidade entre estas culturas, reforçada recentemente com o processo de descolonização. “Em Portugal, porque temos uma ponte com África, vinda dos tempos da colonização já 500 ou 600 anos de história, não é assim tão estranho ver hoje em dia um português a querer influenciar a sua sonoridade com as raízes de África” (RODRIGUES b, 2010). Para tal, nos primeiros tempos, Paulo e Eva referem o contato com mestres e professores africanos, e inclusive pesquisas feitas com vídeos e através da internet. Porém, como dizem, “parece que falta sempre algum componente cultural, falta o cheiro, uma proximidade” (RODRIGUES b, 2010). A busca

dessa proximidade cultural levou-os a Guiné Conacri e Senegal, em 2007 (Paulo e Eva), e, em 2009, a Burquina Faso (Paulo, Eva e Márcio Pinto).

A procura para aumentar o repertório de influências culturais, para além de passar pelos contatos com mestres e professores africanos, viagens e pesquisas próprias, passa, também, atualmente, por convidar pessoas de outros países, o que também é referido por Borges (2010) como uma mais-valia da experiência de pertencer a este grupo.

Por um lado, este projeto parece estar contribuindo para uma maior aproximação entre determinadas culturas africanas e a portuguesa. A cultura cabo-verdiana, ela mesma fortemente marcada por esses encontros, vem ser uma das pontes que o Semente encontra entre Portugal e as “Áfricas”. Bilan (2010) fala sobre as repercussões destes contatos interculturais: “pôr de parte alguns pré-conceitos, alguns valores que se calhar já não fazem sentido. Estamos a evoluir, as coisas estão a ligar-se, conectar-se”.

Entendendo que as relações sociais englobadas nas e pelas práticas artísticas se interligam também com o tema da interculturalidade, quisemos perguntar ao grupo como este espetáculo se relacionava com o contexto português. A hesitação na resposta de todos os entrevistados deu conta que não é um fator que interfira muito no processo criativo. Espontaneamente, as respostas foram surgindo distintas entre si: Dora Borges, recorrendo à ideia dos “contadores de histórias”, considera que o espetáculo se relaciona “com o folclore, que é sabedoria do povo, neste caso a sabedoria com cada um de nós” (BORGES, 2010). Já Eva, a fundadora do grupo, acha que

Relaciona-se com o ser humano, logo relaciona-se com Portugal e com o Porto. Eu acho que nós portugueses também estamos a ter uma abertura para as diferentes culturas do mundo inteiro, e, no fundo, o que nós mostramos também é isso, um pouco de diferentes culturas, de diferentes tradições [...] acho que também neste espetáculo nós também relembramos as tradições esquecidas. [...] A arte quer chegar ao coração. E eu acho que é isso que nós pretendemos com os Semente também. Os espetáculos que eu tenho ido ver é muita depressão, a solidão, a loucura, porquê? Nós isso já temos no nosso dia a dia. Não precisamos de ir ver isso na arte, precisamos é de ver o contrário (AZEVEDO, 2010).

Eva coloca aqui a dança que ela produz como um antídoto da própria realidade social ocidental. As suas palavras reafirmam a visão da arte e da dança como entretenimento, e sugerem esses problemas – loucura, solidão – como se não fizessem também parte das culturas africanas.

Bilan também parece ir nessa linha de ideias de Dora Borges, expandindo-a para a sua inserção no processo de globalização:

Acho que se relaciona a partir do momento que nós, os criadores do espetáculo vivemos aqui. De alguma forma ingénua estamos a fazer por criar um espetáculo assim, mas acho que isso é daquelas coisas que não consigo bem explicar. Acho que este espetáculo retrata um pouco o estilo daquilo que vivemos cá e das ambições de cada membro de conhecer novas culturas e das viagens para África, Brasil, Índia e tentamos criar uns Semente da globalização que se faz sentir hoje, das coisas estarem todas interligadas, independentemente se viveres na China, se tiveres vontade de fazer fado, acho que ninguém pode te impedir (BILAN, 2010).

Nestes dois ultimos comentários estão sendo realçadas as trocas interculturais que estas práticas podem estar criando, por se relacionarem e interpretarem diferentes culturas. Bilan avança mesmo dizendo que este espetáculo é fruto da realidade multicultural que se vive em Portugal, frisando a ideia de que as manifestações culturais são “do mundo”. Porém, nos perguntamos: que tipo de relação intercultural é essa?

Figura 4. Espetáculo do grupo Semente. Foto de divulgação: Hugo Lima.

O que os dados levantados aparentam é que os membros do grupo, na sua maioria portugueses, não estão entrando numa relação cultural a partir das suas referências próprias, mas sim “através” das influências (re-interpretadas) do “outro”, se vendo, muitas vezes, como difusores da cultura africana no seu contexto. Esse tipo de realidade, no mundo globalizado em que vivemos, em que a desterritorialização e o cruzamento de influências se tornou ordem do dia, já não parece tão estranho. Assim, independentemente das trocas culturais acontecerem com os portugueses viajando para conhecer as culturas no seu contexto, quer aconteçam em solo português, o que questionamos é como elas estão sendo feitas.

Para aprofundar a questão das trocas culturais dentro deste grupo, vamos partir da maneira como os seus membros definem a linguagem do grupo: “fusão”. Na definição apresentada no texto de divulgação do grupo, lê-se:

Semente é uma amálgama de influências de África, Cuba, Uruguai, Brasil, entre outros. [...] Os ritmos poderosos dos djembés e dununs, as chicotadas vigorosas das congas, as melodias encantadoras do balafon, a folia do samba, aliam-se às coreografias étnico-contemporâneas, tornando este um espetáculo de forte caráter visual e sensitivo28.

A partir deste excerto identificamos uma dificuldade em definir a linha de trabalho deste grupo, e uma tendência a apresentar numa lógica de somatório, para tentar, de alguma forma, fazer uma definição mais aproximada. Além disso, quando falam em “mesclagem de culturas”, no fundo observa-se que não são todas as culturas, mas sim as culturas “africanas” ou da diáspora africana (Cuba, Uruguai, Brasil, todas são diásporas de África, espalhadas pelo mundo).

Ao mesmo tempo, questionamos que África é abordada nesse espetáculo. Aparentemente, é um sentido alargado de influências africanas a que eles se referem. No espetáculo assistido, existe o uso de uma estrutura e de marcas culturais “africanas”, por vezes já re-significadas. Alguns exemplos: os padrões africanos em figurinos não “tipicamente africanos”; os instrumentos, ritmos e melodias que frequentemente são tocados de uma forma