• Nenhum resultado encontrado

O Sistema de Seguridade Social

CAPÍTULO 2 – O SISTEMA DA SEGURIDADE SOCIAL E SEUS OBJETIVOS

2.2. O Sistema de Seguridade Social

Após a análise no capítulo anterior acerca dos princípios gerais da Seguridade Social, mister fazermos um corte epistemológico no ordenamento jurídico para que possamos compreender a intenção do legislador ao elaborar as normas de proteção social.

O modelo de proteção social tem por escopo a cobertura universal, em que todos que estejam em situação de risco devem ser protegidos, garantindo-se, para tanto, um mínimo vital84 de conformidade com os padrões da sociedade.

Heloísa Hernandez Derzi85 enfatiza que

“o objeto de proteção da Seguridade Social também deve abranger os bens de natureza espiritual ou moral, conclamadas na Declaração Universal dos Direitos do Homem, que vão além da segurança econômica individual, para compreender o pleno desenvolvimento da personalidade dos indivíduos. Nesse ponto coincidirá com a promoção do bem-estar social.”

84

O mínimo vital está prescrito na Constituição da República quando estabelece que o salário- mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, deve ser capaz de atender às necessidades vitais básicas dos trabalhadores, urbanos e rurais, e às de suas famílias com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim (artigo 7.º, inciso IV, da Lei das Leis).

85

Heloísa Hernandez DERZI, A morte e seus beneficiários no regime geral de previdência social, p. 49.

Verificamos que, desde os primórdios, havia situações que não prescindiam de cobertura, preliminarmente por meio das mútuas, e, com a evolução do contexto social, as formas de proteção passaram a ser responsabilidade do Estado e da sociedade, de forma solidária.

Nessa última fase histórica da proteção, constatou-se que a solidariedade, a isonomia e a dignidade da pessoa humana se faziam presentes. Isso ocorreu porque as necessidades mais prementes dos indivíduos passaram a ser protegidas pela legislação pátria, ou melhor, por um complexo de normas sociais.

Ilídio das Neves86 assevera que

“a missão fundamental do sistema é a de assegurar de forma organizada a protecção dos cidadãos contra determinados riscos da existência, pois se considera que os seus efeitos danosos não interessam apenas individualmente às pessoas, mas também à sociedade no seu todo. Daí a particular responsabilidade reconhecida ao Estado no conjunto das diferentes políticas sociais.”

O sistema, pois, foi criado com a finalidade de combater as mais diversificadas formas de necessidades sociais, proporcionando, com isso, uma vida digna e livre de sofrimento. Essa normatização se justifica em razão dos objetivos fundamentais no artigo 3.º da Carta Política de 1988.

“Art. 3.º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...)

III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” (grifamos)

A partir dessa preocupação com o social, surgiram formas de cobertura de riscos sociais – como doença, invalidez, velhice e morte – pela Previdência Social.

E, diante do crescimento da necessidade de proteção, e para dar cumprimento à universalidade, quer dizer, amparar todos aqueles que se encontrem em situação de risco, foi criado, com a Constituição da República de 1988, o Sistema de Seguridade Social, que abarca a saúde, a Previdência Social e a Assistência Social.

Esses três elementos que compõem o sistema devem conviver harmoniosamente, não podendo, destarte, faltar um deles sob pena de não serem alcançados os objetivos da Ordem Social: bem-estar e justiça sociais, e dos demais princípios delineados no parágrafo único do artigo 194 da Lei das leis.

A Constituição, portanto, prescreveu em título próprio a estrutura organizacional do Sistema de Seguridade Social. Trouxe em seus dispositivos as diretrizes fundamentais que devem nortear o sistema como um todo harmônico, bem como as formas para se atingir o dever-ser – o ideal de Justiça.

Esse modelo de proteção garante a segurança de todos que, analisada em conjunto com a liberdade, objetivam alcançar a felicidade social, que se consubstancia na concretização da justiça.

O legislador constitucional, dessa forma, não só visou à proteção daqueles que contribuem para o sistema, como também o organizou, compondo-o a Saúde, a Previdência Social e a Assistência Social, objetivando, conforme a diretriz insculpida no inciso I do parágrafo único do artigo 194 da Lei das leis, a universalidade da cobertura e do atendimento. Isso quer dizer que a proteção integral é o mister do Sistema Securitário Social.

Nesse sentido, ainda no Título VIII da Carta Política de 1988, o constituinte originário prescreveu como a saúde, a Previdência e a Assistência Social alcançariam o objetivo da universalidade da cobertura e do atendimento.

A saúde, direito de todos e dever do Estado, deve ser implementada por políticas públicas de prevenção e de cura. Os seus programas para cumprir com o fim social são destinados precipuamente a prevenir doenças por intermédio de orientação médica, programas incentivadores de cuidados especiais com a saúde e para combater proliferação de enfermidades.

No subsistema saúde, o Poder Público tem o dever de garantir o atendimento a todos indistintamente. De acordo com os princípios da universalidade e da isonomia, o atendimento deve ser feito àquela pessoa, independentemente da sua condição financeira, que se dirigiu a um hospital ou posto de saúde clamando por um atendimento87.

Feijó Coimbra88 preleciona que

“o artigo 196 não faz escolhas nem abriga privilégios: dá o direito aos serviços médicos a quantos, no território nacional, deles tenham necessidade contra a doença. Esses serviços são devidos em dose igual seja qual for seu destinatário, bastando que se revele carecedor deles.” (grifamos)

Dessa forma, com a finalidade de dar cabo às suas responsabilidades, o constituinte de 1988 criou o SUS – Sistema Único de Saúde, cujo objetivo é a concretização do atendimento universal. Além disso, permitiu a assistência à saúde pela iniciativa privada, de forma complementar ao Sistema Único e com preferência às entidades filantrópicas, bem como as sem fins lucrativos.

A Previdência Social – subsistema de caráter obrigatório que exige uma contraprestação do indivíduo e vinculada, em regra, ao exercício de atividade laborativa – é responsável pela cobertura dos riscos doença, invalidez, velhice, morte, maternidade, reclusão. Não basta, por seu turno, a ocorrência do risco, é necessário que a pessoa esteja segurada pelo sistema, quer dizer, deve ser contribuinte e, além disso, deve cumprir alguns requisitos exigidos pela Constituição da República e pelas leis que disciplinam a matéria.

Na Previdência Social, os sujeitos sociais trabalham e contribuem para que, após determinado período estabelecido em lei e a partir do momento que estiverem impossibilitados de exercer o labor, tenham direito à percepção de um benefício, valor este que substituirá a remuneração paga por ocasião do trabalho.

87

Vale salientar que a saúde, além de ser um direito de todos, deve proporcionar um atendimento digno e eficaz, com o escopo de evitar sofrimento ao indivíduo necessitado.

Os beneficiários da Previdência Social podem ser obrigatórios ou facultativos. São obrigatórios (artigo 11 da Lei n.º 8.213/91) os segurados trabalhadores, quer dizer, aqueles que exercem uma atividade laborativa vinculada ou não a uma empresa (empregador). O facultativo (dona de casa, estudante, p. ex.), por seu turno, é aquele que, mesmo sem laborar, deseja contribuir para a Previdência Social com o fito de garantir, quando necessário, a proteção do sistema (artigo 13 da Lei n.º 8.213/91).

A Constituição da República de 1988, por intermédio da Previdência Social, assegura ao trabalhador ou àquele que contribui facultativamente a garantia de, em situação de necessidade que o impossibilite para o trabalho, tranqüilidade no desempenho de suas atividades cotidianas.

Cada risco a ser coberto gera um benefício diferenciado e, por conseguinte, requisitos também diferentes. Podemos citar o benefício em análise nesta dissertação – salário-maternidade. Neste, a gestante deve ser segurada, obrigatória ou facultativa, da Previdência e para determinadas categorias de segurada – especial, facultativa e contribuinte individual – a lei ainda exige uma carência, ou seja, um período mínimo de contribuição que deve ser cumprido para que a segurada faça jus ao benefício.

Nesse processo de proteção social, o constituinte originário ainda estabeleceu a diretriz da seletividade e distributividade, selecionando os riscos que mais afetam a sociedade para depois distribuir com as pessoas mais necessitadas de proteção.

Isso ocorre porque, muito embora a finalidade do sistema seja a de atingir a proteção universal, o Poder Público está limitado por suas receitas decorrentes dos tributos vertidos para seus cofres, principalmente as contribuições destinadas para o sistema que já nascem com um fim específico. Por esta razão é que se faz relevante a prescrição do parágrafo 5.º do artigo 195 da Carta Política de 1988 (regra da contrapartida – para toda despesa, deve existir uma receita).

A Previdência Social, destarte, tem o objetivo de garantir ao segurado impossibilitado de exercer sua atividade laboral uma prestação que lhe dê sustento e assegure a manutenção de uma vida digna.

Por último, temos a Assistência Social, que se consubstancia na concretização dos princípios da universalidade e da solidariedade, uma vez que proporciona àquela pessoa incapacitada para o trabalho, em decorrência de ser portador de deficiência ou de idade avançada, o direito a uma prestação que lhe garanta o mínimo vital.

Almansa Pastor89 aduz que

“la asistencia pública o beneficencia general constituye una parcela de la Administración pública integrada por mecanismos protectores de necesidades sociales dirigidos a garantizar al ciudadano por el Estado y entidades públicas, con carácter graciable, los medios suficientes para atender a sus necesidades vitales”90.

Na Assistência Social o Poder Público dá cobertura sem exigir uma contraprestação. Isso é denominado de solidariedade: toda a sociedade contribui para garantir um mínimo de dignidade àqueles que estão em situação deplorável.

Com isso, infere-se que o Sistema de Seguridade Social é um todo indissociável, visto que o efetivo desempenho de cada um dos subsistemas – Saúde, Previdência Social e Assistência Social – assegura a proteção universal e isonômica – eixo diretor de toda a Ordem Social.