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Se um sistema for constituído por k subsistemas quânticos, e estes estiverem em estados A1, A2, A3, ..., Ak, o estado total T do sistema pode ser descrito listando em sequência o de cada subsistema,8

T = A1 A2 A3 ... Ak. (3)

Isso lembra o produto cartesiano dos estados compostos clássicos, mas não quando considerarmos sobreposições. Se, por exemplo, o segundo subsistema es- tiver em uma sobreposição A2 =

3

B2 – 5C2de autoestados de energia então

T = A1 (

3

B2 – 5C2) A3 ... Ak

.

(4)

Medindo esse subsistema, teríamos chances de 9 para 25 de obter B2 ou C2

e, quando ele colapsasse para um desses estados, isso deixaria o sistema total em

A1 B2 A3 ... Ak ou A1 C2 A3 ... Ak. Logo (4) equivale à sobreposição

T = 3A1 B2 A3 ... Ak – 5A1 C2 A3 ... Ak

.

(5)

Ou seja, a composição dos subsistemas se distribui com relação à sobrepo- sição de estados como um produto em relação à soma. Formalmente, isso significa que o estado total (3) é o produto tensorial dos estados individuais.9

Estados que podem ser descritos na forma (3) são chamados de sepa- ráveis, fatoráveis ou decomponíveis. Se um sistema composto estiver em um estado assim, conhecê-lo equivale a saber o estado de cada subsistema. Por exemplo, se o estado de um sistema de 2 spins for10T = BC + CC, reescrevendo-o

como T = (B + C) C = DC vemos que ele é decomponível: o primeiro elétron está no autoestado de spin para direita, e o segundo no de spin para cima.

É natural esperar que todo estado seja decomponível, pois é o que ocorre na Física Clássica. Surpreendentemente, na Mecânica Quântica isso deixa de ser verdade. O sistema total pode estar em um estado quântico perfeitamente conhe- cido, sem que possamos atribuir a seus subsistemas estados bem definidos. Isso porque duas componentes sobrepostas, como em (5), só podem ser recombinadas em uma só, na forma (3), quando todos os subsistemas, exceto um, estiverem no mesmo estado em ambas.

Estados não separáveis são ditos emaranhados ou quanticamente correla- cionados, e constituem a grande maioria dos estados quânticos compostos, sendo, como veremos, essenciais à Teoria da Informação Quântica.

Paradoxo Einstein-Podolsky-Rosen (EPR)

Um aspecto intrigante dos estados emaranhados é que, em geral, medir um dos subsistemas causa o colapso do estado total, afetando os demais mesmo sem interagir diretamente com eles. Mesmo que estejam separados por enormes dis- tâncias, medições nos diferentes subsistemas dão resultados fortemente correla- cionados. Essa previsão, de que medir uma partícula de um par emaranhado tam- bém colapsa o estado da outra, independente da distância que as separe, constitui o paradoxo EPR, criticado por Einstein, Podolsky e Rosen (1935) por violar certas concepções físicas comumente aceitas. Einstein a chamou de “ação fantasmagóri- ca à distância”, sendo a razão de uma de suas maiores críticas à Mecânica Quântica. Bell (1964) mostrou que correlações tão fortes quanto as previstas pela Mecânica Quântica para um par emaranhado não podem ser geradas por nenhum

9 A notação usual é Ψ = y1  y2  ...  yk.

mecanismo que satisfaça duas hipóteses físicas intuitivamente razoáveis e acei- tas classicamente: realismo (quantidades físicas têm valores bem definidos mes- mo antes de serem medidas) e localidade (não há ação instantânea à distância). Isso abriu caminho para que a questão fosse examinada experimentalmente por Aspect, Dalibard e Roger (1982), comprovando as previsões quânticas, e lançando dúvidas sobre a viabilidade da interpretação de Variáveis Escondidas.

Esse desenvolvimento mostra que nossas concepções de mundo clássicas es- tão incorretas, sendo preciso abandonar o realismo, a localidade, ou ambos. E que o emaranhamento possibilita fenômenos que seriam inviáveis na Física Clássica.

Exemplo: estados de Bell

Exemplos importantes de estados emaranhados são os estados de Bell, que formam uma base ortogonal para um sistema de 2 spins eletrônicos, e são dados por: Φ+ = BB + CC = DD + EE Φ– = BB – CC = ED + DE Ψ+ = BC + CB = DD – EE Ψ– = BC – CB = ED – DE (6)

Um par EPR é um par de partículas em qualquer desses estados.

Para ver porque esses estados são especiais, analisaremos Ψ+ em detalhes.

Os outros têm propriedades parecidas, mas com diferentes correlações entre os resultados para cada eixo. A igualdade em (6) é obtida usando (2):

Ψ+ = BC + CB (7)

= (D + E) C + (D – E) B = DC + EC + DB – EB

= D (C + B) + E (C – B) (8) = DD – EE (9)

Medindo o spin de qualquer dos elétrons na vertical temos probabilidades iguais de obter tanto B quanto C, na horizontal tanto D quanto E, e o mesmo vale para qualquer outro eixo. Logo, mesmo sabendo o estado quântico total, não se

pode atribuir aos elétrons individuais nenhum dos estados B, C, D ou E, nem qual- quer outro estado quântico puro, e por isso Ψ+ é um estado emaranhado.

Após medirmos um dos elétrons, ele passará a ter um estado bem definido. Com isso, o estado total do sistema irá colapsar e o outro elétron também ficará em um estado bem definido, mesmo sem termos interagido com ele. Quando final- mente medirmos esse outro, o resultado estará correlacionado com o anterior. Por exemplo, vemos em (7) que se começarmos medindo o spin vertical do primeiro elétron e obtivermos C, o estado total irá colapsar para Ψ’= CB, e ao medirmos o segundo elétron obteremos B com certeza. Se tivéssemos começado pelo segun- do, o resultado poderia ser tanto B quanto C, mas quando medíssemos o primeiro obteríamos sempre o spin oposto.

Até aqui essa correlação parece algo que pode ser obtido classicamente. Enviando as letras B e C em envelopes lacrados para duas pessoas, sem saber qual envelope foi para quem, teríamos que atribuir a ambas a mesma chance de obter cada letra. Mas após um dos envelopes ser aberto, teremos certeza do conteúdo do outro, mesmo que ainda esteja fechado.

O que a correlação quântica tem de diferente é que podemos escolher como medir um dos elétrons, e isso afetará o que pode acontecer com o outro. Por (9) vemos que se medirmos o spin horizontal do primeiro temos chances iguais de obter D ou E, e se em seguida o outro for medido também na horizontal o resultado será idêntico. Mas (8) implica que se a segunda medição for feita na vertical a cor- relação se perde: o resultado será B ou C, com chances iguais.

Outra propriedade importante dos estados de Bell é que eles podem ser transformados uns nos outros usando apenas operações locais (que atuam sobre só um dos elétrons). Por exemplo, Φ+ pode ser convertido em Ψ+ invertendo o sinal da componente E do primeiro elétron, em Φ trocando as componentes D e E desse elétron, e em Ψ fazendo ambas as operações.