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4 REVISÃO SISTEMÁTICA EM AGROECOLOGIA E SEGURANÇA

4.5 Principais argumentos temáticos dos estudos

4.5.2 Soberania alimentar

As abordagens de argumentação a respeito da soberania alimentar se mostraram como tema de bastante relevância e recorrência, presente na maioria dos artigos, – talvez muito em razão do fato de que na estratégia de busca sistemática estava contido tal conteúdo como descritor do parâmetro de localização dos artigos pertencentes às temáticas, como sinônimo de segurança alimentar e nutricional. Os estudos analisados enfatizam a necessidade de implementação de uma união entre os temas da agroecologia e da SAN, tendo a soberania como meio necessário para a garantia de ambos, deixando clara esta justificativa nas pesquisas.

Como forma de enfatizar o grau de relevância na demanda de discussões que abordam SAN e agroecologia em conjunção, o argumento da soberania alimentar foi defendida como ponto principal de discussão mais diretamente em cinco estudos da seleção: Reardon; Pérez (2010); Holt-Giménez; Altieri (2013); Boone; Taylor (2015); Maluf et al. (2015); Borba et al. (2018); e como panorama auxiliar de discussão em dois estudos da revisão: Chappell; La Valle (2011); Glamann et al. (2015); Canavesi; Moura; Souza (2016).

Como exemplo dessas abordagens, a verificação de desenvolvimento de indicadores em soberania alimentar em agricultores familiares em Cuba, objetivando a alcançar a garantia entre os dois temas centrais citados (REARDON; PÉREZ, 2010); o histórico da presença da soberania alimentar nas políticas públicas de SAN brasileiras (CANAVESI; MOURA; SOUZA, 2016); a discussão sobre sua posição de destaque diante de cenários políticos dominantes e extrativistas (HOLT-GIMÉNEZ; ALTIERI, 2013).

Em suas discussões estes estudos abordam em comum a forma de surgimento e crescimento da soberania aplicada aos contextos de movimentos sociais rurais (como o movimento “La via Campesina”) que conseguiram posicionar a soberania alimentar como “pautada pelo direito das pessoas e seus governos para definir democraticamente a composição de seus e sistemas de produção agrícola sem interferência externa”.

Os autores expressam que tal temática pode ser percebida no intermeio de movimentos rurais como agricultores familiares como La via Campesina – que inicia rompantes sobre reforma agrária e manejos de agricultura alternativa sustentável na América Latina –, a qual atribui em sua definição a noção de soberania alimentar como:

“O direito dos povos à produção de alimentos saudáveis e culturalmente adequados, através de métodos ecologicamente corretos e sustentáveis, e seus direito de definir seus próprios sistemas alimentares e agrícolas. Isso coloca aqueles que produzem, distribuem e consumem alimentos no cerne dos sistemas alimentares e políticas em vez das demandas dos mercados e das empresas. Defende os interesses e inclusão da próxima geração” (LA VIA CAMPESINA, 2017).

No estudo de Boone; Taylor (2015), o qual traz discussões sobre a promoção e manutenção da segurança e soberania alimentar a partir da implementação de projetos agroecológicos, as noções compartimentadas entre estas dois termos é muito bem pormenorizado, ao passo que pontuam o seguinte:

“A segurança alimentar e a soberania alimentar são na prática frequentemente confundidos, com limites entre os dois conceitos pouco claros. Abordagens de segurança alimentar tendem a se concentrar em garantir que as pessoas têm calorias suficientes regularmente e, historicamente, ignore as difíceis questões políticas de como, por que e para quem o alimento é produzido. Estratégias de segurança alimentar tendem a se mover em formação com políticas normativas compatíveis com um sistema de comércio neoliberal. Como tal, os projetos não focam na redefinição das relações de poder ou abordam o sistema de desigualdade nas relações comerciais globais, diferenciando o conceito a partir de uma trajetória de soberania alimentar. Soberania alimentar, por outro lado, prevê uma redefinição de precisamente esses tipos de relações sociais” (BOONE; TAYLOR, 2015).

Nas revisões de literatura que incluíram a soberania como parâmetro de pesquisa nas áreas entre biodiversidade e segurança alimentar, tal argumento também recebeu status de grande importância nesta interseção.

Seguindo esta perspectiva, Glamann et al. (2015) reuniram achados sobre soberania que “frequentemente se baseava nas ciências sociais e enfatizou as relações sociais e governança, ao lado de considerações mais amplas de sustentabilidade e bem- estar humano”. Entre as abordagens desta noção incluiu-se “o papel dos pequenos agricultores, a aplicação de práticas agroecológicas, como rotação de culturas, consórcio, ou agricultura de plantio direto”, englobando a SAN e a conservação da biodiversidade.

Já a revisão de Chappell; La Valle (2011) exprime que é frequentemente sustentado hoje que a “insegurança alimentar decorre de uma ‘falta de soberania

alimentar’, definida como a capacidade de uma região ou povo para definir sua própria agricultura, alimentação e políticas fundiárias ecologicamente adequadas, social, econômica e culturalmente”, apesar de os autores afirmarem também que esta noção vai além de suas discussões apontadas em sua pesquisa.

Outro estudo trata também desta perspectiva, mas como sinônimo direto e síncrono da segurança alimentar e nutricional, mas sem apresentar um conceito bem definido nas discussões: Maluf et al. (2015) delimita o ponto de vista da soberania amparado pela “primazia dos países conferirem suas próprias decisões em relação à produção e consumo de produtos alimentícios” e constrói seu trabalho em razão de uma perspectiva histórica, atrelada a políticas públicas e programas governamentais na área de educação, postulando a soberania como necessidade para a formação de uma agricultura sensível a nutrição.

A publicação de Borba et al. (2018) discute o mesmo argumento da soberania alimentar sobre um viés de aplicação junto aos movimentos sociais – o que trata de outro núcleo de abordagem também analisada nesta pesquisa e que comprova um entrelaçamento entre as discussões narrativas em conformação geral do tema abordado.

Em tal estudo, as argumentações construídas sobre a soberania alimentar são referentes à aplicação de estratégias pedagógicas no assunto e visa retornar tal discussão como forma de conhecimento e empoderamento de agricultores familiares, por meio da aplicação destas teorias em práticas teatrais, acessível e direta a tal grupo.

Neste cenário, o grupo do Movimento Sem-Terra (MST) no Brasil – a quem são destinadas as experiências do projeto dos referidos autores – passam a ter a oportunidade de construção “criticamente empenhada em buscar uma definição de segurança alimentar que os beneficie lidando diretamente com conceitos e práticas de segurança alimentar e soberania social e política” (BORBA ET AL., 2018).

Cabe salientar ainda que o estudo inaugural dos assuntos abordados de Mirkin; Khaziakhmetov (2000) não inclui o argumento da soberania em seus cenários de discussão sobre agroecologia e SAN, o que pode levar a uma percepção de que essa narrativa foi sendo percebida ao longo do desenvolvimento de discussões na área e construindo a sua importância, dada as prerrogativas de sua promoção apresentadas neste tópico.

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