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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS WISLEY GARCIA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

WISLEY GARCIA

A RELAÇÃO ENTRE AGROECOLOGIA E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL:

UMA REVISÃO SISTEMÁTICA

NATAL - RN 2020

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WISLEY GARCIA

A RELAÇÃO ENTRE AGROECOLOGIA E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL:

UMA REVISÃO SISTEMÁTICA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- graduação em Ciências Sociais, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ciências Sociais.

Área: Ciências Sociais / Linha de Pesquisa: Território, Desenvolvimento e Políticas Públicas.

ORIENTADORA: PROFESSORA

DOUTORA CIMONE ROZENDO

NATAL - RN 2020

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA

Garcia, Wisley.

A relação entre Agroecologia e Segurança Alimentar e

Nutricional: uma revisão sistemática / Wisley Garcia. - Natal/RN, 2020.

135f.: il. Color.

Dissertação (mestrado) - Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Pós-Graduação em Ciências Sociais, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2020.

Orientadora: Profa. Dra. Cimone Rozendo.

1. Agroecologia - Dissertação. 2. Segurança Alimentar e Nutricional - Dissertação. 3. Revisão Sistemática - Dissertação. 4. Epistemologias do Sul - Dissertação. I. Rozendo, Cimone. II. Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 631.95:612.3

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WISLEY GARCIA

A RELAÇÃO ENTRE AGROECOLOGIA E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós- graduação em Ciências Sociais, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito para obtenção do título de Mestre em Ciências Sociais.

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________________________ Professora Dra. Cimone Rozendo – Orientadora

Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPGCS/UFRN)

_______________________________________________________________ Professora Dra. Lore Fortes

Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPGCS/UFRN)

_______________________________________________________________ Professor Dr. Melquisedeque de Oliveira Fernandes

Curso de Licenciatura em Educação do Campo – Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA)

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Dedico esta dissertação à minha mãe, como símbolo de um retorno a quem dedicou sua vida aos filhos.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço muitíssimo a todos as pessoas que de alguma forma trocaram experiências comigo e me ajudaram a construir minha trajetória, personalidade e conhecimento. Em especial:

 A minha família, por todo amor e empenho de suas vidas para me proporcionar uma boa formação em todos os aspectos da minha vida.

 A Francisco, pelo amor, paciência e sabedoria para me ajudar em todas as horas.  A Cimone, por ter me apresentado a agroecologia e por enxergar em mim a

capacidade de um caminho na pós-graduação.

 A Michelle, por ter me amparado em meio às dúvidas iniciais de um novo ciclo e por ter me feito acreditar na minha vontade em ser pesquisador.

 Aos professores do PPGCS, pelo apoio nas aulas para compreensão de novas perspectivas no conhecimento, com destaque para Gilmar Santana, Alex Galeno, Fagner França, Hermano Lima e Ana Laudelina.

 A todos os amigos da pós-graduação, pela troca não só de conhecimentos na área, mas também pelos momentos de conversa sobre angústias e alegrias do mestrado.

 As amigas da graduação, por acompanhar e ajudar com muito humor e fraternidade os nossos caminhos: Thágila, Evelyn e Luana.

 Aos parceiros do laboratório de estudos rurais, que me mostraram uma nova percepção na pesquisa e me acolheram muito bem: Semilson, Keillany, Francisco e Letícia.

 As professoras do curso de nutrição, que acompanharam meu processo de estágio e ajudaram a me reafirmar o desejo pela docência: Célia Márcia e Viviane Chaves.

 A Vera Pinto, professora que mesmo de longe me inspira e me ensina o quanto é necessário valorizar o conhecimento e o ensino.

 A UFRN, pela estrutura e oportunidade de uma formação acadêmica.  A CAPES, pelo suporte financeiro da bolsa de pesquisa.

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João foi um pobre como nós, meu filho. Teve de suportar as maiores dificuldades, numa terra seca e pobre como a nossa.

Pelejou pela vida desde menino. Passou sem sentir pela infância. Acostumou-se a pouco pão e muito suor. Na seca, comia macambira, bebia o sumo do xique-xique. Passava fome. E quando não podia mais, rezava. E quando a reza não dava jeito ia se juntar a um grupo de retirantes que iam tentar

sobreviver no litoral. Humilhado. Derrotado. Cheio de saudade. E logo que tinha notícia da chuva pegava o caminho de volta. Animava-se de novo.

Como se a esperança fosse uma planta que crescesse com a chuva. E quando revia sua terra dava graças a Deus por ser um sertanejo pobre, mas corajoso e cheio de fé.

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RESUMO

As áreas da agroecologia e da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) podem ser consideradas como grandes desafios do século XXI em termos de implementação, desenvolvimento, manutenção e garantia. Tais temas, por vezes abordados de forma independente entre si, vêm recebendo destaque em discussões que os interseccionam diretamente. Diante deste campo emergente de interação, objetiva-se nesta pesquisa compreender como os conteúdos da agroecologia e da SAN transversalizam suas discussões no meio acadêmico, particularmente a partir de publicações disponíveis em bases de dados científicas. Devido à grande diversidade de estudos publicados, a metodologia da revisão sistemática da literatura foi escolhida como meio facilitador para seleção dos artigos. Seguindo critérios de análise orientados por tal metodologia, foram localizados 16 artigos científicos oriundos das plataformas SciELO, Scopus, Web of Science, e AGRIS, publicados até o ano de 2018, nos idiomas português, inglês ou espanhol. Com a apuração destes artigos, o questionamento sobre os principais atributos teórico-metodológicos mostrou tendência para um desenho quali-quantitativo, seja em estudos de caso ou em revisões nos temas; e com abordagem temática sobre a conservação da biodiversidade, da soberania alimentar e da manutenção e desenvolvimento dos agro ecossistemas alimentares. A indagação sobre as principais argumentações levantadas pelos estudos diz respeito a: biodiversidade, soberania alimentar, movimentos sociais, políticas públicas, resiliência e saúde. E sobre como estes argumentos auxiliam as intervenções de base agroecológica para contribuição da garantia da SAN foi observado que as perspectivas são amparadas em dois núcleos de discussão nas pesquisas: a) a valorização de estratégias na área da educação e da valorização do conhecimento; b) o incentivo ao fomento e implementação de políticas públicas na área da alimentação e agricultura sustentável. Além destes apontamentos, a análise revelou também uma preocupação dos autores dos artigos em relação ao desenvolvimento da agroecologia, com atenções sobre a disposição de seu futuro. Estas considerações somadas ao atual momento de crise causado pela COVID-19 fizeram despertar para esta pesquisa a proposta de uma reflexão semelhante à dos estudos analisados, a qual buscou fundamentos na teoria das epistemologias do sul para aludir a emergência de mudanças sistêmicas na sociedade contemporânea para a promoção e garantia de fato da agroecologia e da SAN.

Palavras-chave: Agroecologia. Segurança Alimentar e Nutricional. Revisão Sistemática. Epistemologias do Sul.

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ABSTRACT

Agroecology and Food Security can be considered as a major challenger in 21st century in terms of their development, implementation, maintenance and guarantee. Such themes are occasionally discussed independently from each other but recently they have been emphasized in discussions that intersect them directly. In view of this emerging field of interaction, the objective of this research is to comprehend how the intersection between agroecology and food safety contents are being discussed in an academic-scientific scope, particularly in publications available in the most remarkable academic-scientific databases. Due to a great diversity in publications, a systematic literature review was chosen as a methodology to facilitate articles’ selection. Following analysis criteria guided by such methodology, 16 scientific papers were selected, which were published until 2018, in Portuguese, English or Spanish, available at SciELO, Scopus, Web of Science, and AGRIS platforms. After an investigation of these papers, it was observed a tendency on quali-quantitative design in articles’ theoretical-methodological attributes, in case studies or in literature reviews; also a thematic approach on the conservation of biodiversity, food sovereignty and the maintenance and development of agro-food ecosystems. The main arguments raised by the studies are concerned mostly in: biodiversity, food sovereignty, social movements, public policies, resilience and health. These arguments helped to verify that agroecological-based interventions could contribute to food safety guarantee since two research discussion groups support it: promoting strategies in education field and eco knowledge; and encouraging a promotion and implementation of public policies in the area of sustainable food and agriculture. In addition, papers analysis also revealed an author’s concern in relation to agroecology development, focusing in a disposition of agreocology future. Allied to these considerations, current moment of abnormality caused by COVID-19 crisis has aroused to this research a similar proposal that was showed in papers analyzed. With this in mind, considerations on epistemologies of the south theory were approached to highlight the emergence of systemic changes in contemporary society for a deeply promotion and guarantee of agroecology and food safety.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Fluxograma das fases da revisão sistemática. ... 43 Figura 2 – Representação dos principais argumentos tematizados nos estudos ... 63 Figura 3 – Processo de construção de sistemas agro alimentares na promoção da agroecologia e SAN ... 81

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Características entre as dimensões alimentar e nutricional do termo SAN ... 23

Quadro 2 – Caracterização dos estudos incluídos na análise sistemática ... 44

Quadro 3 – Uso de temáticas e metodologias dos estudos selecionados ... 52

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AGRIS – International System for Agricultural Science and Technology ANA – Articulação Nacional de Agroecologia

CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior DHAA – Direito Humano a Alimentação Adequada

EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ENA – Encontros Nacionais de Agroecologia

FAO – Food and Agriculture Organization / Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura.

LOSAN – Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional MST – Movimento Sem-Terra

OMS – Organização Mundial da Saúde OEP – Osservatorio Europeo del Paesaggio PAA – Programa de Aquisição de Alimentos

PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar

PNAPO – Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica PNSAN – Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

PRISMA – Principais Itens para Relatar Revisões Sistemáticas e Meta-análises. SAN – Segurança Alimentar e Nutricional

SciELO – Scientific Electronic Library Online

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 15

2 ASPECTOS TEÓRICOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ... 18

2.1 Metodologia ... 18

2.1.1 Método ... 18

2.1.2 Critérios de elegibilidade dos estudos ... 20

2.1.3 Fontes de informação ... 21

2.1.4 Busca ... 21

2.1.5 Seleção dos estudos ... 22

2.1.6 Coleta de dados ... 22

2.1.7 Análise temática do conteúdo ... 22

2.2 Referenciais teóricos da pesquisa ... 23

3 UM BREVE CONTEXTO HISTÓRICO-SOCIAL ENTRE AGROECOLOGIA E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL ... 28

4 REVISÃO SISTEMÁTICA EM AGROECOLOGIA E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL ... 38

4.2 Seleção dos estudos ... 39

4.3 Caracterização dos estudos ... 40

4.4 Enfoques teórico-metodológicos dos estudos ... 49

4.5 Principais argumentos temáticos dos estudos ... 61

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4.5.2 Soberania alimentar ... 65

4.5.3 Movimentos sociais ... 68

4.5.4 Políticas públicas ... 69

4.5.5 Saúde ... 71

4.5.6 Resiliência ... 72

4.6 Intervenções agroecológicas para a promoção da SAN ... 74

4.7 Discussões ... 77

5 ANÁLISES SISTEMÁTICAS PARA MUDANÇAS SISTÊMICAS ... 89

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 102

REFERÊNCIAS ... 104

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1 INTRODUÇÃO

As noções sobre agricultura e alimentação sempre acompanharam o desenvolvimento da humanidade de uma forma correlacionada. Entre conquistas, lutas e adaptações, a agricultura se expandiu pelos territórios de todo o globo terrestre e exerceu um poder decisivo na história das civilizações, o que pôde proporcionar diversos arranjos na produção e consumo de alimentos.

De igual modo, a alimentação – desde sua dimensão local/regional à internacional –, pode ser compreendida como decorrência de uma miscigenação cultural, a qual foi sendo manifestada por meio dos vestígios entre trocas culturais de um povo.

Evidentemente, o manejo da agricultura influencia a quantidade de alimentos disponíveis para o consumo humano no mundo, o que a caracteriza como importante fator civilizatório. Assim como observa Altieri (2002), a agricultura tornou-se complexa, com a produção de alimentos atrelada ao manejo intensivo e à disponibilidade contínua do suprimento de energia e de insumos.

Entretanto, muitos povos sofrem com uma vulnerabilidade dada a partir da falta de alimentos disponíveis, fazendo estabelecer a fome como uma realidade severa e desumana para milhões de indivíduos. Estas marcas são algumas das características da conformação de um sistema agroalimentar global majoritariamente excludente, o qual, moldado pelo capital, foi sendo desenvolvido ao longo dos tempos modernos.

Este sistema culminou em modificações no modo de produção e consumo de alimentos, considerados a partir da estrutura social moderna, com o advento da globalização, do desenvolvimento industrial, do aumento da população e consequente urbanização; e atrelados ao uso extenuante dos recursos naturais, perda da biodiversidade e das mudanças climáticas.

Nesta perspectiva, é imprescindível a adesão de modelos agrícolas que sejam compatíveis com a manutenção e conservação de recursos naturais disponíveis. Tal adesão vai ao encontro de modelos que devem levar em consideração os avanços científicos, mas também estar atrelados à valorização dos conhecimentos locais; assim como priorizar o uso de tecnologias que sejam menos agressivas ao ambiente e à saúde das pessoas, dada uma aproximação e integração entre a ecologia e a agronomia.

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Tais fatores acompanham a caracterização das ideias e práticas da agroecologia, a qual, a partir da agricultura, orienta aspectos que incorporam questões sociais, políticas, culturais, energéticas, ambientais e éticas.

No que tange o consumo de alimentos pela população mundial, torna-se necessária uma produção em boas quantidade e qualidade, baseada na possibilidade de fácil acesso pela população a estes alimentos produzidos, culminando em dietas saudáveis dos indivíduos, além da promoção da cidadania e dos direitos humanos. Tais parâmetros dizem respeito à noção da segurança alimentar e nutricional (SAN).

Haja vista a importância destes temas, os conceitos de segurança alimentar e nutricional e agroecologia têm chamado muita atenção nas últimas décadas. Ambos podem ser considerados como grandes desafios do século XXI, em termos de desenvolvimento, implementação, manutenção e garantia. Tal como destaca Lima (2017), a garantia da SAN para todos demanda mudanças estruturais profundas na sociedade moderna e a agroecologia segue na direção dessas mudanças.

De mesmo modo, de acordo com Pretty et al. (2003) e Altieri (2004), iniciativas que implicam na aplicação da ciência agroecológica, alimentada por sistemas de conhecimento tradicionais, podem melhorar a segurança alimentar e nutricional, por vias de conservação dos recursos naturais, da agro biodiversidade e da conservação do solo e da água em comunidades rurais de várias regiões, conciliando a proteção dos recursos genéticos com a preservação ambiental.

No mesmo sentido, Bezerra e Schneider (2012) ressaltam que a SAN tem como pano de fundo a adoção de um projeto político intersetorial que estimule produção, processamento, distribuição, comercialização e consumo de alimentos saudáveis e adequados, devendo resgatar e valorizar o patrimônio e os hábitos alimentares culturalmente referenciados, de maneira articulada e integrada com o desenvolvimento sustentável local.

Esses dois temas são mais comumente abordados de forma mais independente entre si, em vários estudos científicos ou em áreas da prática de cada um. Apesar da grande importância denotada a partir da convergência entre agroecologia e SAN, não é muito extenso o campo de discussões que imbriquem diretamente tais tópicos.

Contudo, algumas discussões começaram a abordar especificamente a intersecção entre a agroecologia e a SAN, o que torna interessante refinar o entendimento sobre como as diferentes abordagens vêm sendo discutidas em um campo

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emergente de interação. Diante disso, pretende-se nesta pesquisa compreender como os conteúdos destes dois grandes temas transversalizam suas discussões no meio científico. Neste sentido, como problematizações de pesquisa são orientados questionamentos iniciais tais como: quais são os principais usos teóricos e metodológicos das pesquisas que relacionam agroecologia e SAN? Qual o referencial teórico das pesquisas? Quais teóricos das ciências humanas lançam luz sobre tais discussões? E das ciências biológicas? Existe uma área majoritária de discussão? Esse tipo de divisão no campo científico é observado nos estudos? Qual o tipo de pesquisa? Quais foram as técnicas para construção de dados? Quais narrativas e argumentos são mais destacados? O tema da agroecologia lançou luz para como facilitar a promover da SAN? Como esses estudos apoiam a questão da SAN?

Diante destas indagações prévias, e consciente da diversidade de estudos acadêmicos ancorados em várias bases de pesquisa, torna-se necessário um meio facilitador da sintetização do universo dessa produção científica. Para tanto, a viabilidade do método de revisão sistemática da literatura como procedimento metodológico desta pesquisa serve como apoio para o delineamento mais preciso e viável da análise.

Dessa maneira, a pesquisa segue especificamente os objetivos de analisar como se dá a vinculação da temática da segurança alimentar e nutricional entre os estudos com foco em abordagens agroecológicas e investigar de que modo a interseção dos temas da agroecologia e da segurança alimentar e nutricional tem sido abordada nas discussões científicas, particularmente publicadas em periódicos das maiores bases de dados disponíveis.

Na condição de apresentação dos conteúdos que compõem esta pesquisa, os próximos capítulos descrevem respectivamente: os aspectos teóricos metodológicos da pesquisa (CAP. 2), englobando a descrição detalhada da metodologia, assim como os referenciais teóricos da pesquisa. Depois, um breve contexto histórico-social sobre os temas em questão são deslindados (CAP. 3). O capítulo 4 é destinado para disposição da revisão sistemática estabelecida entre os dois temas citados, apresentando resultados e discussão da pesquisa. O capítulo 5 apresenta a relação entre análises sistemáticas e mudanças na sociedade, aproximando teorias sociológicas para o futuro da agroecologia. E, por fim, as considerações finais (CAP. 6) encerram os apontamentos da pesquisa.

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2 ASPECTOS TEÓRICOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

2.1 Metodologia

Em nível estrutural, o processo de pesquisa está sendo dimensionado nas seguintes etapas:

Inicialmente é feita a abordagem sistemática referente aos estudos sobre o tema geral da agroecologia e da segurança alimentar e nutricional, disposta a partir do método da revisão sistemática de literatura. Desta revisão, passa a ser dado foco à seleção de estudos que abordem ambos os temas de onde são discutidos os achados da pesquisa.

Logo, a partir do delineamento revelado pela sistematização, é discutida a percepção das dimensões que tais estudos expuseram, buscando, desta forma, responder as perguntas de partida concebidas; a saber:

● Quais são os principais atributos teóricos e metodológicos das pesquisas que relacionam agroecologia e segurança alimentar e nutricional?

● Quais os principais argumentos abordados pelos estudos que interseccionam agroecologia e segurança alimentar e nutricional?

● Como intervenções agroecológicas podem ser implementadas para promover a segurança alimentar e nutricional?

2.1.1 Método

Como processo metodológico, foi realizada a elaboração de uma revisão sistemática da literatura sobre as noções de agroecologia e sua interseção com a segurança alimentar e nutricional (SAN). Esta abordagem foi adotada como forma de apreciar a produção científica com discussões sobre as referidas temáticas, de modo a possibilitar respostas às inquietações expostas como objetivos da pesquisa.

Conceitualmente, como descreve as Diretrizes Metodológicas (BRASIL, 2012b, p.13), a revisão sistemática consiste em evidências provenientes de estudos

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primários, conduzido para responder uma questão específica de pesquisa. Também, é seguida pela organização e análise de dados dos estudos que serão incluídos na revisão (ROEVER, 2017, p.127).

Este tipo de revisão trata-se de uma metodologia rigorosa, proposta para “identificar os estudos sobre um tema em questão, aplicando métodos explícitos e sistematizados de busca; avalia a qualidade e validade desses estudos, assim como sua aplicabilidade” (DE LA TORRE; TAKAHASHI; BERTOLOZZI, 2011, p.1261).

A sistematização utiliza um processo de revisão de literatura abrangente, o qual segundo Higgins e Green (2011) localiza, avalia e sintetiza o conjunto de evidências dos estudos científicos para obter uma visão geral e confiável da estimativa do efeito da intervenção.

Ainda sobre esse tipo de revisão, segundo Sampaio e Mancini (2007, p. 84), os métodos sistemáticos são usados para “evitar vieses e possibilitar uma análise mais objetiva dos resultados, facilitando uma síntese conclusiva”.

No processo de revisão foram adotados como base norteadora os parâmetros estipulados pela recomendação PRISMA – Principais Itens para Relatar Revisões Sistemáticas e Meta-análises. Este posicionamento é assumido de forma a agregar características de organização, qualidade, confiabilidade e diminuição de possíveis vieses na composição da pesquisa.

A recomendação PRISMA foi elaborada em 2005 por um comitê de cientistas que atualizaram e substituíram as proposições de um antigo parâmetro. Como descrevem Galvão; Pansani; Harrad (2015, p.336), essa recomendação tem o objetivo de ajudar os autores a melhorarem o relato de revisões sistemáticas e meta-análises, baseando-se em um checklist com 27 itens – os quais podem ser melhor explorados na lista identificada pelo Anexo 1, além de um fluxograma de quatro etapas (Anexo 2).

Para aplacar a análise de como se dispõe a orientação à percepção das dimensões que o tema da agroecologia e sua conjunção com a SAN, são construídas sessões temáticas de análise, a partir do apurado na revisão sistemática.

Diante da seleção de pontos chave de discussão, obtidos de cada tema pontuado, passam a serem estimuladas as discussões teóricas e descritivas dos achados, englobando uma perspectiva mais detalhista e descritiva dos estudos.

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2.1.2 Critérios de elegibilidade dos estudos

Primeiramente, como orienta a recomendação PRISMA, a direção da revisão sistemática é conduzida a partir de questões de partida da pesquisa, já mencionadas, concernentes a três pontos específicos de compreensão.

Para serem considerados pertinentes à seleção da revisão os estudos foram apurados de acordo com os critérios de inclusão a seguir:

a) apenas estudos na categoria de artigos científicos; b) os estudos devem ter sido publicados como artigo original em revista científica, revisado por pares; c) os estudos devem estar escritos nos idiomas português, espanhol ou inglês; d) devem estar disponíveis ao acesso de forma online; e) são considerados artigos publicados até o ano de 2019 e não haverá critério de inclusão quanto à data de início das publicações de artigos no tema;

Em pertinência aos objetivos descritos, alguns critérios específicos também são levados em consideração. Dadas as categorias em que a agroecologia é disposta é tomado o seguinte:

● Dos estudos em que o enfoque da análise se volta para a abordagem científica da agroecologia serão incluídos para seleção final de análise aqueles que tratarem as discussões num âmbito que abordem de igual forma a temática da segurança alimentar e nutricional, a depender dos filtros dispostos orientados pela sistematização;

● Dos estudos em que o enfoque da análise se volta para a abordagem da agroecologia e segurança alimentar e nutricional, são incluídos para seleção final de análise aqueles que tratarem dos temas, apontando como objetivo ou ponto discussão crucial no estudo. Para tanto, devem ser direcionados como assunto do estudo, seja no título, palavra chave ou mesmo no escopo do resumo. Desta demanda, inicialmente a leitura do título e posteriormente a leitura do resumo e/ou trabalho completo serve de guia delimitativo para inclusão ou exclusão do estudo para análise nesta pesquisa.

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2.1.3 Fontes de informação

Como fontes de procura e localização dos artigos para a revisão foram consideradas as seguintes bases de dados: a) Scientific Electronic Library Online (SciELO); b) Plataforma Scopus, da Elsevier; c) Plataforma Web of Science; d) Plataforma AGRIS, da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

De modo a facilitar o processo de busca por fontes de informação, a utilização da plataforma CAPES como buscador é delimitado. Esta fonte, disponibilizada pelo governo brasileiro, inclui de maneira dinâmica e abrangente todas as bases de dados citadas e considera filtros de busca, os quais dão legitimidade e simplicidade ao processo metodológico desta fase da pesquisa, além de servir como ponto de partida para futuros estudos ou confirmação do caminho percorrido nesta revisão.

2.1.4 Busca

A estratégia de seleção dos artigos sobre agroecologia consiste na utilização de descritores específicos nos espaços de busca, em cada banco de dados. Dessa forma, foram utilizados os termos diretos e indiretos em como descritores de busca, e, para abranger maior totalidade nos estudos, a referência nos idiomas inglês e português foram definidas para feitura desta fase de revisão.

Neste sentido, o procedimento de localização dos estudos junto às bases de dados mencionadas detalhou-se pela busca dos seguintes termos chaves: “agroecologia” ou “agroecology”; “segurança alimentar e nutricional” ou “food security”; assim como, seus descritores que podem servir como sinônimos e que abordam uma gama de estudos que podem somar ao tema geral pesquisado, descritores esses em adição: “agricultura sustentável” ou “sustainable agriculture”; soberania alimentar ou “food sovereignty”, também que estejam contidos no título ou como palavra-chave (ou assunto) dos artigos publicados.

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2.1.5 Seleção dos estudos

Com o auxílio do gerenciador de referências Mendeley ®, todos os artigos estão organizados e possíveis duplicatas encontradas em diferentes bases de dados foram descartadas. Aplicando os critérios de elegibilidade previamente delineados, os artigos foram independentemente selecionados por dois revisores (mestrando e orientadora) com a finalidade de garantir maior acurácia nesta etapa. Os títulos e resumos dos artigos foram priorizados, estabelecendo uma primeira filtragem de relevância.

2.1.6 Coleta de dados

Após a seleção, em um primeiro momento cabe é direcionada a fase de extração de dados dos artigos apurados. Assim, foi realizado o preenchimento de uma planilha contendo as seguintes informações: autores; título; ano de publicação; localização do estudo; direcionamento do objetivo e das discussões do estudo em questão.

Neste sentido, os artigos que interligarem a temática da agroecologia no segmento à segurança alimentar e nutricional serão utilizados como arcabouço de construção criteriosa a respeito de como se deslindam as discussões científicas relacionadas sobre estes temas.

2.1.7 Análise temática do conteúdo

Como adição à análise dos dados concebidos pela revisão sistemática de literatura, para aplacar a verificação de como se dispõe a orientação à percepção das dimensões que o tema da agroecologia em si e da agroecologia em conjunção a Segurança Alimentar e Nutricional, serão construídas sessões temáticas de análise, a partir do apurado na revisão sistemática.

Assim, a fim de se construir um referencial de codificação, seguindo a metodologia da análise temática. De acordo com Jovchelovitch; Bauer (2010), a análise temática trata-se de um procedimento gradual de redução do texto, o qual opera com generalização e condensação de sentido. Ou seja, as unidades de texto são

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progressivamente reduzidas de forma a parafraseá-los em sentenças sintéticas, as quais serão posteriormente sintetizadas a palavras-chaves.

Essa síntese será importante para a investigação facilitada de como os estudos apontados referem de maneira mais homogênea a perspectiva de análise sobre a temática envolvida.

Posto em prática, categorias de análise serão elencadas a partir da leitura das discussões dos estudos sobre agroecologia e seu vínculo junto à segurança alimentar e nutricional, possibilitando a expressão direta para alcance real dos objetivos de pesquisa propostos.

2.2 Referenciais teóricos da pesquisa

De acordo com Burlandy; Bocca e Matos (2012), os efeitos da concepção da segurança alimentar e nutricional (SAN) culminaram em sua “abordagem sistêmica, para além da compreensão dos fluxos de interações que atravessam a cadeia agroalimentar, como é próprio dos estudos sobre food systems (sistemas alimentares)”.

Torna-se proveitoso destacar que segurança alimentar e segurança nutricional podem ser vistas como “duas faces da mesma moeda”, não se podendo garantir uma delas sem que a outra também esteja garantida (MALUF; MENEZES, 1996).

Como explicam Macedo et al. (2009) e Burity et al. (2010), as duas dimensões são distintas e complementares, uma vez que a dimensão alimentar refere-se aos processos de produção, comercialização e disponibilidade de alimentos; enquanto a nutricional diz respeito mais diretamente à escolha, ao preparo e consumo alimentar e sua relação com a saúde humana.

No quadro 1 são especificados os principais aspectos das dimensões dos termos da SAN e como elas se correlacionam.

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QUADRO 1: Características entre as dimensões alimentar e nutricional do termo SAN.

DIMENSÃO ALIMENTAR DIMENSÃO NUTRICIONAL

Suficiente para atender à demanda Escolha de alimentos saudáveis

Estável e continuada para garantir a oferta permanente

Preparo dos alimentos com técnicas que preservem o seu valor nutricional. Autônoma para que se alcance a

autossuficiência nacional nos alimentos básicos

Consumo alimentar adequado e saudável (sanitária e nutricionalmente)

Equitativa para garantir o acesso universal às necessidades nutricionais adequadas

Promoção dos fatores ambientais que interferem na saúde e na nutrição Sustentável do ponto de vista

agroecológico, social, econômico e cultural

Promoção dos cuidados com a saúde no âmbito da família e da comunidade Fonte: Burity et al. (2010).

De acordo com Kepple (2014), existem diversos arcabouços conceituais para orientar as discussões técnicas e políticas sobre esse conceito abrangente de SAN, o qual possibilita uma assimilação mais integral das inter-relações entre as dimensões da SAN.

A FAO incorpora quatro principais dimensões neste conceito, as quais servem tanto no auxílio da compreensão do conceito do termo, quanto na orientação, planejamento, elaboração e monitoramento de medidas que sustentem a garantia da SAN. As quatro dimensões da segurança alimentar e nutricional é compreendida por: a disponibilidade do alimento; o acesso ao alimento; a utilização dos alimentos e dos nutrientes; e a estabilidade, que é uma dimensão transversal às outras três.

Em seus relatórios (FAO, 2013; KEPPLE, 2014), a FAO especifica cada uma destas dimensões, as quais, em termos gerais, caracterizam-se pelo seguinte: a disponibilidade envolve questões de produção, comércio internacional e nacional, abastecimento e distribuição de alimentos; o acesso físico e econômico aos alimentos

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realiza-se quando todos têm a capacidade de obter alimentos de forma socialmente aceitável (meio da produção, compra, troca, etc.), o qual envolve os preços diretamente dos alimentos e também das outras necessidades básicas do conjunto de recursos disponíveis para a família; a utilização dos alimentos e dos nutrientes é geralmente tratada sob uma noção biológica nutricional, influenciada pelas condições de saneamento básico, saúde das pessoas, segurança microbiológica e química dos alimentos, além de abranger conhecimento nutricional, as escolhas e hábitos alimentares, e o papel social da alimentação na família e na comunidade. A estabilidade se refere ao elemento temporal das três condições já citadas.

Para seguimento desta pesquisa todas essas dimensões são consideradas, além de perseguir a orientação de uma outra dimensão abrangente, orientada pela perspectiva da sustentabilidade ambiental. Tal dimensão está atrelada diretamente a capacidade eficiente de produção e consumo de alimentos, de modo que sua garantia ganha vigência em um nível macro de assimilação, na busca pelo uso racional dos recursos naturais, buscando minimizar os efeitos do desequilíbrio não só ecológico, quanto econômico e social.

Este pressuposto é amplamente considerado nas discussões científicas sobre o tema em questão e, inclusive, faz parte da agenda política normativa constitucional brasileira. Neste sentido, a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN), institui como uma das diretrizes a “promoção do abastecimento e estruturação de sistemas descentralizados, de base agroecológica e sustentáveis de produção, extração, processamento e distribuição de alimentos”.

De mesmo modo, para elaboração desta diretriz, levou-se em consideração os desígnios da Lei Nº 11.346/2006, a qual assinala oficialmente a sustentabilidade no conceito de SAN, e descreve como definição:

A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis (BRASIL, 2006).

Mais precisamente, a noção sobre sustentabilidade pretendida nesta pesquisa é incorporada pelos atributos da agroecologia, a qual Altieri (2002) concatena a elementos para além dos componentes técnico-agronômicos.

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A evolução do conceito de agroecologia caminhou no sentido de englobar atualmente a contextura de agro ecossistemas sustentáveis, levando em consideração os diversos fatores que podem estar atrelados a essa estrutura e constituindo sólidas correspondências com a SAN. Como exemplo disto, os atores na agroecologia se dedicam à produção de alimentos limpos, à manutenção das sementes puras, à articulação de novos desenhos de distribuição e consumo de alimentos e ao envolvimento dos agricultores nestes desenhos; fatores indissociáveis na garantia da SAN.

Esta perspectiva se aproxima da definição de Sevilla-Guzmán e Woodgate (2002) para a agroecologia como um manejo ecológico dos recursos naturais, articulada por meio da ação social coletiva, com estratégias de natureza sistêmica, capaz de promover pela via da contra hegemonia a ampliação do acesso e melhoria da qualidade dos alimentos e assegurar a segurança alimentar e nutricional.

A agroecologia, como descreve Caporal (2009), tem seus princípios lançados sob um potencial técnico científico capaz de impulsionar mudanças substanciais no meio rural, inspirando estratégias para novos desenhos de agriculturas com maior sustentabilidade socioambiental e econômica sobre os diferentes agro ecossistemas.

Nesta perspectiva, a projeção da agroecologia pode ser pensada neste projeto tal como descrevem Caporal e Costabeber (2002):

A agroecologia corresponde fundamentalmente a um campo de conhecimentos de natureza multidisciplinar que pretende contribuir na construção de estilos de agricultura de base ecológica e na elaboração de estratégias de desenvolvimento rural, tendo-se como referência os ideais da sustentabilidade numa perspectiva multidimensional de longo prazo (CAPORAL; COSTABEBER, 2002).

Para além dos conteúdos conceituais, nas últimas décadas o termo agroecologia tem sido cada vez mais usado em outras dimensões epistemológicas. As perspectivas apresentadas a seguir sobre a agroecologia e suas dimensões serão levadas em consideração nesta pesquisa, de modo a auxiliar na categorização e análise sobre o tema.

Em destaque, o Osservatorio Europeo del Paesaggio (OEP, 2017) deslinda as dimensões da agroecologia em três vertentes: como ciência, sob um aspecto interdisciplinar de estudo, crítico ao padrão agronômico intensivo predominante; como

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movimento social, em contraposição aos efeitos da modernização agrícola mundial, pela defesa da soberania alimentar e proteção de recursos naturais; e como sistema alimentar, dada a interação entre produção de alimentos e sociedade, combinando a organização e consumo do setor.

No mesmo segmento, em revisão feita por Wezel et al. (2009) foi demonstrado que existem três objetos de estudo amplamente aceitos no meio, de modo que o termo agroecologia pode ser percebido em dimensões históricas e geográficas e refere-se a pelo menos três abordagens distintas:

A primeira engloba o aspecto científico, com abordagens sobre o campo, a ecologia de agro ecossistemas e de sistemas alimentares; a segunda se refere às práticas agrícolas, com uso de técnicas sustentáveis; e a terceira diz respeito ao movimento social e/ou político, haja vista o ambientalismo, o desenvolvimento rural, e a agricultura sustentável inseridas neste contexto.

Por fim, é interessante também destacar a visão que Sevilla Guzmán; Woodgate (2013) partilham sobre a agroecologia ser uma ciência que possibilita redesenhar os sistemas de produção por meio de formas de ação social coletiva, possibilitando o encontro dos sistemas de conhecimento – técnico, local, camponês, indígena – para potencializar a biodiversidade ecológica e sociocultural.

Tal compreensão se aproxima da corrente epistemológica que também faz parte como referencial a ser seguida nesta pesquisa, conhecida como as Epistemologias do Sul, descrita por Santos e Menezes (2009) como:

(...) conjunto de intervenções epistemológicas que denunciam a supressão dos saberes levada a cabo, ao longo dos últimos séculos, pela norma epistemológica dominante (...) valorizam os saberes que resistiram com êxito e as reflexões que têm produzido e investigam as condições de um diálogo horizontal entre conhecimentos. A esse diálogo entre saberes chamamos ecologia de saberes (SANTOS; MENESES, 2009).

Como as abordagens em agroecologia desta pesquisa derivam de experiências já discutidas em outras publicações, é enfatizada a importância de incentivar medidas que possam estar sendo silenciadas/suprimidas, tendo, na publicação destas experiências, um resgate emergencial com enfoque sobre fatores muitas vezes minimizados e marginalizados ao sistema. Estes fatores estão em harmonia com as perspectivas defendidas pelas epistemologias do sul.

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Assim, com este pressuposto, os norteamentos da pesquisa buscam incitar o apontamento de novas possibilidades referenciais que possam ir de encontro à supressão dos saberes e que vislumbrem o clareamento de novas perspectivas contestantes ao sistema alimentar prevalente.

3 UM BREVE CONTEXTO HISTÓRICO-SOCIAL ENTRE

AGROECOLOGIA E SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL

Um verdadeiro ciclo constitui o ato de comer, fazendo da alimentação uma estrutura compreendida por aspectos ligados desde a cadeia produtiva dos sistemas alimentares e que alcançam referências ao âmbito da vida social, cultural, econômica e política das sociedades.

A preocupação com uma produção de alimentos disponível para o total da população do planeta já vem sendo tema de discussão desde o final do século XVIII. Neste período, o economista Thomas Malthus anteviu um cenário de fome e miséria, diante da observação de um crescimento demográfico ultrapassando a capacidade produtiva da terra. Com o passar dos tempos a densidade populacional realmente se elevou, no entanto, as medidas tomadas para a produção de alimentos em proporcionalidade não se desenvolveram de forma tão progressista, estabelecendo a confirmação do cenário de fome antevisto.

Na verdade, a situação atual do mundo nesta perspectiva é destacada mais pela abundância e não pela carência da oferta de alimentos, o que pode ser observado como um paradoxo. Como expõem as argumentações de Oliveira e Rozendo (2016), tal situação é vinculada à questões políticas mais amplas; à inadequação dos sistemas agrícolas; às formas precárias e desiguais de acesso à terra, à água; entre outros fatores potenciais.

O próprio cenário brasileiro ilustra essa situação, quando ainda na década de 1940, Josué de Castro já denunciara em seus escritos a fome como um flagelo – um tema encarado como proibido na época. Tal noção é permeada pela geografia da insegurança alimentar presente no Brasil, em especial no Nordeste – cujas origens atrelavam-se mais aos estilos de desenvolvimento adotados até então do que às condições climáticas da região.

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Para Castro (1980) a fome era resultante da desigualdade social e do subdesenvolvimento, arduamente retratada como:

“querer justificar a fome do mundo como um fenômeno natural e inevitável não passa de uma técnica de mistificação para ocultar as suas verdadeiras causas que foram, no passado, o tipo de exploração colonial imposto à maioria dos povos do mundo, e no presente, o neocolonialismo econômico a que estão submetidos os países de economia primária, dependentes, subdesenvolvidos, que são também países de fome (CASTRO, 1980).”

No contexto da Segunda Guerra Mundial os países tiveram suas economias profundamente afetadas. Logo, o combate à fome em escala internacional passou a ser um elemento estratégico importante no jogo de disputas pelo controle geopolítico mundial. Como resultado, surgiram ao longo dos anos diversas organizações multilaterais e acordos internacionais que abordavam temas como comércio internacional, desenvolvimento da agricultura, ajuda humanitária, entre outros (SILVA, 2014).

Nestas circunstâncias, a realização da Conferência de Alimentação de Hot Springs, nos Estados Unidos, em 1943, pontuou um novo envolvimento internacional em torno da questão da fome e teve como marco a criação da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura – Food and Agriculture Organization (FAO). Tal Organização é considerada atualmente como principal iniciativa de articulação internacional para a elaboração e planejamento de estratégias contra a fome em nível global (HIRAI; ANJOS, 2007).

Diante de um cenário mundial pós-guerra, com déficit econômico e escassez de alimentos, Silva (2014) destaca que houve um amplo espaço para inserção do argumento da necessidade de modernização do setor agrícola, capitaneada pelas inovações da indústria química, um processo que passou a ser conhecido como Revolução Verde.

Com esta modernização, contudo, os interesses da industrialização da agricultura não foram orientados apenas para minimizar a situação da fome no mundo, mas sim para maximizar a apetência pelo ciclo de produção e lucro de grandes empresas agrícolas. Para tanto, como descreve Gliessman (2002), uma série de práticas foram desenvolvidas sem considerar os impactos de sua aplicação no longo prazo.

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Dessa forma, como explica Assis (2013), a modernização na agricultura determinou um aumento crescente de problemas de degradação ambiental aliado a uma maior concentração da posse da terra e exclusão social. Tal processo pode ser exemplificado por meio do uso de monoculturas em grandes áreas; do emprego massivo de insumos químicos; da manipulação genética de sementes e plantas; da irrigação mecanizada e do pesado maquinário rural;

Estes fatores auxiliam a compreensão sobre um cenário relativo a inserção das commodities no mercado financeiro, o que passa a indicar o sentido de uma propulsão de “modernização” ao custo da exaustão do planeta e abordando o apaziguamento da fome em segundo plano.

Mesmo com a produção mundial de alimentos crescente, tal como expõe Silva (2014), nos anos seguintes ao processo de industrialização agrícola ainda continuavam evidentes os males da desnutrição e da fome, atingindo gravemente parcela importante da população mundial.

Como descreve Belik (2003), a partir da Segunda Grande Guerra com mais de metade da Europa devastada e sem condições de produzir o seu próprio alimento, o conceito de Segurança Alimentar veio à tona, levando em conta três aspectos principais: quantidade, qualidade e regularidade no acesso aos alimentos.

Sob esta prerrogativa, a I Conferência Mundial de Alimentação das Nações Unidas, em 1974, estimulou uma nova ótica sobre as discussões do problema da fome. Como descreve Silva (2014), naquele momento os debates saíram de uma arena técnica – sem, contudo, abandoná-la – para uma área mais social e política, na medida em que o problema não se tratava apenas da oferta de alimentos, mas também da capacidade de seu acesso pelas populações em situação de vulnerabilidade social.

Nestes encaminhamentos, o mesmo autor enfatiza que a FAO passa a defender o problema da fome global não como uma questão exclusiva de pouca disponibilidade de alimentos, mas sim, derivada da pobreza de grande parte da população.

A transformação sobre a problemática ficou expressa na declaração final do evento, a qual foi representada por Jonsson (1989) como:

As causas da nutrição inadequada são muitas e intimamente inter-relacionadas, incluindo limitações ecológicas, sanitárias e culturais, mas a causa principal é a pobreza. Isto, por sua vez, resulta dos padrões de desenvolvimento socioeconômico, que na maioria dos países mais pobres têm-se caracterizado por um alto grau de

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concentração de poder, riqueza e renda nas mãos de relativamente pequenas elites compostas de indivíduos ou grupos nacionais ou estrangeiros (JONSSON, 1989).

Neste contexto, Silva (2014) salienta que há uma estreita ligação entre fome e pobreza e que ambos os fenômenos se influenciam mutuamente, visto que a fome – resultante da ingestão de alimentos em baixa qualidade e/ou quantidade – implica na deterioração do estado de saúde e, consequentemente, compromete o desempenho produtivo e a integração social de indivíduos.

Neste sentido, a amplificação do entendimento sobre os diversos fatores determinantes da fome e sobre as estratégias para sua erradicação em nível global culminou na adoção de novos conceitos em relação à temática. Assim, o termo segurança alimentar passou a ser cada vez mais recorrente nas argumentações sobre a capacidade de acesso físico e econômico aos alimentos por uma população.

Com a realização da Conferência Internacional de Nutrição (FAO – 1992), o termo nutricional passou a incorporar também a ideia descrita pela segurança alimentar. Valente (2002) elucida que a agregação da face nutricional ao termo faz referência ao acesso a alimentos da garantia da qualidade, no sentido das noções de nutrição e de proteção sanitária, contra a contaminação dos alimentos. Dessa forma, chegou a se estabelecer a denominação de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) para tratar os desafios de acesso e consumo de alimentos por toda população.

Diante dessa conjectura, a emergência da concepção de segurança alimentar e nutricional ocorre, portanto, como consequência da ampliação e politização de um antigo debate que não podia mais ser reduzido à expressão: fome (OLIVEIRA; ROZENDO, 2016).

Tal como expõe Galeazzi (1996), o conceito de SAN foi sendo ampliado ao longo do tempo, ao ponto que foram se estabelecendo políticas continentais que visassem a garantia do acesso à alimentação em quaisquer situações, seja em caso de guerra ou em caso de dificuldades econômicas nas nações. Burlandy (2009) descreve que a SAN passou a aderir progressivamente outras dimensões, tais como saúde, cultura e sustentabilidade ambiental, social e econômica.

Da mesma forma, recorrentemente o tema da SAN enfrenta dificuldades em ser incorporado com relevância como uma agenda política, porém, com avanços recentes sobre o tema. Como exemplo disso, especificamente no Brasil, apenas no ano

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de 2006 a SAN veio a obter um reconhecimento constitucional normativo, com o decreto da Lei nº 11.346, conhecida como a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional – LOSAN (BRASIL, 2006).

Numa direção pluralista o conceito de segurança alimentar e nutricional segue vias da definição da LOSAN, a qual entre suas atribuições indica em seu artigo segundo que:

A alimentação adequada é direito fundamental do ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição Federal, devendo o poder público adotar as políticas e ações que se façam necessárias para promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população (BRASIL, 2006).

Nesta perspectiva, é interessante o destaque sobre a dimensão abrangente da SAN, uma vez que o conceito vai ao encontro de princípios adotados pelas resoluções internacionais sobre a vigência do direito humano à alimentação adequada; além de também incorporar noções de sustentabilidade. Ou seja, percebe-se um enriquecimento do contexto da SAN, ampliando desde a questão da promoção da saúde e do acesso e distribuição de alimentos de forma universal, incorporando aspectos relacionados à sustentabilidade ambiental e ao estímulo a uma economia solidária.

Partindo da mesma perspectiva da sustentabilidade, a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do Brasil instaurou como uma de suas diretrizes a promoção do abastecimento e estruturação de sistemas sustentáveis e descentralizados, de base agroecológica, de produção, extração, processamento e distribuição de alimentos (BRASIL, 2006).

Ainda sobre os aspectos socioambientais concernentes a segurança alimentar e nutricional, de acordo com Molina (2011), o processo de sua garantia envolve a cadeia da produção, elaboração, transformação, transporte, distribuição, conservação e preparação dos alimentos; onde há a necessidade da adoção de uma visão pluralista ao fenômeno agrícola, mais ampla do que a meramente mecanicista.

Não obstante, historicamente no Brasil as políticas de incentivo à produção agrícola se concentraram em culturas especializadas para o mercado de alimentos (GLIESSMAN, 2002). Neste sentido, houve a desvalorização cultural desses recursos alimentares, prevalecendo o sistema de produção de alimentos baseado no modelo agrícola convencional, que em nome do conceito de desenvolvimento, definiu como

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progresso para o meio rural, a sua homogeneização sociocultural, contribuindo com a erosão do conhecimento local (SEVILLA GUZMÁN; WOODGATE, 2013; LEE et al. 2001).

Neste cenário, como aponta Lima (2017), a condição da sustentabilidade ambiental nas práticas alimentares é um indicativo para que os modos de produção de alimentos, cultivados sob uma consciência ecológica, sejam considerados como necessários para a garantia da SAN.

Contudo, vale salientar que a necessidade de incorporação das condições da sustentabilidade a um sistema alimentar vigente já era bem recorrente ao longo das discussões nesse tema. Sobre isso, na perspectiva de Maluf et al. (2015), ao discutirem o papel dos modelos agrícolas na promoção da saúde, apresentam a importância socioeconômica e ambiental na construção dos agro ecossistemas como contraponto ao modelo hegemônico de agricultura – o qual exaure os limites da capacidade produtiva da terra em favor do consumismo.

Nesta perspectiva, Caporal e Costabeber (2004) explicam que foi exatamente em um espaço de busca e construção de novos conhecimentos que emergiu a demanda de um enfoque científico capaz de dar suporte na transição para uma agricultura menos degradante e concernente aos processos de desenvolvimento rural sustentáveis, fenômenos ligados ao pensamento agroecológico.

Sob este aspecto, Maluf et al. (2015) enaltecem a importância do papel dos modelos agrícolas de base agroecológica na promoção de sistemas alimentares mais justos socialmente e ambientalmente sustentáveis. Dessa forma, passa a ser instaurado mais um elemento de reflexão sobre os modelos agrícolas, relacionado à perspectiva da sustentabilidade, de modo a agregar fatores que impulsionem o desenvolvimento agrário com atendimento à justiça social.

Com estas prerrogativas a agroecologia é estendida a novas questões. Logo, figura como ciência e prática que fornece subsídios para o desenho de agro ecossistemas, a partir da observação de experiências sustentáveis existentes, pela incorporação do conhecimento clássico e por influência das distintas correntes de agriculturas, tendo como base a abordagem interdisciplinar e holística (GLIESSMAN, 2001; ALTIERI, 2004; JESUS, 2005).

Como salienta Gliessman (2001), esta demanda pode ter sido um reflexo da influência da agroecologia como resposta ao modelo de desenvolvimento no campo proposto na Revolução Verde. Segundo Caporal e Costabeber (2004), a consciência

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acerca dos impactos da Revolução Verde sobre o meio ambiente e sobre a saúde foi geradora de crescentes movimentos de resistência de parcela importante da sociedade brasileira, a qual reivindicava a necessidade de diminuição do uso de agrotóxicos, eliminação de práticas agrícolas danosas ao solo e às águas superficiais e subterrâneas, eliminarem as queimadas e reduzirem o desmatamento, entre outras questões.

Tais movimentos trazem entre suas bandeiras a luta por uma agricultura nova, socialmente justa e ambientalmente sustentável. Deste modo, a agroecologia contribuiu amplamente para a incorporação do conceito de sustentabilidade na agricultura.

Etimologicamente, como consta na descrição do Marco Teórico em Agroecologia desenvolvido pela EMBRAPA (2006), agroecologia diz respeito à ecologia dos sistemas agrícolas (agro + ecologia), remetendo especificamente ao meio natural inerente a toda e qualquer forma de produção agrícola, seja ela convencional ou “alternativa”.

Como bem pontua Altieri (2004) a agroecologia tem o enfoque de orientar a agricultura à sustentabilidade econômica (potencial de renda e trabalho, acesso ao mercado), ecológica (manutenção ou melhoria da qualidade dos recursos naturais e das relações ecológicas de cada ecossistema), social (inclusão das populações mais pobres e segurança alimentar), cultural (respeito às culturas tradicionais), política (organização para a mudança e participação nas decisões) e ética (valores morais transcendentes).

O conceito de agroecologia admite múltiplas dimensões. Caporal e Costabeber (2004), a compreendem como uma reorganização preocupada com os processos produtivos, que contribuam para a realização de análises críticas para a reconfiguração de manejos adequados aos agro ecossistemas. Em uma definição mais ampla, Guzman e Molina (1996) teorizam que a agroecologia corresponde a “um campo de estudos que pretende o manejo ecológico dos recursos naturais, para reconduzir o curso alterado da evolução social e ecológica”.

Do ponto de vista histórico, a Agroecologia acompanha a agricultura desde seu advento. Como exemplo, Lima (2017) destaca que as chamadas agriculturas tradicionais, indígenas ou camponesas, quando analisadas, revelam sistemas agrícolas complexos adaptados às condições locais, com agro ecossistemas estrutural e funcionalmente muito similares às características dos ecossistemas naturais.

Já a Agroecologia, como campo de conhecimento científico, é algo mais recente. De acordo com Gliessman (2001), que considera a Agroecologia como “a

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aplicação dos conceitos e princípios da Ecologia no desenho e manejo de agro ecossistemas sustentáveis”.

De acordo com a análise temporal realizada por Wezel et al. (2009), a agroecologia aparece pela primeira vez em escritos científicos de 1928, na publicação de Bensin, vinculada a métodos ecológicos em plantas comerciais. Até os anos 1960, a agroecologia continuava sendo apenas um assunto científico centrado em princípios ecológicos; e a partir dos anos 1980, passa a ser vista como prática agrícola atrelada a movimentos sociais, “envolvendo várias abordagens para resolver os desafios reais da produção agrícola” (WEZEL et al., 2009).

Segundo Gliessman (2001), no início dos anos 1980, a Agroecologia tinha emergido como uma metodologia e uma estrutura básica conceitual distinta para o estudo de agro ecossistemas. Esse período teve fortes influências dos estudos sobre sistemas de cultivos e conhecimentos tradicionais em países em desenvolvimento, que passavam a ser reconhecidos como exemplos importantes de manejo de agro ecossistemas, ecologicamente fundamentados (GLIESSMAN, 2001).

Como pontua Gliessman (2001), na década de 1990, após um movimento pró agricultura alternativa, as bases para a construção do movimento agroecológico começaram a se fortalecer, com amplo apoio de agricultores como agentes de transformação social e da revalorização dos seus conhecimentos, nos processos de desenvolvimento e na conformação de estilos de agriculturas mais sustentáveis.

Nessa perspectiva, tal como afirma o marco teórico em agroecologia (EMBRAPA, 2006), amparado na integração interdisciplinar e nas bases científicas da sustentabilidade da agricultura, aflorou-se um novo paradigma que busca uma agricultura para além dos aspectos da maximização da produção, “levando em consideração as influências de aspectos socioculturais, políticos, econômicos e ecológicos no âmbito do sistema alimentar e do desenvolvimento rural”.

As discussões sobre agroecologia foram ancoradas na promoção de um novo modelo de desenvolvimento agrário sustentável, com impactos positivos sobre as dimensões sociais, ambientais e de desenvolvimento locais. Historicamente, no caso do Brasil, Gliessman (2001) denota que as políticas de incentivo à produção agrícola se concentraram em culturas especializadas para o mercado de alimentos, acompanhada da desvalorização cultural desses recursos alimentares, prevalecendo o sistema de produção de alimentos baseado no modelo agrícola convencional.

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No mesmo sentido, tal como descreve Sambuichi et al. (2017), a partir de 2003 no Brasil, a capacidade organizativa de agricultores familiares, representantes técnicos e assessores em agroecologia, regado pela pressão social de movimentos e com discussões cada vez mais avançadas sobre a articulação normativa do fazer agroecologia, foram de suma importância para acelerar as discussões para um plano normativo que traria um caráter prático oficial as demandas e práticas de um modelo agrário sustentável.

Também no Brasil, num cenário de atuação de uma pauta política mais favorável ao avanço do agronegócio, a demanda pela construção de modelos agrícolas alternativos a este aporte torna-se dependente de políticas públicas que apoiem tais iniciativas. Assim, num contexto de disputas, vão sendo formulados instrumentos e normativas legais reconhecendo perspectivas distintas para o desenvolvimento da agricultura no país.

Entre os mais importantes marcos destes resultados está o decreto n° 7.794, de 20 de agosto de 2012, o qual instituiu a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica - PNAPO (BRASIL, 2012a). Embora, muitos de seus preceitos já estivessem incorporados ao desenho de diversos programas e políticas governamentais como mostram Rozendo e Diniz, (2019); Diniz e Rozendo, (2019); Canavesi, (2016).

A PNAPO incorpora como diretriz a oferta de produtos de base agroecológica visando à promoção da soberania e segurança alimentar e nutricional e do direito humano à alimentação adequada. Ademais, tem por objetivo:

“integrar, articular e adequar políticas, programas e ações indutoras da transição agroecológica e da produção orgânica e de base agroecológica, contribuindo para o desenvolvimento sustentável e a qualidade e vida da população, por meio do uso sustentável dos recursos naturais e da oferta e consumo de alimentos saudáveis” (BRASIL, 2012a).

Não obstante, mesmo com todo o potencial e empenho dos atores envolvidos na prática e ciência da agroecologia, o que vem sendo majoritário neste campo ainda é uma observância marginal, com reflexos lentos de mudança na matriz agrária predominante.

Levando em consideração o contexto social, econômico e ambiental de depauperamento mundial, se faz urgente uma melhor compreensão acerca das alternativas ao modelo industrial de agricultura, buscando aliar a produção agrícola com

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a conservação ambiental e a melhoria da qualidade de vida no planeta. Como destaca Souza (2009), há uma inserção lenta do debate entre os movimentos sociais, agricultores familiares – e, consequentemente, por parte dos cientistas – sobre a forma de produzir, a quantidade, as técnicas e os saberes numa perspectiva ecológica da produção de alimentos.

Embora o termo Agroecologia tenha sido utilizado há mais tempo, nas últimas três décadas o conceito ganhou maior visibilidade, consistência e sentido dentro da cultura, da ciência contemporânea e da viabilidade de mudanças sobre um sistema alimentar sustentável. Esse avanço é impulsionado pela contribuição dos atores envolvidos nas amplas perspectivas que a agroecologia abrange, desde os Encontros Nacionais de Agroecologia (ENA), da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), além das discussões de muitos cientistas, a exemplo de Miguel Altieri, Stephen Gliessman, Francisco Roberto Caporal, entre outros.

Diante dessa conjuntura, mesmo depois de décadas de intensa aplicação de um aporte tecnológico à agricultura ainda é possível observar, segunda dados da FAO (2012), a assustadora marca de mais de dois bilhões de pessoas em estado de subnutrição no mundo, dentre os quais 800 milhões de pessoas em situação de fome extrema – ou seja, um a cada nove habitantes no mundo. Além disso, é igualmente preocupante a instauração da transição nutricional da população que também acomete atualmente os indivíduos à epidemia da obesidade, a qual, entre outros fatores, tem na indústria de alimentos uma de suas causas.

A demanda global por alimentos de fato continua crescendo rapidamente, o que gera cada vez mais demandas conflitantes entre a expansão da produtividade agrícola e a manutenção das funções naturais dos ecossistemas que suportam a vida na Terra (HANSPACH et al., 2017). A agroecologia pode auxiliar como importante ferramenta, uma vez que tem sido cada vez mais necessária como aporte na promoção de transformações da realidade social e ecológica em distintas situações, contribuindo assim para o desenvolvimento rural e a sustentabilidade.

Com isso em mente, torna-se claro a urgente necessidade de se implantar sistemas produtivos capazes de aliar a produção e eficiente distribuição de alimentos saudáveis à provisão de outras funções vitais, como a melhoria da qualidade dos recursos naturais, bem como uma maior equidade social (WEZEL et al., 2009).

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