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A partir da análise de conteúdo do CsF emanam novos significados que auxiliam na compreensão acerca da experiência do Programa na UFC e ajudam a responder à questão proposta no início da seção acerca das concepções e valores que nortearam o CsF.

O Programa CsF foi criado com a finalidade de, em seus termos, proporcionar por meio da mobilidade acadêmica uma formação qualificada em áreas de ciência e tecnologia, consideradas prioritárias para a economia brasileira. Como consequência, o programa contribuiria para criar possibilidades de cooperação com universidades estrangeiras, dar maior visibilidade internacional à pesquisa realizada no Brasil, contribuindo não somente para impulsionar a internacionalização das universidades, mas para aumentar a competitividade das empresas brasileiras.

Dessa forma, a caracterização acadêmico-institucional do Programa CsF esconde sua intencionalidade que está no uso econômico do conhecimento com vistas a atender a demandas econômicas e interesses privados. Ao aprofundar na análise de conteúdo do Programa, fica clara sua dimensão econômica, especialmente no Plano Plurianual 2012-2015 que o coloca como estratégia prioritária para “qualificação de mão-de-obra”.

O Programa CsF realça o campo de tensões existente nas universidades e que, por conseguinte, envolve a internacionalização do ensino superior, colocando-a entre as fronteiras da cooperação e da mercantilização da educação. Isto porque a universidade, como instituição social, transforma-se, tendo sua função social ressignificada à medida que o mercado apresenta suas demandas.

Nessa conjuntura, a universidade “perde” relativamente sua autonomia na construção do conhecimento, submetendo-se às necessidades do mercado, o que muitas vezes pode significar maiores investimentos em áreas como engenharias e tecnológicas em detrimento de pesquisas nas áreas de humanidades e ciências sociais. Essa segregação de áreas de conhecimento foi fortalecida com a implantação do CsF, revelando a disputa de interesses, predominante na comunidade científica. (BOURDIEU, 1976; CHAUÍ, 2001).

Na UFC, como em outras universidades, houve críticas por parte do reitor 1, do coordenador de assuntos internacionais e do pró-reitor de graduação 1, ao citar a exclusão do Programa da área de humanidades. Essa percepção afeta de alguma forma o significado que esses gestores atribuíram ao CsF e como ele foi implementado na Universidade, pois os gestores

influenciam sobremaneira a implementação de ações na instituição a partir de seus próprios valores e referenciais, não somente a partir das regras predefinidas. (LIPSKY, 1980).

Lançado de forma abrupta por parte do Governo Federal, não houve participação das universidades no processo de elaboração do CsF. Estas ficaram, portanto, limitadas a implementar o Programa de acordo com as definições impostas pelo Governo Federal, o que restringiu o poder discricionário dos gestores em implementar o Programa e desconsiderou as particularidades da UFC. (OLIVEIRA, 2014; LOTTA; PAVEZ, 2010).

Nesse processo, cabia à UFC divulgar os editais, homologar as inscrições dos candidatos e enviar à CAPES e ao CNPq, bem como realizar o aproveitamento das disciplinas no retorno dos alunos. Inicialmente, em 2011, a Coordenadoria de Programas Acadêmicos, da PROGRAD ficou responsável por realizar essas atividades, passando a cargo da CAI em 2012, já que esse era o setor responsável pelas relações internacionais na UFC. Observa-se, portanto, que a UFC foi ajustando seus processos à medida em que o CsF foi sendo implementado. (LEJANO, 2012).

Por meio da análise de conteúdo, foi possível traçar um cenário acerca das práticas de internacionalização da UFC antes, durante e depois do CsF. Antes, segundo o coordenador de assuntos internacionais, as atividades da CAI eram restritas aos acordos de cooperação com universidades estrangeiras, pelo Programa PEC-G, que recebia alunos oriundos da América Latina e de países de língua portuguesa, além de programas de mobilidade acadêmica que enviavam menos de 100 estudantes por ano, como comprova a figura 13:

Figura 13 – Alunos da UFC no exterior antes do CsF

Fonte: Anuário Estatístico UFC 2012, base 2011

Durante o CsF, de acordo com o coordenador de assuntos internacionais, uma média de 600 alunos por ano saíram da UFC pelo CsF, conforme demonstrado anteriormente na figura 1123. Após o CsF, os números voltaram a cair. O Anuário de 2019, base 2018 mostra

que em 2018 a UFC teve apenas 59 alunos em universidades estrangeiras. (UFC, 2019). Esses dados oferecem um indicador relevante acerca da repercussão do CsF na internacionalização da Universidade, de que no quesito mobilidade acadêmica, um dos critérios da CAPES, a UFC teve um salto relevante em decorrência do Programa, como mostra o gráfico 2:

Gráfico 2 – Alunos da UFC no exterior de 2008 a 2018

Fonte: Anuários Estatísticos da UFC (2017; 2018)

Outro critério utilizado pela CAPES no tocante à internacionalização consiste nas condições estruturais. Sobre esse critério, observa-se que a implementação do CsF não afetou naquele momento a estrutura da CAI, que era composta por um coordenador, dois servidores e um terceirizado. Essa estrutura não foi suficiente para atender a alta demanda decorrente do CsF.

Apesar de haver um movimento entre as universidades para elevar o grau da internacionalização por meio de melhores condições estruturais, não houve, naquele momento, na UFC nenhuma ação nesse sentido. Isto porque, segundo Oliveira (2014), as decisões tomadas são políticas e, por isso mesmo, podem estar, ou não, alinhadas com os objetivos educacionais priorizados pela instituição.

Verificou-se que possivelmente, a falta de um todo um aparato institucional que facilitasse esse processo de implementação, como uma estrutura física adequada, com servidores suficientes, que dessem conta da alta demanda de bolsas submetidas, afetou o controle e monitoramento dos dados que foram divergentes entre a CAI e a PROGRAD.

A CAI, que ficou na condição de coordenadoria por 30 anos, só foi transformada em Pró-Reitoria de Relações Internacionais em 2017, na gestão do reitor Henry de Holanda Campos, quando o Programa CsF já havia acabado, mostrando que a UFC foi se ajustando às demandas da internacionalização, pois, segundo Lejano (2012, p. 228) “mesmo que uma

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política não seja totalmente coerente, a sociedade ao seu redor acabe se ajustando a ela e adeque o que está ao seu redor à nova instituição”.

Já em 2020, três anos depois, na gestão do reitor José Candido Lustosa Bittencourt de Albuquerque, essa Pró-Reitoria assumiu mais uma competência, tornando-se Pró-Reitoria de Relações Internacionais e Desenvolvimento Institucional, com a função de desenvolver o empreendedorismo e a inovação na UFC, em conformidade com a proposta do Future-se. (MEC, 2019).

Percebe-se, portanto, que a internacionalização no sentido de solidariedade entre as universidades vai sendo suprimida e o termo vai assumindo novos sentidos e trajetórias à medida que vão mudando os contextos e os gestores; vai adquirindo contornos mercadológicos, submetendo a universidade à prestadora de serviços universitários. (SOUZA SANTOS, 2011). Por essa razão, não há como dissociar os paradigmas que nortearam o CsF de todo o contexto em que ele estava inserido. Faz-se necessário, portanto, voltar o olhar para a conjuntura política em que o Programa foi implementado, nos Governos Dilma Rousseff (2011- 2016) e Temer (2016-2018), bem como na UFC, compreendendo as gestões dos reitores Jesualdo Pereira Farias (2008-2015) e Henry de Holanda Campos (2015-2019), pois a avaliação de uma política pública não pode estar alijada da configuração do Estado e das instituições.

5 A VIAGEM DE VOLTA: ANÁLISE DE CONTEXTO POLÍTICO INSTITUCIONAL DO PROGRAMA CSF

É necessário deixar o texto por alguns instantes e refletir sobre o que estava acontecendo de forma mais abrangente no seio da sociedade como um todo naquele momento. (Lejano).

Para se compreender melhor as intencionalidades e concepções norteadoras do Programa CsF, que ensejaram não somente sua formulação, mas seu fim, é pertinente refletir: Qual o momento político o Programa CsF foi criado e encerrado? Que mediações de ordem ideológica e política atravessam o Programa CsF?

Esta perspectiva avaliativa considera que não há como se avaliar uma política pública sem analisar a configuração de Estado em que ela está inserida, pois sua dinâmica reflete as concepções ideológicas de um governo e o modelo de Estado vigente. Para tal, faz-se necessário voltar o olhar para os caminhos da atuação do Estado brasileiro no Governo Dilma Rousseff (2011-2016) e no Governo Michel Temer (2016-2018) e como esses reverberaram institucionalmente nas gestões dos reitores Jesualdo Pereira Farias (2008-2015) e Henry de Holanda Campos (2015-2019) na UFC no período de implementação do Programa CsF.

Dessa forma, esta seção está dividida em três partes: 5.1) Análise do Contexto Nacional, 5.2) Análise do Contexto Institucional e 5.3) Sobre os contextos: entre a conjuntura política nacional e a instituição.