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CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO

3.3. Sociedade Inclusiva

Uma sociedade aberta a todos, que estimula a participação de cada um, aprecia as diferentes experiências humanas e reconhece o potencial de todo cidadão é denominada sociedade inclusiva. A sociedade inclusiva tem como objetivo principal oferecer oportunidades iguais para que cada pessoa seja autônoma e autodeterminada. Dessa forma, a sociedade inclusiva é democrática, reconhece todos os seres humanos como livres, iguais e com direito a exercer sua cidadania (CORRÊA, 2005, p.9).

É um modelo de sociedade que tem compromisso com as minorias desfavorecidas e parte do princípio que todos os homens têm o direito de contribuir com seus talentos para o bem comum. A sociedade inclusiva deve estar estruturada para atender às necessidades de cada cidadão, dos privilegiados aos marginalizados (WERNECK, 2000).

Ratza (2001, p.21) define a sociedade inclusiva da seguinte maneira:

É uma sociedade para todos, independentemente de sexo, idade, religião, origem étnica, raça, orientação sexual ou deficiência; uma sociedade não apenas aberta e acessível a todos os grupos, mas que estimula a participação; uma sociedade que acolhe e aprecia a diversidade da experiência humana; uma sociedade cuja meta principal é oferecer oportunidades iguais para todos realizarem seu potencial humano.

Refere-se ao respeito à diversidade na perspectiva da construção de uma sociedade que, embora diversa, ofereça aos seus cidadãos, condições crescentes de vida digna, produtiva e satisfatória (BUENO, 2004; FÁVERO, 2004). Um lugar onde as diversidades sejam aceitas e respeitadas no convívio sociocultural, contribuindo para a autonomia e a participação social de todos sem discriminação.

A Convenção da Guatemala define discriminação, deixando clara a impossibilidade de diferenciação, exclusão ou restrição com base na deficiência. Fávero (2004) acrescenta que para se garantir o direito à inclusão social irrestrita é preciso muita cautela na aplicação do princípio de igualdade quando estivermos tratando de diferenciação feita com base em deficiência, para não se cair na idéia de igualdade vinculada a idéia de justiça, que nos faz agir tratando de maneira igual aos iguais e desigual aos desiguais, mesmo que por caridade, solidariedade ou qualquer outro sentimento que tente promover a dita justiça.

Na própria Convenção da Guatemala são apresentados três requisitos para não se transformar diferenciação em discriminação, já que em alguns casos a diferenciação é necessária, mas esta não deve ser discriminatória. Fávero (2004, p.46) resume esses três requisitos da seguinte forma:

1o requisito – é preciso que a diferenciação seja adotada para promover a

inserção social ou o desenvolvimento pessoal daquele que está sendo diferenciado. Ou seja, é preciso que se trate de uma medida positiva, um „meio de acesso a ...‟, e não uma diferenciação para negação de acesso da mesma forma que outros.

2o requisito – ainda que se trate de uma medida positiva, é preciso que

essa diferenciação não limite, em si mesma, o direito à igualdade dessas pessoas. Essa proibição é também muito importante, porque deixa claro que a „diferenciação positiva‟, ou „permissão de acesso‟ tem que visar o mesmo direito fundamental a ser exercido por qualquer pessoa (saúde, educação, trabalho, lazer).

3o requisito – finalmente, e felizmente para quem tem deficiência, ainda que a diferenciação seja considerada positiva, que não fira em si mesma o direito de igualdade; de acordo com a Convenção, para não ser discriminatória, é preciso que a pessoa não seja obrigada a aceitar a diferenciação, ou mesmo, a preferência.

Em suma, a diferenciação mesmo quando necessária e positiva deve permitir e proporcionar oportunidades de escolha em utilizá-la ou não. É dentro dessa perspectiva que se considera hoje a acessibilidade e a inclusão, lembrando sempre que a proposta não é criar espaços e ambientes separados para uso exclusivo das pessoas com deficiência, o que seria uma forma de discriminação, e sim, pensar em produtos, sistemas e ambientes desde o projeto que possam ser utilizados por todos de forma sadia e segura, sem tornar nítida a limitação que alguém possa vir a enfrentar (CREA-SP, 2003; FÁVERO, 2004).

Os processos sociais, de integração e de inclusão, são ambos muito importantes. A ação de integração social terá uma parte decisiva a cumprir, cobrindo situações nas quais ainda haja resistência contra a adoção de medidas inclusivistas dentro de organizações e de espaços excludentes da sociedade (SASSAKI, 200_).

O que se deve ter em mente é a diferença existente entre ambas. A moderna terminologia da inclusão social apresenta sentidos distintos para os dois processos sociais. Na integração (FÁVERO, 2004; SASSAKI, 200_), a sociedade admite a existência das desigualdades e permite a incorporação de grupos excluídos, diz respeito a inserção da pessoa com deficiência que consiga adaptar-se e esteja preparada para conviver na sociedade.

O mérito da proposta da integração está em seu forte apelo contra a exclusão e a segregação de pessoas com deficiência. Todo um esforço é concentrado no sentido de promover a aproximação entre a pessoa com deficiência e o ambiente (mundo) comum. Contudo, sempre com o peso da responsabilidade colocada sobre as pessoas com deficiência no sentido de se prepararem para serem integradas à sociedade. Neste caso, a sociedade é chamada a deixar de lado seus preconceitos

e aceitar as pessoas com deficiência que realmente estejam preparadas (SASSAKI, 200_).

A inclusão, por sua vez, significa a modificação de diversos aspectos da sociedade, como um pré-requisito para que as pessoas com deficiência possam buscar seu desenvolvimento e exercer sua cidadania plena. Nela todos fazem parte da mesma comunidade e garante-se a adoção de ações para evitar a exclusão por não aceitá-la como condição intrínseca da sociedade (FÁVERO, 2004; SASSAKI, 200_).

De acordo com Sassaki (200_), não são todas as pessoas com deficiência que necessitam de uma reestruturação geral da sociedade, algumas estão aptas a se integrarem na sociedade como esta se encontra ou se nela forem realizadas adaptações básicas no meio físico. Contudo, a situação de exclusão não deixa de existir para aquelas com limitações que a impedem de integrar-se. Esse grupo não poderá participar plena e igualmente da sociedade se esta não se tornar inclusiva e democrática.

Muitos avanços já foram conseguidos na luta pela inclusão, mas o que acontece comumente dentro das administrações públicas brasileiras são ações pontuais que não contemplam o todo e, dessa forma, se tornam ineficientes. É um desperdício do dinheiro público em projetos muitas vezes com níveis de prioridade e de magnitude superficiais e contraditórios, incentivando assim, investimentos e ações pontuais desarticuladas que não abrangem a diversidade e nem facilitam a construção de uma sociedade inclusiva. Enquanto as questões de acessibilidade forem tratadas sob forma de políticas e de administrações temporárias, suas ações continuarão a ser pontuais e desconexas.

Muitas leis foram e são criadas (MASSARI, 2004; MENDONÇA, 2004) buscando a integração e a inclusão das pessoas com deficiência dentro da sociedade. Os problemas que dificultam os trabalhos de inclusão social das pessoas com deficiência, não se caracterizam pela ausência de dispositivos legais que promovam essa garantia, mas, por exemplo, ao fato da inexistência de um plano eficaz de monitoramento de suas regulamentações.

Para Mendonça (2004), o que falta é integrar o que é recomendado por lei dentro da sociedade brasileira, transmudando o que hoje constitui obrigação, em satisfação de integrar um cidadão impedido de exercer sua cidadania plena, ao convívio social sadio e produtivo, sem que com isso, lhe estejam concedendo uma

graça, por simpatia, por piedade, por generosidade ou por concessão, mas promovendo justiça. Outra questão que dificulta o cumprimento das leis é que, como são legislações muito específicas, dão margem a má interpretação e suas sugestões acabam sendo usadas de maneira errônea, dificultando ainda mais a inclusão e o deslocamento autônomo desta parcela da população dentro da cidade.

Dischinger (2006) afirma que a complexidade das situações a se avaliar, onde problemas de diferentes naturezas estão associados, juntamente com a dificuldade de acesso ao conhecimento técnico existente, são agravados pela falta de uma formação profissional que complemente o conteúdo das diversas leis e normas existentes. A autora coloca (DISCHINGER, 2006) como exemplo, a mera aplicação de soluções pontuais previstas pela nova norma técnica (NBR 9050/2004).

As recomendações previstas nesta norma que atende pela eliminação de barreiras espaciais não garantem a acessibilidade para todos se não houver uma compreensão das necessidades resultantes das características dos indivíduos com deficiência em organizações espaciais diversas. Esta afirmação apresenta outro fator de dificuldade para a implementação da prática inclusiva e da legislação normativa: a falta de capacitação profissional em áreas de atuação diretamente relacionadas à acessibilidade.

Como a geração de acessibilidade é um fenômeno complexo, assim como a inclusão, a interação entre áreas de conhecimento e de profissionais capacitados, reunidos em equipes integradas e multidisciplinares (LOCH, 2000; SILVA, 2004; DISGINGER, 2006) se faz necessária para avaliar e criar soluções além das que estão previstas em leis. Deve-se lembrar que as leis são guias de ações mínimas e não as únicas soluções possíveis para a resolução de problemas, havendo sempre a possibilidade de se melhorar suas recomendações.

Barbosa (2003, p.226) defende que:

A construção da sociedade inclusiva e saudável é aquela que se utiliza dos múltiplos mecanismos para promoção da qualidade de vida das pessoas e fundamenta o seu planejamento na realidade e necessidade de cada comunidade, o que ocorre com a participação da comunidade, com metas e ações objetivas para ampliar a inclusão social. A equiparação de oportunidades, principalmente para aquelas pessoas que apresentam necessidades especiais, se faz presente em todos os campos da vida municipal, influindo na urbanização e na arquitetura acessível da cidade. Governo e comunidade devem estar em coerência e em parceria. (...) As leis em vigor garantem um mínimo do patamar de vida digna para todos, cabendo a nós, cidadãos, estudá-las, nos apropriarmos de sua aplicação, e, no exercício do controle social, fazermos cumprir as leis e propormos

novas, quando necessária a alteração das que não se adequam aos objetivos da sociedade justa e inclusiva e, ao mesmo tempo, devemos analisar se as normas, portarias e instruções estão em coerência com os anseios populares ou com os direitos já adquiridos.

Como apresenta Sassaki (2003), em suma, o movimento para a construção de uma sociedade inclusiva trabalha sob a inspiração de princípios, tais como: celebração das diferenças, direito de pertencer, valorização da diversidade humana, contribuição de cada pessoa, aprendizado cooperativo, solidariedade humanitária, igual importância das minorias em relação à maioria, cidadania com qualidade de vida, dentre outros.