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SUBORDINAÇÃO NAS RELAÇÕES HIERARQUICAS

As práticas de gestão na CESAN são também marcadas por uma herança de autoritarismo e subordinação que perpassam as relações hierárquicas.

Esta forma de ação está aqui descrita pelas práticas: III. I) Subordinação nas relações hierárquicas; e III. II) Melindre nas relações hierárquicas. A primeira se expressa pelo que se chamou de “não vejo, não ouço, não falo”, ao passo que a segunda se manifesta pela cautela extrema ao propor mudanças para os superiores e pelo “delegar para cima”, expressão utilizada pelos próprios gestores.

6.3.1 Subordinação nas relações hierárquicas

A prática do “não vejo, não ouço, não falo” se refere à postura do gestor de acatar ordens percebidas como contrárias ao bom desempenho da CESAN. Ou seja, o

gestor finge não ver e não ouvir e limita-se a não falar. Trata-se de uma forma de subjugar-se para evitar punições e manter-se no cargo, mesmo sem concordar com o que está sendo feito.

Vinha determinação, a gente tinha que cumprir [...] determinação era determinação, tinha que obedecer tinha que cumprir. Até porque para não correr risco de ir contra decisão de diretoria, mesmo a gente entendendo que não era o ideal tinha que praticar aquilo que queriam como determinação (Gerência Intermediária).

Algumas vezes tinha que fazer a coisa errada por determinação [...] Nesta situação eu respondia, olha lá, foi executado, porque a gente não pode dizer 100% não [...] fazia com aquilo atravessado na garganta, então é aquele ditado: manda quem pode obedece quem tem juízo, então infelizmente isto acontecia (Gerência Intermediária).

Eu fui perseguido por um diretor da companhia [...] o camarada aprontou e ai então quando a gente foi utilizar a forma correta de administrar [...] ele disse que simplesmente não aceitava advertência, que eu podia mandar ele embora, não é? [...] Ai eu fiquei jurado [...] o que existia de pior na CESAN foi o que ele escolheu a dedo, para me mandar para lá (Gerência de Linha).

Sobre esta prática, os gestores de alta gerência apontam tratar-se de uma prática típica da gestão anterior, não sendo a mesma, característica da gestão atual. Ao mesmo tempo, atores chaves e gestores de nível intermediário demonstram que esta prática ainda persiste.

Hoje a ordem vem de cima para baixo, faça, cumpra, tchau. Como que vai fazer não interessa, não tem questionamento, faça isso e acabou, e é assim que funciona e aceita, não se tem questionamento, não vejo gestor questionando diretor, porque, medo de perder o poder. Poder é uma coisa muito ruim (Agente Crítico).

Eu fico calado, eu acabei perdendo um pouco a minha forma de proceder (Gerência Intermediária).

Há, entretanto, uma diferença na percepção sobre posturas arbitrárias nessa gestão e na gestão anterior. As determinações, as quais era preciso acatar na gestão anterior, conforme os entrevistados, eram vistas como motivadas por fins diferentes dos organizacionais. Em relação às ordens “de cima para baixo” estabelecidas pela gestão atual, os gestores consideram que, mesmo não sendo a melhor forma de se atingir resultados, foram tomadas com esse objetivo. Ou seja, os gestores afirmam que seus superiores, ao agirem de maneira arbitrária, podem não estar tomando a

melhor decisão para a organização, mas, ao menos, estão agindo com a intenção de fazê-lo.

A reação desses sujeitos frente a essas decisões, por sua vez, caracteriza-se muitas vezes pelo não questionamento e pela subordinação.

6.3.2 Melindre nas relações hierárquicas

Já a prática do melindre nas relações hierárquicas se manifesta tanto pela cautela extrema para propor mudanças para os superiores, quanto pela tendência a “delegar para cima” problemas rotineiros.

Retratando a prática da cautela, gestores afirmam que sentem uma liberdade maior para propor e para tomar decisões a partir de 2003, entretanto, demonstram em suas práticas que a postura de deferência e receio em relação à hierarquia ainda se faz presente.

A diretoria atual coloca, a decisão é do chefe, o que vocês assumirem lá a gente acata aqui, e é real e está acontecendo. [...] Ano passado tomei a liberdade de fazer um documento [...] com o que eu to sentindo e vendo, eu vou passar para ele e passei a realidade e pedi mudança na estrutura, nossa gerente falou assim: você é louco, você vai tomar um não. Eu posso tomar um não, mas então eu tenho que colocar a minha função a disposição, porque eu como pessoa não estou suportando, a carga de trabalho está muito grande. Então coloquei, apresentei para diretoria e falei. E eles acataram, vamos fazer mudança na coisa (Gerência Intermediária). A gente filtra muita coisa, porque a gente não tem muita intimidade de se sentir totalmente aberta, existe uns paredões que separam um pouco (Gerência de Linha).

Olha tem [autonomia], não vou dizer que não tem, não é? [risos]. Eu acho que eu aqui até tenho autonomia, em relação a outras áreas. Parte muito isso daí do gestor, sabe, tem gestor que é mais atirado, ai consegue. Tem gente que toma a decisão e depois leva. E tem gente que antes de tomar decisão recorre. Nas coisas que eu acho que eu posso dominar, que eu posso executar, eu executo. Muitas coisas são coisas que não afetam a gestão da empresa em parte alguma, são irrelevantes, não afetam o resultado da empresa. [...] É sempre bom tomar cuidado com as coisas (Gerência Intermediária).

A prática do “delegar para cima” se refere à dificuldade dos gestores de tomar decisões sozinhos, e a postura de, por conta disso, atribuir a responsabilidade por decisões do seu nível de gestão, ao nível superior dentro da cadeia hierárquica.

No modelo de gestão que está implantado na CESAN, os níveis menores e intermediários não se sentem em condições de tomada de decisão e delegam para cima e jogam uma série de problemas e isso acumula, então é um enorme desafio ser gestor em uma empresa estatal porque você se acumula com vários fatores externos, muitas questões que são trazidas e ficam muito diferentes do que em uma empresa privada (Alta Gerência). [...] eu poderia até ter resolvido sozinho, se eu tivesse ligado para a empresa, procurado saber, poderia, mas eu não fiz isso [...] então peguei e mandei um correio para a gerência, para evitar desavença, para ela poder dar uma opinião. Ele ainda não respondeu, mas eu acho pelo que eu conheço dele que ele vai me dizer pra eu tomar a decisão (Gerência Intermediária).

Essas práticas são condicionadas por uma herança de autoritarismo e subordinação que acompanha a história da organização desde sua criação, no contexto do governo militar. Pode-se conjeturar, inclusive, que há por parte dos gestores, um medo em assumir responsabilidades, dada a cultura de premiação de acertos e punição de erros que caracteriza a CESAN (CASTOR, 1995). Assim, como consequência disso, são geradas posturas embotadas e maquiadas, havendo desperdício de energia e entraves para a inovação.

Quadro 19 – Prática III – Herança de Subordinação nas Relações Hierárquicas