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Substratos: aspectos comuns e particulares – Implicações para

Capítulo 1 – Revisão de Literatura

1.2. Expertise e Relações Objetais

1.2.4. Substratos: aspectos comuns e particulares – Implicações para

Diante do que foi exposto sobre diversos personagens da história considerados gênios, sejam eles da arte musical, da pintura, da ciência e da matemática, verifica-se que remontar as suas histórias de vida é de grande valor para pensá-los enquanto tais. Está certo que cada um deles é um sujeito diferente e que viveu um momento histórico diferente também, mas aspectos comuns podem ser observados ao perpassar as suas vidas e refletir a constituição de seus psiquismos.

Verificam-se, em geral, os sentimentos mais primitivos, originários da infância e que precisavam encontrar uma forma de descarga. A via da sublimação, seja pelas artes ou pelas ciências, foi o caminho encontrado por todos, de modo que são observados num engajamento contínuo, necessário e incessante com o objeto de conhecimento escolhido. O adiamento de

prazeres amorosos e da vida social é uma constante, como se a configuração deles enquanto sujeito só fizesse sentido a partir da vinculação dos mesmos com as suas obras. Mesmo em Dalí, que não deixou de lado a sua vida social e amorosa, observa-se o maior investimento nos projetos sublimatórios, que buscam sempre um novo contorno, seja pela via do cinema, do teatro e outros. Nesse ponto, o pintor se assemelha a Da Vinci que não se manteve em uma só obra, utilizando-se de descobertas científicas.

Pode-se pensar, no caso de Dalí e Da Vinci, que o vazio seria tão angustiante que outras formas de expressão deveriam ser encontradas para que a sua existência fosse garantida. De outro modo, Mozart, Einstein, Skakespeare e Dostoiévski esgotaram as suas possibilidades em suas obras por uma única via. No caso de Beethoven, que tocava

instrumentos e veio a se dedicar especialmente ao piano, ao entregar-se à depressão, do ponto de vista psicanalítico, aniquilou-se enquanto sujeito pela falta de sentido de sua existência enquanto tal. Já no caso de Nash, havia uma condição esquizofrênica que lhe contornava, mas a sua genialidade na matemática é o que fez garantir uma referência e seguir a sua vida sem medicamentos e choques elétricos, num grupo comunitário que o aceitou enquanto tal.

Já nesses pensamentos iniciais, pode-se voltar aos estudos quanto à mente expert, como ela se configura e os estudos existentes sobre a questão. Manter-se no conteúdo é algo que está para além de interconecções cerebrais. Trata-se de uma necessidade de manter-se vivo, de lidar com as forças mais primitivas do sujeito e que causam muita culpa, como é fortemente percebido com Shakespeare, Dostoiévski e Dalí. Mesmo inconsciente, é esse dinamismo psíquico que movimenta esses sujeitos no sentido da vida.

Uma outra característica fortemente observada é a da solidão. Se não se constituíram enquanto sujeitos solitários, ao menos, a solidão lhes foi necessária para entregarem-se as suas obras. Storr (1998), ao abordar a história de pessoas ilustres, percebe como fundamental a característica da solidão. A partir da análise que faz dos componentes da infância dessas pessoas, nas suas características individuais, verifica o quanto a solidão contribuiu para sua genialidade. É o que observamos quanto aos estudos sobre a expertise. Os experts preferem estar só porque assim desenvolvem os estudos constituídos enquanto deliberados e auto- regulados. De toda forma, retornando a Storr, o estar sozinho para os gênios é mais que uma solidão que se verifica ao se debruçar sobre a vida de cada um: trata-se da capacidade de estar só, na presença de demais, como é verificado especialmente com Da Vinci e Dalí.

Dos experts discutidos, Nash é o único a apresentar uma condição esquizofrênica. Portanto, uma condição cindida desde a infância. A estranheza que causava às outras crianças, o que incomodava mãe e irmã, não lhe era uma questão. Aos doze anos, em seu quarto, realizou uma primeira experiência científica e foi nessa solidão que talvez tenha começado a se constituir enquanto matemático de renome.

Os romances literários de Shakespeare apontavam para uma condição mais primitiva e até mesmo melancólica e que necessitava de encontrar uma forma de expressão. No caso de Dostoiévski, ao escrever sobre o parricídio, a sua culpa, o medo da morte, e a vontade de matar-se tornaram evidentes e funcionaram como uma espécie de associação de suas angústias, mesmo que camufladas pela sua obra literária.

Por fim, Dalí sugere a necessidade de expressar a sua condição histérica e a culpa que trazia em si por meio da pintura. As leituras da obra de Freud parecem ter lhe dado o aval que precisava para unir imagens e símbolos capazes de expressar seus sentimentos e sua

O que se pode verificar, então, é que os estudos apresentados aqui, sobre alguns gênios, refletem os estudos da expertise, a partir de similaridades que podem ser visualizadas. Por exemplo, observa-se um grande investimento dos artistas e cientistas em suas obras; muito estudo individual diante de um objeto de conhecimento quase que personalizado; o adiamento de gratificações, bem como o processo em que constituíram as suas práticas como deliberadas, dando à relação com o objeto um contorno todo particular.

Como não existem pesquisas que articulam a genialidade de personagens de renome na história da humanidade com a posição subjetiva que ocupam, assim, se pretendeu, no presente estudo, relacionar a condição expert com o conhecimento de expertise, na intenção de compreender como se configuraria essa forma específica de conhecimento.

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