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A relação entre sujeito expert e objeto de conhecimento de expertise

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Academic year: 2017

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Universidade

Católica

de Brasília

Pró-Reitoria de Pós-Graduação

Strictu Sensu em Psicologia

Mestrado

A RELAÇÃO ENTRE SUJEITO EXPERT E OBJETO DE

CONHECIMENTO DE EXPERTISE

AUTORA: ANA CAROLINA ANTUNES GOMES

ORIENTADOR: PROFº DRº AFONSO CELSO TANUS GALVÃO

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Ana Carolina Antunes Gomes

A RELAÇÃO ENTRE SUJEITO EXPERT E OBJETO DE

CONHECIMENTO DE EXPERTISE

Dissertação submetida ao Programa de Pós- Graduação Stricto Sensu em Psicologia, na Área de Ensino e Aprendizagem da

Universidade Católica de Brasília, para a Obtenção do Título de Mestre.

Orientador: Prof º Dr º Afonso Celso Tanus Galvão

Brasília

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G633r Gomes, Ana Carolina Antunes.

A relação entre sujeito expert e objeto de conhecimento de expertise / Ana Carolina Antunes Gomes. – 2008.

115 f. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2008. Orientação: Afonso Celso Tanus Galvão.

1. Psicanálise. 2. Relações objetais (Psicanálise). 3. Sublimação. I. Galvão, Afonso Celso Tanus, orient. II. Título.

CDU 159.964.2

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Dissertação de autoria de Ana Carolina Antunes Gomes, intitulada “A RELAÇÃO ENTRE SUJEITO EXPERT E OBJETO DE CONHECIMENTO DE EXPERTISE.’, requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Psicologia, defendida e aprovada em 5 de Dezembro de 2008, pela banca examinadora constituída por:

Prof º Dr º Afonso Celso Tanus Galvão Orientador

Profª Dr ª Marta Helena de Freitas Membro Interno - UCB

Prof ª Drª Inês Maria M. Z. P. de Almeida Membro Externo - UnB

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A menos que uma pessoa queira levar a cabo o trajeto que dificilmente

conduz ao desenvolvimento do talento, nem o potencial inato nem todo o

conhecimento do mundo bastará.

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AGRADECIMENTOS

Acredito que agradecer é reconhecer a generosidade, disponibilidade, paciência e afeto do outro para conosco. Por isso, agradeço ao Professor Afonso pelo apoio na minha trajetória no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu, da Universidade Católica de Brasília. Sem ao menos conhecer-me de início, se dispôs a uma parceria num estudo ainda inovador, enriquecendo o meu conhecimento acadêmico com artigos, pesquisas e autores. Com a oportunidade de realizar o Estágio em Docência em uma de suas disciplinas de Graduação, possibilitou-me vivenciar uma outra forma de se fazer psicologia, a do ponto de vista do Mestre, contribuindo para a minha solidificação enquanto psicóloga. Agradeço, em especial, pelos últimos meses, nos quais estive no Rio de Janeiro e a distância não impossibilitou o nosso contato e andamento da pesquisa.

Agradeço aos meus pais, Carlinhos e Maria Eugenia, que sempre estiveram presentes em minha vida, incentivando a capacitação profissional, não só com palavras, mas como modelos que são de determinação e dedicação, através dos quais cumprem seus exercícios profissionais com tanto sucesso. Agradeço a paciência, o apoio e o amor dedicados a mim. Agradeço, também, à minha irmã Bia, que no auge do seu Mestrado em Filosofia, não lhe faltam argumentos a me colocar a refletir sobre a sociedade e o ser humano.

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RESUMO

A presente dissertação tem como objetivo investigar o que vincula o expert e seu o domínio de expertise, através da busca pelos significados subjetivos e características da relação entre o sujeito e o seu objeto de estudo. A teoria psicanalítica, ou mais especificamente, as teorias as relações objetais, possibilitam o avanço das perspectivas cognitivas e das teorias da aprendizagem no que se refere à compreensão do procedimento expert. Assim, foram realizadas três entrevistas clínico-qualitativas com experts de renome das áreas do conhecimento da advocacia, da música e da academia. Verificou-se a importância das relações iniciais de cada um dos participantes e do meio pelo qual estruturaram seus conflitos psíquicos. Os experts entrevistados apresentam uma personalidade organizada subjetivamente pela oralidade, o que reforça a sua relação bastante específica com o conhecimento. As suas pulsões mais primitivas se encontram sublimadas em torno dos objetos de estudo mencionados. A falta, que constitui todo o ser humano do ponto de vista da psicanálise, coloca o sujeito no movimento da vida, e permite que os experts se mantenham no mesmo conteúdo de estudo ou renovem os seus estudos constantemente. Isto pode ser compreendido do ponto de vista das relações de aprendizagem ou a partir da construção do processo do estudo deliberado, que se apresenta então, como algo pertinente, no qual os experts negociam com o conhecimento que lhes foi introduzido e se auto-regulam diante do mesmo, na busca constante pelo seu aprimoramento.

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ABSTRACT

The present reaserch´s purpuse is to investigate what binds an expert to its domain of expertise, by searching for the subjective meanings and the characteristics of the relation between the individual and its object of study. The psychoanalysis theory or, more specifically, the theories of the objects and its relations, make possible to surpass the cognitive perspectives and the theories of learning applied to the understanding of the expert procedure. Thus,three clinical qualitative interviews were done with prestige experts in areas of knowledge such as law, music and academy. The importance of the inicial relations of each one of the them was verified as well as the way each one had structured its psychics conflicts. The experts that were interviewed have a subjetive personality organized by orality, which can be proved by the specific relation they make with knowledge. Their most primitive drives are sublimated around mentioned objects of study. The lack that constitutes all human being, in the point of view of the psychoanalysis, places them into the movement of life, and allow them to keep studying the same content or renew the studies constantly. This can also be understood in the point of view of learning relations or through the construction of the deliberated study´s process, in which experts negociates with the knowledge that they were introduced to by becoming self-regultated and always searching for their improvement.

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SUMÁRIO

Introdução...10

Capítulo 1 – Revisão de Literatura...13

1.1. Definições de Expertise...13

1.1.1. Teorias de Expertise...16

1.1.2. Teorias Cognitivas da Expertise...19

1.1.3. Estudo deliberado...22

1.1.4. Estratégias de aprendizagem...24

1.1.5. Auto-regulação e metacognição...25

1.2. Expertise e Relações Objetais...27

1.2.1. Motivação e Desejo...43

1.2.2. Estudos sobre expertise e psicanálise...45

1.2.3. Expertise e pontuações psicanalíticas: alguns casos...46

1.2.4. Substratos: aspectos comuns e particulares – Implicações para estudos em expertise...55

Capítulo 2 – Natureza da Pesquisa e Metodologia..,,...58

2.1. Problema...58

2.2. Justificativa...59

2.3. Objetivos...61

2.3.1. Objetivo Geral...61

2.3.2. Objetivos Específicos...61

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2.4.1. Caracterização da Pesquisa...62

2.4.2. Participantes...63

2.4.3. Instrumentos de coleta de dados...63

2.4.4. Procedimentos...64

2.4.5. Estratégias de análise de dados...64

Capítulo 3 – Resultados e Discussão: Experts e domínios de expertise...67

3.1. Infância...67

3.1.1. A relação mãe-bebê e a constância do objeto...68

3.1.2. A introdução da lei...71

3.1.3. A função fraterna...73

3.2. Adolescência...81

3.2.1. A escolha objetal...85

3.2.2. Sublimação x estudo deliberado...88

3.3. Vida Adulta...90

3.4. Considerações finais...94

Capítulo 4 – Conclusões...96

Referências...103

Anexo A: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido...110

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Introdução

A dedicação a um domínio específico, com intenso envolvimento e relacionamento particularizado define o expert. Tendo em vista o interesse em desvendar as características da mente expert em contraposição à de nonexperts, modelos cognitivos e conseqüentes

conceituações acerca da expertise foram criadas. Diante de estudos sobre os processos de ensino-aprendizagem, observou-se o procedimento do estudo deliberado, quando o indivíduo é introduzido a conteúdos que passam de uma relação de obrigatoriedade para a de um estudo auto-regulado e metacognitivamente eficiente, o que viria a caracterizar a expertise (Galvão, 2001).

Características comuns de experts são destacadas e enfatizadas com os estudos

mencionados acima. Porém, uma lacuna foi detectada ao pensar a expertise. Algo escapava às investigações quanto às interfaces cognitivas que se desenrolariam nesse processo. Desafiou-se pensar como os experts Desafiou-se mantém num mesmo conteúdo por um longo período de tempo, ou ainda, como o desejo do mesmo se colocaria de tal forma que o motivaria a se dedicar tão aprofundadamente a um certo objeto de estudo.

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A pesquisa buscou explorar, inicialmente, diversos conceitos acerca do que define a expertise. Uma das primeiras pesquisas sobre o assunto a apresentou como uma condição inata do expert, explorando a possibilidade de identificação de diferenças no sistema nervoso desses indivíduos, como condição genética ou hereditária para se obter a expertise. Reflete-se a perspectiva de talento, ou de algo que a pessoa traz consigo desde o nascimento e que facilitaria a aquisição do conhecimento (Galton, 1969).

Pesquisadores em expertise (Simon e Chase, 1973; Ericsson, 1996; Galvão, 2001) sugerem diferenças qualitativas nas experiências primeiras de experts em relação à de nonexperts. Hábitos, gostos e o estudo deliberado individual, específico e sistemático, são enfatizados pelos pesquisadores como importantes para a aquisição da expertise.

Assim, a fim de buscar explorar o que está na base da constituição desse saber expert, a partir dos aspectos afetivos envolvidos no percurso do seu desenvolvimento e que se relacionam à posição de um sujeito desejante, avançou-se com os estudos da psicanálise, mais especificamente, com os das relações objetais, que deram subsídios para a compreensão das relações que são estabelecidas entre experts e objeto de expertise.

Como um insight inicial, no intuito de compreender o processo de seus

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Capítulo 1 - Revisão de Literatura

Experts são pessoas que nos chamam a atenção pela capacidade que possuem de desempenhar particularmente bem uma tarefa. Inicialmente, o desenvolvimento da expertise se dá com a introdução a um campo do conhecimento pelo processo de ensino-aprendizagem, numa relação de obrigatoriedade do indivíduo com o conteúdo que lhe foi introduzido

primariamente. Num outro momento, a pressão que é exercida começa a ser negociada pelo mesmo, coexistindo uma pressão exterior e um controle gradativo do conteúdo em questão. Até que num instante posterior, o indivíduo passa a ter controle próprio do que vem a ser seu domínio de interesse, garantindo o desenvolvimento da qualidade da performance no seu domínio de expertise. A prática do estudo deliberado é uma constante, levando o indivíduo muitas vezes a adiar gratificações em nome de seu objeto de estudo, algo característico da aprendizagem nesse nível. Neste capítulo, são discutidos aspectos das teorias da expertise particularmente relevantes no contexto deste trabalho e sua articulação com certas teorias psicanalíticas que estruturam a investigação. Finalmente são oferecidos alguns exemplos da história de vida de experts, analisadas à luz da teoria das relações objetais.

1. Definições de expertise

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apresentado a alguém por meio de processos de ensino-aprendizagem, e a sua relação com o conteúdo passa de uma obrigatoriedade para um estudo deliberado e então, auto-regulado pelo indivíduo. Experts apresentam estratégias variadas na resolução de problemas e o domínio do conhecimento tem como referência uma área específica de dedicação por muitos anos, individualmente e de modo sistemático (Galvão, 2001). Como exemplo de campos de envolvimento expert, podem ser citados: a música, os esportes, as artes, a matemática, a medicina, a história, dentre outras possibilidades de expertise.

Ericsson e Smith (1994) argumentam que estudar a expertise requer, inicialmente, identificar as tarefas padronizadas que levam à performance superior sob condições

controladas. Porém, diante dos domínios complexos do conhecimento, existem dificuldades em captar a gama de particularidades que o procedimento da expertise envolve. Assim, pontuam que é possível a identificação de um menor número de tarefas que caracterizam a elite performática. Propõem pensar a expertise a partir da sua correspondência com as formas padronizadas de atividades através das quais os experts se caracterizam. Entretanto, salientam que diferentes experts podem apresentar diferentes formas de experimentar a sua condição de expertise. Então, para detectar tais condições, deve-se voltar a um pequeno grupo de experts para pensar a sua performance, ou ainda, a estudo de caso individual.

A reprodução da performance expert em laboratório implica em grandes problemas práticos por reduzir a poucos fatores a complexa dinâmica da expertise. Ericsson e Smith (1994) atestam para a problemática da reprodução de estímulos com o intuito de produção de indivíduos experts. Embora hajam aspectos comuns ao desenvolvimento da aprendizagem

expert para diferentes pessoas em diferentes domínios, a aquisição de habilidade neste nível implica em um tipo de relação muito especial entre uma pessoa e seu objeto de

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para o exercício da performance superior. Isto posto, torna-se possível refletir cada um na sua constituição enquanto sujeito expert ou nas relações subjetivas construídas com o objeto de expertise

Sosniak (2006) considera o desenvolvimento da expertise como um longo processo de aquisição de uma habilidade específica. Para a autora, mesmo crianças prodígios e de grandes habilidades em áreas específicas, não possuem o suporte essencial para se considerá-las experts. Para compreender o desenvolvimento da expertise, Sosniak usa e advoga o método da entrevista retrospectiva. Este método permite o olhar do expert sobre o seu próprio desenvolvimento, a considerar os procedimentos perpassados para a aquisição da habilidade que domina. Em outras palavras, voltar-se à constituição do sujeito enquanto um expert permite entender as relações que se estabeleceram na sua primeira infância e que dizem da sua relação com o conteúdo de expertise.

Deakin, Côté e Harvey (2006) privilegiam o uso do tempo por considerá-lo central no estudo da expertise. Preparação, práticas, tarefas constituem pré-requisitos fundamentais para o desenvolvimento da expertise. Os autores colocam que será justamente o tempo qualitativo e quantitativo de investimento do sujeito que o qualificará como expert. Este é o pano de fundo para a produção de expertise, a partir do qual as práticas, o preparo e as atividades essenciais serão desenvolvidas. Voltar-se a tais atividades, num movimento retrospectivo, portanto, permitiu aos autores entender como experts se desenvolveram e como se

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Como pôde ser verificado, foram destacadas algumas conceituações que dão forma à expertise, seja enfatizando a prática de habilidades específicas, seja o longo tempo de estudo deliberado para a aquisição da expertise, entre outros aspectos. Em estudos sobre expertise é comum a entrevista retrospectiva como tentativa em voltar a momentos anteriores do expert para a compreensão de como se constituíram enquanto tal, o que foi de grande relevância para esta investigação. A partir de agora, será verificado os modos historicamente

encontrados para explicar a expertise enquanto uma atividade particularizada de algumas pessoas.

1.1.1. Teorias de expertise

Através de pesquisas sobre pessoas bem sucedidas que concluíram que estas tinham pais que eram também bem sucedidos, Galton (1869) reforçou a idéia da habilidade expert como naturalmente herdada. Assim como cor dos olhos, tipos de cabelos, altura e outros atributos físicos apresentam um caráter hereditário, também a expertise foi pensada como hereditária. Ou seja, diferenças no sistema nervoso dos indivíduos experts refletiriam as suas habilidades particularizadas. Trata-se, portanto, de uma perspectiva que considera a noção de talento, ou de algo que o indivíduo traz consigo desde o nascimento e que possibilita uma facilidade na aquisição desse tipo de conhecimento. A perspectiva de Galton é pioneira na associação entre expertise e hereditariedade.

Uma outra perspectiva de grande repercussão entre os estudiosos do assunto (Simon e Chase, 1973; Ericsson, 1996; Galvão, 2001), ao invés de considerar o talento como

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desenvolvimento desse tipo de habilidade. Hábitos, gostos, estudo deliberado individual, específico e sistemático, bem como a pertinência de uma quantidade de tempo em estudo, constituiriam práticas que caracterizariam a expertise. Desenvolver a aprendizagem para a composição musical, por exemplo, poderia se estender por quase vinte anos. Desse ponto de vista, o envolvimento com o domínio e a qualidade desse envolvimento seriam determinantes para a performance expert, bem como o tempo de preparo para tal (Galvão, 2001).

Diante dessa explicação, com base nas experiências ao longo da vida do sujeito, conclui-se que experts, assim se tornaram, principalmente, devido ao estudo deliberado que desenvolveram diante de um conteúdo de interesse. De acordo com Sloboda (1996), o desenvolvimento da expertise pode ser pensado a partir de diferentes momentos. Num primeiro momento, estiveram envolvidos com a relação de ensino-aprendizagem que lhes foi obrigatória e vivida sob pressão de pais, professores, da família em geral e outros. Depois, passaram a negociar o seu próprio estudo, saindo de uma relação de obrigatoriedade para a de um controle gradativo do mesmo, até que passaram a se auto-regular e constituir controle próprio da aprendizagem do assunto de interesse (Kemp, 1996).

De acordo com Hunt (2006), é observado que para se tornar um expert são necessários ao menos dez anos de dedicação, o que pode variar dependendo do conteúdo de domínio do indivíduo. Por exemplo, músicos levam em torno de dez anos para tornarem-se experts instrumentistas, o mesmo tempo que se leva para a prática expert do xadrez. Na composição musical, o alcance da expertise pode levar até 20 anos (Hayes, 1981).

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suas práticas deliberadas de estudo e aprofundando o seu conteúdo de envolvimento. Os futuros experts precisam adquirir mecanismos que lhes permitam monitorar, controlar e avaliar a própria performance e, então, gradualmente, refiná-la.

Seguindo com os autores acima citados, os caminhos para a performance expert requerem prática aprofundada e continuada. Diante da insuficiência dos programas escolares, as escolas deveriam ajudar os estudantes na aquisição de habilidades e mecanismos de estudos para que possam, gradualmente, tomar para si o controle dos processos de aprendizagem e investir no domínio profissional pretendido.

A expertise não é uma meta fácil de atingir. Assim, descobrir métodos de treinamento para maximizar a aprendizagem de domínios complexos, pode permitir aos pesquisadores propor meios para que mais indivíduos alcancem níveis de performance que não eram imaginados anteriormente. O estudo da expertise retoma os primeiros estágios de

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1.1.2. Teorias cognitivas da expertise

Estudos sobre expertise foram desenvolvidos a partir de enfoques predominantemente vinculados à psicologia cognitiva, tanto no que diz respeito a teorias, quanto no contexto de modelos computacionais que simulam o comportamento expert. Nesse contexto, pode-se identificar três gerações de teorias. As teorias de primeira geração foram influenciadas pelos trabalhos de Newell e Simon (Newell e colls., 1958; Newell e Simon, 1972). Esta estava centrada na concepção da solução de problemas através de métodos heurísticos que poderiam ser replicados a uma gama indefinida de domínios, mesmo com apenas um mínimo de

conhecimento sobre um tema em especial. Tais métodos, ou a forma generalizada de resolução de problemas diante de qualquer questão, contribuíram para as primeiras conjecturas sobre a expertise. Estas estavam apoiadas na premissa de que os experts eram extremamente habilidosos em lidar com métodos heurísticos gerais.

O método heurístico refere-se à redução de respostas a um problema de forma

criativa. Em outras palavras, trata-se de uma estrutura de controle que melhora a eficiência de um processo de busca por uma solução, mapeando as descrições do estado de um problema. Então, retornando a Galvão (2001), com o conceito de resolução expert de problemas através de métodos heurísticos, estes poderiam ser replicados em variados domínios, mesmo tendo-se pouco ou nenhum conhecimento sobre os mesmos. Por exemplo, para melhor compreender um problema, esquemas podem ser utilizados como mecanismos para se chegar a uma resolução, abordando pontos gerais da questão e torná-la mais específica e solucionada.

Esta visão subsidiou a idéia de que quanto mais se sabia sobre métodos gerais para a resolução de problemas, mais acurada seria a capacidade de solucionar problemas

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Simon, 1973), física (Larkin e cols., 1980; Chi e cols., 1981), dentre outros domínios,

chegaram à conclusão de que a expertise dependia do conhecimento em detalhes do conteúdo de interesse. Isto influenciava, por exemplo, a qualidade da memória desses indivíduos. Sendo assim, os meios heurísticos seriam fracos diante das habilidades experts e seriam usados mais por novatos do que por experts. Assim, a primeira teoria de métodos heurísticos de explicação da expertise por mecanismos cognitivos não teve vida longa.

Influenciada pelo desenvolvimento de modelos cognitivos construídos na forma de softwares computacionais, uma segunda geração de teorias buscou estudar de forma mais ampla a resolução de problemas. Iniciaram-se, então, estudos complexos e fundamentais para o entendimento do processamento cognitivo expert (Galvão, 2001).

Com Newell (1973), a segunda geração de estudos sobre a expertise colocou em questão a complexidade da solução de problemas pela mente expert, integrando os processos da memória, da atenção e do raciocínio, como fundamentais à questão. Esta geração, então, tomou como base os processos cognitivos pensados como ‘arquitetados` de forma

particularizada ou como um ‘sistema de produção serial’, que se refere ao surgimento de uma nova regra a ser incorporada à série de regras já existentes na solução de problemas.

Imaginando-se, aqui, uma seqüência de informações armazenadas a se tornar mais complexa com o surgimento de novas informações. O sistema ‘ACT*’, de Anderson (1983), é um típico representante do tipo de modelagem computacional desenvolvida no contexto dessa geração.

A segunda geração de teorias que visa explicar a expertise foi articulada a partir da teoria de compilação de conhecimento de Anderson (1983), juntamente à teoria de

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a problemas similares que possam ocorrer no futuro. A compilação, então, é vista como um procedimento que envolve a integração de agrupamentos de conhecimentos e que vem a caracterizar a complexidade da mente expert em funcionamento (Ericsson e Smith, 1994).

Contudo, o modelo da segunda geração passou a apresentar problemas pois, nem sempre situações reais de performance aconteciam do modo como previsto nos modelos. Por exemplo, experts podem dar passos para trás na resolução de um conflito, como um novato faria. O estudo deliberado não reflete uma continuidade na performance. A inconstância em procedimentos experts, em seus variados domínios, implica diversas formas de solução de problemas. Daí o interesse em aprofundar tais estudos por outra perspectiva, de modo a considerar os aspectos singulares que constituem os experts. Pesquisadores (Ericsson e Smith, 1994) concluíram que seria melhor pensar a atividade expert a partir de dois tipos gerais de expertise: a rotineira e a adaptativa. A expertise de rotina refere-se a resolver mais rapidamente e de modo eficaz problemas que são familiares aos experts. Já a expertise adaptativa se refere a novos procedimentos, inventados a partir do conhecimento expert, para dar conta das novas situações que podem vir a surgir (Galvão, 2001).

Devido às dificuldades destacadas nos estudos descritos acima, uma terceira geração de estudiosos, comandada por Holyoak (1994), apresentou o ‘conexionismo simbólico’ como uma possibilidade de se pensar a expertise. Trata-se da busca de união de idéias com base em modelos simbólicos (como os de segunda geração) e modelos conexionistas que

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cotidiana, está referida aos problemas rotineiros e as respostas a informações, desse nível, ocorreriam de forma automática, sem a utilização de um mecanismo cognitivo mais complexo.

A psicanálise, diante das teorias cognitivas destacadas, surge como a possibilidade de verificar o que imprime no sujeito o desejo em vincular-se e manter-se em seu conteúdo de domínio de forma tão complexa, significativa e específica.

1.1.3 Estudo deliberado

O processo de aprendizagem expert costuma ter início com o auxílio externo de professores, pais e outros. Posteriormente, o conhecimento vai se tornando gradualmente auto-regulado pelo sujeito, até que ele assuma controle próprio do estudo individual. Destacam-se, então, três etapas que constituem o desenvolvimento da expertise: o apoio do meio externo, a transitoriedade e a auto-regulação, quando o envolvimento e as

responsabilidades com o processo de aprendizagem vão se modificando passo a passo.

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O termo “estudo deliberado” é utilizado por Ericsson (1994) para conceituar uma forma de estudo na qual o aprendiz controla e manipula o seu próprio processo de aprendizagem, sempre na busca de um melhor desempenho. Assim, a capacidade de desempenhar particularmente bem uma atividade é aprendida, caracterizando o estudo

individual deliberado, como a organização da habilidade expert, a partir da qual se buscam os objetivos a serem alcançados. Vários autores, dentre eles Gagné (1985), identificam etapas essenciais na aquisição de uma habilidade. São elas: o entendimento dos comportamentos iniciais e que dizem de um estágio cognitivo primeiro; a organização de regras em

seqüências, que envolve parte da prática da habilidade; e o domínio final da tarefa.

Assim, partindo de conceituações acerca do estudo deliberado, Galvão e Galvão (2006) enfatizam que o tempo de estudo, assunto de importância histórica quanto às pesquisas sobre aprendizagem, é de grande e especial relevância para pensar a expertise. Colocam que investigações longitudinais em diversos campos do conhecimento têm apontado, convincentemente, que as primeiras experiências de vida, preferências, hábitos, possibilidades e, essencialmente, a dimensão temporal individual do estudo deliberado, qualitativa e quantitativamente eficazes, constituem as principais características para a obtenção da performance expert.

Tais estudos contribuem para reforçar a idéia de que o conhecimento expert é principalmente uma conseqüência do estudo individual deliberado, de longo prazo, e

direcionado para um conteúdo do conhecimento específico. Isto contribui para reforçar a ‘lei de potência da aprendizagem’. Uma lei da psicologia cognitiva que explica o estudo

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4. Estratégias de aprendizagem

Para alguns autores (Entwistle, 2000), estratégias de estudo podem ser superficiais e profundas. Os objetivos dos indivíduos irão caracterizar qualitativamente os diferentes modos de aprendizagem. Estudos demonstram como é constituída uma ou outra forma de aprender. De acordo com Stiernborg, Guy e Tinker (1997), a motivação dos alunos que adotam como prática a estratégia superficial, tem como meta a necessidade de prontamente atender as demandas de um curso em exercício, ou mesmo medo de punição diante do fracasso escolar. Nesses casos, a realização de tarefas utiliza parte de informações, muitas vezes sem relações entre si, e tendo a memorização um papel característico do processo. A aprendizagem é, então, restrita e apresenta um baixo nível de compreensão.

Webb (1997) vai colocar, em contraposição à estratégia de aprendizagem superficial, a estratégia de estudo profunda. Esta refere-se àquela na qual o aluno compreende o material em estudo, realizando articulações entre os assuntos e construindo significações. Entwistle (2000) aponta que a busca de significados no processo de aprendizagem leva o aprendiz a se envolver ativamente com o mesmo, relacionando idéias, analisando-as criticamente e

constituindo uma forma de aprendizagem consistente. O aprendiz que adota essa postura está motivado pelo objeto de estudo, reconhece a sua relevância e o articula com conhecimentos já existentes e experiências pessoais.

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1.1.5. Auto-regulação e metacognição

A expertise costuma ser atingida por estudantes auto-regulados e metacognitivamente eficientes, ou que se responsabilizam pelo seu processo de aprendizagem a partir de

interrogações, negociações e organização do material de aprendizado.

A auto-regulação se refere a uma habilidade que permite uma avaliação do estudo, construção de metas a atingir, criação de estratégias de regulação das informações e

flexibilidade de ações. É composto por algumas etapas, como a etapa de auxílio externo que reflete o ambiente familiar, escolar e outros que oferecem o apoio material e a pressão inicial para que os estudos se mantenham. Na transição para um momento de maior controle sobre o estudo, a pressão exterior diminui e ocorre uma sistematização do aprendizado, com o estudo orientado de forma individual e deliberada (Galvão, 2001).

O auto-feedback e o feedback exterior são destacados por Galvão (2001) como de grande relevância no desenvolvimento da aprendizagem expert. O primeiro, como uma forma de monitoramento de especificidades do aprendizado e que segue padrões estáveis com representatividade interna. O segundo, referindo-se ao feedback que é dado por mestres e outros que estão envolvidos com a área específica da expertise do indivíduo. O ‘como’ é estabelecida a relação do expert com o seu domínio, o nível de expertise já alcançado pelo mesmo, bem como a qualidade do feedback exterior, podem contribuir para o

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O processo de aprendizado expert é colocado por Galvão (2001) como envolvendo a metacognição, o comportamento e a motivação. A metacognição reflete o comportamento específico de tomar consciência por parte do indivíduo quanto às suas metas de estudo, sistematizando-o e direcionando-o. O expert articula estratégias, planeja e auto-monitora as suas atividades, o que ocorre então de forma consciente e autônoma.

Existe uma grande diferença entre experts e non-experts quanto aos métodos de auto-regulação utilizados. Os experts delimitam objetivos, selecionam estratégias tecnicamente, de forma orientada, peculiar, e com isso, possibilitam maior eficácia no relacionamento com o domínio expert (Zimmerman, 2006).

Experts se constituem através de ambos, suporte externo e práticas auto-direcionadas. À criança são dadas instruções e realizados monitoramentos por pais e professores, além dos exemplos que lhes são transmitidos pelos mesmos e a sociedade mais ampla (Zimmerman, 2006). Citando Bloom (1985), Zimmerman argumenta que os considerados ‘talentosos’ pianistas, escultores, matemáticos, neurologistas, jogadores de tênis e outros, ao resgatarem seu processo de desenvolvimento, apontam que seus pais não apenas providenciaram o ensino de alta qualidade, porém enfatizaram a importância da dedicação e prática para o alcance de suas intenções. Então, essas crianças tiveram que desenvolver uma auto-disciplina, no que tange ao estudo e à prática para a consistência do seu conteúdo de interesse.

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qual o processo auto-regulatório não seria possível. Sabe-se já com razoável detalhamento que a expertise ocorre em função de estudo deliberado quantitativo e qualitativamente

eficiente. No entanto, considerando que, como apontou a literatura (Ericcson, 1996), o estudo individual tende a ser desprazeroso. Assim, experts parecem desenvolver algum tipo de estrutura motivacional capaz de sustentar por anos e anos esse tipo de estudo focalizado.

Os estudos atuais, influenciados pela psicologia cognitiva e pela modelagem computacional, permitem a compreensão de como a mente se estrutura para dar conta do conhecimento expert. As relações de aprendizagem apontam as práticas deliberadas de estudo como condições fundamentais à conquista expert. Porém, o que faz o sujeito expert eleger um objeto de estudo específico e a se relacionar com o mesmo com tamanha complexidade, intensidade e particularidade? Qual o ganho psíquico que possui diante dessa relação

particularizada com o conhecimento? As relações subjetivas a que está envolvido permite, do ponto de vista psicanalítico, tentar compreender como foi estabelecido o encontro entre o sujeito e o objeto de conhecimento de expertise.

2. Expertise e as relações objetais

Não existem estudos específicos que relacionem experts e conhecimentos de expertise ou estudos que aprofundem a expertise do ponto de vista da teoria psicanalítica mais ampla. Estudo de Silva (1984), intitulado Da paixão de formar: uma contribuição psicanalítica à formação de educadores, realizado com professores selecionados pelo entusiasmo em dar aulas e formar seus alunos, bem como pela eficácia em lecionar,

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apesar da realidade do ensino no âmbito externo, o que permite realizar, aqui, uma analogia entre tais professores, considerados professores apaixonados e os experts.

Silva (1994) expôs que, como psicanalista e a partir da sua própria curiosidade como pesquisadora, pretendeu desvendar o que levaria professores mesmo diante de condições externas desfavoráveis, como a violência escolar, a falta de equipamentos para o ensino e de investimento na educação em geral, a se envolver de tal forma com a transmissão do conhecimento e com a formação de alunos de modo tão apaixonado.

Então, Silva realizou uma pesquisa na qual foram indicados por alunos e outros professores, cinco professores caracterizados pela paixão em ensinar, da área de Ciências Humanas de uma instituição de ensino, no período de 1988 a 1989.

Totalizaram-se trinta horas de entrevistas, somadas às observações em sala de aula, que possibilitaram o encontro entre o que foi dito na entrevista e a prática realizada pelos professores.

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permitindo a prevalência do amor e não do ódio. Tal pesquisa possibilitou a reflexão com relação aos aspectos psicodinâmicos que podem estar envolvidos na relação entre os experts e o conteúdo de expertise.

Para Sordi (2005), um adulto inteligente é alguém provido de linguagem e sexualidade direcionada a um objeto exterior. Trata-se de um sujeito que renunciou ao auto-erotismo para entrar na cultura, recalcando as suas pulsões primitivas e colocando-as a serviço de alguma atividade sublimatória. Então, desse ponto de vista, refletir a expertise é refletir um sujeito com as suas pulsões parciais integradas a se relacionar com um objeto exterior. A atividade do expert, portanto, pode ser vista como um processo de sublimação de suas pulsões e que encontrou, na forma incessante e particular de lidar com um conhecimento, a sua configuração enquanto sujeito.

Anteriormente à condição sublimatória das pulsões sexuais dos experts, existe um momento na constituição do sujeito que apresenta grande importância para pensar a expertise. Quando a vida sexual parcializada da criança encontra seu auge em torno dos três aos cinco anos de idade, é iniciada nela um movimento que se inscreve na pulsão de saber ou de investigar. Talvez as questões sexuais a coloque a serviço dessa curiosidade e que a institui no campo do querer saber. Os enigmas como “de onde vem as crianças” e as suas diferenças sexuais são interrogações sobre a sua própria existência e que contribuem para a sua entrada no mundo simbólico. Caso não exista uma percepção dessas diferenças, comparece alguma questão quanto ao processo de constituição do sujeito (Sordi, 2005).

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do umbigo da mãe para que pudesse passar. Certas lembranças, mesmo que fora do processo de análise são comuns permanecerem quanto às possibilidades de origem dos bebês. Mas é esse trabalho de investigação e curiosidade que deve comparecer a colocar o indivíduo a serviço do saber. Aqui entra o investimento dos pais ou outros diante das curiosidades que as crianças manifestam diante de objetos do conhecimento e o

incentivo à permanência no objeto de estudo, o que vem a ganhar um contorno todo pessoal com o passar do tempo, ao remeter-se à expertise. Pode ser realizada, aqui, uma analogia com o processo do estudo deliberado. Em seu primeiro momento, o estudo deliberado pode ser articulado às curiosidades que se colocam diante da criança nessa etapa de seu desenvolvimento e o incentivo dos pais. Posteriormente, articulando com o processo auto-regulatório, a criança põe-se a dissecar o conhecimento, a compreendê-lo minuciosamente, o que viria a ser atualizado em sua constituição ao longo do tempo.

Partindo de Bergeret (2006), pensar a psicogênese do sujeito psicanalítico reflete considerar dois eixos como centrais na formação da personalidade. São eles, o

desenvolvimento psicossexual do sujeito, como visto brevemente ao ser destacada a vida parcializada inicial da criança e o movimento sublimatário de suas pulsões sexuais primitivas; bem como o estabelecimento das relações de objeto, ou a dinâmica do eu na relação com o outro, ou no caso, a dinâmica do expert na relação com o conhecimento de expertise.

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particularidades, no seu encontro com o ambiente familiar, posteriormente escolar e com a sociedade mais ampla.

De acordo com Bergeret (2006), na fase oral, o bebê tem como zona erógena a boca ou tudo que o tocar, como a área corpórea tocada pela mãe. Tem a incorporação como meio para a auto-conservação, bem como para o seu prazer parcial sexual. Esse momento pode ser pensado como uma fase primária ou canibalística, quando o bebê incorpora o objeto como parte de seu próprio corpo, por não haver uma diferenciação entre o eu e o não-eu. Uma fase posterior seria a da mordida, quando ao perceber que o objeto que lhe dá o prazer não faz parte de si, tenta destruí-lo e marcá-lo como

possibilidade de incorporação. As primeiras interdições começam a aparecer pela via do corpo, quando o bebê inicia a percepção da diferenciação do eu e do outro. Os

sentimentos de amor e ódio começam a se constituir na medida em que a diferenciação com o objeto começa a se tornar mais evidente. Ao morder o seio da mãe, a criança tenta uma união com o objeto, descoberto externo a ela ao perceber-se separado do mesmo.

Se voltarmos ao sujeito expert, poderia existir uma personalidade organizada subjetivamente pela oralidade, da qual o sujeito partiu para a sua relação consigo próprio e com o mundo. Ao lhe ser introduzido um objeto de estudo, vincula-se a ele, incorporando-o canibalisticamente, de modo a destrui-lo em todas as suas dimensões. Passa a conhecê-lo em suas extensões, não se permitindo o sentimento de frustração dada a sua relação de indiferenciação com o objeto. Confunde-se com o objeto, empregando-lhe sua força pulsional, de forma a garantir a sua identidade enquanto sujeito expert de conteúdo

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ou interna, o sujeito, para dar conta de sua existência no mundo, retorna ao estágio oral e assim se organiza diante do conteúdo investido, assumindo outra posição subjetiva diante do mesmo. Com relação a este último comentário, assim se pode refletir quanto as outras fases colocadas por Freud, sujeitas à regressão por alguma circunstância. De outro modo, pensar a fixação em estágios específicos implica no desenvolvimento da personalidade normal e patológica em adultos, que não é o caso da investigação aqui presente.

Bergeret (2006) trata da fase anal, seguindo Freud, como a etapa na qual as

sensações de retenção e expulsão das fezes se fazem pertinentes, para além do controle dos esfincteres. O domínio, na retenção, e o prazer, tanto na retenção quanto na expulsão, conquista a ambivalência da atividade e passividade do sujeito. A finalidade é auto-erótica, porém a posição na relação narcísica com o objeto já está mais elaborada do que na fase anterior, a oral. Também pode ser pensado aqui, o sadismo, devido a sua finalidade auto-erótica, como acontece na fase oral. De outro modo, pode ser pensado o masoquismo, já que a manipulação do ambiente em direção ao outro começa a tomar mais forma.

A expertise pode ser estruturada com base na posição subjetiva na qual o sujeito se coloca analmente. A retenção do conteúdo que lhe foi introduzido para seu bel-prazer é uma possibilidade, bem como seu desprendimento ou expulsão de modo a manipulá-lo como bem entende. A sua relação é com um conteúdo externo que lhe foi introduzido e o retém e/ou o manipula de acordo com seus interesses individuais. O objeto, é em parte parcial, de modo que se fusiona a ele para alcançar os seus objetivos possíveis.

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a segunda, ao princípio do prazer, como é instituído o modelo da fantasia. A

impossibilidade da realização do prazer absoluto pela criança leva ao recalcamento, e diferentemente da sintomatização, uma possibilidade de escoamento da energia sexual recalcada ocorre pela via da sublimação, como visto, quando a pulsão é desviada de seu alvo sexual para o social. Podem ser pensadas, aqui, realizações nas artes, nas relações de amizade, sentimentais de casais, nas expressões sociais, todas as formas encontradas pela pulsão sexual de modo a se desviar do incesto ou de completude com o genitor do sexo oposto.

A expertise, desse ponto de vista, pode ser entendida como uma forma criativa do sujeito expert de direcionar a sua pulsão para um conteúdo específico, que lhe foi introduzido anteriormente, passando a dedicar-se ao mesmo e de forma particularizada. Refere-se a uma cota de prazer que o sujeito retira e coloca no conhecimento. A sua dedicação e aprimoramento podem estar sendo mantidos pela via da sublimação como forma de canalizar a pulsão sexual inconsciente constituinte.

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por não possui-lo, e busca como reivindicação o desejo de ter um filho com o pai, que lhe daria o falo.

Com a introdução da lei, o menino renuncia o seu desejo pela mãe, a quem buscou para se tornar seu falo, e seu ódio pelo pai, com quem competia pela posse da mãe. Com a renúncia, passa a investir em novos objetos. A menina, ao perceber que não irá ganhar nada, se alia à mãe, antes odiada por justamente não tê-la dado algo que seu pai tem, e compensa a falta através de outros objetos reinvestidos.

Depois da fase fálica, vem o período de latência, quando ocorre uma quietude no nível sexual. Posteriormente,vem o estágio genital, relacionado à puberdade e sexualidade adulta e com a configuração da identidade feminina e masculina e investimento em um objeto total exterior.

Dessa forma, a expertise pode ser um reinvestimento do sujeito no objeto de estudo como uma tentativa de preenchimento da falta, constituinte do sujeito, tornando-se uma possibilidade fálica ao mesmo (Almeida, 1998). Então, em busca da satisfação absoluta, que não é possível, o sujeito busca esgotar de todas as formas seu conteúdo de interesse e

relaciona-se com ele intensamente. A falta é constituinte do sujeito neurótico, marcado pela lei. Então, vai em busca daquilo que lhe dê prazer, mesmo que momentâneo. A sua busca é contínua, construindo novos saberes em torno do seu objeto de interesse, novas formas de resolução de conflitos e, com isso, tem-se a idéia de completude, ou de seu conhecimento como correspondente ao falo.

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do terceiro simbólico que irá introduzir a separação mãe-bebê. O bebê encontra-se, nesse momento, assujeitado ao desejo do outro ou de sua mãe, ou de alguém que exerça a função materna. Então, alienado ao desejo da mãe, esta se apresenta como o objeto fálico do mesmo e com a entrada do terceiro simbólico, essa díade é desfeita. Frustra a criança de ser e estar nessa posição fálica diante da mãe e o desejo dela se dirige ao pai. Entra na dialética edipiana, saindo da certeza de ser o falo para ter o falo para si. A mãe é faltante, então aonde se encontraria o falo? O menino busca se identificar com o pai, mas ao vê-lo castrado, o sujeito se constitui dentro da neurose enquanto um ser desejante em busca do gozo. No caso da menina, abandona o objeto mãe, pela rivalidade fálica, para ir de encontro com aquele que teria o falo, portanto, o pai, e retorna à mãe como identificação, pela impossibilidade fálica do pai. Constitui-se como um sujeito desejante, assim como o menino.

Passando brevemente por essa questão Lacaniana, tem-se a possibilidade de pensar o expert como alienado ao conteúdo de expertise, de modo que este se confunde com o

próprio, como sendo detentor do falo, representado pelo conteúdo. Aliena-se ao

conhecimento que lhe foi apresentado e vive essa relação harmoniosa até ser barrado pela impossibilidade de continuidade nessa posição. Assim, necessita se auto-regular para manter a sua relação com o mesmo para além do posicionamento fálico, que a apresentação do conteúdo lhe conferiu, inicialmente. De outro modo, já auto-regulado, tendo o

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Então, como visto com Bergeret (2006), as pulsões sexuais vão buscando organizações ao longo da constituição do sujeito numa força construtiva que equivale à pulsão de vida. A pulsão de vida tem como oposição a pulsão de morte, que se refere à compulsão à repetição, como uma tendência ao retorno inorgânico ou de retornar ao estado de quietude. A pulsão de morte se apóia na pulsão de vida, com a repetição, que nada mais quer dizer que a desistência da força que impulsiona a vida. Os dois existem na criança, e a pulsão de morte tem justamente o intuito de voltar a este estágio originário. Até que ponto o sujeito expert, ao se dedicar continuamente a um dado conteúdo, não estará em busca, pela via da repetição, de um estado de quietude e inorganicidade? Também se encontra aqui uma outra possibilidade para pensar a expertise.

Retornando-se a Bergeret (2006), e partindo do ponto de vista pulsional, num momento mais anterior, o narcisismo vai permitir uma primeira integração das pulsões sexuais infantis em torno do eu, o que coincide com o aparecimento do ego como uma unidade psíquica e de representação corpórea. Contudo, entre o desenvolvimento das pulsões parcializadas em unificadas, que tornam o corpo erógeno, e o desenvolvimento do ego, mentor e produto das atividades do narcisismo, o segundo ponto recebe maior notoriedade sobre as condições biológicas quanto ao estabelecimento das relações objetais do sujeito. Há uma exigência egóica de ser amado e que é desenvolvida com a necessidade de satisfação narcísica. Necessidade essa que age no psiquismo como uma força pulsional, precisando sempre ser satisfeita, o que acompanha o sujeito em sua vida e propicia a superação das tendências parciais de pulsão (Freud, 1914/1969).

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tomou como central a questão da sexualidade contra alguma força oposta e que implica em conflito psíquico. Assim, o ego tornou-se o mentor da ação do recalcamento em defesa da não sexualidade. Realizando uma restrospectiva, antes do narcisismo,

verificam-se as pulsões de auto-conservação, posteriormente, a pulsão de morte, com a tendência a voltar-se ao estado de inércia inicial. Com a introdução do narcisismo ocorreu a libidinização das pulsões de auto-conservação a serem designadas de pulsões egóicas. Assim, o narcisismo ocorrerá enquanto envolvido no contexto libidinal, em prol de uma satisfação egóica e, ao mesmo tempo, em contraposição ao que vem a ser contrário aos seus ideiais. Verifica-se, então, o ego colocado entre o conflito psíquico quanto à sexualidade infantil e em relação aos investimentos no eu e nos objetos.

Remetendo-se à segunda tópica freudiana, com o antagonismo entre a pulsão de vida e morte, observa-se o eu ocupando um lugar destacado quanto aos conflitos psíquicos diante dessas tendências, a partir da identificação com o objeto. O conflito psíquico em torno do narcisismo se atualiza no social quando uma tendência pulsional se coloca contra os ideais do sujeito e do social, de modo a atender às exigências das necessidades narcísicas (Freud, 1914/1969).

O narcisismo primitivo está relacionado com o momento no qual são instaurados no sujeito, a partir do olhar das pessoas, qualidades que o definem tanto para os outros quanto para si, o que é fundamental para a constituição do sujeito. É o investimento exterior que diz desse narcisismo primário e um estado precoce no qual a criança investe a sua libido em si mesma. Trata-se de uma ilusão inicial que integra uma

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narcísica e necessária nessa etapa do desenvolvimento do sujeito. Trata-se de uma relação consigo próprio a qual implicará em uma demanda de ser objeto de amor de outro.

O “eu ideal” se constitui como um modelo ao qual o eu sempre tenderá a

retornar ou a uma posição perfeita narcísica na qual é onipontente e admirado em toda a sua extensão. O outro passa a entrar nessa relação na medida que supre as necessidades narcísicas do psiquismo. No primeiro momento do bebê, o investimento exterior é o da mãe e o eu precisa ser tomado como objeto para a sua constituição enquanto tal. Coincidem, aí, o investimento da mãe corpóreo, nas zonas parciais, e investimento narcísico, que configurará a criança enquanto sujeito. Sujeito e objeto encontram-se fusionados nesse momento.

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Freud define a forma através da qual o sujeito escolhe o seu objeto como anaclítica ou narcísica, que são originárias das suas primeiras experiências infantis. A escolha objetal anaclítica refere-se ao modelo de amor das relações com os pais, que alimentam e protegem. Ocorre um apaixonamento num grau elevado, que abre mão do próprio narcisismo, direcionando a libido ao objeto amoroso. Ao objeto é atribuída uma equivalência ao ego ideal, de tão idealizado pelo sujeito. Daí, muitas articulações podem ser refletidas em torno da condição expert. Configurando as suas relações de modo anaclítico, adiam-se gratificações prazerosas, amorosas e sociais em torno de um objeto que é investido em potencial, alimentando-se desse investimento numa relação ilusória de ego idealizado.

Já o modo de relação objetal narcísica procura em si mesmo o objeto de amor, ou seja, em última instância, o objeto investido é o próprio eu. Constitui-se um modelo relacional de amor, tanto quando o investimento ocorre em si mesmo, como quando o investimento do eu vem do objeto. É comum colocar-se na posição daquele que é amado ao invés de no lugar de objeto investido pelo outro. A satisfação narcísica, diferente da anaclítica, é secundária e deriva de um investimento objetal. O grau de dependência e alienação inicial narcísica com o objeto irá definir uma ou outra

possibilidade de relação objetal. Nesse segundo caso, a relação objetal do expert pode ser pensada a partir de uma alienação ao objeto de estudo de tal modo que o

investimento e esforços são colocados sobre si em prol do conhecimento ao qual se dedica. Uma ou outra forma de relação objetal que pode caracterizar o expert diz da sua constituição enquanto sujeito e como se posicionou diante do objeto.

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sujeito. Melanie Klein trata das relações de objeto, estabelecendo que os conflitos do sujeito estão calcados nos confrontos entre pulsão de vida e pulsão de morte desde o nascimento. O primeiro objeto externo com o qual o bebê se depara é o seio materno, que é sentido com hostilidade devido à ansiedade persecutória que é instaurada na relação com o mesmo. Num primeiro momento, o seio é apresentado à criança e a repetição desse procedimento permite a ela a sensação de prazer. Com a retirada do seio, a criança fantasia a existência de um seio mau, que não a gratifica, e é

internalizado como hostil na tentativa de sua destruição a partir da ansiedade persecutória instaurada nesse processo (Tyson & Tyson, 1993).

Esse primeiro momento Melanie Klein denomina de posição esquizoparanóide, devido à dissociação que o bebê faz entre “bom” e “mau”, já que ainda não possui artifícios para a integração do objeto como um só, e que propicia a fantasia da perseguição do objeto exterior mau. A hostilidade, vontade de destruição e controle que exerce sobre a mãe são reflexos da tentativa de ter para si o objeto mau que prejudica. O objeto bom também é internalizado na busca de preservação enquanto tal. Aqui, comparecem os confrontos do bebê em relação à pulsão de vida e de morte, caracterizadas pela luta entre o seio ideal e o seio devorador, que o persegue. O medo da criança gira em torno de perder o objeto bom, daí a sua tentativa de destruição do objeto mau.

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Este raciocínio pode ser utilizado para refletir sobre como se dão as relações de objeto entre o expert e o seu domínio. Ao ser introduzido em um certo campo do conhecimento é possível que a sua relação com o mesmo tenha se baseado numa relação de amor e ódio, quando o conteúdo que o gratificava também era o que o frustrava, talvez por não corresponder às suas expectativas. Porém, já pensando num sujeito integrado na sua relação com o objeto, o expert poder se auto-regular diante do conhecimento, configurando-se àquilo que é de configurando-seu interesconfigurando-se como o configurando-seu objeto de estudo, internalizando e dando um contorno todo particular ao mesmo.

Numa visão diferente da de Melanie Klein, Anna Freud que também trata das relações de objeto, postula que o bebê, inicialmente, é regulado pelas suas necessidades, tendo a mãe a função primária de satisfação das mesmas. No segundo semestre de vida, o relacionamento com a mãe continua, porém para além das necessidades fisiológicas, período que veio a chamar de constância de objeto, quando o investimento da mãe se torna libidinal também, e a criança é gratificada em maior ou menor grau nesse percurso. Anna Freud acredita que a partir do segundo ano de vida a criança já possui a variedade de relacionamentos que ocorre entre adultos, porém, inicialmente, ainda na sua relação

simbiótica com a mãe. Os sentimentos ambivalentes de amor e ódio constituem parte dessa relação. No momento do conflito edípico, rivalidade e raiva tomam corpo e assim por diante (Tyson & Tyson, 1993).

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interesse, internalizando pressões e necessidades que antes talvez se configurassem como predominantemente externas.

Margareth Mahler discutiu o processo de separação e individuação do bebê, postulando um momento mais primitivo no qual ele se encontraria numa fase de não-integração a desenvolver-se para uma fase integrada (Tyson & Tyson, 1993). De modo semelhante, Winnicott trata de uma relação inicial do bebê, a de não integração, quando a mãe, a partir do que ele chamou de preocupação materna primária, estaria em sintonia com o bebê, a gratificá-lo e frustrá-lo na medida certa, de modo que a partir do holding ou o suporte que ela lhe provém, o bebê poderia vir a emergir enquanto sujeito. Ilusionando o objeto em sua ausência, o bebê buscaria mecanismos criativos para lidar com a falta do mesmo, como a utilização de objetos transicionais, brincadeiras e, com isso, estaria dando início ao seu processo de simbolização e de sua constituição enquanto sujeito integrado (Winnicott, 2000).

A partir das postulações acerca das relações de objeto de Margareth Mahler e Winnicott, é possível pensar o processo de estruturação do estudo deliberado. O expert, antes não-integrado diante do objeto do conhecimento, passa a se relacionar com o mesmo de forma particularizada e a dar o contorno necessário para a sua relação com o mesmo. A partir de uma alienação inicial com o objeto do conhecimento, o expert vai se diferenciando e auto-regulando com o conteúdo que lhe foi apresentado e construindo o seu processo de individuação diante do mesmo.

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constituinte. Todas essas questões servem de base para um estudo mais aprofundado quanto ao tema da expertise e as relações de objeto, constituindo uma base inicial e motivando a pesquisa de campo com sujeitos considerados experts a compreender a dinâmica de seu psiquismo.

1.2.1. Motivação e Desejo

Voltando-se à história da educação, o encontro entre estudantes e o objeto do conhecimento ganhou diversos contornos ao longo do tempo. Houve o momento em que as punições funcionavam como a motivação para os estudos, ou seja, os jovens

estudavam pelo medo de serem punidos. Portanto, tornou-se claro que esse tipo de comportamento direcionado aos estudantes não sustentava o conhecimento. Eles poderiam sim aprender, mas a aprendizagem estaria relacionada a uma testagem imediata e, logo, o conhecimento armazenado perderia a sua força. Trata-se de um mecanismo que retira o indivíduo do seu processo de estudo. Nas pesquisas existentes sobre a psicologia da expertise existentes, a motivação é conceituada como um

mecanismo que possibilita ao indivíduo expert se manter por longo prazo num campo do conhecimento. Isto ocorre a partir de um envolvimento intenso com o a área de domínio, de modo que cria novas estratégias para lidar com a mesma, novos objetivos para o seu estudo, estabelecendo, portanto, uma relação dinâmica com o conteúdo de expertise (Ericsson, 1996).

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venham a se desenvolver enquanto experts. O envolvimento desde muito cedo com o conhecimento permite uma maior capacidade adaptativa aos processos de estudo, dado que a criança ainda não estabeleceu mecanismos mais rígidos de atuação no mundo. As possibilidades que o meio social da criança oferece também são muito importantes, já que permitem a prática mais livre de suas habilidades.

Portanto, cabe a pergunta: são essas características suficientes para a explicação do envolvimento do expert com o conteúdo de expertise? Ao tomar a psicanálise como base de estudo, observa-se que a relação entre desejo e motivação nem sempre é clara. O desejo está referido a uma espécie de motor do psiquismo que surge a partir das necessidades primárias de objeto que se tornaram, então, insatisfeitas. A insatisfação, por sua vez, acionou no sujeito o movimento constante de busca por objetos

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esvaziada de significados. A análise permite o preenchimento das lacunas conscientes percebidas (Freud, 1940 [1938] / 1996).

Então, se as ações do sujeito foram anteriormente inconscientes e referem-se à projeções de suas atividades psíquicas no mundo exterior, elas dizem dos mecanismos que operam nas bases psíquicas desse sujeito. O ‘como’ essa ação é colocada no mundo, como é percebida pelo sujeito e a sua intencionalidade, dizem do desejo ou do que o vincula a si mesmo tais comportamentos. Raciocinando em termos da expertise, o que liga o sujeito expert ao seu conhecimento de expertise diz dessas relações estabelecidas subjetivamente pelo sujeito e encontram-se, primariamente, em nível inconsciente.

Assim, desse ponto de vista, a motivação na psicanálise pode ser entendida como tendo uma base no movimento do desejo inconsciente do sujeito. Ao encontrar uma forma em nível consciente de sua projeção, através de manifestações como as artes, as ciências e outras, a motivação se torna algo que pode ser ‘falada’ pelo sujeito. No caso da

aprendizagem expert, esta dá ao sujeito a possibilidade de dizer daquilo que o motivou a ter elegido um certo domínio de conhecimento como objeto de estudo, tornar-se um expert nesse campo do conhecimento e a se manter nessa relação específica com o mesmo. Então, é no desejo organizado subjetivamente pelo sujeito que está o interesse em desvendar a vinculação entre experts e conteúdos de expertise.

1.2.2. Estudos sobre expertise e psicanálise

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conhecimento. As características de estudo deliberado apresentam-no como uma atividade maçante e que implica no adiamento de gratificações. Em outras palavras, alguém deixa de fazer algo considerado prazeroso, como ir ao cinema ou namorar, por exemplo, para se dedicar a uma atividade detalhada e estafante.

Não existe uma literatura de base psicanalítica que trate da problemática da expertise. No entanto, existem alguns estudos sobre pessoas geniais, que podem servir como um insight inicial a partir do qual se pode debruçar uma discussão psicanalítica sobre o assunto. Deve-se enfatizar que todo gênio é um expert, mas nem todo expert é um gênio, dado que o expert apresenta um conhecimento profundo sobre um assunto específico, enquanto os gênios apresentam conhecimentos que superam o mero domínio de área, estabelecendo novos paradigmas em uma área de atuação.

Verifica-se o longo caminho já percorrido pela psicologia da cognição a fim de dar conta do processamento diferenciado da mente expert. Como mencionado, são poucos os estudos que apontam articulações entre a genialidade e as experiências primeiras de indivíduos ilustres, como Leonardo da Vinci, abordado por Freud, e Albert Einstein, abordado por Storr, entre outros exemplos, que serão vistos a seguir. Também serão destacadas características comuns ao psiquismo desses indivíduos, de modo a refletir possibilidades que implicam no desenvolvimento da configuração expert.

1.2.3. Expertise e pontuações psicanalíticas: alguns casos

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nutrição das plantas, reações e venenos e em dissecar cadáveres de cavalos, despertavam a curiosidade em compreender como o artista e cientista havia se configurado enquanto tal.

De acordo com Freud, observa-se a transformação da força psíquica pulsional de Da Vinci em diversas atividades e, assim, as forças físicas não poderiam ser realizadas sem algum prejuízo. Daí, o adiamento de gratificações da ordem da sexualidade em sua vida. Pode-se considerar o artista como um expert ao retratar o belo de sua época e ao realizar as suas experimentações, o que o fez tornar a sua própria existência esquecida. De outra forma, contradizendo a condição expert de um sujeito que sabe muito sobre um determinado assunto, Da Vinci se dedicava a diversos conteúdos. Possivelmente, antes mesmo que uma atividade beirasse o seu esgotamento, envolvia-se logo com outra, de modo a não lidar com a angústia do vazio que o faria enfrentar o seu desmoronamento enquanto sujeito.

Um outro ponto destacado por Freud (1910/1974) são os detalhes minuciosos de suas obras e pesquisas. Punha-se a serviço das mesmas por tempo indeterminado e a contemplar os pequenos contornos que tinha dado a elas, atendo-se a um caráter quase que obsessivo compulsivo. Apesar de cercado constantemente por muitos amigos e desfilar na alta sociedade, preservava o seu momento contemplativo e solitário.

Freud argumenta que, no recalcamento da expressão sexual, Da Vinci encontrou na ânsia do conhecimento a via para sublimar as suas pulsões. Observa a sua extraordinária capacidade em sublimar o que existe em si de mais primitivo. A sede de conhecimento, investigações do mundo a sua volta, pinturas de quadros melancólicos e enigmáticos, como o da Mona Lisa, projetam a dificuldade pela busca por gratificações amorosas.

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seu pai, também compositor, Leopold, Mozart constituiu forças suficientes para continuar as suas composições. A consciência é colocada por Storr como a motivação para a persistência, prática e aprimoramento da atividade com a qual o sujeito se relaciona.

Remetendo-se aos conhecimentos quanto ao desenvolvimento do sujeito expert, o estudo deliberado pode ser pensado em paralelo à história de Mozart. Houve um momento no qual o pai o incentivou a permanecer na composição das suas músicas, movimento que o fez negociar com a sua melhor forma de expressão criativa, e a se auto-regular diante dela, monitorando e aprimorando a sua arte.

Nannerl, filha de Leopold, também fora incentivada nas práticas musicais pelo mesmo. Mas logo o pai percebera que Mozart desempenhava melhor a função e dedicou-lhe maior atenção. Percorreram diversas localidades da Europa com o próposito de Leopold mostrar as práticas de seus filhos. Mozart foi aperfeiçoando-se no cravo e verificou-se que pelo fato de ser uma criança e tocar as suas composições próprias deixava o grande público impressionado. Ao deixar a filha em um plano secundário, Leopold deu apoio suficiente a Mozart para continuar na sua empreitada (Storr, 1972).

Observa-se, nesse momento da vida de Mozart, que seu grande interesse pela composição ganhou o aval de terceiros que não apenas o pai, o que constitui uma etapa do desenvolvimento do estudo deliberado também, contribuindo para o relacionamento que o compositor veio a estabelecer com a sua arte.

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posicionamento subjetivo se tornam fundamentais, seguindo Storr (1972), para pensar os gênios.

Mozart, em seus últimos anos de vida, com a popularidade em baixa, teve problemas financeiros e de saúde, o que contribuiu para a diminuição da sua produção. De todo modo, mesmo dedicando-se intensamente ao longo de sua vida à arte, casou-se, porém manteve-se sempre na dúvida quanto à sinceridade do amor que sua esposa lhe dedicava. Refletindo quanto ao adiamento de gratificações em prol de suas composições, pode residir aí a sua desconfiança com relação à esposa (Storr, 1972).

Outro exemplo, também destacado por Storr (1972), é o de Albert Einstein. A partir da biografia realizada pelo seu filho, Albert Einstein Junior, Storr analisou a infância do gênio da física e verificou algumas características. Einstein fora uma criança considerada bem comportada, tímida e sozinha, e que já se afastava do mundo a sua volta desde muito cedo. Na escola, a sua marca estava na dificuldade de socialização, e na tendência de manter-se envolvido com os manter-seus sonhos, considerados absurdos, a partir dos quais era julgado como um deficiente mental.

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Verifica-se, mais uma vez, a constituição do sujeito como fundamental para pensar a configuração de um expert, na perspectiva psicanalítica. A condição solitária tornou-se fundamental para a criação de Einstein, ao se distanciar da vida partilhada em sociedade e suas gratificações. Integrou as suas pulsões no interesse em desvendar mistérios do universo.

Storr (1972) diz que a criatividade constitui um modo adaptado de uma potencialidade humana que busca soluções simbólicas para as tensões internas e dissociadas a que todos os seres humanos estão submetidos, mesmo que em níveis diferentes. Os passos da criança até a vida adulta são fundamentais para a constituição do sujeito. Como foi visto com Einstein, a sua genialidade não pode ser separada da sua condição infantil e da sua estrutura de

personalidade esquizóide.

Beethoven é considerado um dos maiores mestres da música, por ter inovado toda a forma musical, tornando-a plástica, verificando a arquitetura de seu movimento e

diversificando modos musicais já cristalizados. O músico teve uma vida pessoal muito tumultuada. A sua vida amorosa é lembrada por um curto relacionamento que não seguiu adiante pela não aprovação da família de Josephine. Teve uma paixão que não pôde ser vivida e não se sabe ao certo o motivo. Seus relacionamentos familiares foram marcados por discórdias. Mudava-se de endereço constantemente e era conhecido pelo tratamento ruim dispensado aos outros. Seus hábitos eram o de vestir roupas sujas, com o que não se

importava. Não teve um círculo de amigos próximos ao longo de sua vida. Sua mãe morreu cedo de turbeculose e, com os problemas de alcoolismo de seu pai, Beethoven teve que cuidar dos seus dois irmãos mais novos (Davies, 2002).

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afetivos mais próximos, o que, de todo modo não constituía o seu interesse. A severidade com que tratava os demais refletia um grande sofrimento que o amargurava. Observa-se que veio a sublimar as suas pulsões vitais em torno de algo que lhe gratificasse, a música. As outras esferas da vida tornaram-se-lhe secundárias.

O primeiro professor de música de Beethoven foi seu pai, um tenor a serviço do Electoral Court at Bonn. Posteriormente, pediu a Tobias Pfeiffer, do mesmo grupo de música de seu pai, que continuasse a ministrar as suas aulas de música. Com ele, praticava a música até o amanhecer. Com pouca idade, já estudava órgão, violino e piano. Tem-se, aí, toda a movimentação de um estudo deliberado. A partir do que aprendeu com o seu pai, foi negociando quais lhe seriam os melhores professores. Depois, passou a se relacionar a seu próprio modo com a música. Beethoven gostaria de ter estudado com Mozart, que havia morrido um ano antes de sua chegada em Vienna. E foi nessa localidade que se estabilizou como um grande pianista.

Matemático americano, filho de um engenheiro elétrico e uma professora, John Nash, aos doze anos, já realizava experimentos científicos em seu próprio quarto, sempre solitário a preferir trabalhar com outras pessoas. Estar consigo próprio e realizar as suas experiências era uma forma organizadora das suas angústias que lhe trazia apaziguamento (Nasar, 1998).

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de seu contato com um livro chamado Men of Mathematics, dado por seu pai e, a partir daí, foi se envolvendo passo a passo com a matemática (Nasar, 1998).

Os primeiros sinais da esquizofrenia de Nash foram através da paranóia, sendo admitido no McLean Hospital, quando diagnosticado como esquizofrênico paranóide, juntamente a um quadro de depressão. A sua vida então passou a ser entre permanências em hospitais e fora deles. Passou a receber a terapia de choque e antipsicotizante como medicamentos. Mas, um tempo depois, decidiu que não mais os tomaria, nem mesmo faria a terapia de choque e, assim, nunca mais os realizou. Fixou-se num trabalho comunitário no qual a sua diferença era então aceita. Tornou-se conhecido no Centro de Matemática de Princeton, local no qual se tornou pesquisador Senior em Matemática, como o “Fantasma do Corredor”, por ser tido como uma figura estranha que deixava esboçadas equações matemáticas em quadros-negros durante a madrugada.

Hamlet e Macbeth foram obras de Shakespeare na qual Freud se debruçou mais intensamente. Dedicou-lhes ensaios e explorou como ambas refletiam a exposição de suas próprias idéias acerca da psicanálise, como diante das estruturas intrapsíquicas. De toda forma, Freud não deixaria escapar o amplo material conflituoso neurótico que povoava o universo shakespeareano (Perestrello, 1996).

Referências

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