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Embora possa parecer uma suspeição que por seu tipo excede as co- muns, certos fatos e tendências de nossa época não deixam de chamar poderosamente a atenção, ao revelarem bem às claras qual é o estado ambiente ou, melhor ainda, a aspiração comum, a qual, embora se tenha o especial cuidado de ocultar, ao que parece por uma espécie de recato pessoal e até coletivo, nem por isso deixa de manifestar-se em múlti- plos sentidos.

O homem, em geral, se move, atua e realiza por impulso de determi- nados estímulos, que viriam a ser os seus agentes motores. Esses es- tímulos, não obstante se acharem ao alcance das possibilidades indi- viduais, passam inadvertidos para a maioria, a ponto de ser necessário mostrá-los a seu entendimento, a fim de que os perceba e sinta o in- fluxo de sua influência benéfica.

Pode-se dizer, portanto, que essa maioria carece de estímulos, mais por força de um costume que parece ser inato no homem - o de esperar tudo dos demais e não do esforço próprio, o de confiar na sorte ou numa providência com perfume de fadas - do que pelo fato de tais es- tímulos não existirem em realidade.

Pois bem; essa aparente orfandade de estímulos faz o ser sentir ou experimentar, amiúde, a necessidade de se liberar da opressão que para ele representa uma vida monótona, sem maiores alternativas. E, enquanto uns buscam dissipar o fastio ou preencher o vazio com dis- trações e diversões de toda espécie - e quantas são as coisas úteis e valiosas com que se poderia preenchê-lo! -, outros manifestam, de diferentes modos, sua predisposição ao sobrenatural, ao que está além do humano. Assim, por exemplo, vemos que existe nos países em luta uma marcante tendência a aparecer, perante o adversário, ameaçando esgrimir ou utilizar “armas secretas”, desconhecidas, como se fossem fabricadas com elementos de outro mundo, e com soldados a quem

atribuem uma força invencível, sobre-humana, capaz de causar a estu- pefação do inimigo.

Vemos também que, de uns tempos para cá, quase todas as histórias em quadrinhos publicadas, e que constituem o deleite de um con- siderável número de leitores, crianças e adultos (os últimos são a maioria), têm suas tramas baseadas em super-homens dotados de forças extraordinárias, que realizam proezas estupendas, fazendo o co- mum das pessoas sonhar em possuir, algum dia, iguais condições ou qualidades, dignas da admiração e do assombro do semelhante.

Encontramos a mesma coisa nos filmes de desenhos animados, em que aparecem homens de força hercúlea, e é bem possível que isso obedeça ao fato de que - tendo-se humanizado tanto o animal nessas projeções, a ponto de dotá-lo do uso da razão, da fala e de todas as ex- pressões características do ser humano - este tenha ficado em situação bastante incômoda, sendo necessário, em conseqüência, elevá-lo à cate- goria de semideus ou super-homem quanto à potência física.

Não deixa, pois, de ser sugestivo esse movimento mental voltado para um pretenso ideal que, pelo fato mesmo de ser inalcançável, exal- ta ainda mais a imaginação de quantos coincidem em tal aspiração.

Todo esse movimento mental, que, conforme demonstramos, se re- produz em diferentes setores do pensamento e da atividade humana, mostra com irrefutável evidência qual é o estado de meia humanidade. Até parece que, não se conformando com uma existência que não lhe proporciona os inefáveis gozos que os câmbios notáveis produzem na alma, o homem alimenta, cada dia com maior afã, o pensamento de ser algo superior; superior a tudo o que existe de vulgar no sentir hu- mano.

A Logosofia, com sua riqueza de estímulos, vem preencher esse grande vazio, conduzindo o homem rumo ao despertar de uma vida que não é a comum, cheia de tristezas e limitações, e sim outra, na qual podem ser satisfeitas as mais extremas exigências. Ao mesmo tempo que assinala, como um absurdo pouco feliz para o bom senso, a ilusória imagem das criações fantasiosas, indica ao homem, com a elo-

qüência de seus quadros experimentais, qual é o caminho a seguir para conquistar até as mais altas expressões de sua humana natureza e de sua hierarquia mental.

Se, por exemplo, se admite que o homem comum, civilizado, é para o índio inculto um super-homem, por que não se haverá de admitir que um homem dotado de um extraordinário saber também o seja para o homem comum?

Convenhamos, então, que a riqueza de conhecimento faculta ao ser viver uma vida que só em aparência se assemelha à vulgar, pois dela dista muito quanto à amplidão, às perspectivas, à qualidade e eficiên- cia de suas particularidades, sobretudo na ordem das possibilidades conscientes.

Nada pode ser mais propício a todos, nestes momentos, do que pôr mãos à obra, com o propósito de criar uma nova individualidade, cu- jas necessidades vitais sejam atendidas com o sumo dos conhecimen- tos que se prodigalizam ao entendimento de quem cumpre suas próprias promessas nesse sentido; e podemos assegurar que, embora nunca chegue a ser um Tarzan, um Patoruzú* ou um Popeye, é muito possível que o faça no concernente à potência mental, moral e espiri- tual, dentro do quadro das reflexões que fazemos neste estudo.

* N.T.: Índio patagônio fictício, dotado de grande força física, famoso super-herói de histórias em quadrinhos da Argentina. Sua popularidade alcançou o auge em meados do século XX.