• Nenhum resultado encontrado

Para aferir se os resultados estão a ser atingidos, teremos de avaliar o processo empreendido. Quer seja a avaliação dos resultados pretendidos na avaliação dos alunos, quer seja na ponderação da efetividade das nossas práticas de ensino, para saber se estas devem ser mantidas, reformuladas ou substituídas. Por isso qualquer processo ou intervenção deve ser sempre sujeito a uma avaliação.

Sendo a Física em geral e a Mecânica em particular um tópico tão vasto e tão rico, tanto em termos conceptuais, matemáticos e como provocador de desenvolvimento cognitivo, poderia pensar-se que seria difícil construir um instrumento de avaliação simples que permitisse aferir se as estratégias usadas foram as corretas. Essa dificuldade começa a simplificar quando verificamos que há um conceito que é central a toda a mecânica Newtoniana, o conceito de Força.

Efetivamente, a grande maioria das situações analisadas em Mecânica a nível do ensino secundário, podem resolver-se pela análise correta dos sistemas de forças em jogo.

É relativamente pacífico entre os investigadores e professores que desenvolvem trabalho em Física que uma abordagem concetual, garantindo que os alunos entendem primeiro as situações, os fenómenos e as leis da Física, antes de avançar para a abordagem matemática dos problemas, promove uma melhor compreensão da aprendizagem desta ciência e contribui para uma melhor ligação entre os conceitos físicos, a sua representação matemática e o mundo real (Mazur, 1997, McDermott, 1984). Claro que em certos casos muito específicos em que os alunos mostrem dificuldades em perceber os fenómenos, pode-se partir diretamente para a análise matemática e esperar que essa análise ajude a perceber a profundidade do conceito. Esta última abordagem alternativa só funciona nos casos em que os alunos já tenham bases matemáticas bastante desenvolvidas e poderá até servir como teste, verificando se a nossa ideia é matematicamente consistente. Uma análise matemática, ainda que simples e meramente mental, pode ajudar-nos a fugir das “garras” do senso comum por oposição à realidade.

Se por um lado, o conceito de força facilita e ajuda a compreender todos os outros conceitos inerentes à mecânica, por outro ele próprio pode ser um empecilho a esse entendimento, porque encerra em si mesmo uma grande complexidade. Halloun e Hestenes (1985b) referem que no estudo da Mecânica, uma das primeiras dificuldades dos alunos tem a ver precisamente com a definição deste conceito. A primeira dificuldade advém logo, como em tantos outros casos, das diferentes interpretações que esta palavra tem na linguagem quotidiana não científica, em

106

confronto com o seu significado científico. A isso acrescem as conceções alternativas que afetam a compreensão dos movimentos e amplificam as dificuldades de interpretação (McDermott,1987) e Villani (1996).

Assim, termos como "força", "energia" e "potência" são muitas vezes usados como sinónimos, como o são os termos "velocidade" e "aceleração".

Muitos alunos continuam a chegar ao 12º ano com uma visão aristotélica sobre o movimento, onde não entendem como pode um objeto inanimado exercer força sobre outro. Apesar de estes conceitos já terem sido trabalhados no ensino básico e nos10º e 11ºanos, as conceções alternativas continuam a perdurar em muitos alunos. Por exemplo, uma dessas ideias consiste em acreditar que uma força constante, produz uma velocidade constante que depende da resistência do meio e da inércia do objeto e na ausência dessa força, o objeto para imediatamente (Halloun e Hestenes, 1985b); ou seja, força e velocidade são diretamente proporcionais. O que é mais curioso é que muitos alunos, ao afirmarem esse facto, conseguem ao mesmo tempo referir a definição das Leis de Newton sem se aperceberem do contrassenso.

A existência de forças passivas, como a tensão de um fio, que vão sofrendo um ajuste ou desaparecendo conforme são solicitadas como resposta a outra força aplicada é algo de difícil compreensão para muitos alunos (McDernott, 1994). A aplicação da força de atrito e da reação normal de um plano, também são frequentemente mal interpretadas. Um expressivo número de alunos julgam que para manter um corpo com velocidade constante é necessária uma força maior que a força que se opõem ao movimento.

Muitos alunos até resolvem problemas numéricos com a nítida utilização da famosa relação de Newton entre força e aceleração (2ª Lei), mas em compensação, quando é necessária uma compreensão Física do problema mais uma vez a ideia intuitiva, paragem de um corpo caso não haja nenhuma força exercida sobre ele, voltava a estabelecer-se.

Se existem dificuldades com a 1ª e a 2ª Leis de Newton, então com a 3ª lei, essa dificuldade é ainda maior. A impossibilidade de observação direta das forças que dois objetos exercem um no outro e a abstração necessária para as perceber, são a causa dessas dificuldades.

A 3ª lei é confundida com as outras duas leis, não analisando corretamente as situações de repouso e de velocidade constante, atribuindo maior força ao objeto de maior massa (Maloney, 1984). Como tal, os alunos acreditam que um corpo com maior massa exercerá uma força maior durante a interação de corpos de massas diferentes. Esta má interpretação, surge logo na definição de interação, pois muitos alunos vêm a interação como uma “luta entre forças opostas”, algo que decorre do sentido de que "a vitória pertence ao mais forte." Assim, os alunos não encontram razoabilidade na 3ª Lei e preferem uma versão do princípio da dominância: Em interação, o "mais forte" exerce a maior força. Aqui "mais forte "pode significar" maior "," maior massa", ou" mais

107 ativo. Daqui decorrem duas conceções alternativas: “maior massa implica uma maior força” e “o agente mais ativo produz uma maior força”.

Por causa da sua forte base metafórica, o princípio da dominância (embora raramente seja claramente articulado) é tão natural para os alunos que é um dos últimos equívocos a ser vencido na transição para o pensamento newtoniano (Hestenes et al., 1992).

Quando se referiu o corpo mais ativo, isso decorre de outra conceção alternativa frequentemente encontrada, a conceção da “força ativa”.

A “força ativa“ é atribuída apenas a certos "agentes ativos" (geralmente os seres vivos), e atua somente por contato direto. Agentes ativos são agentes causais, porque eles têm o poder de causar um movimento para criar “ímpeto” e transferi-lo para outros objetos, como quando um rapaz chuta uma bola. A noção de senso comum mais próximo de uma "lei de causalidade" é expresso pelo silogismo: “Todo o efeito tem uma causa. O movimento é um efeito. Portanto, o movimento tem uma causa.”

A força gravítica, apesar de aparentemente simples, também é foco de muitos equívocos. É conhecida a convicção generalizada de que os objetos mais pesados caem mais depressa e até se chegam a encontrar alunos que entendem não ser necessária qualquer força para um objeto cair, pois isso é natural (McDermott, 1984). Quanto à força de atrito, esta é geralmente vista como sendo sempre oposta ao movimento e portanto uma força indesejável, estando a maioria dos alunos convencidos que será sempre benéfico eliminá-la do sistema (Minstrell, 1982, Carvalho e Sousa, 2005).

O conceito de ímpeto permanece na mente de muitos alunos (Halloun e Hestenes, 1985b). Ele é encarado como uma força de origem diferente da já citada “força ativa”. Claro que os alunos nunca usam a palavra "ímpeto", pois normalmente expressam esta ideia por uma série de termos, dos quais "força" é talvez o mais comum. Ímpeto é concebido como algo, a "força motriz" ou a "força intrínseca", que mantém os corpos inanimados em movimento. Este é relacionado com a já referida ideia da necessidade de uma força aplicada para manter um objeto em movimento a velocidade constante. O ímpeto é implicitamente entendido como uma força que é transmitida aos objetos e que se vai esgotando, por ação de outras forças como a força gravítica e a força de atrito. Isto, claro, contradiz a Primeira Lei de Newton. A evidência de que um aluno acredita em algum tipo de incentivo intrínseco para que haja movimento é a evidência de que a 1ª Lei de Newton não terá sido devidamente assimilada.

Muitas outras conceções alternativas relativas a estes assuntos são referidas na literatura, como a confusão entre força e momento da força (torque), velocidade e variação da velocidade ou entre velocidade e rapidez média e ainda entre instante e intervalo de tempo (Halloun e Hestenes, 1985b); (McDermott, 1984, Towbridge e Mcdermott, 1981).

108

A “força centrifuga”, devido ao nome e à aparente necessidade da existência dessa força para explicar alguns fenómenos, é um equívoco encontrado com muita frequência. No mundo do senso comum, obstáculos como cadeiras e paredes não exercem forças ", eles só ficam no caminho". A massa é considerada como um tipo de resistência, porque "resiste" aos esforços de um agente ativo. O Movimento ocorre apenas quando a força ativa "supera" a resistência (note a metáfora), e cessa quando a força se torna "muito fraca" (Hestenes et al., 1992).

Será importante ter um plano de ação que vá de encontro a estas ideias, no sentido de os alunos alterarem as suas estruturas mentais, abandonando-as por as considerarem inadequadas. A investigação educacional ajuda-nos, dando sugestões para trabalharmos muitas destas dificuldades. Uma das recomendações mais importantes é a necessidade de envolver sempre ativamente o aluno em todo o processo de ensino e aprendizagem. Uma estratégia que traz bons frutos no estudo destes temas é o esboço de diagramas de corpo livre, sendo esta uma poderosa ferramenta no auxílio à análise e resolução de problemas envolvendo sistemas de forças (Puri, 1996). Um diagrama de forças aplicadas num corpo livre, se bem desenhado, permitirá a identificação de todas as forças envolvidas, o seu ponto de aplicação e prever as características do movimento resultante. Estes diagramas também são a melhor forma de abordagem à 3ª Lei de Newton e consequente identificação dos pares ação-reação das forças internas ao sistema. O desenho de um diagrama permite também ter uma melhor perceção se será possível utilizar o modelo da partícula material, ou se não será possível representar o objeto como uma simples partícula. É aqui necessário tomar muito cuidado com a utilização destes diagramas, nomeadamente quando ocorrem rotações para além de translações. Há referência a que por vezes são encontrados em certos livros e até artigos científicos, que não têm uma análise correta deste pormenor, onde parecem diagramas de forças incorretos, inculcando ideias erradas aos alunos (Puri, 1996, Briosa, 2011). Outras situações problemáticas recorrentes têm a ver com os cálculos das forças resultantes e trajetórias dos movimentos. Um conhecimento profundo sobre a utilização de eixos cartesianos e a possibilidade de simplificação dos problemas pelo entendimento da sobreposição das suas componentes são algo obrigatório, sob pena de todo o estudo ser inútil.