CAPÍTULO 4: O DESENVOLVIMENTO DA PROPOSTA DE ENSINO
4.3. Tarefa III: Cubos enfileirados
A tarefa intitulada “cubos enfileirados” foi trabalhada no primeiro horário de aula da turma (50 minutos), na manhã do dia 15 de junho de 2011 – quinta-feira47.
Nessa atividade, ao contrário das anteriores, não distribuí orientações, propus uma discussão coletiva acerca de uma tarefa. Enfileirei cubos em uma mesa igual à dos alunos em um dos cantos da sala, um a um, e pedi aos alunos que investigassem quantas faces ficariam expostas, ou seja, quantas faces não estariam voltadas para o chão nem para a parede. Dessa forma, primeiramente, coloquei o primeiro cubo e contei o número de faces expostas. Em seguida, coloquei o segundo cubo, encostado no primeiro, e observamos o número de faces expostas. Seguindo adiante, enfileirei o terceiro cubo e repetimos o procedimento:
Figura 5: Três cubos enfileirados no canto da sala. Fonte: Grecco (2008, p. 69).
O principal objetivo dessa tarefa era que os alunos encontrassem uma regra ou uma fórmula geral para calcular o número de faces expostas em função do número de cubos enfileirados.
Portanto, disponibilizei 5 cubos iguais, construídos com dobradura. A ideia inicial era ir adicionando um cubo de cada vez, para que os alunos fossem contando o número de faces expostas e, gradativamente, percebessem a regularidade envolvida, ou seja, em cada um dos cubos enfileirados, observamos duas faces expostas (uma voltada para cima e a outra voltada para frente), com exceção do último cubo, no qual teremos três faces expostas.
47 Não estavam presentes os alunos A1, A5 e A19. A aluna A5 havia pedido transferência da escola na qual as
Na escolha dessa sequência, a disposição espacial de seus elementos é um importante aliado na percepção de uma regularidade e na elaboração de uma fórmula para o cálculo do número de faces expostas em função do número de cubos enfileirados. Além disso, o trabalho com tal sequência permitiu-nos realizar uma dinâmica diferente da realizada até o momento.
Assim, com a atividade planejada, cheguei à sala de aula, e no canto direito da sala, na frente das carteiras dos alunos, arranjei uma mesinha igual à dos estudantes para que eu pudesse ir enfileirando os cubos, de forma a ficar visível para toda a turma. Decidi desenvolver a atividade sobre a mesa, pois, se fosse diretamente sobre o chão, dificultaria que todos acompanhassem e a coleta dos dados para a pesquisa.
Dessa forma, iniciei a atividade colocando um cubo sobre a mesa, de forma que três de suas faces ficassem escondidas: duas ficassem encostadas em cada uma das paredes e outra ficasse apoiada na mesa, como na figura:
Figura 6: Um cubo sobre a mesa.
Concomitante a essa ação, perguntei quantas faces haveria expostas. Antes que eu finalizasse a pergunta, alguns alunos começaram a dar palpites quanto à resposta correta: A12: 2!
A7 e A12: 2! 2! A4 e A6: 3!
Depois de deixar que os alunos apresentassem suas respostas, prossegui contando o número de faces que havia expostas no cubo que estava sobre a mesa.
Em seguida, pergunto, antes de adicionar o segundo cubo, apontando para a face exposta da esquerda do cubo que já estava sobre a mesa:
P: Se eu colocar mais um cubinho aqui, eu vou...
Novamente, antes que eu finalizasse a pergunta, os alunos A10 e A12 interromperam-me e iniciaram uma discussão a respeito da quantidade de faces expostas que teríamos no caso de dois cubos enfileirados. O aluno A12 defendeu a ideia de que seriam 6 faces expostas, enquanto o aluno A10 dizia que seriam 5.
A turma toda, de modo geral, acompanhou atentamente e de maneira bem silenciosa a discussão dos alunos A10 e A12. Não interferi e deixei que eles fizessem suas deduções antes de acrescentar o segundo cubo. Depois de finalizada a discussão (detalhada no próximo capítulo), prossegui perguntando a toda a turma:
P: Vamos ver? 5 ou 6?
A7: 3... não! 4! Não! 5! Tá certo! Vai ser 5! A10: 5, véi!
Neste momento, pego um cubo e convido os alunos a verificar quantas faces ficariam expostas com dois cubos enfileirados:
P: Vamos pensar? Vamos experimentar? (Acrescentando o segundo cubo ao lado do primeiro). Se eu
colocar mais 1 cubo, o que acontece?
Enquanto falo e acrescento o cubo, os alunos A10 e A7 continuam afirmando que serão cinco faces expostas. Depois que os dois cubos já estão enfileirados (Figura 7), eles apontam e contam em voz alta o número de faces expostas:
Figura 7: Dois cubos enfileirados sobre a mesa.
Em seguida, dei continuidade à discussão, de forma a instigar os alunos a perceberem uma regra para o cálculo do número de faces expostas em função do número de cubos enfileirados:
P: Eu quero perceber se vai existir um padrão nisso aqui... A7: Como assim?
A6: Eu acho que vai...
P: ... com certeza... com certeza... de cada um desses cubinho que eu enfileiro, quantas faces que eu
tenho expostas?
A partir de tal pergunta, eu tentava induzir a turma a perceber que em cada cubo enfileirado tínhamos sempre duas faces expostas, visto que eu considerava que se os alunos percebessem tal fato, ficaria mais fácil encontrar uma regra para o cálculo do número de faces expostas em função do número de cubos enfileirados.
Prosseguindo a atividade, antes de acrescentar o terceiro cubo aos dois que já estavam enfileirados sobre a mesa, convidei os alunos a pensarem no número de faces expostas que teríamos nessa situação. A aluna A6 apresentou a resposta correta – 7 faces expostas – e nós a confirmamos adicionando o terceiro cubo e fazendo a contagem.
Continuei apontando para os cubos enfileirados, a fim de que os alunos percebessem a regularidade:
P: Eu posso pensar, então, olha só: se eu enfileiro 3 cubinhos, cada um desses 3 sempre não vai ter 2
A7: Aham... A4: Ou 3!
P: Com a que tá aqui do ladinho (apontando para a face exposta da esquerda do último cubo)... eu
também posso pensar nessa regra?
A7: Pode!
P: Então, pra 3 cubos... A7: Vai ser 7 faces. P: Serão 7... A7: Faces. P: 7 faces.
Neste momento, volto ao quadro para continuar completando a relação entre o número de cubos e o número de faces expostas que eu havia começado a escrever, ficando registrado:
1 cubo → 3 faces 2 cubos → 5 faces 3 cubos → 7 faces
Ao acabar de completar essa escrita no quadro, voltei-me para os alunos com a pergunta:
P: E pra 4 cubos?
A4, A6 e A18 : 9, 9 faces! P: 9 faces...
E continuo registrando no quadro:
1 cubo → 3 faces 2 cubos → 5 faces 3 cubos → 7 faces
4 cubos → 9 faces
P: Por quê?
A6: É só adicionar 2. A7: É...
Novamente, volto à mesa com os cubos enfileirados e explico aos alunos porque aumentava de 2 em 2.
P: Porque essa aqui (apontando para a face da esquerda) que fica exposta ela é constante. Essa aqui
não sempre vai ficar exposta? Quando eu aumento um cubinho, então, eu estou aumentando só essas duas faces? (Apontando para a face voltada para cima e a face voltada para frente). Olha só, tira esse (retirando o terceiro cubo que estava enfileirado). Eu tinha quantas (faces): 1, 2, 3, 4, 5! (Faço a contagem das faces, apontando-as com o dedo indicados direito). Essa aqui (apontando para a face da esquerda do segundo cubo) vai continuar aqui (apontando para a face da esquerda do terceiro cubo),
não vai? Na hora que eu encaixo? E vão aumentar só essas 2. (Apontando para a face voltada para cima e a face voltada para frente do terceiro cubo a ser enfileirado). Então, vão aumentar só essas 2? (...)
A7: Eu entendi!
P: Então, se eu colocar mais um cubo aqui (juntamente com os 3 que já estavam enfileirados)...
A7: Vai... Vai continuar aparecendo as duas faces (apontando para o terceiro cubo enfileirado), mas
não a face dele, a face do outro (que será acrescentado).
P: Isso... Vai aparecer... Essa aqui vai continuar, né? (Apontando para a face esquerda do terceiro cubo). E vai aumentar só a de cima e a que está de frente pra vocês? Sim?
A7: Porque essa face aí (apontando novamente para o terceiro cubo) vai ser tampada pela outra (apontando para o cubo que seria acrescentado e que estava sobre a mesa do professor).
P: Muito bem, ela vai ser tampada. Mas, aí vem outra que vai compensar ela, não vai? A7: Claro, claro!
P: Então, vão ser quantos? Se eu tiver...
Acrescentei o quarto cubo aos anteriores. Ressaltei que em cada um desses quatro cubos, temos duas faces expostas (a de cima e a de frente para os alunos), além da face da esquerda do último cubo. Depois, perguntei:
P: E se fosse 5 cubos, então? A7: 5 cubos?
Percebi que eles encontraram esse último resultado usando a relação que eu havia escrito no quadro. Para que eles encontrassem outra estratégia de cálculo, diferente de ir acrescentando 2, pedi que eles encontrassem o número de faces expostas para 10 cubos enfileirados.
Assim, enquanto A7 e A6 tentavam fazer cálculos e os demais alunos estavam parados olhando para mim, o aluno A4 responde de imediato, em tom alto, que seriam 22 faces, pois bastava tomar o número de faces expostas para o caso de 5 cubos enfileirados e multiplicar por 2.
Retomando a exemplos dos cubos enfileirados sobre a mesa, mostrei que o número de faces expostas no caso de quatro cubos enfileirados não é exatamente igual ao dobro do número de faces expostas no caso de dois cubos enfileirados, pois é preciso subtrair uma face correspondente àquela que será tampada.
Em seguida, o aluno A10 apresenta a resposta correta – 21 faces expostas – e justifica que foi contando de 2 em 2.
A fim de que os alunos construíssem estratégias diferentes daquela de ir somando de 2 em 2, pedi a eles que encontrassem o número de faces expostas para o caso de 17 cubos enfileirados
O aluno A10 diz a gíria ‘marca aí!’, pedindo que eu esperasse um tempo para que ele fizesse os cálculos. Os alunos A4 e A7 também pedem para esperar. O aluno A14 começa a fazer registros em seu caderno. Eles pensam e, 15 segundo depois, a aluna A15 pergunta se seriam 35 faces expostas.
Antes que ela explicasse sua resposta, os alunos A4 e A10 começam a dar seus palpites ao mesmo tempo. O aluno A10 continua com o argumento de que bastava ir somando de 2 em 2 e o aluno A4 diz que se deve somar, sem especificar que soma seria.
Diante da confusão, eu retomo o controle e explico à turma por que a resposta correta era 35 faces expostas, de forma a mostrar aos alunos que uma possível regra para o cálculo do número de faces expostas em função do número de cubos enfileirados seria tomar o número de cubos, multiplicar por 2 e ao resultado adicionar 1.
De modo geral, os alunos compreenderam a explicação. Apenas a aluna A7 demonstrou dificuldade de entender. Dessa forma, voltamos ao exemplo dos cubos enfileirados sobre a mesa para tentar esclarecer sua dúvida. Ao final, pergunto à classe:
P: Então a gente descobriu o segredo? Então agora eu posso perguntar pra vocês, se eu tiver 1000
cubos...
A12: Eu! Pode! A7: Não, isso não!
P: 1000 cubos! A regra não vai ser a mesma? A4: 201 cubos!
P: 201? Faces! A4: É! Isso mesmo!
Visto que já havíamos gastado algum tempo com a discussão e que a maioria dos alunos mostrou ter entendido a regularidade da sequência trabalhada, pedi à turma que se organizasse em duplas (Apêndice B, página 219), a fim de que eles registrassem as nossas “descobertas” acerca do número de faces em função do número de cubos enfileirados. A princípio, eles reclamaram de ter que escrever, mas rapidamente se organizaram para cumprir a tarefa.
Como eles estavam compenetrados e envolvidos durante a discussão, preferi não interferir na formação das duplas e dar-lhes liberdade para trabalhar com quem preferissem, por acreditar que, dessa forma, eles continuariam o trabalho com a mesma seriedade mostrada até então.
Enquanto se organizavam, entreguei a cada dupla uma atividade impressa (ver Apêndice M, página 239) em que, primeiramente, eles deveriam completar uma tabela, que tinha por objetivo verificar se os alunos realmente haviam apreendido a regra para calcular o número de faces em função do número de cubos dados. Apenas a dupla 4, formada pelas alunas A3 e A7, completou a tabela com valores incorretos:
Imagem 7: Tabela e registros da dupla 4 na atividade II.
Percebemos que, na segunda coluna da tabela, do número de faces expostas correspondentes a 1 cubo, até o número de faces expostas correspondentes a 15 cubos enfileirados, as alunas foram completando com a sequência de números ímpares. Elas não perceberam que, na primeira coluna da tabela, o número de cubos não era a sequência de números naturais do 1 ao 6. Quanto ao número de faces expostas para 50 cubos enfileirados, apesar de, ao lado da tabela, percebermos o registro do cálculo 2 x 50 = 100, na tabela, elas completaram com o número 107, não nos permitindo conclusões.
Em seguida, eles responderam à segunda questão, em que deveriam expor sobre a regra encontrada para o cálculo do número de faces expostas em função do número de cubos enfileirados, que será detalhada no capítulo seguinte.
Os alunos gastaram cerca de 15 minutos para cumprir a tarefa escrita. Em seguida, nos minutos restantes da aula, realizamos uma discussão sobre o tipo de linguagem que estávamos utilizando para expressar a regra que havíamos encontrado.
Minha intenção foi instigar os alunos a criarem uma linguagem simbólica para escrever a fórmula em que o número de faces expostas é igual ao número de cubos enfileirados, mais um. Porém, eles apresentaram dificuldade e, quando pretendia continuar a discussão, a fim de perceber se surgiriam letras para indicar a quantidade de cubos enfileirados, o sinal anunciando o final da aula tocou.
Apesar de não ter prosseguido a discussão sobre a linguagem, consideramos que a atividade toda, desde as discussões até os registros escritos dos alunos, foi muito rica. A
dinâmica da aula funcionou muito bem. E, embora não tenhamos conseguido a participação efetiva de toda a turma, alguns alunos foram mais participativos que outros, percebemos que a maioria acompanhou atenta a evolução da atividade, e não apresentou dificuldades para realizar os registros escritos.