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CAPÍTULO 8 CONCLUSÕES

2. A CONSTRUÇÃO DE TAIPA E A SUA CONSERVAÇÃO

2.3. ENSAIOS DE CARACTERIZAÇÃO DA TERRA COMO MATERIAL DE CONSTRUÇÃO

2.3.7. Teor em sais conceito e valores limite

Os sais solúveis são um dos agentes de degradação mais prejudiciais para os materiais de construção porosos (Steiger e Siegesmund 2007). Os sais solúveis têm origem nos iões (cloreto, nitrato, sulfato ou outros) que migram, dissolvidos em água na fase líquida, na rede de poros dos materiais. A cristalização de sais ocorre como resultado da supersaturação destas soluções devido a processos de evaporação ou variações de temperatura. A deterioração por sais deve-se à cristalização cíclica de cristais de sal na superfície do material poroso (eflorescência) ou no seu interior (subflorescência ou criptoflorescência). As subflorescências podem introduzir tensões internas que podem superar a resistência mecânica do material poroso e, portanto, introduzir danos físicos. As eflorescências não constituem ou causam danos materiais, embora possam representar problemas estéticos e de salubridade. No entanto, os sais presentes nas eflorescências podem ser novamente dissolvidos e reabsorvidos pelo material, podendo eventualmente recristalizar como subflorescências.

A deterioração por sais de construções de terra é ainda uma matéria muito pouco estudada. A maioria dos trabalhos de investigação, estudos de caso incluídos, são dedicados aos materiais de construção clássicos, tais como pedra, cerâmica, argamassas de cal ou cimento. No entanto, é reconhecido que os solos são uma importante fonte de sais. O cloreto de sódio, por exemplo, surge frequentemente em solos a partir da contaminação com água do mar, ou devido ao consumo de cloreto de sódio associado à alimentação (comércio, utilização, resíduos domésticos) (Hall e Djerbib 2004a). Os solos podem também conter nitratos produzidos pela decomposição de matéria orgânica de fertilizantes orgânicos, dejetos de animais, tecidos orgânicos ou microrganismos. Podem ainda conter também sulfatos, por exemplo, de sódio (Zehnder e Arnold 1989).

No caso de edifícios em terra, os sais solúveis podem ser transportados pelos próprios materiais, terra ou outros, ser provenientes do terreno ou depositados pelo nevoeiro salino, por exemplo. Os sais depositados à superfície podem também ser arrastados para o interior e eventualmente causar danos em elementos adjacentes, tais como rebocos e argamassas (Schaffer 1932). Além disso, alguns sais - nitratos e cloretos, por exemplo - são significativamente higroscópicos. Por conseguinte, têm uma elevada capacidade de absorver água a partir da humidade presente no ar, dissolvendo-se e aumentando os níveis de humidade na parede. Esta condição sucede quando a humidade relativa de equilíbrio (HReq) de um sal ou solução salina é inferior à humidade relativa (HR) do ar.

A maior parte das referências bibliográficas referem que solos que contêm sais solúveis não são adequados para as construções de terra. Assim, algumas referências propõem requisitos relativos ao teor de sal para a taipa (Tabela 2.10). No entanto, apenas três dos dez documentos (Warren 1999, Walker et al. 2005, New Mexico Code 2006) que abordam esta propriedade recomendam limites quantitativos, estabelecendo todos um teor máximo de sal de 2% (em massa). Outros SNZ 4298 (1998), EBAA (2001), Walker e Australia (2001), Maniatidis e Walker (2003) estabelecem apenas em termos qualitativos uma obrigação geral de rejeitar o uso de solos com sais prejudiciais. Já Houben e Guillaud (2006) referenciam a nocividade potencial de apenas três tipos de sais de sulfato (magnésio, sódio e cálcio). Também Keefe (2005) limita, de forma generalista, a presença de sais tais como nitratos, cloretos e, sulfatos. Por último, o regulamento SAZS 724 (2001) aconselha, de uma forma muito geral, a rejeição de solos que contenham sais, tais como sulfatos.

Tabela 2.10. Requisitos para o teor em sais, para a técnica da taipa

Documentos Requisitos para o teor em sais (% em massa)

SNZ 4298 (1998) Não devem ser utilizados solos que contenham sais solúveis em água, podendo estes prejudicar a resistência ou a durabilidade da parede

Warren (1999)  2%

SAZS 724 (2001) O solo não deve conter sais, como por exemplo sulfatos, uma vez que interfere com a utilização de ligantes EBAA (2001) A utilização de solos para construção que contenham sais solúveis em água deve ser evitada, de modo a não

comprometer a resistência ou durabilidade da parede

Walker e Australia (2001) Solos com sais devem ser evitados; contudo a ser usados devem ser estabilizados. São necessários cuidados especiais durante a construção da edificação

Maniatidis e Walker (2003) São de evitar solos que contenham sais solúveis, a fim de não prejudicar a resistência da parede ou durabilidade Walker et al. (2005)  2%

Keefe (2005) Limitar os principais sais presentes numa parede de terra, nomeadamente os nitratos, cloretos e, sulfatos Houben e Guillaud (2006) Sulfatos de sódio (NaSO4), magnésio (MgSO4) e cálcio (CaSO4) são prejudiciais aos solos utilizados nas

construções de terra, uma vez que estes cristalizam, aumentando a possibilidade de desintegração do material New Mexico Code (2006)  2%

A análise efetuada mostra assim que os requisitos são demasiado genéricos (SNZ 4298 1998, EBAA 2001, Walker e Australia 2001, Maniatidis e Walker 2003), carecem de justificação quanto ao tipo de sais abrangidos (SAZS 724 2001, Keefe 2005, Houben e Guillaud 2006) ou apresentam valores limite para o teor total de sais não mencionando qualquer justificação (Warren 1999, Walker et al. 2005, New Mexico Code 2006). Com efeito, a deterioração devida ao sal deriva de processos complexos que ainda não foram completamente entendidos e dependem de uma variedade de fatores interrelacionados, tais como o tipo e o teor de sal, as condições ambientais (temperatura, humidade relativa e velocidade do ar), as características físicas e o teor de humidade de todos os materiais envolvidos (porosidade e distribuição do tamanho de poros, bem como as propriedades de transporte de vapor e de líquido), e a presença e as características dos revestimentos (rebocos, argamassas, tintas).

Entre os documentos analisados são poucos os que mencionam o método para a determinação do teor em sais em solos para construção. Walker et al. (2005) mencionam o método da BS 1377-3 (1990), que incide sobre os teores de cloreto, sulfato e carbonato presentes no solo. Houben e Guillaud (2006) sugerem um teste expedito para deteção de sulfatos e cloretos, por observação de precipitações baseadas em soluções de cloreto de bário (BaCl2), para sulfatos, e de nitrato de prata (AgNO3), para cloretos. Keefe (2005) cita o ensaio descrito no

Building Research Establishment Digest 245, “Rising damp in walls; diagnosis and treatment (1985)”, que se

baseia na determinação do teor em humidade higroscópica (hygroscopic moisture contente, HMC). Este método, como se verá, permite estimar a presença de sais solúveis (apesar da determinação do teor de sal não ser o objetivo deste método do BRE). Nesta tese, a determinação do teor de sais dos materiais foi efetuada por meio da determinação do teor de humidade higroscópica (HMC) seguindo o método descrito em Gonçalves e Rodrigues (2006), Gonçalves et al. (2006) e Gonçalves (2007).