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11 Áreas do conhecimento científico e técnico relevantes para a apreciação, crítica e fundamentação da

11.4 Teoria da Forma

No que respeita ao design de comunicação gráfica, em muitas situações, prevalece a aparência visual em relação à geometria rigorosa. É caso disso o espacejamento entre letras e entre palavras. Também na composição dos vários elementos gráficos, nas páginas, o equilíbrio visual das mesmas reporta-se à aparência e não à regularidade da distribuição geométrica. Dado que a componente interpretativa da percepção visual, aliás tradicionalmente associada ao design, funciona bem na prática da construção de projectos gráficos e visto ainda o seu interesse histórico e cultural, parece-nos oportuno dar aqui um relativo desenvolvimento a esta matéria, independentemente do seu actual valor científico.

As chamadas figuras duplas e as figuras impossíveis terão despoletado o aparecimento da Teoria do Gestalt, também chamada Psicologia da Forma ou ou Teoria da Forma (Fig.87).

Todos nós ficamos sem dúvida intrigados em presença delas, sendo no entanto utilizadas com frequência como simples passatempo sem que se tirem as devidas conclusões.

A sua análise aprofundada levou a constatações que vieram pôr em causa as teorias associacionistas.

A raiz moderna destas teorias encontra-se na filosofia cartesiana da dúvida metódica que se opunha a toda a ideia inata, defendendo que todo o conhecimento humano se baseava na experiência adquirida e nas sensações. Defenderam-na John Locke, G. Berkeley e David Hume através das teorias associacionistas. O pensamento, segundo elas, desenrola-se através de três operações: a continuidade, o contraste e a semelhança.

Von Ehrenfels, Wertheimer e Koffka, numa tese bem diferente formularam a Gestaltpsychologie onde defendem que um conjunto é imediatamente apercebido através da sua estrutura, independentemente da memória. Uma forma, segundo eles, organiza-se num todo, mesmo quando composta de elementos (Gestalt em alémão, designa exactamente forma global).

Ehrenfels apresentava em defesa da sua tese o exemplo de um trecho musical que poderá mudar de tom, mantendo-se no entanto a mesma melodia. A nível visual e em paralelo, podemos escolher uma letra do alfabeto, sempre reconhecível, independentemente de ser escrita à mão, à máquina ou impressa em vários tipos ou fontes.

Em síntese, a psicologia tradicional faz assentar as suas teses na experiência adquirida, enquanto a psicologia do gestalt defende que as formas são a base condutora da nossa percepção.

• Princípios da Gestaltheorie

Com base nos trabalhos de Wertheimer, Kohler e Koffka, o filósofo francês Paul Guillaume, nos anos 30, apresentou um trabalho onde expôs de uma forma lapidar os princípios da teoria do gestalt:

o Uma forma é diferente e algo mais do que a soma das partes que a compõem. Uma forma é um todo indissociável que tem qualidades próprias e que não resulta exclusivamente da soma dos elementos que a compõem.

o Uma parte num todo é diferente da mesma parte isolada ou num outro todo. o Os factos psíquicos são formas, isto é, unidades orgânicas que se individualizam e se

limitam no campo espacial das percepções e das representações.

o Cada forma é uma função de várias variáveis e não a soma de vários elementos. o As formas são transponíveis, ou seja, algumas das suas propriedades conservam-se

através de mudanças que afectam de certo modo todas as suas partes. • Conceitos Fundamentais do Gestalt

o Todas as formulações teóricas começam por definir uma metalinguagem, ou seja, uma série de conceitos indispensáveis para a sua exposição e desenvolvimento. o Na teoria do gestalt existem três conceitos básicos: O Campo; a Estrutura e a Forma. o Campo Perceptivo.

Campo de percepção é o espaço que serve de suporte aos diversos fenómenos visuais, apresentando- se neutro em relação a esses fenómenos, o que levou Attilio Marcolli, no seu livro “Teoria del Campo” [AM 88], a defini-lo do seguinte modo:

“ Campo é um espaço que apresenta algumas características constantes em todos os seus pontos. A título de exemplo: a sala de aula será um campo e da mesma maneira são campos, a folha de desenho, a tela do pintor, a estrada que vemos através da janela, o terreno onde se encontra a escola. São igualmente campos o prado, o cinzeiro, a cadeira ,etc., porque no seu interior têm certas características homogéneas (cores, materiais, forma, função, etc). Nessa medida determinam espaços, tanto mais que neles se podem realizar certas operações. No entanto, qualquer acção ou operação implica não só um determinado espaço, como igualmente um certo tempo, pelo que este conceito deve ser considerado de natureza espaço-temporal.”

• Estrutura e Forma

o Estes dois conceitos andam intimamente ligados entre si e ao de campo.

o Estrutura é o conjunto de elos que permite a definição de uma forma independentemente dos elementos que a compõem.

o Em suma. com os mesmos elementos podem-se constituir muitas formas por intervenção da estrutura, podendo-se concluir que formas são zonas do campo que, por atingirem um determinado grau de estruturação, se segregam das zonas não estruturadas (Fig. 88).

• Relação Forma-Campo

o Num mesmo campo, a mesma forma pode ter significações distintas de acordo com a sua localização.

o Isto significa que, se o campo em si mesmo, sendo homogéneo, é neutro, na presença da forma, nem todas as suas zonas são iguais para a forma.

o De acordo com a sua localização num campo, as formas podem ter maior ou menor peso. o Uma figura isolada num campo destaca-se muito mais do que se estiver integrada

num conjunto de formas. A escala pode fazer igualmente variar o seu peso na composição (Fig. 89).

o O campo embora homogéneo, pelas formas que contiver, ganha uma orientação. Uma forma regular destaca-se mais num campo do que as formas irregulares.

A simetria duma figura acentua-se se o seu eixo no campo se orientar verticalmente. • Forma Fundo

o Às formas que são, como vimos, as zonas do campo que se segregam e destacam, contrapõe-se o fundo, ou seja, todas as zonas que se mantêm neutras e o mesmo é dizer, excluídas pela estrutura. O fundo, como o campo, visto ter características homogéneas em toda a sua extensão, passa despercebido o que levou um teórico a interrogar-se:

o “Porque razão vemos as coisas e não os vazios, isto é, os espaços entre elas?”

o Curiosamente existem figuras reversíveis como algumas do artista gráfico holandês Escher onde se vêm alternadamente, por exemplo, peixes e pássaros ou os conhecidos perfis confinando com a imagem duma jarra.

o É-nos no entanto, difícil, quando não impossível, fixar ambas as estruturas ao mesmo tempo. Quando uma se segrega, a outra torna-se neutra ou fundo e vice-versa. o Embora o fundo seja uma área complementar da forma, perfazendo o espaço do

campo, em termos de percepção, ele é entendido, em qualquer das duas leituras da figura, como contínuo, passando portanto por trás daquela.

• Leis da Organização da Forma

o Qualquer padrão de estímulos tende a ser visto de tal modo que a estrutura resultante é a mais simples que as condições dadas permitem.

• Lei da Proximidade Relativa

o Num conjunto de vários elementos que ocupam um campo, criam-se relações de tensão que os unem, prevalecendo no entanto as mais fortes. Estas são as que se formam entre os elementos que se encontram mais próximos uns dos outros. o O princípio da proximidade, é estruturante: elementos mais próximos no campo

criam tais tensões visuais entre si que os levam a segregarem-se dos restantes, para constituirem uma forma autónoma.

o O princípio da proximidade relativa pode no entanto entrar em contradição com outros princípios do gestalt que se lhe podem sobrepor. É o caso da lei da semelhança:

• Lei da Semelhança

o Quando num campo se encontram grupos de formas de naturezas diferentes, elas têm tendência a associarem-se segundo critérios de semelhança que poderão ser a configuração, o tamanho, a cor, a orientação, a textura, etc.

• Lei da Simetria

o As formas simétricas surgem-nos como formas mais acabadas do que as não simétricas, conferindo a simetria maior unidade.

• Lei da Pregnância

o Existem formas que pela sua regularidade, simetria ou simplicidade são facilmente detectáveis num conjunto de elementos. Por outro lado, essas mesmas formas podem, dadas as qualidades citadas, ser definidas de modo minimalista (Fig. 90).

o Três pontos ou três pequenos ângulos definem perfeitamente formas triangulares. Formas abertas têm a qualidade de serem vistas como fechadas ou completas, no dizer de Attilio Marcolli. A esse propósito, este autor estabelece um paralelo entre os pares de conceitos aberto/fechado e incompleto/completo no que diz respeito às formas . • Acentuação e Nivelamento

o O princípio geral do gestalt, segundo o qual a nossa percepção tende a ver, num dado padrão, a forma mais simples possível, leva-nos a caracterizar e reter em memória esses mesmos padrões através de dois mecanismos: acentuação e nivelamento (actuando o primeiro por excesso e o segundo por defeito).

o Por estes processos temos a tendência para ignorarmos certas diferenças e eliminá-las (nivelamento) ou as acentuarmos por forma a torná-las mais notórias (acentuação). Tanto num caso como no outro, trata-se de processos mnemónicos, tornando a estruturação mais evidente e, por isso mesmo, mais simples e facilmente reconhecível.

Fig. 87- Figuras ambíguas

Fig. 88- Diferentes campos partindo

Fig. 90 - Uma das formas de verifi cação do

princípio da pregnância é a constatação da percepção de formas apenas sugeridas.

Fig. 89 - Destaque da forma pelo isolamento e