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1.3 PRECEITOS TEÓRICOS

1.3.2 O processo de constituição de agenda

1.3.2.1 Tipos de Agenda

Kingdon (2006) observa a existência de três tipos de agenda, quais sejam: a agenda sistêmica, a agenda governamental e a agenda de decisão. A primeira origina-se em ocasiões de controvérsias políticas. A segunda abarca a lista de temas-objetos das atenções. Já a terceira apresenta a lista dos assuntos, também constantes na agenda governamental, que são encaminhados para deliberação.

São por meio de normas, valores e ideologias que os agentes políticos se envolvem no entorno de um problema público, compartilhando preocupações, mesmo que por razões ou interesses distintos, para sustentar e criar a agenda sistêmica (KINGDON, 2006).

A agenda sistêmica é composta de questões que são percebidas pela maioria dos sujeitos como pertinentes à atenção pública, a ser colocada como matéria que compete à autoridade governamental.

Kingdon argumenta que para um assunto sair da agenda sistêmica e entrar na agenda de governo, é necessário que haja eventos dramáticos ou crises, influência de um quadro de indicadores ou acumulações de informações e experiências (VIANA, 1996).

Numa outra perspectiva, mas muito semelhante, Cobb e Elder (1995) argumentam sobre a existência de dois tipos básicos de agendas políticas, a saber: 1) agenda sistêmica; 2) agenda institucional. No campo da agenda sistêmica, verifica-se que esta se origina em ocasiões de controvérsias políticas.

Os referidos autores salientam que a agenda sistêmica do estado, por exemplo, pode envolver questões das agendas sistêmicas locais. Além disso, para ter acesso a essa modalidade de agenda, eles apontam alguns pré-requisitos (COBB; ELDER, 1995, p. 99):

(1) widespread attention or at least awareness;

(2) shared concern of a sizeable portion of the public that some type of action is required, and;

(3) a shared perception that the matter is an appropriate concern of some governmental unit and fall within the bounds of its authority.

Por meio de normas, valores e ideologias, ou seja, pela constituição de uma esfera de envolvimento de agentes, tem-se a “preocupação compartilhada" e uma "percepção comum” entre os envolvidos como condições que dão sustentação e criam a agenda sistêmica. Em síntese, sob um olhar sistêmico, os autores afirmam que os eventos (os elementos que estruturam a dinâmica social) são indicados pelos inputs, que transformam o problema em um assunto público, e, por conseguinte, são reconhecidos pelos outputs, que se apresentam como a própria agenda, como resultado do processo.

Por sua vez, a agenda institucional (governamental ou formal) se configura como um conjunto de questões priorizadas por quem decide. Ela tende a ser mais específica por delimitar as questões da agenda sistêmica, deixando-as mais concretas. Isso ocorre por meio da identificação das facetas de um problema a ser considerado por um órgão de decisão. A agenda sistêmica, como já compreendida, é de escopo mais amplo e abstrato, com a função de identificar a área-problema (COBB; ELDER, 1995).

De qualquer maneira, a agenda governamental tende a evidenciar vieses estruturais e institucionais encontrados dentro do sistema, decorrentes das diferenças de recursos, entre os indivíduos e grupos. Nesse campo, os líderes políticos são participantes ativos no processo de construção da agenda, árbitros não simplesmente imparciais das disputas em questão, pois podem ser gratos a um determinado grupo ou identificarem-se como um membro desse grupo. Por outro lado, como mencionado, alguns grupos têm mais recursos do que outros ou ao menos são mais capazes de mobilizar os seus recursos.

Frente a esta situação, “Cobb e Elder afirmam que é preciso repensar a teoria do processo decisório, sublinhando as contribuições de Schattschneider (1960), Dahl (1956) e Gamson (1968), para quem a participação é bastante limitada na arena onde se decide que políticas serão implementadas” (VIANA, 1996, p. 12).

1.3.2.1.1. Agenda e Conteúdos

Além dos tipos de agenda, faz-se necessário compreender as categorias que demarcam os conteúdos da agenda pública. Segundo Cobb e Elder (1995), o conteúdo da agenda formal pode ser dividido em duas categorias, a de antigas e a de novas questões. Nesse campo, constata-se via constituição da agenda, a manutenção de alguns assuntos públicos. Isso pode decorrer da criação de “notícias” e da renovação dos recursos simbólicos associados ao tema.

Além dos assuntos que são novamente elencados na agenda, Carmines e Stimson (1989, apud FUKS, 2000, p. 83) visualizam outros três tipos de assuntos associados à ascensão para a agenda pública, quais sejam: 1) aqueles que não captam a atenção pública, pois são muito técnicos, complexos, não favorecendo o elo comunicativo entre as elites e os cidadãos: são resolvidos no âmbito das elites (p. ex: política energética); 2) aqueles que têm grande impacto imediato, mas não deixam marca de longa duração no sistema político; 3) aqueles, raros, que têm um longo ciclo de vida, capazes de alterar o ambiente político em que surgiram e se desenvolveram, conduzindo a mudança no sistema (p. ex.: a questão racial, na política norte-americana).

Por fim, é importante frisar que os conteúdos, na configuração de uma causa a ser defendida, podem se inserir na agenda ao aproveitar uma janela de oportunidade. Para Kingdon (2006, p. 236), no campo das políticas públicas, uma janela aberta representa uma oportunidade para apresentação de soluções pelos defensores de uma determinada causa, ou para chamar atenção para questões especiais. Como salienta o referido autor, as janelas se abrem decorrentes de problemas e questões políticas (eleições, por exemplo). Com efeito, “De fato, defensores de políticas dentro e fora do governo mantêm suas propostas e suas indicações de problemas sempre prontas”, aguardando o surgimento de oportunidades. “Eles desenvolvem propostas de soluções, por exemplo, e esperam que apareçam os problemas para os quais possam oferecer soluções”.

Além das janelas de oportunidades, outra forma de um problema ou proposta entrar na agenda se dá por meio do empreendedor político. Para Kingdon (2003, 2006), não importa se o empreendedor está situado no poder executivo ou na alta burocracia estatal, nos partidos políticos, no parlamento ou nas suas assessorias, na mídia ou na academia, sempre se caracterizam como pessoas dispostas a investir tempo, energia, reputação e dinheiro em uma ideia ou ação pública.

Foi a partir do lugar de leitor e de interlocutor que desenvolvi este trabalho, alinhado ao construcionismo social, pelo qual busquei alcançar a inteligibilidade sobre o colocar o assunto público na agenda, por meio de diálogos entre as entrevistas, os registros e as imagens sobre as experiências do Conselho Gestor dos Mananciais e do CONRESOL, e as teorias sobre agenda e processo decisório para escolha de alternativas (formulação) (KINGDON, 2006; COBB e ELDER, 1995). E, ainda, por acreditar que estas leituras seriam úteis (e foram!) para responder a questão de tese: as experiências do CGM e do CONRESOL têm

auxiliado na construção de práticas de gestão metropolitana na RMC? Como? E, por quê?

Estas leituras envolveram compreender a vida política por meio do entendimento das relações e debates que acontecem nas arenas argumentativas, entre partidos políticos, grupos organizados, mídia e poder público, em um processo de construção social da realidade, não se limitando a uma investigação objetiva.

Para aprofundar o processo de constituição de agenda e de construção de um problema público, trouxe ao diálogo (integrei as histórias sobre como as experiências foram construídas), a perspectiva do policy analysis, no que se refere à leitura sobre geração e mobilização de conhecimento para identificar o problema, elaborar alternativas e formular políticas públicas.