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4. CONVENÇÃO ARBITRAL

4.3. Tipos de cláusula compromissória

Quanto aos tipos de cláusula compromissória pode-se, para efeitos de bem analisá-las, dividi-las em: cheias, vazias, patológicas ou escalonadas, combinadas (ou fracionadas).

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A posição contrária é defendida em sua maioria por processualistas como José Carlos Barbosa Moreira, Humberto Theodoro Júnior, Alexandre Freitas (CARMONA, Carlos Alberto. Op. cit., p. 78). 85

Diz-se cláusula cheia aquela que “se constitui no padrão pretendido e que permite a instauração de plano do procedimento arbitral”86.

A cláusula compromissória será cheia na medida em que for suficiente para que se instaure o procedimento arbitral. Poderá em seu texto fazer menção à arbitragem institucional ou ad hoc desde que verse sobre todos os pontos indispensáveis para abertura do procedimento.

A cláusula cheia, por conter todos os requisitos que a lei determina mínimos para a instituição da arbitragem eficaz, deve ser acordada contemplando o número de árbitros (sempre ímpar); a sede da arbitragem; a lei aplicável; o idioma (previsão normalmente quando houver partes estrangeiras); as regras para a arbitragem (se reportar às regras de algum órgão arbitral institucional ou uma entidade especializada ou mesmo delegar ao árbitro ou tribunal que regulem o procedimento); os limites da arbitragem; a autorização ou não para o julgamento por equidade; a responsabilidade pelo pagamento de honorários e despesas com a arbitragem.

Ainda assim o são, pois que redigidas com clareza suficiente a que as partes signatárias evitem que a instituição dela, já de per si, estabeleça controvérsias.

Pode-se, além daquelas que a lei considera mínimas para a eficaz instituição da arbitragem, descer a minúcias, como, por exemplo, indicar o nome do árbitro que irá atuar quando ocorrida a questão controvertida.

Segundo José Emilio Nunes Pinto87,

[...] a cláusula compromissória bem redigida, com clareza e precisão do escopo e termos, há de agregar inúmeras vantagens a todo o procedimento arbitral, lembrando-se sempre de seu efeito vinculativo para as partes, seus sucessores e cessionários a qualquer título. Sem dúvida, a forma segura de convencionar a cláusula arbitral cheia dá-se mediante as regras de uma instituição arbitral, visto que as partes se vinculam ao procedimento regimental da entidade eleita, reportando-se às cláusulas do regulamento interno da instituição.

86 PINTO, José Emilio Nunes. Cláusulas arbitrais patológicas – esse mal tem cura. Disponível em: < .mundojuridico.adv.br cgi-bin upload texto82 .rtf >. Acesso em: 10 mar. 2013.

87 PINTO, José Emilio Nunes. As vantagens da cláusula compromissória clara e precisa para a condução da arbitragem. Disponível em: <http://www.mundojuridico.adv.br>. Acesso em: 10 mar. 2014.

Destarte, a cláusula cheia por si só, é suficiente para que o árbitro assuma sua função e dê início ao processo arbitral, sem que haja necessidade de qualquer outra providência.

Por outro lado, na cláusula vazia, também denominada cláusula em branco, não há condições de ser iniciado o procedimento arbitral, pois ausentes as informações mínimas necessárias a tanto. Estas podem ser definidas como a “versão em negativo das cláusulas cheias”88.

Assevera, nesse sentido, inclusive, Francisco José Cahali89, que tais cláusulas, na própria acepção do termo, seriam aquelas em que a previsão de arbitragem traz uma lacuna quanto à forma de instauração do procedimento arbitral, que deverá ser suprida.

Nesses tipos de cláusula, por exemplo, não consta forma de nomeação de árbitros, como se dará o chamamento da parte adversa para o início do procedimento, forma de remuneração dos árbitros entre outros pontos indispensáveis a possibilitar o início do procedimento. Em verdade, apenas discorrem sobre a eleição de dirimir qualquer eventual problema resultante daquele pacto pela arbitragem.

O cuidado com relação à inserção de cláusula, para que não se constitua vazia, é de rigor, pois uma vez surgido o conflito a impossibilidade de instauração do procedimento arbitral trará consequência às partes.

José Emilio Nunes Pinto90 assevera que:

[...] não sendo possível instaurar-se de plano a arbitragem, o desequilíbrio da equação é agravado. Desequilíbrio decorrente da controvérsia que é potencializado pela impossibilidade de se instaurar a arbitragem como pretendido.

Em assim ocorrendo, a questão pode ser dirimida pelas partes com a confecção de um compromisso arbitral, que estabelecerá as normas a serem utilizadas no procedimento.

88 PINTO, José Emilio Nunes. Cláusulas arbitrais patológicas – esse mal tem cura. Disponível em: .mundojuridico.adv.br cgi-bin upload texto82 .rtf . Acesso em: 10 mar. 1013.

89 CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 126.

90 PINTO, José Emilio Nunes. Cláusulas arbitrais patológicas

– esse mal tem cura. Disponível em: .mundojuridico.adv.br . Acesso em: 10 mar. 2013.

Mas nem sempre no momento em que se instala um conflito as partes preservam a mesma conexão inicial que tiveram ao firmarem o negócio a que se atrela a cláusula arbitral.

Diante disso, surge um problema, que é a resistência de uma das partes em assinar o termo, admitindo a lei, em casos tais, que, conforme o art. 7º da Lei Arbitral, a parte proponha a ação perante o Poder Judiciário, para firmar ou não a competência da arbitragem para julgar e processar aquela demanda ou mesmo por disposição das partes, através de um termo de compromisso arbitral.

Diferentemente, se a cláusula vazia pode ser corrigida sem intervenção estatal, a cláusula patológica não dá margem a essa possibilidade. É que a cláusula patológica, porquanto seja aquela de conteúdo dúbio, incompleto ou impreciso, sublimando em sua essência a real intenção das partes quando de sua origem redacional, e, assim denominadas pois “padecem de um mal crônico que as acometeu quando de sua criação”91.

Como exemplo de cláusula patológica, José Emilio Nunes Pinto92 sugere um caso em que a cláusula prevê as regras da Câmara de Comércio Internacional de Paris – CCI para serem aplicadas por uma instituição brasileira, pois tais regras foram desenvolvidas para a estrutura daquela instituição e, portanto, incompatíveis com a estrutura das instituições brasileiras.

Consequentemente, a inviabilidade da utilização da cláusula patológica acaba por derivando na impossibilidade de se instaurar a arbitragem ante a ausência de consenso entre as partes a tal ponto que a parte somente conseguirá dar início ao procedimento arbitral se contar com a boa vontade da outra ou socorrer-se do Poder Judiciário, dados os elementos omissos da cláusula patológica.

Dessarte, uma cláusula pode ser considerada patológica quando não cumpre ao menos quatro funções: não produz efeito obrigatório entre as partes; não dá aos árbitros o poder de resolver o litígio, permite a intervenção da jurisdição estatal para solver o conflito; não permite a organização do procedimento de modo que conduza a uma sentença arbitral93.

91 PINTO, José Emilio Nunes. Cláusulas arbitrais patológicas

– esse mal tem cura. Disponível em: <www.mundojuridico.adv.br . Acesso em: 10 mar. 2013

92 PINTO, José Emilio Nunes. Cláusulas arbitrais patológicas

– esse mal tem cura. Disponível em: .mundojuridico.adv.br . Acesso em: 10 mar. 2013

93 DERAINS, Yves. El contrato de arbitraje: cláusulas compromissórias patológicas y conbinadas. Legis: Universidad del Rosario, 2005, p. 191.

É que a cláusula arbitral tem o intuito de possibilitar a instauração, organização e desenvolvimento da arbitragem, agregando valores. Todavia, uma vez confusa, ambígua, contraditória, dentre outros atributos do gênero que possam retirar-lhe a eficácia para a utilização vinculativa da arbitragem, torna-se inoperante.

Pela cláusula arbitral patológica, pode-se afirmar, no mais das vezes, que, em verdade, a intenção das partes foi efetivamente utilizar-se do instituto para solucionar eventuais questões controvertidas previstas no instrumento firmado entre elas, sem que se possa dimensionar, efetivamente, elemento substancial dessa via eleita – e, em algumas situações, pode ser que a própria opção das partes à utilização da arbitral, pesem dúvidas, como exemplifica Francisco Cahali94:

[...] indicação do regulamento de uma instituição, porém para ser administrada por entidade diversa, com regras contrárias àquelas previstas ou até mesmo para ser desenvolvida por árbitro único, impossibilitando a utilização de algumas previsões; [...] as partes elegem o foro da Comarca de São Paulo para as questões decorrentes de contrato a serem dirimidas por arbitragem judicial, ou, ainda, os conflitos serão resolvidos por arbitragem dos juizados especiais de pequenas causas.

Importa, em análise da validade da instituição arbitral em casos tais, que a vontade das partes, quando nos deparamos com cláusulas vazias, esteja suficientemente clara, o que preservaria um mínimo de eficácia na utilização do instituto.

Caso contrário, recomenda Francisco José Cahali95 sejam invalidadas ou

interpretadas inexistentes sob ótica restritiva e de rigor extremo, sob pena de, uma

vez instado o conflito, ensejarem a exposição sentencial a invalidação final pelo Judiciário.

Não obstante, caso a vontade das partes em utilizarem-se da arbitragem esteja suficientemente cristalina, embora a cláusula esteja defeituosa, pode-se instaurar procedimento arbitral, adaptando-se a vontade das partes e utilizando-se dos princípios da cláusula arbitral antes vistos, de forma a preservar-se seu efeito.

A par da questão da vinculação da cláusula, quando ainda de inviável acesso, será dirimida nos termos com que refere a Lei de Arbitragem, através de seu art. 7º, em que a parte interessada busca, através do Judiciário, o compromisso arbitral da parte adversa.

94 CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 134. 95 CAHALI, Francisco José. Op. cit., 2013, p. 135.

Quanto à cláusula escalonada, pode-se dizer daquelas em que se utiliza a arbitragem híbrida, ou seja, estipula-se a utilização da mediação ou conciliação previamente à arbitragem.

Normalmente, tal formato é utilizado em instituições arbitrais para comporem a solução de questões controvertidas, submetendo às partes em lide, previamente ou durante o próprio procedimento arbitral, as técnicas compositivas não contenciosas.

Fernanda Levy96 retrata que

Esse escalonamento pode ocorrer de duas maneiras: pela previsão inicial de mediação e caso ela reste infrutífera no sentido de obtenção do acordo, continua-se a gestão do conflito com a arbitragem (cláusula arbitral escalonada med-arb) ou no sentido inverso, iniciado o procedimento arbitral, ele é suspenso para que a mediação se desenvolva, para em seguida ser retomado para a homologação do acordo ou continuidade do procedimento arbitral (cláusula arb-med).

Sem dúvidas, o resultado positivo na utilização desse formato de solução conflitual geralmente coaduna-se aos feitios de contratos em que as partes mantêm relações comerciais, de forma continuada e no advento do conflito, parte dessa relação interessa a continuidade, possibilitando em fase prévia da arbitragem, apararem as arestas e obterem um consenso, solvendo o conflito e submetendo o entendimento delas e acertamento, à homologação por um árbitro.

Não demais lembrar que, uma vez que tenham as partes disposto a instituição da arbitragem através de cláusula escalonada, outro não poderia ser o entendimento senão a aplicação de todos os métodos eleitos, uma vez que não se trata de opção por um ou outro, mas em escala como o próprio nome conceitual remete.

A forma híbrida mais conhecida seria a utilização da med-arb, modalidade normalmente prevista em cláusula contratual em que, de forma escalonada, as partes se dispõem a solucionar a questão controvertida apresentada, inicialmente, através de mediação que, caso inexitosa, passa a ser objeto da arbitragem.

Nessa modalidade, normalmente também o mediador atuará como árbitro, situação que, se, por um lado, possa dar a entender que haveria certa distorção na figura do mediador quando ocupasse posição de árbitro, já que ambas as formas pressupõem ambientes e técnicas diferentes, por outro lado pode-se entender

96 LEVY, Fernanda Rocha Lourenço. Cláusulas escalonadas: a mediação comercial no contexto da arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 200.

proveitoso em razão de que o antes exercido papel de mediador tornaria o árbitro mais a par do cenário do conflito e suas nuanças. De dizer que não se encontra proibição legal alguma para que o árbitro atue como mediador ou mesmo conciliador.

No med-arb, assim como em todos os métodos híbridos, ao se utilizar as vantagens da mediação e da arbitragem para a solução eficaz de um conflito, inicialmente a audiência inaugural serve para facilitar a mediação, enquanto no med/arb a mediação vem primeiro e, se mal sucedida, submete-se o caso à arbitragem.

Destarte, as formas híbridas podem combinar-se entre si, na utilização de duas ou mais formas alternativas para solução de conflitos e, considerando-se, inclusive, no caso concreto, variadas etapas para o objetivo de solver a controvérsia instaurada, é possível justapor-se esses diferentes métodos.

Conforme Richard Hill97, cada método cumpre determinados fins, da mesma forma como na medicina há diversos medicamentos para curar diversos graus de uma mesma enfermidade.

O método a ser aplicado dependerá sempre daquilo que as partes convencionarem, mas deve-se para tanto considerar, sendo o intuito óbvio solver controvérsias, que aquele eleito à aplicação seja adequado a determinado caso concreto.

De qualquer forma, a solução conflitual, quer pela mediação, quer pela conciliação, quer pela arbitragem ou seus meios híbridos, fica cada vez mais sedimentada em nível nacional.

Por derradeiro, de registrar que há outra forma de cláusula arbitral, pouco utilizada ainda, mas que vem firmando espaço no terreno da arbitragem, como indica Selma Ferreira Lemes98:

[...] Cada vez mais se verifica a necessidade de moldar as formas extrajudiciais de solução de controvérsias às especificidades de contratos complexos [...] Por todas essas razões, a indicação da arbitragem e a eleição de foro num mesmo contrato podem ser válidas e eficazes [...]

97 HILL, Richard. The theoretical basis of mediation and other forms of ADR: why they work. Arbitration International, LCIA, v.14, n. 2, 1998.

98 LEMES, Selma Ferreira. Cláusulas combinadas ou fracionadas. Revista do Advogado, AASP, ano 33, n. 19, p. 153-154, abr. 2013.

Nesse pensar, vislumbram-se as chamadas cláusulas arbitrais combinadas ou fracionadas, ou seja, sincronizadas, que permitem às partes, no âmbito de suas vontades, fracionarem um contrato e elegerem, por exemplo, leis diferentes para reger cada matéria nele contida ou mesmo, nesse fracionamento, a eleição da justiça estatal e da arbitral para cada questão delimitada na cláusula.

Tal modalidade permite ainda que questões contratuais versadas em direitos indisponíveis sejam submetidas à jurisdição estatal e as relativas aos direitos disponíveis pactuados sejam dirimidas por meio da arbitragem.

Nessa via, a cláusula fracionada permitiria que se preservasse a utilização da arbitragem em determinados e delimitados contextos do contrato a que ela se coaduna, e que se remetesse ao Judiciário aqueles que sejam de competência exclusiva deste ou mesmo que tenham assim estipulado as partes.

Da doutrina de Carlos Alberto Carmona99, acrescenta-se:

[...] enganam-se portanto aqueles que veem alguma patologia por conta da inserção, num mesmo contrato, das duas cláusulas: a convivência de ambas é pacífica, não havendo necessidade de conceber artifícios interpretativos, muito menos de investigar eventuais intenções das partes para excluir uma ou outra avença. No entanto, especial atenção merece a redação dessas cláusulas, tendo em vista que devem guardar sintonia entre si, não podendo dar previsão contraditória, de modo que uma negue a aplicação da outra, sob pena de, consequentemente, encaminhar a cláusula a sua invalidade ou inoperância.