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3.3 As tarefa (task)

3.3.4 O trabalho em grupo

Antes de expor as atividades76, consideramos indispensável descrever as principais características do trabalho em grupo, dado que as tarefas atribuídas exigiam colaboração entre os aprendizes.

Em primeiro lugar privilegiamos o trabalho em dupla, modalidade muito mais eficiente para a resolução dos problemas acadêmicos, em comparação com grupos compostos de um número maior de pessoas (NUSSBAUM, 1999).

Com efeito, o trabalho em grupo apresenta uma série de vantagens (ver, entre outros, ALMEIDA; ARAÚJO e SÁ, 2004; ARNÓ, 2002; BARNES; TODD, 1977; BYGATE, 1988; 73 Na prática, porém, come observa KLEIMAN (1989b), a tendência, tanto nos manuais de LM como nos

manuais de LE, é usar o texto como pretexto para o ensino da gramática e do vocabulário.

74A definição que demos é aquela do QECR (2002), que considera texto qualquer elemento linguístico, um

enunciado seja oral seja escrito que, na execução de uma tarefa, torna-se ocasião de atividade linguística.

75Doravante, ao falarmos de competências, faremos referência à divisão proposta pelo QECR (2002), que inclui:

as competências gerais (conhecimento declarativo; conhecimento sociocultural; consciência intercultural, habilidade e saber fazer); as competências linguístico-comunicativas (competência lexical; competência gramatical, competência semântica, competência fonológica, competência ortográfica, competência ortoépica); a competência sociolinguística (referente aos conhecimentos e habilidades envolvidas na dimensão social do uso linguístico); as competências pragmáticas (competência discursiva, competência funcional); a competência plurilíngue e pluricultural das quais falaremos mais adiante.

CILIBERTI, 2003b; 2012; FASULO; GIRARDET, 2002; FOSTER, 1998; GRIGGS, 1998; NUSSBAUM; TUSÓN; UNAMUNO, 2002; PICA, 1987; RULON; MCCREARY, 1986)77.

Cazden (1988), Hall (1995) e, posteriormente, Fasulo e Girardet (2002), ao estudarem a estrutura comunicativa que caracteriza a maior parte das trocas entre professor e aluno na sala de aula, denominada Initiation-Response-Follow-up (IRF)78, comentam que uma rotina desse tipo não oferece aos estudantes a oportunidade de desenvolverem, em sua complexidade, o conhecimento interacional, linguístico e cognitivo necessário para a conversação corriqueira, porque a pergunta pode apresentar aspectos que bloqueiam a comunicação ou, pelo menos, a limitam dentro de determinados esquemas.

Os assuntos e sua organização são controlados por um único participante e não refletem a curiosidade e a necessidade de aprofundamento que afloraram no decorrer das trocas verbais (FASULO; GIRARDET, 2002). A esse respeito, Bange (1996) observa que esse tipo de sequência instaura uma comunicação totalmente diferente da conversação costumeira, porque a passagem para a unidade sucessiva depende exclusivamente da avaliação que o professor fará da dupla adjacente precedente, ao passo que, na conversação, os turnos da palavra se sucedem reciprocamente. Portanto, uma avaliação negativa provocará uma parada na progressão e induzirá a retomada de alguns elementos da dupla adjacente, objeto de uma avaliação79.

Uma rotina desse tipo, além de não propiciar aos estudantes a oportunidade de desenvolverem o saber complexo interacional, linguístico e cognitivo que é exigido pela conversação comum, reduz drasticamente a conversação à mera atividade de correção gramatical, na qual o terceiro lance, aquele começado pelo professor, consiste, geralmente, na reformulação de problemas de natureza formal (BANGE, 1996; CAMBRA, 2003; PEKAREK, 2002). Por causa disso, os enunciados produzidos pelos aprendizes serão pouco elaborados, formados por palavras ou grupos de palavras isoladas (CAMBRA, 1998; LUCAS, 1991).

77CILIBERTI (2003a) observa que, na prática, a ajuda e a discussão entre os alunos geralmente são dificultadas

mais do que estimuladas. Em lugar de fazer do grupo um suporte para o ensino e a aprendizagem, o professor prefere estabelecer uma relação a dois, professor-aluno. Os resultados de uma pesquisa sobre as formas de comunicação acadêmica numa faculdade de tipo humanístico confirmam essa impressão (CILIBERTI; ANDERSON, 1999). Para a maior parte dos docentes que participaram da pesquisa, as tarefas da atividade de docência são, fundamentalmente, duas: transmitir saberes e servir de suporte.

78Essa estrutura foi apontada, pela primeira vez, por SINCLAIR e COULTHARD (1975) e MEHAN (1979) é

conhecida como trípleta. É formada por uma sequência em que o primeiro lance, geralmente, é constituído por uma pergunta formulada pelo professor, seguida pela resposta do aluno e a avaliação do professor. Uma análise muito detalhada da interação na sala de aula é aquela de ORLETTI (2000).

79De acordo com as repostas, a avaliação poderá ser positiva ou negativa. Nesse último caso, a troca não poderá

O trabalho em duplas ou em pequenos grupos, ao contrário, viabiliza a participação em atividades comunicativas semelhantes àquelas que ocorrem em contextos naturais, aumentando a motivação e a integração social. Os estudantes, trabalhando juntos, sentem-se mais à vontade, porque não estão sujeitos à avaliação individual do professor. Bygate (1988) afirma que o input produzido pelo professor não é suficiente para fins de aprendizagem e que o aluno, por meio da interação com os colegas, sente-se na obrigação de elaborar frases que produzam um sentido, aprendendo, assim, a utilizar as características típicas do discurso falado.

Segundo Barnes e Todd (1977), os alunos esforçam-se mais quando falam sem a presença do professor e têm a possibilidade de assumir um papel mais ativo e independente em relação aos seus conhecimentos. O trabalho em grupo permite que os alunos experimentem, reelaborem, realizem autocorreções e heterocorreções, colaborem na construção do discurso, visando levar a termo a tarefa (GRIGGS, 1998). Numa situação colaborativa de aprendizagem entre pares, haverá um uso da língua funcional e expressivo, dirigido para o interlocutor e próximo das necessidades reais de aprendizagem. Os estudantes terão todo o tempo necessário para elaborar suas estratégias de aprendizagem e utilizarão os processos do grupo seja para instaurar formas de colaboração seja para dirigir sua aprendizagem (CILIBERTI, 2003b; 2012). Finalmente, as atividades em dupla ajudam a manter um clima mais distenso e a regular o filtro afetivo80, contribuindo para o desenvolvimento da competência conversacional (QECR, 2002, p. 154)81.

Estudando a conversação assimétrica, comparável, sob alguns aspectos, ao contexto que observamos, Matthey, De Pietro e Py (1989) comentam que, para que a interação não aconteça em uma situação de incompreensão permanente, é necessário que, entre os interactantes, exista colaboração, atitude que dará origem a um formato discursivo denominado SPA (Séquences Potentiellment Acquisitionelles). A noção de Séquences

Potentiellment Acquisitionelles é utilizada para indicar as sequências que “les interlocuteurs eux-mêmes construisent, ensemble, em leur attribuant dês vertus acquisitionelles” (1989, p.

117).

Uma SPA consiste na justaposição dos seguintes elementos: 1. as formas da interlíngua do falante não nativo; 2. uma proposta do falante nativo; 3. uma retomada do 80De acordo com as hipóteses de KRASHEN (1982, 1985), o filtro afetivo seria uma espécie de bloqueio que

limitaria a entrada de novos conhecimentos.

81 A competência comunicacional implica algo mais do que aprender a entender e a produzir enunciados.

falante não nativo. Essa sequência está focalizada, geralmente, nas formas lexicais e é formada, no turno inicial, por, trocas de entoação que assinalam a incerteza e o pedido de ajuda por parte de quem está falando. O falante mais experiente poderá ajudar, mas nem sempre sua reformulação é aceita, dado que o falante menos experiente pode resolver buscar em seu repertório linguístico os recursos para expressar-se. De qualquer maneira, trata-se de trocas que detêm o fluxo interacional para que seja resolvido um problema linguístico. Uma vez resolvido o problema, a troca principal volta a fluir. Outro tipo de produção discursiva que favorece a aquisição presente nas conversações assimétricas recebe o nome de

achèvement interctif (GÜLICH, 1986). São sequências que se manifestam por meio de

pedidos de esclarecimento, enunciados incompletos, pausas, alongamentos vocálicos, hesitações, risos, que interrompem a sequência discursiva do falante menos experiente, à espera que o interlocutor possa intervir sugerindo as partes que faltam. As sequências que acabamos de descrever são muito úteis para a compreensão de quanto a interação entre pares pode ajudar a aquisição da língua, num contexto exolinguístico come aquele descrito no presente trabalho.