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Tradução de expressões onomásticas

ANÁLISE DE QUESTÕES DE TRADUÇÃO

Esquema 8: Imagem esquemática de termo (Contente 2008:36)

1.3 Tradução de expressões onomásticas

Uma das questões de tradução notada em Kana, alma de mujer teve que ver com as estratégias a adotar relativamente a termos onomásticos, mais especificamente, topónimos e antropónimos.

Apesar de, na generalidade, se acreditar que a tradução onomástica não levanta quaisquer dificuldades de tradução e que os nomes próprios não são traduzidos, a verdade é que em qualquer tradução podemos constatar que, de facto, os tradutores refletem sobre esta questão, adotando diferentes estratégias de tradução em relação àqueles.

A este respeito, Nord (2003:182) considera que «“Proper names are never translated” seems to be a rule deeply rooted in many people’s minds. Yet looking at translated texts we find that translators do all sorts of things with proper names». Na mesma linha, Vermes (2003:89) sustenta que “The translation of proper names has often

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been considered as a simple automatic process of transference from one language into another, due to the view that proper names are mere labels used to identify a person or a thing. (...) the translation of proper names is not a trivial issue but, on the contrary, may involve a rather delicate decision-making process, requiring on the part of the translator careful consideration of the meanings the name has before deciding how best to render it in the target language”.

Relativamente à presente questão linguística, Vermes (2003) apresenta-nos quatro estratégias básicas, a partir das quais o tradutor se poderá orientar na tradução de nomes próprios:

i) Transferência ii) Substituição iii) Tradução iv) Modificação

Na primeira estratégia, transferência, “the translator makes use of the source text proper noun without applying any changes in the target languages” (Vermes 2003 apud Shirinzadeth & Mahadi 2014:11); na segunda estratégia, substituição, “the translator uses the conventional correspondent of the source language noun in the target language(op.cit.:11), para além disto, situações em que o tradutor utiliza o nome do TP, mas com alterações gráficas no TC consideram-se também casos de substituição. Nesta situação, a forma da LC torna o valor fonológico do nome da LP explícito, situação que se prende com o facto de línguas distintas possuírem convenções grafológicas igualmente distintas. Na tradução, terceira estratégia, “the noun is rendered in the target text by the translator” (op.cit.:11). O tradutor recorre a esta estratégia para traduzir o nome original ou parte dele no TC, obtendo-se um nome com as mesmas conotações ou com conotações muito próximas do nome do TP. Por último, na modificação, utiliza-se “a substitute in the target text for the original noun which is not related or just partly related to the source language noun conventions or logics” (op.cit.:11), resultando numa alteração considerável na forma e nas conotações do nome do TC. Para Vermes (2003), esta última estratégia é um termo genérico que inclui estratégias de omissão (o tradutor omite total ou parcialmente o nome), adição (o tradutor expande o nome da LP) e generalização (o tradutor recorre a um hiperónimo, em vez de utilizar o nome da LP).

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Newmark (1988) distingue três classes de nomes próprios: (i) nomes de pessoas; (ii) nomes de objetos; (iii) nomes geográficos. O autor menciona as estratégias normalmente utilizadas pelo tradutor em cada uma destas classes. Segundo o autor (1988 apud Vermes 2001), o primeiro e o último nome das pessoas é, normalmente, transferido (assumindo que estes não têm qualquer conotação no TP), preservando-se, desta forma, a sua nacionalidade; o nome de objetos e de marcas registadas é também, normalmente, transferido; e, por último, quanto aos nomes geográficos, o tradutor deve verificar se existe algum correspondente na LC e, caso exista, utilizá-lo. No entanto, o autor acrescenta que quando um nome geográfico remete para um endereço, este deve, neste caso, ser transferido.

Ainda a respeito dos nomes geográficos, autores como Newmark (1988), Vermes (2003) e Nord (2003), sustentam que a convenção remete para a utilização do termo exónimo da cultura de chegada do topónimo da cultura de partida, caso exista. Ou seja, a convenção é recorrer à estratégia de substituição. No entanto, caso o tradutor deseje preservar a essência estrangeira do topónimo do TP, poderá, por exemplo, recorrer à estratégia de substituição com alterações a nível gráfico, que explicitam as convenções fonológicas do topónimo da LP.

Atentemos, em seguida, nos exemplos (73) – (76), ilustrativos da ocorrência de questões de tradução onomástica na nossa tradução:

(73)

a) También durante esta etapa el emperador dispondrá de un palacio en la ciudad que irá frecuentando cada vez más, destinando el Palacio Imperial a sus funciones oficiales, tanto es así que el actual que hoy se visita en Kyoto desciende de uno de estos palacios en ciudad del siglo XIV (…).

(Página 25, linha 25)

b)Também durante esta etapa, o imperador irá dispor de um palácio na cidade que frequentará cada vez mais, destinando o Palácio Imperial às suas funções oficiais. Tanto é assim que o atual que hoje se visita em Quioto descende de um desses palácios citadinos do século XIV (…). (Página 24, linha 27)

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Em (73a), destaca-se o topónimo “Kyoto”, observando-se que a autora do TP decidiu manter o carácter estrangeiro desta cidade japonesa, optando por seguir o romaji (transcrição alfabética e fonética dos caracteres japoneses para os caracteres latinos ou romanos) deste nome geográfico, em detrimento da utilização do termo exónimo deste topónimo que a língua espanhola possui – “Kioto”.

Existindo, em português, um termo exónimo correspondente ao presente em (73a) – Quioto –, optámos por utilizá-lo, recorrendo, assim, à estratégia de substituição pelo nome correspondente nesta língua.

Vejamos, em seguida, o exemplo (74), ilustrativo de uma outra questão onomástica na nossa tradução:

(74)

a) La obra permanece actualmente en el Museo Gotô de Tokio. (Página 94, linha 10)

b) A obra encontra-se atualmente no Museu Gotô de Tóquio. (Página 83, linha 31)

Em (74a), ao invés de manter a estratégia de substituição com alterações no nome ao nível da forma que adotara para o topónimo presente em (73a) – “Kyoto”, a autora optou por recorrer ao método de substituição, utilizando a forma consagrada desta cidade japonesa em espanhol – “Tokio”.

À semelhança do que fizemos em (73b), para o topónimo em análise, recorremos novamente à estratégia de substituição pela forma toponímica consagrada na língua portuguesa – “Tóquio”.

Observemos, agora, um outro exemplo que levantou questões de tradução a nível onomástico, neste caso a nível da antroponímia:

(75)

a) Este tipo de poesía profunda, reflexiva, universal, es una invención de Narijira (…).

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b)Este tipo de poesia profunda, reflexiva, universal é uma invenção de Narihira (…).

(Página 76, linha 2)

Neste exemplo, a autora utiliza o nome “Narijira”, que resulta de uma adaptação de “Narihira” à grafia espanhola. Sabendo que “Narihira” é, por si só, a forma romaji de なりひら, podemos concluir que a autora realizou uma substituição de uma substituição, ou seja, fez uma transcrição fonética, de uma transcrição fonética realizada a partir do sistema de escrita japonês.

No entanto, em português, as convenções gráficas não são as mesma que as do espanhol, pelo que recorremos à estratégia de substituição, considerando a transcrição romaji deste antropónimo japonês – “Narihira”.

Vejamos, por último, um outro exemplo ilustrativo da ocorrência de questões onomásticas na nossa tradução, neste caso uma forma de tratamento relacionada com um antropónimo:

(76)

a) Asimismo al «International Research Center for Japanese Studies» (Nichibunken) de Kyoto, al que tuve acceso gracias a la comprensión y apoyo de Ms. Yukiko Okuno (…).

(Página 9, linha 5)

b)Gostaria também de agradecer ao «International Research Center for Japanese Studies» (Nichibunken) de Quioto, ao qual tive acesso graças à compreensão e ao apoio da Sra. Yukiko Okuno (…).

(Página 9, linha 5)

No presente exemplo, a autora utiliza a expressão inglesa “Ms.” como forma de tratamento. No entanto, existindo, em português, uma forma de tratamento equivalente, optámos, neste caso, por recorrer à estratégica de tradução, pelo que traduzimos “Ms.” para “Sra.”. Neste caso, realizámos uma tradução parcial, mantendo inalterados o primeiro e o último nome da identidade mencionada em (76a).

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Em suma, como pudemos verificar através dos exemplos analisados nesta secção, ao contrário do que eventualmente se possa crer, a tradução de nomes próprios não é um processo automático de transferência de uma língua para outra, nem passa simplesmente pela não tradução daqueles. É, em contrapartida, uma questão linguística inerente ao processo de tradução, que o tradutor deverá ter em consideração enquanto traduz, adotando as estratégias de tradução que melhor se adaptam aos seus objetivos comunicativos.