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CAPÍTULO 3 CAMINHOS POR ONDE ANDAMOS: NOSSA TRAJETÓRIA DE

3.7 Tratamento e Análise dos Dados

A análise dos dados para este estudo aconteceu em dois momentos. O primeiro iniciou-se com os estudos exploratórios dos documentos oficiais selecionados, como as Propostas Pedagógicas da Rede Municipal do Recife de 1996 e de 2002, em consonância com os registros das entrevistas transcritas e realizadas com os assessores/docentes elaboradores dessas propostas e que, no decorrer da pesquisa, foram retomados. No segundo momento, foi realizado um estudo aprofundado na escola a partir das observações das práticas curriculares cotidianas e das entrevistas com educadores sujeitos da nossa pesquisa.

Assim sendo, os documentos, como os dados das observações, foram pré- analisados em primeira instância, ou seja, foi realizada uma leitura “flutuante” geral, objetivando obter contato com os dados para o reconhecimento das mensagens explícitas e implícitas, para depois irmos construindo as categorias empíricas. Nessa perspectiva, contamos com apoio teórico da análise de conteúdo com ênfase qualitativa dos dados obtidos no campo empírico. Segundo Bardin (1997, p. 96), “pouco a pouco a leitura vai-se tornando mais precisa, em função das hipóteses emergentes, da projeção das teorias adaptadas sobre o material, e da possível

aplicação das técnicas utilizadas com os materiais análogos”. Afastamo-nos, portanto, da perspectiva clássica dos anos 1940, da análise do conteúdo que considerava a mensagem como algo estático, cujo foco centrava-se nos dados quantitativos.46

Entendemos que toda técnica apresenta limites e como tal pode ser pensada e complementada com outros encaminhamentos. Nessa perspectiva, as unidades de contexto nos ajudaram a interpretar os dados. Como o nome induz, as unidades de contexto podem ser obtidas mediante o recurso a dados que exemplifiquem o contexto da produção, tai como: condição de produção das propostas pedagógicas e princípios que nortearam a produção das mesmas.

As unidades de contexto do nosso trabalho foram importantes para tentarmos esclarecer certos significados dos processos educativos embutidos no vocabulário educacional. Utilizamos mapas com objetivo de categorizar os dados, sempre acompanhados de suas devidas análises.

Ao demarcamos o gênero dos documentos sobre os quais realizaríamos a análise, tivemos clareza que eles não podiam ser compreendidos isoladament e, por isso, entendemos a necessidade de recorrer à constituição de um corpus.47 Por isso, utilizamos, com base na literatura, as seguintes regras: a) a exaustividade, ou seja, foram considerados na análise todos os elementos componentes do corpus; b) a representatividade que sinaliza a análise de um volume significativo de material em relação ao universo da pesquisa; c) a homogeneidade: as escolhas dos documentos, das técnicas e dos temas foram realizadas a partir de técnicas semelhantes.

Destarte, compreendemos que a inferência foi um elemento imprescindível em nossa pesquisa na medida em que, tal como arqueólogos, trabalhamos com vestígios e pistas para descobrir o que ainda não se apresentava claro na descrição dos dados (BARDIN, 1997). Nessa perspectiva, a descrição (enumeração das características do objeto pesquisado) e a interpretação (o sentido e o significado concedido às características) vêm intermediadas pela inferência, uma vez que, de acordo com Franco (2003, p. 25),

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A análise de conteúdo é um procedimento de pesquisa que se situa em um delineamento mais amplo da teoria de comunicação e que tem como ponto de partida a mensagem. O investigador ao analisar as mensagens vai fazendo inferências sobre elas, buscando as características dos textos e os efeitos de comunicação (AMORIM, 2004).

47 “O corpus é um conjunto de documentos tidos em conta para serem submetidos aos procedimentos

Produzir inferência é, pois, la raison d’ etre da análise de conteúdo. É ela que confere a esse procedimento relevância teórica, uma vez que implica, pelo menos uma comparação, já que a informação puramente descritiva sobre o conteúdo, é de pequeno valor. Um dado sobre o conteúdo de uma mensagem (escrita, falada e/ou figurativa) é sempre um sentido até que seja relacionado a outros dados. O vínculo entre eles é representado por alguma forma de teoria. Assim, toda análise de conteúdo implica comparações; o tipo de comparação é ditado pela competência do investigador no que diz respeito a seu maior ou menor conhecimento acerca de diferentes abordagens teóricas.

A partir da inferência, procuramos analisar, ler ou ouvir discursos, compatibilizando a estes explicações teóricas dadas pelos estudiosos. Assim, fizemos comparação de uma única fonte em diferentes situações e momentos e comparações de conteúdos das comunicações em tempos diferentes. Reiteramos que, de uma forma ou de outra, produzir inferências pressupõe a comparação de dados com pressupostos teóricos a que estamos filiados.

As categorias teóricas desta pesquisa foram tecidas em meio a um árduo caminho de reflexão sobre o campo teórico e os dados do campo. Vale salientar que o caminho percorrido levou-nos a buscar direções, em cujo centro estava o conceito de cultura que abarca a pluralidade do termo. Assim, a composição do percurso teórico-metodológico da nossa investigação levou-nos a tratar com categorias e conceitos que ajudaram a compreender a dimensão que a concepção de cultura aqui adotada assume nas “artes de fazer” cotidianas dos professores e professoras em suas práticas curriculares. Dessa forma, práticas curriculares, recontextualização, hibridismo, cotidiano, cultura, poder, relações étnico-raciais constituíram em categorias centrais dessa investigação. A partir dessas, outras categorias e outros conceitos foram sendo tecidos como: identidade, educação das relações étnico-raciais e subjetividade, e formando o quadro conceitual que deu suporte à nossa investigação.

Ao longo do trabalho, essas categorias, compreendidas como elementos centrais em torno de um conceito (GOMES, 2002), ajudam a reafirmar a força e a pertinência dos nossos argumentos na constituição do nosso objeto de pesquisa. Na elaboração das categorias empíricas destacamos, a partir das conversas com os /as estudantes, a concepção sobre o continente africano, o ideal de branqueamento, o preconceito e a relação com o outro, a construção da identidade e da subjetividade dos e das estudantes.

O currículo é um campo de disputas e negociações e, portanto, precisa ser entendido sob múltiplas perspectivas e dimensões.

CAPÍTULO 4 AS PROPOSTAS CURRICULARES DA REDE MUNICIPAL DO