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UM “UM ESTRANHO NO NINHO”: O QUE A ESCOLA NÃO VÊ NO JOVEM

4. CULTURA E EDUCAÇÃO ESCOLAR

4.3 UM “UM ESTRANHO NO NINHO”: O QUE A ESCOLA NÃO VÊ NO JOVEM

A história de vida nos pôs a par das influências e ações socializadoras oriundas de cada indivíduo como venho apresentando no decorrer deste trabalho. Falar sobre suas próprias vidas é um grande desafio para os jovens. Não é fácil se expor e, tampouco se deixar conhecer. Não é fácil descortinar as realidades vivenciadas em suas experiências, tanto positivas como negativas. Entretanto, conhecer a realidade do sujeito além do que aparenta ser, além da sala de aula, é essencial para o reconhecimento do outro e de si mesmo como sujeito. É essencial para o reconhecimento do outro, que por muitas vezes, se encontra oculto, desencontrado, como um “estranho no ninho”.

Abordar os diferentes processos de socialização, bem como aquilo que é comum nos sujeitos, e perscrutar as realidades de suas relações e peculiaridades é envolver-se como ator social. O espaço disposto no educandário é limitado para tais progressões, mas a necessidade de intervenção extraclasse se torna notória nas interpelações dos professores e no pano de fundo das relações em sala de aula, tanto no aspecto professor para com o aluno e vice-versa.

Neste contexto podem se manifestar conflitos, sejam eles a nível pessoal ou institucional (família ou escola), é parte integrante da vida e da atividade social. Ele se origina do estranhamento, da diferença de interesses, de desejos e de aspirações oriundas de posições que são defendidas frente a outras diferentes. Quando essas diferenças não são percebidas ou respeitadas há dificuldade de comunicação, de assertividade das pessoas, de condições para estabelecer o diálogo gerando comportamentos de intolerância, como menciona Chrispino & Chrispino na seguinte citação:

Em geral, nas escolas e na vida, só percebemos o conflito quando este produz suas manifestações violentas. Daí podemos tirar, pelo menos, duas conclusões: a primeira é que se ele se manifestou de forma violenta é porque já existia antes na forma de divergência ou antagonismo, e nós não soubemos ou não fomos preparados para identificá-lo; a segunda é que toda a vez que o conflito se manifesta, nós agimos para resolvê-lo, coibindo a manifestação violenta. E neste caso, esquecemos que problemas mal resolvidos se repetem! (2002, p.67).

Compreendendo que estes problemas não são problemas necessariamente individuais, nascem, entretanto, da diversidade humana se relacionando, então a sua resolução deve perpassar uma concepção que integre a percepção do outro, que é de fundamental importância no processo de reconhecimento de si próprio e fundamental para legitimação da alteridade.

Reconhecer o outro não se trata de uma percepção existencial, mas de uma interação que permita a identificação das culturas, valores, crenças que constituíram o sujeito em sua complexidade como humano do qual é resultado hoje. Perceber então carências afetivas, sentimentos de abandono também podem constituir as demandas dos jovens em seus diversos contextos e precisam ser interpretadas e dialogadas para auxiliar no enfrentamento das suas inquietações interiores.

Trabalho como professor de música em duas escolas do município de Giruá. Enquanto conversava com a coordenação e a direção da escola sobre o projeto da banda para o desfile do sete de setembro, e mencionava os benefícios da música no ser humano e sua influência no comportamento do sujeito, fui interrompido pela diretora: “professor, o aluno X precisa fazer parte da banda, pois não sabemos mais o que fazer com ele, só dá trabalho, é mal educado, desbocado e não respeita ninguém! Já passou por duas escolas e ninguém quer mais ele. Se o senhor mudar esse menino já valeu à pena projeto da banda.”

A falta de sensibilidade para perceber, conceber e entender o outro pode se tornar um ato abortivo da pessoa humana e de suas potencialidades e aspirações. Os profissionais da educação, que compõem a escola, ao enxergarem os seus educandos como plurais, como portadores de identidade e culturas diversificadas, como atores sociais em processo de construção, contribuem com o sujeito para o estabelecimento do seu lugar de pertença na vida e sociedade, onde a escola e educadores podem ser colaboradores e não entraves nessa ação educacional.

A escola como instituição ao se interessar pelos jovens como pessoas totais, oriundas de contextos diversificados, poderá promover com o protagonismo, com práticas de participação, comunicação e expressão para além dos conteúdos. É necessário motivar e desenvolver conhecimentos significativos para a vida levando em conta a diversidade cultural, social, ética, religiosa e geográfica. A escola desta forma, pode contribuir para formação cidadã e desenvolver competências e conhecimentos interdisciplinares, úteis para vida e não de esquemas abstratos de utilidade escolar ou acadêmica apenas. A escola pode ser um lugar de aprendizado prazeroso para o jovem atendendo as dimensões do desenvolvimento humano, físico, afetiva e cognitivamente com sentido de pertinência onde os jovens se identificam com abertura e reciprocidade. Um lugar onde eles não sejam vistos como um estranho no ninho. Diante disso, o próximo capítulo aborda possíveis relações dialógicas que permitem os jovens se aproximarem de um contexto emancipatório.

5. CULTURA E IDENTIDADE – VIVÊNCIAS EMANCIPATÓRIAS DOS JOVENS

Desenvolvido em dois subcapítulos este capítulo elucida em sua parte inicial a diferença entre o discurso e a prática identificada nas propostas metodológicas de consecução de vivências emancipatórias. Na sua parte final analisa o papel da dialogicidade na compreensão dos conceitos de autonomia e alteridade como uma possibilidade de emancipação com vinculação com o outro. Para isso utilizo de Vieira & Vieira(2007), Fraiman (2011), Mills (1965), Vigotsky (1988), Freire (1980, 1998, 1999) e Gadoti, (1991) afim de fundamentar minhas reflexões.

5.1 O CAMINHO DA EMANCIPAÇÃO: CONTRASTES ENTRE DISCURSO E