• Nenhum resultado encontrado

4 UMA ABORDAGEM SOBRE PROCEDIMENTOS DE VIOLÃO E GUITARRA DE TONINHO HORTA

Sub II de preparação para Imaj7 bVIm7 Imaj7 bIIIm7 de preparação para V7 Empréstimo Modal – função S bVImaj7 Imaj7 bIIImaj7 Empréstimo Modal – função T

4 UMA ABORDAGEM SOBRE PROCEDIMENTOS DE VIOLÃO E GUITARRA DE TONINHO HORTA

Ao falarmos sobre a obra de Toninho Horta é imprescindível destacarmos a importância de suas habilidades como instrumentista. O artista é considerado, no meio musical, além de representativo compositor, uma referência como violonista e guitarrista. Muitos músicos do cenário nacional e internacional declaram ter recebido forte influência de sua música, como Nivaldo Ornelas, Juarez Moreira, Nelson Faria, Ivan Lins, João Bosco, John Pizzarelli, Jack Lee, Pat Matheny e George Benson. Após entrar em contato pela primeira vez com a obra de Horta, este último gravou, em 2005, um álbum ao lado do artista, com o repertório voltado para a música brasileira, que ainda não foi lançado. Lembramos que o enfoque principal deste trabalho está nas composições de Toninho Horta. Dedicamo-nos neste capítulo em abordar alguns procedimentos violonísticos característicos de Toninho Horta por serem elementos constitutivos de suas composições.

O violonista brasileiro Fábio Zanon organizou uma série radiofônica, chamada “O Violão Brasileiro” (ZANON, 2008), na qual segmentou as diferentes escolas violonísticas do país e destacou instrumentistas por seus estilos individuais. Para Zanon, é possível se pensar em um subgrupo mineiro, adjacente ao violão brasileiro, por considerar a criação de música para violão no estado de Minas Gerais bem diferente do resto do país (Ibidem, 0:50’’). Em uma retrospectiva sobre a música mineira, além de ressaltar a importância econômica e histórica do estado, Zanon atribui a originalidade desta à sua descontinuidade histórica, à tradição católica e à herança africana:

Sua tradição musical é das mais antigas e marcantes de todo o país. Mas depois do chamado Barroco Mineiro84 houve um enorme hiato de criação no século XIX que só foi interrompido no século XX. Todo o interior de Minas foi palco de músicos itinerantes, vindos da capital e do sul, mas a inabalável fé católica fez com que o mundo sonoro das igrejas continuasse predominando sobre as influências externas. Mais que nos estados circunvizinhos, a herança africana

84 O musicólogo Bruno Kiefer utiliza o termo “Escola Mineira” (KIEFER, 1977) para se referir à música mineira composta no século XVIII, considerando o termo “Barroco Mineiro” inadequado, tendo em vista que estilisticamente aquela música se aproximava mais do classicismo europeu do que do barroco.

também foi mantida em uma forma sincrética muito peculiar (ZANON, 2008, 1’:02’’).

Zanon reforça que, apesar do forte referencial Barroco da música mineira, quando se pensa atualmente sobre a música deste estado, o mais comum é esta ser associada à música popular dos anos 1960, produzida pelo grupo de instrumentistas, compositores, cantores e letristas, denominado “Clube da Esquina”. Fábio Zanon refere-se a Toninho Horta como um expoente da música mineira, reconhecido mundialmente por sua linguagem sofisticada do violão e da guitarra, que cristalizou os antecedentes significativos de seu estado (Ibidem, 2’:10’’).

Sob forte influência jazzística, orquestral e bossanovística, desde o início da adolescência, Toninho Horta desenvolveu-se musicalmente, em um aprendizado autodidata. No final dos anos 1960, passou a somar a estas referências musicais a sonoridade do rock e do pop internacional que perpassavam suas produções, dentre as quais destaca-se o álbum CLUBE DA ESQUINA (1972). A inventividade, proveniente do autodidatismo, levou-o a elaborar técnicas particulares em suas composições e releituras, na tentativa de reproduzir a sonoridade das referências musicais das quais tinha conhecimento, com destaque para o jazz, a música erudita e a bossa nova, além de modinhas, música sacra mineira, congados, valsas, boleros, e de outros estilos que também costumava ouvir. O gosto pelo piano e pelas big bands de jazz, como as de Duke Ellington, Nelson Riddle e Stan Kenton, fizeram com que Toninho buscasse uma sonoridade ampla, orquestral, utilizando o violão como recurso para alcançá-la85.

A extensão do som real do violão, ou da guitarra, é a seguinte:

Fig. 1 Extensão do violão

E suas cordas soltas são representadas pelas notas:

Fig. 2 Cordas soltas do violão

O violão de seis cordas, utilizado por Toninho Horta, possui âmbito melódico um pouco maior que três oitavas. Só é possível neste instrumento executar simultaneamente seis notas. Na mão direita é comum o uso de quatro ou cinco dedos ao mesmo tempo para se tanger as cordas e na mão esquerda, usa-se normalmente quatro dedos concomitantes, para se produzir o som desejado. É importante ressaltar que na técnica de violão clássico é habitual o uso de apenas quatro dedos da mão direita: polegar, indicador, médio e anular. Horta utiliza sempre os cinco dedos. Outra característica específica de Toninho Horta é o timbre de seu violão e de sua guitarra. Seu som é considerado “aveludado”, resultante do contato direto da ponta do dedo com as cordas, descartando o uso de palheta ou unhas. O guitarrista de jazz norte-americano Wes Montgomery, considerado uma forte influência para Toninho Horta (GOMES, & CARRILHO, 2007, p. 26), também possuía este mesmo atributo, no entanto utilizava apenas o dedo polegar para tocar. Toninho Horta relaciona o resultado sonoro de seu violão ao fato de roer as unhas: “Eu rôo unha, é a maneira de descarregar minhas tensões. Acabei me acostumando com o som doce do toque direto dos dedos.” (Ibidem, p. 25)

A concepção violonística de Toninho Horta, segundo o próprio artista, seguiu parâmetros orquestrais e de sonoridades mais amplas, que ultrapassavam as limitações técnicas de seu instrumento. Para estender os artifícios sonoros, em sua forma de tocar, Toninho Horta explorou as possibilidades do violão, através de experimentações harmônicas e técnicas, que resultaram em caminhos particulares que caracterizam seu estilo. É possível notar estes traços distintivos através dos comentários de Horta sobre seu pensamento harmônico ao violão:

Então eu sempre fui fanático com orquestrações, com piano. Porque o piano tem uma dimensão muito grande, você pode apertar o pedal e dar oitenta e oito notas do piano, se tocar as notas todas. No violão

você não consegue fazer isso. Então a formação dos acordes no violão fica limitada.(ZANON, 2007, 19’:55’’)

Eu ampliei o meu conhecimento musical em termos de desenvolvimento, dessa parte mecânica do violão assim: experimentando as inversões. E como artifício também para a gente conseguir uma sonoridade maior do violão, eu utilizo muita corda solta, para dar uma amplitude maior, como se fosse um teclado, ou como se fosse uma orquestra. E faço arpejos também, que já é uma influência da área erudita, então utilizo arpejos ascendentes e descendentes. E pela minha influência também pop, que aconteceu nos anos 70 e a bossa nova dos anos 60, que me pegou na veia, começando a tocar, o ritmo da bossa nova e tudo, eu junto tudo isso quando eu estou tocando. (...) Eu faço umas linhas de baixo, aí faço os arpejos, que parece uma harpa, aí de repente faço as terças, que parecem duas flautas tocando, de repente eu toco como se fosse uma percussão (ZANON, 2007, 20’:45’’).

Algumas das experiências violonísticas de Toninho Horta resultam de procedimentos característicos, que abrangem o uso de pestanas e de aberturas específicas, o uso constante de acordes com cordas soltas, o emprego de arpejos, o uso predominante de acordes com cinco ou seis vozes, a condução de vozes e o emprego menos freqüente da mudança de afinação das cordas. Para esclarecer e descrever os procedimentos mencionados, extraímos exemplos recorrentes das composições do disco TERRA DOS PÁSSAROS e também de alguns discos posteriores, lançados pelo artista.

4.1-ARPEJO

Um exemplo característico de uso de arpejo nas composições de Toninho Horta, ocorre na Introdução da música CÉU DE BRASÍLIA,no acorde B7sus4, preparatório para a

entrada da parte A . Lembramos que nesta música há o emprego da scodatura na segunda corda do violão, si, que é afinada em sol#. A maneira de arpejar as cordas com a mão direita reforça o efeito do som de uma harpa, no qual as notas agudas se sobressaem. Embora seja perceptível na gravação do disco TERRA DOS PÁSSAROS,é possível ouvir este efeito com maior nitidez na versão do álbum DURANGO KID (1993), gravada apenas com voz e violão.

Fig. 3 Arpejo da Introdução de CÉU DE BRASÍLIA