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Uma travessia: da trajetória de vida para a trajetória do projeto de

2 VOZES DO ENVELHECER E DA VELHICE

2.4 Do interior à capital: rumos da trajetória acadêmica e profissional

2.4.1 Uma travessia: da trajetória de vida para a trajetória do projeto de

pesquisa “vozes na coxia”

Foi interessante observar ao longo da minha trajetória que houve uma estreita ligação entre a minha vida pessoal e os afetos que me influenciaram para uma forma de escutar as pessoas idosas, bem como observar os processos de envelhecer da população idosa do nosso país. Mas nem sempre a travessia de uma constatação sobre essa ou aquela realidade nos facilita de pronto a construção de um projeto de pesquisa. Especialmente quando tentamos buscar através desse projeto de pesquisa

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uma possibilidade de intervir em questões reais no cotidiano das pessoas e das políticas de um país.

Com o afirmam os dados estatísticos e demográficos O crescimento vertiginoso da população idosa, em relação a outros seguimentos populacionais tanto no mundo como Brasil, é uma questão cada vez mais pautada nas discussões levantadas tanto pelos setores públicos, quanto pela sociedade civil. Entretanto o que se observa embora esteja pautada nos discursos, de forma tão enfática. Não aparece com a mesma ênfase, nem tem sido efetivada como prioridade na agenda de execução das políticas públicas, ou sequer dos programas e projetos destinados à atenção da pessoa idosa. Desta forma, desenvolver um projeto de pesquisa sobre o envelhecimento, com o pressuposto de que este é um processo biopsicossocial e cultural, com o foco no binômio comunidade e velhos, requer um olhar crítico e profundamente comprometido com a humanidade, no que tange a sua universalidade e singularidade, bem como sobre os dispositivos que sustentam esta relação na sua imanência29.

Espera-se de um pesquisador mais atento, antes de vincular seu projeto a uma instituição, uma análise aguçada das formas de pensar e interpretar o tema escolhido nas instituições de ensino e pesquisa, e o exercício de examinar alguns dados sobre suas produções e sobre a sua forma de posicionar-se politicamente, diante do tema. Escolhido para o estudo. Principalmente quando o que pesquisamos, situa-se numa área de interesses e de relações de poder, cujos processos ideológicos na formação possam senão comprometer a pesquisa, no mínimo desviá-la de seus objetivos. Esta foi uma questão que considerei ao optar pelo Mestrado em gerontologia da PUCSP, que tem seu foco na gerontologia social, e na perspectiva de uma gerontologia Crítica. O fato de que o projeto tenha sido contemplado posteriormente, na segunda fase que me inscrevi no programa de bolsas do mestrado fornecido pela CAPES/CNPQ teve um valor imensurável não apenas pelo subsídio financeiro, mas

29A noção de imanência em Espinoza é sustentada pelo princípio monista de que a substancia é em si una e múltipla. E Deus natureza, no sentido de que é na ação de existir e não fora dela que ele se manifesta. As coisas existem por si sem necessidade de um outro atributo que as defina a não ser o próprio atributo de existirem. É graças a autonomia humana que o homem se vincula ao divino, dando lugar à realização da ordem divina na ordem humana. A imanência é a afirmação de Deus aí, manifesto em seus próprios atos na sua unicidade e multiplicidade. Para Espinoza a imanência e a autonomia humana encontram sua expressão mais elevada no amor a Deus, e o amor a Deus só se firma na imanência, e na autonomia que se traduzem na própria afirmação ética e política do homem. A autonomia do homem e seu vínculo com o divino se promovem e enriquecem reciprocamente, pois o homem vincula-se com Deus a partir unicamente da propagação da caridade e da justiça, e a conseguinte construção do reino de Deus na Terra:

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por fornecer a condição necessária para que eu pudesse concluir um trabalho já iniciado, legitimando a importância da pesquisa com o seu fomento. Junte-se a este fato, a parceria da minha orientadora, que teve implicação ético-política e solidária indispensável para minha formação ao propiciar-me o suporte Teórico necessário, com sua escuta sensível.

Todos esses fatores propiciaram um desfecho temporário, para um ciclo de aprendizagem pessoal e profissional, que espero, possa contribuir com a população idosa, por meio dos frutos de uma produção, que embora, tenha utilizado um tempo maior para a coleta de dados, poderá trazer aquele prazer próprio do fruto temporão. Uma construção, que exatamente por ser intensa, necessitou de um tempo e um percurso que desafiou a rigidez do tempo estipulado para a pesquisa nos órgãos de fomento, não apenas por limitações pessoais, mas sobretudo pela sua associação com escolhas que demarcam claramente a valorização da dialogicidade estabelecida entre o campo teórico e o campo prático como construtores de práxis científicas. Entre o lugar da ciência e o lugar dos sujeitos que se beneficiam da ciência; entre a gerontologia como ciência e a gerontologia crítica aplicada à produção de mudanças efetivas no cotidiano das pessoas idosas; entre o sujeito pesquisador que pensa e sente, e o sujeito pesquisado que age e transforma a si mesmo e a realidade por meio do que pensa e sente. E, finalmente, entre a psicologia como ciência que constrói teorias sobre a escuta da pessoa humana e de seus afetos, e a psicologia como ciência que age por meio da escuta humana, sobre o sujeito concreto, na complexidade do contexto em que ele se insere, propiciando a produção de novos devires, novas significações tanto no sujeito que afeta e é afetado pela realidade, quanto na realidade que o afeta.