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2.3 Valores

2.3.3 Valores Organizacionais

A partir de concepções que se fundamentam nas motivações pessoais, o estudo dos valores humanos proposto por Schwartz (1992), fundamenta o estudo dos valores organizacionais. Dessa forma, estudos empíricos sobre valores organizacionais têm sido desenvolvidos para apresentar as relações desse fenômeno com o comportamento organizacional.

Para Oliveira e Tamayo (2004, p. 131), tanto os valores organizacionais, quanto os valores do indivíduo “possuem uma interface na medida em que ambos compartilham metas universais que expressam a satisfação de exigências básicas do ser humano”.

Da mesma forma que os indivíduos e os grupos sociais possuem necessidades que devem ser satisfeitas para poder sobreviver, as organizações têm suas necessidades específicas que necessitam ser atendidas. Conforme Tamayo e Borges (2006), cada organização tem de criar ou aprender respostas adequadas às suas necessidades. Eles citam que, de acordo com a abordagem cultural dos valores proposta por Schwartz e Ros (1995), toda a organização enfrenta três exigências fundamentais: 1) a relação entre o indivíduo e o

grupo, que implica a tentativa de compatibilizar os interesses individuais e coletivos; 2) a necessidade de estabelecer uma estrutura que garanta à obtenção das metas objetivos da organização, e 3) a relação da organização com o ambiente físico e social.

A fim de representar alternativas de respostas, tendo em vista essas exigências fundamentais, Schwartz e Ros (1995 citado por TAMAYO; BORGES, 2006) apresentaram, para os grupos sociais, três dimensões bipolares, representadas na figura 2.

Figura 2 – Dimensões Culturais dos Valores

Fonte: Schwartz e Ros (2006).

Autonomia versus Conservadorismo é a primeira dimensão. Representa um contínuo em que se estabelecem as alternativas de compatibilização dos interesses do indivíduo e do grupo organizacional. A autonomia envolve perceber o indivíduo como ser autônomo, capaz de buscar seus próprios interesses, estipulando suas metas individuais em harmonia com os objetivos, metas e normas da organização. Este pólo se caracteriza fundamentalmente pela obtenção e promoção de mudanças, inovações e transformações organizacionais. Organizações com valores que se situam mais do lado da autonomia valorizam a iniciativa, a liberdade, a criatividade e a inovação. Inversamente, localiza-se o conservadorismo, que se baseia na preservação do status quo. Neste pólo, desestima-se a inovação e privilegiam-se rumos já conhecidos, soluções acertadas. Comportamentos que possam alterar as normas e tradições organizacionais são evitados. Interesses do indivíduo e do grupo se fundem.

Na segunda dimensão aparece o pólo Hierarquia versus Igualitarismo. Nestes extremos situam-se as alternativas de solução para o problema fundamental de gerar uma estrutura que seja possível especificar o sistema social da organização, a constituição das funções e papéis a serem exercidos, as relações desencadeadas entre as diferentes unidades e

Domínio Harmonia Autonomia Igualitarismo Hierarquia Conservadorismo

seus membros. A hierarquia é o pólo que se destaca como forma de assegurar o compromisso dos membros da organização com a missão e os objetivos dela. Autoridade, fiscalização, supervisão e influência compõem este pólo. Eles exprimem a legitimidade da definição e distribuição hierárquica dos papéis da organização. Contraposto a este pólo encontra-se o igualitarismo, constituído por valores como: justiça, eqüidade e responsabilidade.

As organizações desenvolvem algum tipo de relação com o ambiente físico e social e estabelecem características bem definidas. Certas organizações necessitam de recursos da natureza para produzirem seus produtos. A terceira dimensão Harmonia versus Domínio se configura pelas alternativas de solução para problemas associados à conservação da natureza versus interação desequilibrada com o meio físico e social. Nesta composição, o pólo harmonia manifesta-se pela relação consonante com a natureza. Proteção da natureza, integração com outras organizações já existentes a fim de preservar o ambiente físico e social e tolerância são alguns valores que fazem parte dessa extremidade. No outro extremo dessa dimensão está o domínio, isto é, valores que se caracterizam pela inclinação à desordem da organização no sentido de falta de preocupação com questões ecológicas. É o domínio exacerbado dos recursos materiais, da tecnologia e do conhecimento que possam provocar conseqüências negativas ao meio ambiente.

Essas dimensões, anteriormente representadas, são consideradas o referencial para definir a estrutura dos valores organizacionais. Tamayo e Borges (2006, p. 425) argumentam que “essas três dimensões podem constituir os pilares teóricos para o estudo empírico da estrutura dos valores organizacionais tal como eles são percebidos pelos empregados. Elas podem ser postuladas como representação, constituindo, portanto, uma espécie de estrutura universal dos valores organizacionais”. Porém os autores esclarecem que são as dimensões que são estabelecidas como postulado universal e não os valores que as constituem, uma vez serem os valores diferentes nas organizações, mas possíveis de serem organizados em torno das referidas dimensões.

A grande vantagem dessa abordagem, segundo Tamayo e Borges (2006), é que ela permite o estudo comparativo das prioridades axiológicas das organizações, a partir de conjuntos de valores que possui meta comum e que expressam tentativas de solução para os dilemas que todas as organizações enfrentam.

Cabe enfatizar que a partir de tais estudos fundamentados na abordagem cultural dos valores, pesquisas brasileiras desenvolveram instrumentos para mensurar valores organizacionais que evidenciaram a distinção entre valores do indivíduo e valores organizacionais, afirmando-se, inclusive, segundo Oliveira e Tamayo (2004), que pesquisas

nacionais demonstraram-se mais consistentes teoricamente e empregaram instrumentos mais adequados, do que no exterior.

Assim, no Brasil, dois instrumentos são utilizados, baseados na abordagem cultural dos valores: a Escala de Valores Organizacionais (TAMAYO; GONDIM, 1996) e o Inventário de Valores Organizacionais - IVO, de Tamayo, Mendes e Paz (2000). A construção do IVO foi baseada no modelo cultural que pauta-se nos seis tipos motivacionais definidos pelos pólos das dimensões harmonia-domínio, igualitarismo-hierarquia e autonomia- conservadorismo, já citadas anteriormente. O tópico deste trabalho denominado de Pesquisas sobre Valores Organizacionais e a Relação Valores e Comportamento Organizacional, especificará, com mais exatidão sobre os citados instrumentos.

Oliveira e Tamayo (2004), com o objetivo de analisar a relação dos valores organizacionais com os valores pessoais, propõem uma nova estrutura para o estudo dos valores organizacionais baseados no conteúdo motivacional dos valores pessoais e não mais nos valores culturais. Eles constroem e validam um novo instrumento para a avaliação dos valores organizacionais, o Inventário de Perfis de Valores Organizacionais (IPVO), o qual será adotado nesse estudo.

Em decorrência de algumas pesquisas sobre valores organizacionais se limitarem a estudá-los, analisando-se essencialmente documentos oficiais da organização, procedimentos oficiais dos diretores e slogans da empresa, Oliveira e Tamayo (2004) propõem o estudo dos valores a partir da percepção que têm os membros de uma organização sobre os princípios que orientam a vida organizacional. Nesse modelo proposto pelos autores, a percepção dos valores organizacionais é resultado principalmente das práticas adotadas pela organização, das atitudes de seus membros, considerando-se o que realmente ocorre na vida organizacional. O estudo dos valores organizacionais a partir dessa abordagem abrange a representação mental que os empregados possuem da organização que atuam, concebendo-se seu sistema axiológico.

De acordo com Tamayo e Borges (2006), parece que esta concepção seja uma maneira pouco objetiva de pesquisar os valores de uma organização, uma vez que analisar os documentos oficiais é mais prático e direto. Porém, valores encontrados nos documentos oficiais podem não manifestar efetivamente a realidade organizacional, pois muitas vezes esses valores existem mais na idealização dos diretores e fundadores das empresas, do que propriamente na vida real das organizações. Inversamente, a vida organizacional representada pelos empregados retrata o pensamento das pessoas que nela atuam. Morgan (1991 citado por TAMAYO; BORGES, 2006) salienta: “as organizações são essencialmente estruturas de

realidades sociais que descansam na mente de seus membros, que as põem em prática em séries de regras e relações”.

É imprescindível enfatizar que a avaliação dos valores organizacionais deve ocorrer a partir dos valores compartilhados, por meio da percepção dos membros que atuam na organização. Porém, não há uma padronização de percepções. As pessoas não percebem de forma igual às práticas vivenciadas, há diversidade na maneira de compreender a vida organizacional. Apesar dessas diferenças, para Tamayo e Borges (2006), o mais importante são as semelhanças, ou seja, a percepção consensual existente entre os membros da organização sobre a presença de determinados valores. Nesse sentido, entendem por valores compartilhados, a convergência na percepção dos valores organizacionais entre todos os membros da organização ou entre parte significativa deles.

Tamayo e Borges (2006) afirmam ainda que a realidade organizacional é representada pelo pensamento coletivo, isto é, por modelos mentais compartilhados pelos membros da organização. Sendo assim, a partir do funcionamento das organizações e da sua própria missão, modelos mentais vão sendo construídos pelos empregados. Entretanto, modelos mentais diferentes produzem percepções diferentes da empresa, do comportamento organizacional e da maneira como o trabalho deve ser realizado. Os valores organizacionais compartilhados assumem a função de criar nos membros da organização modelos mentais semelhantes, estabelecendo, inclusive, elementos importantes para a construção da identidade social da organização, indicando como ela é, valendo-se da percepção de seus empregados.

De acordo com Gondim e Tamayo (1996, p. 63), valores organizacionais podem ser definidos como “princípios ou crenças, organizados hierarquicamente, relativos a comportamentos ou metas organizacionais desejáveis que orientam a vida da organização e estão a serviço de interesses individuais, coletivos ou mistos”. Eles postulam que os valores organizacionais expressam a filosofia da empresa, sua visão do que funciona ou não numa organização, alertando para a diferença existente entre valores pessoais e organizacionais.

Para os autores anteriormente citados, as pessoas, ao ingressarem nas organizações, trazem valores que foram apreendidos com a família e desenvolvidos no meio social a que pertencem seus valores pessoais. Em relação aos valores organizacionais, as organizações, ao serem criadas desenvolvem um sistema de valores próprios que aparecem em função de problemas característicos do próprio negócio. Sendo assim, a existência desses valores organizacionais antecede ao ingresso das pessoas na organização.

Não há como os valores organizacionais serem idênticos aos valores dos membros da organização (valores pessoais). Esses valores muitas vezes podem se conflitarem,

considerando-se que as metas organizacionais podem ser diferentes das metas pessoais, pois se tratam de sistemas de valores distintos. Entretanto, para Tamayo, Mendes e Paz (2000), estes dois sistemas de valores são bem consolidados e as características gerais são comuns aos dois sistemas de valores, pessoal e organizacional.

Tamayo, (2005, p. 167) descreve o paralelismo motivacional entre valores pessoais e valores organizacionais, citando: “Valores pessoais expressam metas da pessoa, os valores organizacionais referem-se a metas da organização. Tanto os valores organizacionais quanto os valores pessoais são princípios que orientam e guiam a vida de pessoas e grupos”.

Conceitualmente, ambos apresentam componentes motivacional, cognitivo, hierárquico e social. As exigências internas de uma organização são, em grande parte, decorrentes das necessidades e motivações de seus membros. Portanto, os valores organizacionais se constituem a partir daquilo que as pessoas, com seus valores pessoais, crêem e pensam, dentro de suas necessidades e concepções prioritárias (TAMAYO, 2005). O quadro 2 apresenta a correspondência entre valores organizacionais e pessoais.

Valores Organizacionais

Correspondência com os valores pessoais

Metas dos

valores organizacionais Alpha

Autonomia Autodeterminação Estimulação

Oferecer retos desafios e variedade no trabalho, estimular a curiosidade, a criatividade e a inovação.

0,87

Bem-estar Hedonismo Promover a satisfação, o bem-estar e a qualidade de vida no trabalho.

0,87

Realização Realização Valorizar a competência e o sucesso

dos trabalhadores.

0,80

Domínio Poder Obter lucros, ser competitiva e

dominar o mercado.

0,80

Prestígio Poder Ter prestígio, ser conhecida e

admirada por todos e oferecer produtos e serviços satisfatórios para os clientes.

0,81

Tradição Tradição Manter a tradição e respeitar os

costumes da organização.

0,75 Conformidade Conformidade Promover a correção, a cortesia e as

boas maneiras no trabalho e o respeito às normas da organização. 0,75 Ética Preocupação com a Coletividade Benevolência Universalismo

Promover a justiça e a igualdade no trabalho, bem como a tolerância, sinceridade e honestidade

0,86

Quadro 2 - Correspondência entre valores organizacionais e pessoais

Fonte: Tamayo, A. (2005).

Segundo Enriquez (1997 citado por TAMAYO, 2005), o Deus venerado nas organizações é o dinheiro em termos de lucro, salários, custos e benefícios. Porém, subjacente

ao lucro, há um mundo de ilusões, de desejos, de sentimentos, de paixões, de aspirações e de frustrações. Esses elementos representam a conjuntura motivacional do trabalhador e a organização não deve ignorar. A omissão a estes aspectos desencadeará o não alcance de metas de produtividade e eficiência. Dessa forma, deduz-se que as metas organizacionais incorporam metas e motivações pessoais.

O próximo tópico menciona as pesquisas sobre os valores organizacionais e as relações com o comportamento organizacional.

2.3.4 Pesquisas sobre Valores Organizacionais e a relação Valores e Comportamento