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Capítulo 2 Dimensão Pessoal

2.2 Vinte e tal anos de história

Ativa, será a palavra que melhor caracteriza a menina Mariana Ribeiro da Silva, de vinte e quatro anos, natural da freguesia de Santo Ildefonso, do concelho do Porto.

Desde sempre ouvi relatos de familiares e amigos onde as descrições sobre mim diziam que, enquanto criança, nunca parava quieta, calada ou de me portar mal. Isto diferenciava-me de todas as outras crianças da minha idade, porque me aventurava, fazia traquinices com muita piada, segundo dizem, e gostava das brincadeiras dos meninos como por exemplo, brincar com carros e jogar à bola. Por outro lado, as bonecas e pinturas nunca me fascinaram.

Tive a felicidade de passar grande parte da minha infância entre duas aldeias, Melres, do concelho de Gondomar, e outra do concelho de Penafiel, Rio Mau. Nelas tive a possibilidade de ser livre como seria impossível num contexto urbano, nelas eram imprescindíveis os amigos, as brincadeiras na rua, durante toda a tarde, os jantares rápidos para retomar a brincadeira. Nelas ganhei o gosto pelo movimento, o jogo, as aprendizagens e o companheirismo.

É neste seguimento que a disciplina de Educação Física ocupa um lugar de relevo ao longo de todos os meus anos de escolaridade, em paridade com a disciplina de Educação Musical. Através do Desporto Escolar pratiquei várias modalidades como a natação, a orientação e o atletismo, de onde retirei grandes valores para a minha vida quotidiana, como o respeito, o espírito de grupo, a entreajuda, a superação, a confiança e a autonomia. Respondi positivamente a um convite de uma amiga para experimentar a modalidade de remo, modalidade que me fascinou e pratiquei durante algum tempo e que também me ajudou na minha formação enquanto pessoa.

Tudo isto, e algumas boas e más experiências com os meus professores de Educação Física, como por exemplo, ter uma professora no sexto ano de escolaridade que me retirou da avaliação de Voleibol porque eu não sabia jogar, e no sétimo ano uma professora que me deu o reconhecimento que outrora não tinha tido e com quem me identifico até aos dias de hoje, facilitaram a minha decisão quanto ao meu futuro. Sabia que queria ser como o meu Pai, um excelente Professor, mas encontrava-me dividida entre a Música e a Educação Física. Então, tendo por base as minhas experiências, decidi que queria ser Professora de Educação Física, principalmente porque o desporto sempre foi uma grande paixão. Desta forma a música ocupou um papel muito importante na minha vida, mas de modo secundário, tendo integrado a Banda Musical de Rio Mau durante alguns anos, como clarinetista. Foram anos muito enriquecedores e gratificantes, uma vez que senti que podia conjugar duas das minhas grandes paixões, podia pertencer a um grupo e ser o orgulho de alguns dos meus familiares.

No ano de 2006, vi-me obrigada a mudar de escola para poder frequentar o Curso Tecnológico de Desporto. Foi então que a Escola Secundária de Rio Tinto entrou na minha vida. Esta escola deu-me a possibilidade de, no décimo segundo ano, realizar um estágio, integrado no curso tecnológico que frequentava, junto de uma população muito especial, que sofria de Paralisia Cerebral, abrindo-me algumas portas, conforme relato mais à frente. É aqui que nasce o meu carinho e o meu interesse pelas pessoas portadores de deficiência. Durante três anos estudei, treinei, dediquei-me e esforcei-me para garantir a minha entrada na Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, o que se verificou em 2009.

Foi neste ano que a minha vida mudou radicalmente. A realidade do Ensino Superior, as pessoas que conheci, os amigos que fiz, as aprendizagens que conquistei e o crescente interesse pelo Desporto fizeram de mim o que sou hoje. Em 2010 iniciei a minha atividade profissional relacionada à minha área de formação, tendo trabalhado no Clube Fluvial Portuense e nas Piscinas Municipais de Gondomar como Professora de Natação e de Hidroginástica. Também neste ano, fui convidada a integrar uma equipa de treinadores de

Desporto Adaptado, no Clube Estrela Vigorosa Sport, onde tive o prazer de reviver a alegria que estas pessoas me proporcionam, trabalhar com uma equipa fantástica e com atletas enternecedores, sendo esta a experiência mais marcante e importante da minha vida. Os campos de férias desportivas organizados pelo Clube Estrela Vigorosa Sport em parceria com o Colégio das Escravas e o Projeto da Universidade Júnior têm contribuído para o aumento da minha experiência profissional, sendo há quatro anos as atividades que me ocupam ao longo dos meses de junho e julho. Por fim, relato a minha experiência como vendedora na loja Decathlon, durante o verão de 2014, experiência esta que me enriqueceu bastante ao nível das relações humanas e do meu entendimento sobre o mundo do trabalho.

Atualmente, encontro-me no último ano do Mestrado de Ensino de Educação Física nos Ensinos Básico e Secundário, tendo desempenhado a função de Professora Estagiária numa Escola onde outrora fui aluna, a Escola Secundária de Rio Tinto. Desde sempre a vertente do ensino foi o meu objetivo ao ingressar neste curso, desde sempre o desejo de voltar à minha Escola me acompanhou, até ao momento em que comecei a perceber todas as dificuldades sentidas no ensino público, até ao momento em que me fizeram perceber que, com algum sacrífico e uma fuga do meu meio confortável, poderia haver esperança para a minha profissão. Com isto, os Açores passaram a ser o destino de eleição para a realização do estágio, conquistando assim uma prioridade importantíssima no concurso de professores. Contudo, o mundo está sempre a mudar e quando julguei ser garantida a minha mudança do continente para a ilha, tudo foi impedido, guardando ainda alguma tristeza por não ter conseguido ganhar esta batalha. No entanto, não baixo os braços e continuo a lutar, a dedicar-me e a esforçar-me por conseguir alcançar o futuro que tanto desejo, aproveitando cada oportunidade e desafio.

Neste caminho conto com aspetos positivos e negativos. Considero-me uma pessoa bastante sensível, carinhosa, motivada, persistente, trabalhadora, observadora, preocupada mas também nervosa, pouco confiante, desanimada, aborrecida, inquieta, insatisfeita e teimosa. Todas estas características espelharam-se junto da minha turma, tendo pontos positivos como a boa

relação que consegui criar com todos os meus alunos, o trabalho diário para lhes proporcionar as melhores aulas e as melhores aprendizagens, mas também pontos negativos como o nervosismo e insatisfação antes e depois de cada aula onde não me sinto tão à vontade.

“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.”

(Freire, 1996, p. 47)