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3.3 Modalidades de violência doméstica contra crianças

3.3.2 Violência psicológica

A violência psicológica é uma das formas mais graves de violência doméstica contra crianças e adolescentes, pois deixa sequelas emocionais de difícil cicatrização. O que a torna tão grave é principalmente o fato de que geralmente é ignorada por não deixar marcas físicas. Ocorre quando o adulto constantemente “deprecia a criança, bloqueia seus esforços de auto aceitação, causando-lhe grande sofrimento mental”. Pode inclusive ser designado como ‘tortura psicológica’ (AZEVEDO; GUERRA, 2007, p. 41).

Embora a maioria dos pais ame seus filhos e queiram que eles se desenvolvam de forma sadia e feliz, muitos não sabem como fazê-lo. Infelizmente, muitos pais não sabem equilibrar suas emoções e expõem os

filhos a experiências que suscitam sentimentos de rejeição, isolamento, medo, humilhação etc. Ameaças de abandono, por exemplo, podem tornar uma criança medrosa e ansiosa, representando formas de sofrimento psicológico.

A violência psicológica pode assumir a forma de negligência afetiva, quando se evidencia a falta de interesse pelas necessidades da criança ou rejeição afetiva, caracterizada por manifestações de agressividade e depreciação para com a criança. Ambas as formas são difíceis de detectar e por isso acabam sendo categorizadas como violência psicológica apenas as situações extremas e continuadas de rejeição ou negligência afetiva (LACRI, 2006).

Para se desenvolver de forma sadia a criança necessita experimentar a sensação de ser acolhida e aprovada pelas pessoas que a cercam. Aliás, existe uma necessidade universal inerente a todos os seres humanos que é o desejo de ser amado e valorizado pelos que o cercam. Pela sua condição peculiar de desenvolvimento a criança é muito frágil e acaba arcando com as consequências do desequilíbrio emocional dos pais.

Ao nascer, é na família que a criança terá seus primeiros referenciais e poderá ter seu anseio por aceitação suprido. Os pais ou responsáveis pela criança funcionam como uma espécie de espelho, onde ela vê refletida a primeira impressão sobre si mesma e sobre o tipo de pessoa que pensa que é. A criança para se desenvolver plenamente precisa sentir o amor dos pais e perceber que é valorizada e importante. Quando uma criança sente que não é importante, amada e valorizada ou quando é depreciada e humilhada, podemos dizer que está sendo vítima de violência psicológica o que certamente trará consequências na autoestima da criança que poderá inclusive, tornar-se um adulto com sérios problemas psicológicos de aceitação, bem como desenvolver comportamentos violentos.

O ambiente emocional do lar é percebido pela criança de tal maneira que logo identifica se existe à sua volta uma atmosfera de harmonia e amor ou de ódio, violência e confusão. Assim, a convivência familiar saudável, principalmente nos primeiros anos de vida, contribui para a formação de uma boa imagem de si mesma, tornando-a apta para enfrentar o mundo lá fora.

Muitos pais, desejosos em ver seus filhos bem encaminhados na vida, acabam por sobrecarregá-los com cobranças intermináveis. Críticas permanentes são uma forma de violência psicológica. A criança que é muito criticada pelos pais, sendo raramente valorizada pelos seus acertos, desenvolve dentro de si a ideia de que não é aprovada por aqueles a quem mais ama, se tornando insegura, com medo de encarar desafios e enfrentar a vida (CUNHA, 2004).

O amor incondicional é um pré-requisito para que o ser humano ame a si mesmo. Mas o que é o amor incondicional? É amar sem impor condições. É gostar de alguém pelo que é e não pelo que faz. Amar incondicionalmente é amar apesar das falhas do outro.

Apesar de amarem muito os filhos, alguns pais somente demonstram este amor quando os mesmos conseguem se sobressair em alguma tarefa. A demonstração do amor fica condicionada ao que a criança é capaz de realizar. Essa forma de agir é muito comum em nossa sociedade apesar de ser profundamente nociva para a criança que passa a acreditar que seus pais só a amarão se conseguirem bons resultados em suas atividades.

Uma criança que só recebe amor de forma condicional terá muita dificuldade de amar e apoiar a si mesma quando cometer algum erro. Além disso, ela desenvolverá sentimentos de inferioridade que sufocarão seu amor próprio e autoestima (AZEVEDO; GUERRA, 2007).

Outro “sintoma” de violência psicológica é evidenciado pela falta de prioridade que os pais dão aos filhos. As crianças medem a importância que têm para seus pais através do grau de atenção que recebem deles. A sobrecarga de compromissos assumidos pelos pais os transforma em figuras inatingíveis para seus filhos, que se sentem rejeitados e com um profundo sentimento de desamparo. Tão importante quanto dedicar tempo para os filhos é observar a qualidade desse tempo. De nada adianta o pai passar o final de semana em casa distraído diante da televisão ou lendo um livro o dia inteiro. Às vezes é mais produtivo disponibilizar meia hora de atenção concentrada para o filho do que passar o dia inteiro dentro de casa absorvido com atividades domésticas.

Outra modalidade de violência psicológica (e talvez a mais perniciosa) é a cobrança exagerada de alguns pais, na tentativa de forjar “filhos modelos”. Assim, acabam sendo extremamente exigentes e levando a criança e/ou o adolescente a abandonar seus sonhos para vivenciar as expectativas dos pais. Sem perceber, alguns pais acabam projetando para os filhos coisas que eles próprios não conseguiram realizar em suas vidas.

A comparação de desempenho entre os filhos também se caracteriza como uma forma de violência psicológica, que causa constrangimento e insegurança nos filhos. Além disso, cria a cultura de competitividade dentro do lar.

Conforme explicitado, a violência psicológica está, via de regra, presente nas relações pai-mãe-filho-filha, seja através de chantagem emocional, da coerção psicológica, da imposição da vontade adulta contra os desejos da criança.